CICLO
In Memoriam Alberto Vaz da Silva | Nuno Melo | Maria Barroso


ALBERTO VAZ DA SILVA
Alberto Vaz da Silva (1936-2015) fez parte de uma geração brilhante e marcante que emergiu em finais dos anos cinquenta e se torna conhecida no início da década seguinte. Autodenominados “Católicos Progressistas”, tinham em O Tempo e o Modo, revista que criaram de raiz, a sua tribuna. Dela fizeram parte, entre vários outros, João Bénard da Costa, Helena Vaz da Silva, Pedro Tamen, M.S. Lourenço, Nuno Bragança, José Pedro Pinto Leite, Manuel Lucena, Mário Murteira e António Alçada Baptista. Alberto Vaz da Silva é, porventura, o menos mediático (sintomaticamente é o único de entre os citados que não tem entrada direta na Wikipédia). A sua prioridade nunca foi fazer uma “carreira”, fosse ela política, artística ou sequer académica. A prioridade para Alberto Vaz da Silva, aquilo que ele, como nenhum outro praticou (porque teorizá-lo é muito fácil), foi a vida, a sua própria vivência. O ideal, a filosofia, a utopia de toda essa geração. Canalizou todo o seu enorme talento e toda a sua energia para estabelecer, com uma lógica irrefutável, as pontes mais improváveis (Palolo e Agustina Bessa-Luís; Freud e Mozart; Proust e Nicholas Ray).
Esporadicamente, muito esporadicamente, Alberto Vaz da Silva escreveu sobre cinema. Sobre filmes e realizadores mas também sobre os Astros ou o Mar. A Cinemateca presta-lhe homenagem, exibindo um dos filmes da sua vida: LOLA de Jacques Demy (excecionalmente acompanhado por um texto de sua autoria, publicado no’Tempo e o Modo em 1963).
A Cinemateca publica no seu sítio web (www.cinemateca.pt) todos os escritos de Alberto Vaz da Silva sobre cinema.


NUNO MELO
Era um dos mais populares atores portugueses, muito pelas suas participações em programas e séries televisivas. Mas tinha também um longo currículo no cinema português, de que era um rosto recorrente desde finais dos anos oitenta. Muitas vezes como secundário, outras, menos, com papel preponderante. Evocamo-lo com três filmes em que foi protagonista: A FILHA de Solveig Nordlund, LOBOS de José Nascimento, e sobretudo O BARÃO, de Edgar Pêra, porventura o único filme feito à sua medida. Nuno Melo morreu em Junho passado, aos 55 anos.


MARIA BARROSO
Na homenagem que a Cinemateca presta a Maria Barroso (1925-2015) são exibidos três filmes dos mais relevantes da sua filmografia: MUDAR DE VIDA, de Paulo Rocha (1966), BENILDE OU A VIRGEM MÃE e AMOR DE PERDIÇÃO (1974/78) de Manoel de Oliveira.
Na sua vida enquanto atriz, antes do cinema, Maria Barroso tinha feito teatro. Mal finalizou o Curso de Artes Dramáticas do Conservatório Nacional, em 1943 (a par com o curso de Histórico Filosóficas da Faculdade de Letras, como prometera aos pais), entrou para o Teatro D. Maria II. O reconhecimento do público veio com o papel de Benilde na peça de José Régio: Benilde ou Virgem Mãe. Nascia uma jovem atriz num país onde não o pôde ser, a não ser a espaços, e muito longe das medidas das suas faculdades. Aconteceu que, após a apoteose, em A Casa de Bernarda Alba – em que Adela/Maria Barroso, a filha revoltada, partia em cena, com o joelho, um bastão usado pela mãe autoritária, o teatro veio abaixo!, e a censura acordou. A peça foi cancelada e Maria Barroso, claro… afastada do teatro pelo regime. "Até parecia que era Salazar que ela estava a partir", diria Amélia Rey Colaço naquela famosa representação em Santarém. Só voltaria a pisar os palcos 17 anos depois. Em 1966, na peça de Jean Cocteau, A Voz Humana deu-se a sua última representação, no Teatro São Luiz em que, de novo, a peça foi interrompida com violência pela PIDE. Já tinha, por esta altura, forçosamente percebido que “quando se vai à polícia política, fala-se muito pouco, sorri-se muito e mente-se sempre.” Maria Barroso, acompanhando permanentemente o marido, Mário Soares, na vida política conseguiu manter sempre o seu espaço. Espaço dedicado a uma luta constante na defesa da cultura, da liberdade e da justiça. Na convicção absoluta de que era na voz dos poetas que podia encontrar uma forma intransigente e inquebrável de expressão, nunca deixou de dar récitas de poesia, o que muito irritava os censores. Certa vez, quando subia ao estrado, um chefe da polícia a agarrá-la por um braço, diz: "A Senhora está proibida de falar!!!", claro… Maria Barroso diz: “Não posso falar, mas posso recitar!!”
E, precisamente quando o afastamento já parecia definitivo, é em 1966 que Paulo Rocha se lembra de a convidar para o seu filme MUDAR DE VIDA: “Nunca tinha feito cinema. Paulo Rocha veio falar comigo... os diálogos eram maravilhosos”, diz “talvez até os melhores diálogos que o nosso cinema tem tido. Pensei que seria uma experiência a tentar, que me enriqueceria…”. A nós enriqueceu! Maria Barroso compõe, deixa-nos nesse filme, uma das mais comoventes personagens dos verdes anos do cinema português: Júlia, mulher do mar, em que tudo se centra, tudo se quebra: vida e arte, força e fragilidade, silêncio e grito, ausência e exílio, do país que somos, no país que somos: “este nosso bem-querer / só tem fim na sepultura”.
Quando, em 1976, Manoel de Oliveira entende adaptar para cinema Benilde ou a Virgem Mãe, sendo José Régio sua admiração maior, não é de surpreender que se lembrasse de ir buscar, trinta anos depois, os atores do Teatro D. Maria II. Maria Barroso não poderia dizer que não, mas não poderia também repetir o papel do passado, o de Benilde, e no filme faz de Genoveva, a velha criada, atenta e secreta, firme na sua fé. A segunda colaboração com Oliveira não tardou. Em 1978, surge no papel de Madre Superiora no – como diria quem mais defendeu o filme à época – “inadjectivável” AMOR DE PERDIÇÃO. Filme que fez quebrar tantas grades e que tanto tumulto provocou. Talvez também por isto, quando Teresa vai para o convento e a Madre Superiora diz: “Estas grades não se abrem”, a frase, assim dita e por quem é, vai muito além do sentido do momento. Com Manoel de Oliveira fez mais dois filmes: LE SOULIER DE SATIN (1984) e LISBOA CULTURAL (1983). Da sua filmografia consta ainda, de Armando Miranda, o documentário AQUI, PORTUGAL! (1947) e o filme de Manuel Guimarães O CRIME DE ALDEIA VELHA (1963), no qual fez a dobragem da atriz Barbara Laage.

 
08/09/2015, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo In Memoriam Alberto Vaz da Silva | Nuno Melo | Maria Barroso

Benilde ou a Virgem Mãe
de Manoel de Oliveira
Portugal, 1974 - 106 min
 
10/09/2015, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo In Memoriam Alberto Vaz da Silva | Nuno Melo | Maria Barroso

A Filha
de Solveig Nordlund
Portugal, 2003 - 77 min
08/09/2015, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
In Memoriam Alberto Vaz da Silva | Nuno Melo | Maria Barroso
Benilde ou a Virgem Mãe
de Manoel de Oliveira
com Maria Amélia Matta, Jorge Rola, Jacinto Ramos, Maria Barroso, Augusto de Figueiredo, Glória de Matos
Portugal, 1974 - 106 min
M/12
In Memoriam Maria Barroso

BENILDE OU A VIRGEM MÃE é a adaptação fiel da peça homónima de José Régio (1947) e foi o filme que marcou a consagração internacional de Oliveira. É uma obra que nos leva à significação última da corporalidade e da oralidade, permanentes manifestações da morte ou da luta contra ela. Maria Barroso e Augusto de Figueiredo que, à data da estreia da peça tinham representado os protagonistas, surgem agora nos papéis da criada e do padre. Foi um dos últimos filmes apoiados pelo Centro Português de Cinema e um dos primeiros a ser apoiado pelo recém-criado fundo do Instituto Português de Cinema, um mês antes da Revolução. Teve estreia discreta no quente mês de novembro de 1975. Acusado de ter realizado um filme reacionário, à época Oliveira dizia: “o cinema revolucionário está atrasado face à revolução”. BENILDE foi pretexto para acesas polémicas em que se debatia o futuro de um país, mas também o futuro do cinema. Maria Barroso interpreta Genoveva, a velha criada, guardiã da jovem Benilde, o papel que trinta anos antes lhe coubera e lhe valera a consagração, no palco do Teatro D. Maria II.

10/09/2015, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
In Memoriam Alberto Vaz da Silva | Nuno Melo | Maria Barroso
A Filha
de Solveig Nordlund
com Nuno Melo, Joana Bárcia, Margarida Marinho, Cláudio da Silva, Alexandre Falcão, Cecília Guimarães
Portugal, 2003 - 77 min
M/16
In Memoriam Nuno Melo

Com argumento original da realizadora e Mário de Carvalho, A FILHA segue a história do desencontro entre um homem de 45 anos, produtor de televisão de sucesso concentrado na sua carreira, e a sua filha que, à beira do 18º aniversário, acusa a ausência paterna na sua vida, faz-lhe um ultimato (que ele falha) e abandona a casa forçando uma viagem de procura e tentativa de reconhecimento. Nuno Melo é “o pai” de Joana Bárcia, “a filha”. Primeira exibição na Cinemateca.