CICLO
O Medo


Reza a lenda que as primeiras projeções públicas de L’ARRIVÉE D’UN TRAIN EN GARE DE LA CIOTAT, um dos filmes iniciais dos irmãos Lumière, provocaram nos seus espectadores um pânico incontrolado, causado pela imagem do comboio a avançar na direção da plateia. Verdade ou mentira, exagero ou retrato fiel do sucedido em – pelo menos – algumas sessões, o certo é que este episódio associa o cinema, desde o primeiro momento, a uma emoção primordial: a experiência do medo.
De emoções (dixit Samuel Fuller no PIERROT LE FOU) se constitui muita da matéria essencial do cinema que se fez a seguir a esses anos pioneiros. E de entre essas emoções, talvez nenhuma tenha sido tão trabalhada como o medo, respondendo a um desejo mais ou menos secreto de todo o espectador de cinema. Vamos ao cinema também para ter medo, para reviver medos básicos – o "medo do escuro", por inerência – e para descobrir medos novos. O espectador de cinema tem prazer no medo: a quantidade de filmes, para não dizer géneros inteiros, fundados nesta exploração e nesta experiência, serve de prova incontestável.
Em primeiro lugar é sobre isto este nosso Ciclo. Sobre o cinema do medo, do grande e quase abstrato medo que faz o espectador sentir-se sozinho mesmo se a sala de cinema estiver cheia de gente, e do qual Hitchcock terá sido o mais incontestável dos mestres. Mas é também um Ciclo que procura o medo para além do "cinema do medo", pelo menos fora dos géneros habitualmente entendidos como "do medo". A agitação das personagens de A CAÇA de Manoel de Oliveira, refletindo e instilando um medo difuso, tão mais perturbante por, precisamente, parecer não ter objeto definido. O pavor estampado no rosto das crianças de Kiarostami que, por exemplo nos "TRABALHOS DE CASA", são introduzidas às regras da recompensa e do castigo. Num caso como noutro, o medo que se vê no filme é a expressão de um medo mais vasto, de origem social e/ou política. E esse é, finalmente, outro ponto que este Ciclo pretende aflorar: a presença do medo no espaço público, como conceito ou instrumento de manipulação coletiva – do "medo da bomba" ao "medo do terrorismo", para dar dois exemplos flagrantes, pelo menos desde o final da II Guerra que o medo vive na linha da frente das emoções coletivas nas sociedades ocidentais. "Caixa negra" do seu tempo – aliás uma vocação cada vez mais mal entendida numa época em que a pulsão para a "correção" da História fez dos filmes um território particularmente belicoso – o cinema deixou registado praticamente tudo aquilo que, em determinados instantes e determinados quadrantes, nos meteu medo. É a derradeira proposta do Ciclo: para além de querer proporcionar, através de vários exemplos célebres, essa experiência, quase infantil (como o atesta a quantidade de mergulhos na infância ao longo destes filmes), do medo no seu estado mais puro e mais abstrato, quer também levar o espectador a refletir sobre o medo numa dimensão diferente, uma dimensão "histórica" por assim dizer, mas sempre transponível para o momento presente. Porque, pegando num célebre aforismo associado a um filme de Cronenberg, a questão está em saber se, no século XXI, é ainda o cinema quem mais nos diz que "tenham medo, tenham muito medo".
 
 
22/01/2018, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo O Medo

Le Diable Probablement
de Robert Bresson
França, 1976 - 96 min
 
22/01/2018, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo O Medo

Don’t Look Now
Aquele Inverno em Veneza
de Nicolas Roeg
Reino Unido, Itália, 1973 - 109 min
23/01/2018, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo O Medo

Le Diable Probablement
de Robert Bresson
França, 1976 - 96 min
23/01/2018, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo O Medo

El Espiritu de la Colmena
O Espírito da Colmeia
de Victor Erice
Espanha, 1973 - 95 min
24/01/2018, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo O Medo

A Caça | Night of the Living Dead
duração total da projeção: 117 min | M/16
22/01/2018, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
O Medo
Le Diable Probablement
de Robert Bresson
com Antoine Monnier, Tina Irissari, Henri de Maublanc, Laetitia Carcano
França, 1976 - 96 min
legendado em português | M/16
Penúltimo filme de Robert Bresson, LE DIABLE, PROBABLEMENT é talvez o mais terrível e desesperado de todos os seus filmes. Um olhar impiedoso sobre o mundo contemporâneo e a destruição da natureza e das formas de vida. Uma reflexão sombria feita a partir da descoberta de um cadáver, o corpo de um jovem cuja única resposta para o estado do mundo é o suicídio.
 
22/01/2018, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
O Medo
Don’t Look Now
Aquele Inverno em Veneza
de Nicolas Roeg
com Donald Sutherland, Julie Christie, Hilary Mason, Clelia Matania, Massimo Serato, Leopoldo Trieste
Reino Unido, Itália, 1973 - 109 min
legendado em português | M/16
O conto que o argumento adapta é de Daphne du Maurier. Lidando com a morte e o luto, o filme é um thriller, protagonizado por um casal que viaja para Veneza depois da morte acidental de uma filha e aí se instala durante um inverno em que conhece duas irmãs cujo caráter sinistro vai interferir com a sua vida. Estruturado em “flashbacks” e “flashforwards”, DON’T LOOK NOW é um título de culto da filmografia do terror nos meandros do oculto.
 
23/01/2018, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
O Medo
Le Diable Probablement
de Robert Bresson
com Antoine Monnier, Tina Irissari, Henri de Maublanc, Laetitia Carcano
França, 1976 - 96 min
legendado em português | M/16
Penúltimo filme de Robert Bresson, LE DIABLE, PROBABLEMENT é talvez o mais terrível e desesperado de todos os seus filmes. Um olhar impiedoso sobre o mundo contemporâneo e a destruição da natureza e das formas de vida. Uma reflexão sombria feita a partir da descoberta de um cadáver, o corpo de um jovem cuja única resposta para o estado do mundo é o suicídio.
 
23/01/2018, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
O Medo
El Espiritu de la Colmena
O Espírito da Colmeia
de Victor Erice
com Ana Torrent, Isabel Tellaria, Fernando Fernan-Gomez
Espanha, 1973 - 95 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Um dos melhores filmes espanhóis de sempre, construído à volta do mito de Frankenstein, recriado no espírito de uma criança depois de ver o filme de James Whale num cinema ambulante. O ESPÍRITO DA COLMEIA desenvolve-se na atmosfera deprimente e opressiva da província espanhola nos anos que se seguiram ao fim da Guerra Civil e ao mesmo tempo num clima algo irreal.
 
24/01/2018, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
O Medo
A Caça | Night of the Living Dead
duração total da projeção: 117 min | M/16
A CAÇA
de Manoel de Oliveira
Portugal, 1963 – 21 min
NIGHT OF THE LIVING DEAD
O Despertar dos Mortos Vivos
de George A. Romero
com Duane Jones, Judith O’Dea, Karl Hardman, Marilyn Eastman, Keith Wayne
Estados Unidos, 1968 – 96 min / legendado em espanhol

É o primeiro filme de Romero e um filme de culto do género de terror, na altura considerado um expoente da estética gore: sete pessoas barricam-se numa velha casa de campo enquanto um exército de Zombies sedentos de sangue humano se ergue dos túmulos... Já longe do universo da magia negra do Pacífico, NIGHT OF THE LIVING DEAD estabeleceu a mitologia dos Zombies modernos enquanto mortos renascidos como criaturas canibais de destruição. A abrir a sessão veremos A CAÇA, poderosa alegoria sobre o destino humano em forma “semi documental”, que alguns defendem ser o mais “buñueliano” dos filmes de Manoel de Oliveira.