CICLO
Jean-Claude Brisseau


Desaparecido em maio passado, aos 75 anos, Jean-Claude Brisseau foi um cineasta muito falado nos últimos anos da sua vida, pelas piores razões. Muito falado, mas pouco visto: grande parte da sua obra, iniciada nos anos 70, permanece totalmente inédita em Portugal, e ao circuito comercial português os seus filmes só começaram chegar com regularidade a partir de CHOSES SÈCRETES, já anos 2000. Esta retrospetiva, que mostra todas as longas-metragens de Brisseau de que exista cópia física em condições de projeção, realizada agora na sequência da sua morte mas nos planos da Cinemateca há tempo considerável, será portanto uma revelação: pela primeira vez, em Portugal, um olhar de conjunto sobre uma obra crucial do cinema contemporâneo.
Principiada no domínio do cinema amador, de onde evoluiu para o profissionalismo graças ao patrocínio de Eric Rohmer (que viu e admirou LA CROISÉE DES CHEMINS), é uma obra singularíssima e perturbante, fundada na sobreposição entre a realidade "real" (nos seus mais diferentes aspetos sociais e políticos) e uma dimensão "mística", vértices fundamentais de boa parte dos filmes de Brisseau. Os elementos eróticos, a que os acontecimentos da última década trouxeram uma carga sulfurosa (o processo movido por três atrizes que o acusaram de assédio durante o "casting" de CHOSES SECRÈTES, cujas consequências, em plena época "me too", implicaram o cancelamento de uma retrospetiva prevista pela Cinemateca Francesa) encontram-se aí, porta de passagem de um vértice a outro, o êxtase sexual como acesso a uma dimensão mítica ou mitológica – que no entanto conta mais por ela mesma do que pela forma como se lhe acede. Louis Skorecki chamou a Brisseau o "único herdeiro credível de Luis Buñuel", e se nem toda a obra de Brisseau se pode resumir a uma "herança de Buñuel", a chave é boa: é o cineasta duma realidade sempre vacilante, mas quem quando mergulha totalmente nos mistérios puramente anímicos perde de vista a realidade "real", as condições de vida, sociais e económicas, que lhe são contemporâneos.
Um cineasta do mistério, Brisseau – em todos os sentidos do termo, dos mais imediatos aos mais profundos. Como esta retrospetiva deixará claro. Ou como o cineasta preferiria, obscuro. "Obscurité, oh ma lumière!", essa expressão que também aqui faria pleno sentido.
 
 
16/07/2019, 18h30 | Sala Luís de Pina
Ciclo Jean-Claude Brisseau

De Bruit et de Fureur
de Jean-Claude Brisseau
França, 1988 - 95 min
 
16/07/2019, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Jean-Claude Brisseau

Un Jeu Brutal
de Jean-Claude Brisseau
França, 1983 - 90 min
17/07/2019, 18h30 | Sala Luís de Pina
Ciclo Jean-Claude Brisseau

Noce Blanche
de Jean-Claude Brisseau
França, 1989 - 92 min
17/07/2019, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Jean-Claude Brisseau

De Bruit et de Fureur
de Jean-Claude Brisseau
França, 1988 - 95 min
18/07/2019, 18h30 | Sala Luís de Pina
Ciclo Jean-Claude Brisseau

Que Le Diable Nous Emporte
Que o Diabo nos Carregue
de Jean-Claude Brisseau
França, 2018 - 97 min
16/07/2019, 18h30 | Sala Luís de Pina
Jean-Claude Brisseau
De Bruit et de Fureur
de Jean-Claude Brisseau
com Bruno Cremer, François Négret, Fabienne Babe
França, 1988 - 95 min
legendado eletronicamente em português / M/14
Um dos mais poderosos filmes de Jean-Claude Brisseau, que por si só bastaria para atestar a grandeza do cineasta. Como em tantos momentos desta obra, trata-se de um grande choque (cinematográfico) entre o realismo e um universo mágico ou mítico. O realismo é o dos subúrbios de uma grande cidade francesa, um liceu cheio de adolescentes problemáticos (que colhe na experiência pessoal de Brisseau, que foi professor de liceu antes de se tornar cineasta), famílias caóticas em bairros degradados. A “magia” e o “mito” entram pela força dos “seres” que entram em diálogo com as personagens, assim criando um “compartimento” paralelo ao mundo reconhecível, capaz de evacuar todo o discurso de tipo “sociológico”. Filme extraordinário. A apresentar em cópia digital.
 
16/07/2019, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Jean-Claude Brisseau
Un Jeu Brutal
de Jean-Claude Brisseau
com Bruno Crémer, Emmanuelle Debever, Lisa Herédia
França, 1983 - 90 min
legendado eletronicamente em português / M/16
Com UN JEU BRUTAL Jean-Claude Brisseau explora, talvez até ao seu ponto máximo, um vértice crucial dos seus filmes: a observação desafetada, neutra ou quase neutra, do Mal, entendido quer em termos "místicos" quer enquanto designação de comportamentos criminosos ou antissociais. Outra demolição da fachada de uma "família" normal, é a história de um biólogo reputado que tiraniza a família (sobretudo a filha, deficiente motora) enquanto que, "nas sombras", se dedica à atividade de "serial killer". Talvez o mais "brutal" dos filmes de Brisseau, mas essencial para o conhecimento da sua obra, com um Bruno Crémer assombroso no papel do protagonista. A apresentar em cópia digital em primeira exibição na Cinemateca.
 
17/07/2019, 18h30 | Sala Luís de Pina
Jean-Claude Brisseau
Noce Blanche
de Jean-Claude Brisseau
com Vanessa Paradis, Bruno Crémer, Ludmilla Mikael
França, 1989 - 92 min
legendado eletronicamente em português / M/16
Um dos filmes de Brisseau imediatamente mais reconhecidos: Vanessa Paradis, que se estreava no cinema, conquistou um César de "melhor esperança feminina". NOCE BLANCHE é uma incursão arriscadíssima de Brisseau (e porventura o seu filme mais rohmeriano) no tema do amor "proibido", narrando a paixão nascida entre uma adolescente (Paradis) e o seu professor de filosofia (outra vez Bruno Crémer, por estes anos o ator-chave de Brisseau). A apresentar em cópia digital em primeira exibição na Cinemateca.
 
17/07/2019, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Jean-Claude Brisseau
De Bruit et de Fureur
de Jean-Claude Brisseau
com Bruno Cremer, François Négret, Fabienne Babe
França, 1988 - 95 min
legendado eletronicamente em português / M/14
Um dos mais poderosos filmes de Jean-Claude Brisseau, que por si só bastaria para atestar a grandeza do cineasta. Como em tantos momentos desta obra, trata-se de um grande choque (cinematográfico) entre o realismo e um universo mágico ou mítico. O realismo é o dos subúrbios de uma grande cidade francesa, um liceu cheio de adolescentes problemáticos (que colhe na experiência pessoal de Brisseau, que foi professor de liceu antes de se tornar cineasta), famílias caóticas em bairros degradados. A “magia” e o “mito” entram pela força dos “seres” que entram em diálogo com as personagens, assim criando um “compartimento” paralelo ao mundo reconhecível, capaz de evacuar todo o discurso de tipo “sociológico”. Filme extraordinário. A apresentar em cópia digital.
 
18/07/2019, 18h30 | Sala Luís de Pina
Jean-Claude Brisseau
Que Le Diable Nous Emporte
Que o Diabo nos Carregue
de Jean-Claude Brisseau
com Fabienne Babe, Isabelle Prim, Anna Sigalevitch
França, 2018 - 97 min
legendado em português | M12
Um equívoco com o horário da chegada da cópia de L’ANGE NOIR à Cinemateca, que fora garantida pela transportadora até às 17h30 de hoje, impede a apresentação do filme nesta data. Em sua substituição, antecipamos uma primeira passagem do último filme de Jean-Claude Brisseau, QUE LE DIABLE NOUS EMPORTE (2018), previsto para dia 29, às 19h, sessão que igualmente se mantém. Lamentando profundamente o sucedido, apresentamos as nossas desculpas, solicitando a compreensão dos espectadores.
O filme final de Brisseau, talvez em plena consciência disso. Outra vez rodado, com um mínimo de meios, em casa do próprio autor, é um filme que retoma os temas (e o imaginário) do cinema de Brisseau (de CHOSES SECRÈTES em diante mas também o anterior, por exemplo o de CÉLINE) para o enformar duma gravidade desconcertante, com remissões a Bresson e a Pushkin, que vive paredes meias com a sua própria irrisão. Um bom resumo para a sua obra, afinal: inclassificável, sofisticada, habitante duma críptica ambiguidade. Primeira exibição na Cinemateca.