CICLO
Stan Brakhage: A Arte da Visão


“Imagine an eye unruled by man-made laws of perspective, an eye unprejudiced by compositional logic, an eye which does not respond to the name of everything but which must know each object encountered in life through an adventure of perception.”
                                                                                                             Metaphors on Vision
 
Uma retrospetiva do essencial da vasta produção de Stan Brakhage (1933-2003), nome fundamental da vanguarda cinematográfica norte-americana que, ao longo de cinco décadas e de mais de trezentos e cinquenta filmes, perseguiu aquilo que definiu como uma “arte da visão”. Um criador que reclama profundas influências de outras artes como a literatura, a pintura e a música, que trabalhou o cinema como modo de reproduzir uma visão essencialmente interior ou de impulsionar uma experiência como uma pura perceção visual, realizando filmes que se dirigem diretamente à visão do espectador, proporcionando uma real "aventura da perceção".
Podendo dividir-se em distintos períodos, o cinema de Brakhage é um cinema muito pessoal e lírico com um forte fundo autobiográfico, composto maioritariamente por filmes não narrativos que recorrem a uma multiplicidade de peculiares procedimentos como a repetição, uma arte única de câmara à mão e da montagem rápida, à sobreimpressão de imagens ou a um trabalho sobre a materialidade da luz (componente essencial da sua obra) que radica em abstrações fotográficas, mas também em processos como a colagem de matéria orgânica sobre o filme e a pintura e o desenho direto sobre a película, que dominou a sua produção a partir de meados dos anos oitenta, aproximando-se do expressionismo abstrato – técnicas que celebrizaram o cinema de Stan Brakhage.
Os vários programas da retrospetiva concentram-se no “período” pós 1958, em que Brakhage realizou ANTECIPATION OF THE NIGHT, filme lírico estruturado em torno da experiência da visão, que condensa várias das inovações técnicas que marcam uma segunda fase da sua obra, ao deixar para trás os “psicodramas” ou os “trance films” sonoros e a preto e branco, a que sucedem “épicos mitológicos” e a transição para um cinema não representacional com o recurso intensivo à pintura que, a partir dos anos noventa, coexistirá com o regresso a um “cinema fotográfico”. O cineasta referia-se frequentemente às suas obras como "pensamento visual em movimento" ou "música visual", pelo que a maior parte da sua filmografia caracteriza-se pela ausência de som, que concorreria com a força das imagens.
Criador multifacetado, é ainda autor de vários livros e escritos sobre cinema, entre os quais o seminal Metaphors on Vision (Film Culture,1963), esgotado durante quarenta anos e recentemente reeditado.
Esta retrospetiva é um programa ambicioso composto por mais de sessenta filmes exclusivamente exibidos em cópias em película, que assim restituem a dimensão material do cinema de Brakhage, a maior parte dos quais inéditos na Cinemateca, revelando obras fundamentais do cineasta que atravessam cinquenta anos de cinema.
 
P. Adams Sitney, proeminente historiador do cinema de vanguarda, cofundador dos Anthology Film Archives (com Brakhage, Mekas ou Kubelka), que escreveu intensivamente sobre Brakhage em obras como Visionary Film, Modernist Montage, Eyes Upside Down e The Cinema of Poetry, estará na Cinemateca para apresentar duas conferências no âmbito deste programa: uma dedicada a Metaphors on Vision, de que foi editor, e a segunda votada a uma análise mais abrangente da obra do cineasta.
 
 
28/03/2018, 18h30 | Sala Luís de Pina
Ciclo Stan Brakhage: A Arte da Visão

A Child's Garden and the Serious Sea | Anticipation of the Night
duração total da projeção: 117 min | M/12
 
29/03/2018, 18h30 | Sala Luís de Pina
Ciclo Stan Brakhage: A Arte da Visão

The Text Of Light | Roman Numeral I e II | Arabic 1 e 2
duração total da projeção: 94 min | M/12
28/03/2018, 18h30 | Sala Luís de Pina
Stan Brakhage: A Arte da Visão
A Child's Garden and the Serious Sea | Anticipation of the Night
duração total da projeção: 117 min | M/12
Programa 9
A CHILD'S GARDEN AND THE SERIOUS SEA
Estados Unidos, 1991 – 75 min / sem som
ANTICIPATION OF THE NIGHT
Estados Unidos, 1958 – 42 min / sem som
de Stan Brakhage

No início dos anos noventa, em paralelo com os filmes pintados à mão, Brakhage produziu uma série de meditações sobre a infância, a adolescência e o envelhecimento que ficou conhecida como “Vancouver Island Quartet”, de que o primeiro filme desta sessão é o capítulo inicial. Série de cariz mais documental indiretamente associada à biografia da sua segunda mulher, Marilyn, cujos locais onde viveu a infância são representados neste primeiro capítulo. Se A CHILD'S GARDEN AND THE SERIOUS SEA assinala uma nova fase na obra do cineasta, o mesmo papel tem ANTICIPATION OF THE NIGHT, o trabalho seminal de uma montagem elíptica que convoca a imagem de uma inocência perdida, que, em 1958, anuncia uma transição decisiva no seu cinema. Inteiramente estruturado pela natureza da experiência da visão, ANTICIPATION OF THE NIGHT deixa para trás formas mais narrativas e explora de modo consistente todo um conjunto de novas técnicas em que a ideia de repetição, importada dos escritos de Gertrude Stein, desempenha um papel primordial.
 
29/03/2018, 18h30 | Sala Luís de Pina
Stan Brakhage: A Arte da Visão
The Text Of Light | Roman Numeral I e II | Arabic 1 e 2
duração total da projeção: 94 min | M/12
Programa 10 – O Texto da Luz
THE TEXT OF LIGHT
Estados Unidos, 1974 – 70 min / sem som
ROMAN NUMERAL I E II
Estados Unidos, 1979 – 6, 9 min /sem som
ARABIC 1 E 2
Estados Unidos, 1980 – 4, 5 min / sem som
de Stan Brakhage

THE TEXT OF LIGHT é um trabalho essencial pelo modo como Brakhage realiza um verdadeiro estudo da luz a partir dos reflexos de um cinzeiro de vidro. Dedicado ao cineasta Jim Davies, THE TEXT OF LIGHT revela-se como uma aventura extrema no domínio da abstração. Uma sinfonia de padrões de luz e de ritmos de composição que Brakhage prosseguiria em filmes posteriores em que o trabalho da abstração fotográfica atinge o auge como as séries ROMAN NUMERAL e ARABIC, de que mostramos quatro exemplos. E se o cineasta descrevia as suas primeiras experiências como tentativas de reproduzir modos de visão alterados, atribui a estes filmes a qualidade de procurarem revelar um mundo ainda não visto. “All that is, is light” afirmaria Johannes Scotus Erigena, citado por Ezra Pound, por sua vez citado por Brakhage enquanto um dos elementos fundamentais do seu trabalho.