CICLO
António da Cunha Telles – Continuar a Viver


António da Cunha Telles é uma das figuras centrais do Cinema Novo Português nos anos sessenta ou, se quisermos, a figura central, do ponto de vista da produção. Mas a imagem do produtor, que diz ter sido “por acidente”, esconde uma vontade primeira: a de ser realizador. Vindo da Madeira, onde nasceu, no Funchal, em 1935, para estudar medicina em Lisboa, rapidamente percebeu que o seu verdadeiro interesse residia nas imagens em movimento (ecos da memória de um adolescente que revelava os seus próprios filmes feitos em 9,5mm), vinculando-se, na faculdade, às atividades ligadas ao cinema, nomeadamente a realização de um filme científico. Num impulso de mudança, e tendo conseguido uma bolsa do Fundo do Cinema Nacional, ingressa no IDHEC (Institut d’Hautes Études Cinematographiques), em Paris, onde cruza os seus estudos com Paulo Rocha, uma amizade que resultou na produção do primeiro filme do realizador portuense: OS VERDES ANOS (1963). No ano seguinte, produz também a primeira longa-metragem de Fernando Lopes, BELARMINO, iniciando assim a carreira de dois dos nomes mais sonantes da cinematografia portuguesa, e assumindo a produção contínua, até 1967, de filmes destes e outros realizadores, como António de Macedo e Manuel Guimarães, numa fase que denominou de “filosofia de produção”, à semelhança das intenções de António Lopes Ribeiro nos anos quarenta. De retorno a Lisboa – cidade-cenário dos vários filmes que produziu e também dos que realizou – vai criar o Curso Universitário de Cinema Experimental, que formou grande parte da geração de técnicos do Cinema Novo e iniciar-se na distribuição, em 1973, com a fundação da Animatógrafo. O seu papel como distribuidor, alicerçado numa lógica cinéfila que cultivou na Cinemateca Francesa (nos tempos de estudante), é igualmente notável, tendo sido responsável pela exibição em Portugal de filmes clássicos de cineastas como Sergei Eisenstein, Jean Renoir, Jean Vigo, Roberto Rossellini, bem como de cineastas então emergentes: Nagisa Oshima, Alain Tanner, Bernardo Bertolucci e Glauber Rocha. A sua carreira ganha, no final dos anos sessenta, uma nova – e desejada – vertente: a realização (não abandonando, no entanto, a produção, nomeadamente produções executivas estrangeiras). O CERCO (1970) é a primeiro das seis longas-metragens que realizou até à data, granjeando-lhe as atenções nacionais e internacionais, com o rosto de Maria Cabral a cobrir capas de jornais e revistas de moda, num espírito de abertura e cosmopolitismo completamente fora dos trâmites da época. O seu filme seguinte, MEUS AMIGOS (1974), demarca-se do anterior por um certo tom de pessimismo geracional, onde se põem à prova os limites da ficção. CONTINUAR A VIVER ou OS ÍNDIOS DA MEIA-PRAIA, de 1976, é a sua única longa-metragem documental, um trabalho que se desvia da efervescência panfletária da altura. VIDAS (1984), PANDORA (1995) e KISS ME (2004) são as três últimas longas-metragens que dirigiu, agrupados assim porque se interligam pelo mesmo raciocínio, segundo o realizador, de projetos pensados para “chegar ao público”, um pouco no rasto da memória do sucesso que O CERCO conquistara, sempre recheados de elencos surpreendentes, sobretudo PANDORA, um filme “autorretrato”.
Este Ciclo, que se estenderá por junho e julho, aborda a atividade de António da Cunha Telles, como realizador, como produtor, como distribuidor, três facetas cujo cruzamento compõe uma obra ímpar e absolutamente crucial no cinema português. Será publicado um catálogo.
 

 
25/06/2014, 19h30 | Sala Dr. Félix Ribeiro
Ciclo António da Cunha Telles – Continuar a Viver

Catembe | Cortes de Censura de Catembe
duração total da sessão: 56 min
 
25/06/2014, 22h00 | Sala Luís de Pina
Ciclo António da Cunha Telles – Continuar a Viver

O Trigo e o Joio
de Manuel Guimarães
Portugal, 1965 - 98 min
26/06/2014, 19h00 | Sala Dr. Félix Ribeiro
Ciclo António da Cunha Telles – Continuar a Viver

Domingo à Tarde
de António de Macedo
Portugal, 1965 - 93 min
26/06/2014, 19h30 | Sala Luís de Pina
Ciclo António da Cunha Telles – Continuar a Viver

O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro / Antonio das Mortes
de Glauber Rocha
Brasil, 1969 - 95 min
26/06/2014, 21h30 | Sala Dr. Félix Ribeiro
Ciclo António da Cunha Telles – Continuar a Viver

Sever do Vouga uma Experiência | Mudar de Vida
duração total da sessão: 123 min
25/06/2014, 19h30 | Sala Dr. Félix Ribeiro
António da Cunha Telles – Continuar a Viver
Catembe | Cortes de Censura de Catembe
duração total da sessão: 56 min
M/12
Produções António da Cunha Telles

CATEMBE
CORTES DE CENSURA DE CATEMBE
de Faria de Almeida
Portugal, 1964 – 45 min + 11 min

Coproduzido por Faria de Almeida com António da Cunha Telles, na sua versão original de 87 minutos o filme chamava-se CATEMBE – 7 DIAS EM LOURENÇO MARQUES e incluía uma reportagem sobre a capital moçambicana como cidade turística. Retalhado pela censura que lhe impôs 103 cortes correspondentes a planos de negativo que foram destruídos, teve uma segunda versão (de 48 minutos) que foi igualmente interdita. CATEMBE é uma valiosa obra da filmografia portuguesa que permaneceu invisível durante largo tempo mas é agora possível apresentar em cópia nova.
 

25/06/2014, 22h00 | Sala Luís de Pina
António da Cunha Telles – Continuar a Viver
O Trigo e o Joio
de Manuel Guimarães
com Eunice Muñoz, Igrejas Caeiro, Mário Pereira, Barreto Poeira
Portugal, 1965 - 98 min
M/12
Produções António da Cunha Telles

Adaptação do romance homónimo de Fernando Namora, assinada pelo próprio escritor. Um drama sobre uma família de agricultores do baixo Alentejo em que o chefe desbarata na feira o dinheiro destinado à compra de uma burra, indispensável para a labuta no campo. A realização é despojada e moderna. Música de Joly Braga Santos. Foi o segundo filme de Manuel Guimarães (co)produzido por Cunha Telles.

26/06/2014, 19h00 | Sala Dr. Félix Ribeiro
António da Cunha Telles – Continuar a Viver
Domingo à Tarde
de António de Macedo
com Isabel de Castro, Ruy de Carvalho, Isabel Ruth
Portugal, 1965 - 93 min
M/12
Produções António da Cunha Telles

Título marcante do Cinema Novo Português, DOMINGO À TARDE é cronologicamente o terceiro, emparelhando com OS VERDES ANOS (Paulo Rocha, 1963) e BELARMINO (Fernando Lopes, 1964), também produzido por Cunha Telles, e, como aqueles, um título perfeitamente inserido nas tendências do novo cinema dos anos sessenta. “Gosto de experimentar, cinema de montagem intenso, sincopado, gosto de inserir teoria dentro da ação fílmica” (Luís de Pina) são algumas das características desta obra amarga e sóbria, situada no meio hospitalar e que inclui o segmento de um filme fantástico que indica a dimensão experimental da obra futura de Macedo. Com argumento baseado no romance de Fernando Namora, foi o seu primeiro filme de longa-metragem. Foi selecionado para a secção competitiva do Festival de Veneza de 1965, onde foi exibida uma versão não censurada.

26/06/2014, 19h30 | Sala Luís de Pina
António da Cunha Telles – Continuar a Viver
O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro / Antonio das Mortes
de Glauber Rocha
com Maurício do Valle, Odete Lara, Lorival Pariz, Antonio Piranga
Brasil, 1969 - 95 min
M/12
Distribuídos por António da Cunha Telles

A projeção de O DRAGÃO DA MALDADE CONTRA O SANTO GUERREIRO / ANTONIO DAS MORTES, de Glauber Rocha, substitui a do inicialmente programado SANGRE DEL CONDOR, de Jorge Sajines por impossibilidade de projeção.

Mais conhecida como ANTONIO DAS MORTES, esta primeira longa-metragem a cores de Glauber Rocha amplia o universo de DEUS E O DIABO NA TERRA DO SOL, com uma mise-en-scène que tem alguns pontos em comum com o western spaghetti. O filme aproxima certos mitos populares brasileiros e a alegoria política. O protagonista, Antonio das Mortes, assassino por contrato a serviço dos poderosos, já surgira em DEUS E O DIABO NA TERRA DO SOL. Mas desta feita acaba por se voltar contra eles e massacra os representantes da ordem estabelecida. “ANTONIO DAS MORTES é o meu ALEXANDRE NEVSKI, é o ALEXANDRE NEVSKI do sertão, a ópera global inspirada pelas lições de Eisenstein” (Glauber Rocha). Estreado a 13 de outubro de 1972 no cinema Estúdio, com distribuição da Animatógrafo.

26/06/2014, 21h30 | Sala Dr. Félix Ribeiro
António da Cunha Telles – Continuar a Viver
Sever do Vouga uma Experiência | Mudar de Vida
duração total da sessão: 123 min
M/12
Produções António da Cunha Telles

com a presença de António da Cunha Telles

SEVER DO VOUGA UMA EXPERIÊNCIA
locução de Alexandre O’Neill
Portugal, 1971 – 30 min
MUDAR DE VIDA
de Paulo Rocha
com Geraldo Del Rey, Maria Barroso, Isabel Ruth, Constança Navarro
Portugal, 1966 – 93 min

Filmada no Furadouro, creditada como uma Produção Cunha Telles, a segunda longa-metragem de Paulo Rocha é um filme onde ecoa em surdina a guerra colonial, com a história de um homem que regressa ao país e se reencontra dificilmente com a sua aldeia natal, por onde também passam sinais de um desejo de mudança. Mudança de vida, mudança de cinema. Depois de OS VERDES ANOS, novo fortíssimo retrato de um país e de um tempo, numa obra que convida incessantemente a novas visões e avaliações. “Se OS VERDES ANOS é um filme de condenação, MUDAR DE VIDA é um filme de redenção […]. É o seu primeiro filme em que a influência do cinema japonês é visível, quase sempre quando não se espera, com a mesma rebeldia no feminino das heroínas de Mizoguchi, é também o filme onde o realizador melhor absorve as lições da Nouvelle Vague. (…) É a sua primeira e radical colagem, conduzida pela poética de António Reis, autor dos mais belos diálogos do cinema português” (João Bénard da Costa). A sessão abre com SEVER DO VOUGA UMA EXPERIÊNCIA, produzido por Cunha Telles com o patrocínio da Shell Portuguesa, realização de Paulo Rocha e supervisão creditada a Manoel de Oliveira. O filme aborda a questão agrícola em Portugal, sublinhando os problemas devidos à má qualidade das alfaias e das sementes e propondo como solução a mecanização e a criação de uma cooperativa.