CICLO
Graças a Henri Langlois


Henri Langlois, o maior cinéfilo de todos os tempos, o inventor da profissão de programador de filmes, nasceu há cem anos em Izmir, na Turquia, numa família francesa e só foi viver para França aos oito anos de idade. Em 1936, com apenas 22 anos, com Georges Franju, Jean Mitry e Paul-Auguste Harlé, fundou a Cinemateca Francesa (a segunda a ter sido fundada no mundo, três anos depois da sueca) e foi o seu secretário-geral até à sua súbita morte, em janeiro de 1977. Entre os anos que se seguiram à Segunda Guerra Mundial e finais dos anos sessenta, o prestígio e a influência da Cinemateca Francesa não pararam de crescer, a tal ponto que a abrupta exoneração de Langlois pelo governo francês, em fevereiro de 1968, desencadeou motins nas ruas de Paris e protestos das maiores personalidades do mundo do cinema, obrigando os seus adversários a recuar. Autodidata, dotado de uma extrema inteligência, nascido apenas vinte anos depois das primeiras projeções dos irmãos Lumière, Langlois pôde conhecer pessoalmente diversos pioneiros, inclusive Méliès, e via o cinema como um vasto espaço que podia ser percorrido de diversas maneiras e em diversas direções. Recusava as noções de bom gosto e fazia questão de guardar todos os filmes, sem descurar os que eram considerados maus. Contrariamente a outros diretores de cinematecas, que, pondo à frente a noção de preservação, se opunham a mostrar a mostrar e sobretudo a emprestar parte das cópias que tinham, Langlois afirmava que “as únicas obras-primas em perigo são as que não são vistas” e fazia questão de tornar acessível o maior número possível de filmes, independentemente de critérios técnicos de conservação. Henri Langlois tornou-se um mito em vida, cultivando uma personagem extravagante, obeso, por vezes imprevisível, mas por detrás desta personagem havia um verdadeiro, profundo e incessante trabalho. Era um homem que podia ser muito generoso e ajudou muitas cinematecas amigas, como a Cinemateca Portuguesa, com cujo fundador, Manuel Félix Ribeiro, teve vários contactos mesmo antes do arranque da instituição na década de cinquenta (há indícios de que Langlois teria vindo a Portugal durante a Segunda Guerra Mundial e houve contactos pelo menos desde 1940). Langlois também ajudou a Cinemateca Portuguesa a organizar vários Ciclos históricos, desde o início dos anos sessemta até ao fim da sua vida. João Bénard da Costa escreveu que aprendeu com ele “tudo de uma profissão que também veio ser a minha”, a de programador de filmes. Os futuros realizadores da Nouvelle Vague, que se conheceram na sala da Cinemateca Francesa, foram chamados “filhos da Cinemateca”. Mas todos os espectadores de cinema, ainda que não o saibam, são até certo ponto “filhos” deste homem extraordinário, que teve grande influência na história do cinema, moldando-a em parte, porque influenciou aqueles que viam filmes, aqueles que os comentavam, aqueles que os programavam e aqueles que viriam a fazer filmes. Este programa, organizado pela Cinemateca Francesa, aborda diversos aspetos do trabalho de Langlois como programador: a sua paixão pelo cinema mudo, filmes que ele fez entrar e ficar na história do cinema, paixões pessoais (Jean Renoir, Louise Brooks), o diálogo com jovens cineastas, num panorama que vai de Georges Méliès a Philippe Garrel.
Além dos filmes abaixo discriminados, serão apresentados antes das sessões um dos treze breves filmes de cerca de dois minutos em homenagem a Langlois por Manoel de Oliveira, Bernardo Bertolucci, Agnès Varda, Souleymane Cissé, Stephen Frears, Wim Wenders, William Friedkin, Costa-Gavras, Kyoshi Kurosawa, Jean-Paul Rappeneau, Volker Schlöndorff, Roman Polanski e Francis Ford Coppola.
Assinala-se ainda que, evocando o elo fundamental estabelecido entre Henri Langlois e João Bénard da Costa, este Ciclo será seguido, ainda este ano, por novas iniciativas da Cinemateca em homenagem a João Bénard da Costa, em torno do seu legado.
 

 
12/09/2014, 21h30 | Sala Dr. Félix Ribeiro
Ciclo Graças a Henri Langlois

Citizen Langlois
de Edgardo Cozarinsky
França, 1994 - 68 min
 
12/09/2014, 22h00 | Sala Luís de Pina
Ciclo Graças a Henri Langlois

Nana
de Jean Renoir
França, 1926 - 150 min
13/09/2014, 15h30 | Sala Dr. Félix Ribeiro
Ciclo Graças a Henri Langlois

Une Partie de Campagne
Passeio ao Campo
de Jean Renoir
França, 1936 - 50 min
13/09/2014, 19h00 | Sala Dr. Félix Ribeiro
Ciclo Graças a Henri Langlois

Langlois | Cinema de Vanguarda 2
duração total da sessão: 73 min | M/12
13/09/2014, 19h30 | Sala Luís de Pina
Ciclo Graças a Henri Langlois

L’Enfant de Paris
de Léonce Perret
França, 1913 - 120 min
12/09/2014, 21h30 | Sala Dr. Félix Ribeiro
Graças a Henri Langlois

Em colaboração com a Cinémathèque Française
Citizen Langlois
de Edgardo Cozarinsky
com narração de Niels Arestrup
França, 1994 - 68 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Retrato

Encomendado pela Cinemateca Francesa a Edgardo Cozarinsky, escritor e cineasta argentino então parisiense, CITIZEN LANGLOIS, composto unicamente por imagens de arquivo e narração em off, é o melhor documentário feito à data de hoje sobre Langlois, porque vai além dos factos, embora não os oculte. Fascinado pelo tema do exílio, do desenraizamento, Cozarinsky procura encontrar o rosebud deste citizen do cinema, o que levou um homem muito jovem a salvar o passado, como forma de projetar-se no futuro.

12/09/2014, 22h00 | Sala Luís de Pina
Graças a Henri Langlois

Em colaboração com a Cinémathèque Française
Nana
de Jean Renoir
com Catherine Hessling, Jean Angelo, Werner Krauss
França, 1926 - 150 min
mudo, intertítulos em francês legendados eletronicamente em português | M/12
Jean Renoir

NANA, o mais ambicioso dos poucos filmes mudos de Renoir é uma sumptuosa adaptação do magnífico romance homónimo de Zola, próxima do grotesco de Stroheim, cuja influência Renoir reconheceu explicitamente. Foi a última colaboração de Renoir com Catherine Hessling, que foi a sua primeira mulher e tem uma performance absolutamente extravagante no papel da cortesã parisiense de fins do século XIX.

13/09/2014, 15h30 | Sala Dr. Félix Ribeiro
Graças a Henri Langlois

Em colaboração com a Cinémathèque Française
Une Partie de Campagne
Passeio ao Campo
de Jean Renoir
com Sylvia Bataille, Jacques Brunius, Jeanne Marken
França, 1936 - 50 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Jean Renoir

UNE PARTIE DE CAMPAGNE é a homenagem de Jean Renoir ao seu pai, o pintor Auguste Renoir, num filme que é uma digressão pelo tempo e pelo espírito dos impressionistas. Na segunda metade do século XIX, uma família parisiense vai dar um passeio ao campo, à beira rio. Enquanto os homens pescam, as mulheres encontram o romance que, para uma delas, será recordação inesquecível. Embora coerente do ponto de vista narrativo, o filme ficou inacabado, mas é considerado um dos pontos culminantes da arte de Renoir. A apresentar em cópia digital.

13/09/2014, 19h00 | Sala Dr. Félix Ribeiro
Graças a Henri Langlois

Em colaboração com a Cinémathèque Française
Langlois | Cinema de Vanguarda 2
duração total da sessão: 73 min | M/12
Cinema de Vanguarda

CHRONOPHOTOGRAPHIES
de Étienne Jules Marey
França 1894 – 2 min / mudo
SUR UN AIR DE CHARLESTON
de Jean Renoir

com Catherine Hessling, Johnny Higgins
França, 1926 – 23 min / mudo, intertítulos em francês legendados eletronicamente em português
BALANÇOIRES
de Noël Renard
com Herbert Daix, Valentine Gragowska
França, 1928 – 29 min / mudo, intertítulos em francês legendados eletronicamente em português
RAINBOW DANCE
de Len Lye
Reino Unido, 1936 – 3 min
RABBIT’S MOON
de Kenneth Anger
com André Soubeyran, Claude Revenant, Nadine Valence
França, 1950 – 16 min / legendado eletronicamente em português

Neste programa, são feitas analogias langloisianas entre uma série de curtas-metragens que se caracterizam pelo alto grau de invenção e criatividade. A sessão começa com três cronofotografias do grande precursor Marey, o primeiro a chegar à decomposição do movimento numa imagem. Seguem-se duas pequenas comédias, de Jean Renoir e Noël Renard, um brilhante filme de publicidade para as cadernetas de poupança dos correios britânicos, de Len Lye (que foi primeiro realizador de animação a desenhar diretamente na película) e RABBIT’S MOON, de Kenneth Anger, que foi um amigo próximo da Cinemateca Francesa. O filme de Anger é apresentado na sua versão original, nove minutos mais longa do que a que o realizador estabeleceu muitos anos depois. CHRONOPHOTOGRAPHIES é apresentado em cópia digital. BALANÇOIRES é uma primeira exibição na Cinemateca.
 

13/09/2014, 19h30 | Sala Luís de Pina
Graças a Henri Langlois

Em colaboração com a Cinémathèque Française
L’Enfant de Paris
de Léonce Perret
com Suzanne Le Bret, Louis Luubas, Maurice Lagrenée
França, 1913 - 120 min
mudo, intertítulos em francês legendados eletronicamente em português | M/12
Figuras do Cinema Mudo Francês / Léonce Perret

Léonce Perret foi um dos atores mais célebres do seu tempo, protagonista e autor de inúmeras comédias frívolas. Mas também tinha surpreendentes capacidades de realizador e em L’ENFANT DE PARIS (um melodrama sobre uma criança cujo pai supostamente morreu na guerra e que cai nas garras de bandidos) é um filme muito à frente do seu tempo, sobretudo pelo uso da luz. Henri Langlois, que ajudou a salvar muitos filmes de Perret, definiu-o como “um precursor genial, que deu toda a atenção ao valor espacial da imagem e da realização, fazendo com que a luz participasse da mise en scène”. Um filme surpreendente, a apresentar em cópia restaurada.