CICLO
Marlen Khutsiev, Um Segredo do Cinema Moderno


Há grandes cineastas que escapam durante muito tempo à atenção dos cinéfilos. Marlen Khutsiev é um deles. Embora tenha chamado a atenção da crítica internacional quando MNE DVADSAT LET / “TENHO VINTE ANOS” (versão censurada e parcialmente refilmada de ZASTAVA ILLIYCHA / “A PORTA DE ILLYCH”) recebeu o prémio do júri no Festival de Veneza, o seu nome só foi verdadeiramente reconhecido a nível internacional nos últimos dez anos. Mas aos noventa anos, Khutsiev continua ativo. Nasceu em 1925 em Tbilissi, na Geórgia. O seu pai, que foi executado numa purga política em 1937, escolheu o nome do filho misturando as primeiras sílabas dos nomes de Marx e Lenine. Depois de obter o seu diploma de realizador no VGIK, a escola de cinema de Moscovo, Khutsiev foi trabalhar no estúdio de Odessa, onde realizou os seus dois primeiros filmes, VESNA NA ZARECHNOI ULITSE / “PRIMAVERA NA RUA ZAREHNAIA” e DVA FEDORA / “OS DOIS FEDORS”, nos quais “já se encontra um tom surpreendente, feito de rapidez, de liberdade de comportamento das personagens”, segundo escreveu Bernard Eisenschitz. De regresso a Moscovo, entre 1958 e 1962 Khutsiev trabalhou em ZSTAVA ILLYITCH / “A PORTA DE ILLYCH”, um marco no moderno cinema soviético. Mas o filme (cuja versão inicial de 1962 o próprio repudia) foi violentamente criticado por Nikita Khrouchev e, na sequência disso, alterado pelo autor. Em 1965 foi então apresentada uma nova versão (remontada e com partes refilmadas) com o título MNE DVADSAT LET / “TENHO VINTE ANOS” que foi distribuída na URSS e que veio a obter o Prémio do Júri no Festival de Veneza. Mais tarde, em 1988, Khutsiev voltou ainda a trabalhar no mesmo filme, estabelecendo o que considera hoje a sua versão mais genuína, de novo com o título original ZASTAVA ILLIYCHA / “A PORTA DE ILLYCH” e que incorpora troços das duas versões anteriores (neste Ciclo, será possível comparar as montagens de 1965 e de 1988). Entretanto, um novo filme importantíssimo de 1967, IYULSKIY DOZHD / “CHUVA DE JULHO” levanta menos polémicas mas é pouco exibido e Khutsiev passa aos estúdios de televisão, para os quais faz uma das suas obras preferidas: BYL MESYATS MAY / “FOI NO MÊS DE MAIO”. Depois de completar com Elem Klimov e German Lavrov o último e inacabado filme de Mikhail Romm I VSYO-TAKI YA VERYU…/ “E AINDA ACREDITO…”, Khutsiev só conseguiu fazer dois filmes em vinte anos, antes de, mais recentemente, voltar à realização. A partir de 1978, Marlen Khutsiev passou a ensinar no VGIK, onde formou vários realizadores. Na primeira metade dos anos sessenta, na União Soviética como em outros “países do Leste” (Polónia, Checoslováquia, Hungria), houve o equivalente de uma nova vaga, um cinema mais leve e mais moderno, feito por cineastas ainda jovens que nada tinham a ver com as convenções académicas e muito menos com a herança do “realismo socialista”. Na União Soviética, “cineastas do degelo” como Otar Iosseliani, Larissa Chepitko, Vassili Chukchin, Kira Muratova, Gueorgui Danelia, são alguns dos nomes mais significativos dessa corrente. É mais do que surpreendente que um cineasta da envergadura de Marlen Khutsiev não tenha tido à época, ou depois, o reconhecimento que merece. Em Portugal, depois de uma primeira sessão na Cinemateca, em 2004 com o filme “A PORTA DE ILLYCH” (no Ciclo “Gelos e Degelos: uma outra história do cinema soviético 1926-1968”), e depois da retrospetiva organizada em 2014 pelo Lisbon & Estoril Film Festival (que incluiu a exibição de “CHUVA DE JULHO” na Cinemateca), é chegada a hora de um Ciclo integral na Cinemateca, feito em presença do realizador. Para além de todos os filmes antes exibidos nessas várias iniciativas, poderão agora ser comparadas as duas versões da sua maior obra da década de sessenta (“TENHO VINTE ANOS” e o restauro de 1967, “A PORTA DE ILLYCH”), poderá ser visto um documentário de 2001 (“GENTE DE 1941”), poderá também ser vista a obra de Mikhail Romm que terminou com Klimov e Lavrov (“E AINDA ACREDITO…”), e, finalmente, poderão ser vistos troços do seu último e inacabado filme NEVECHERNYAYA. Com as exceções de INFINITAS, GENTE DE 1941 e NEVECHERNYAYA, todos serão apresentados no suporte original de 35mm.

 

Marlen Khutsiev acompanha a retrospetiva dos seus filmes na Cinemateca, apresentando algumas das sessões, para além da de abertura e do Encontro anunciado. O Encontro com o realizador é de entrada livre mediante o levantamento de ingressos na bilheteira.
 

 
19/11/2015, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Marlen Khutsiev, Um Segredo do Cinema Moderno

Lyudi 1941 Goda
“Gente de 1941”
de Marlen Khutsiev
URSS, 2001 - 53 min
 
20/11/2015, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Marlen Khutsiev, Um Segredo do Cinema Moderno

Nevechernyaya
“Ainda Não é Noite”
de Marlen Khutsiev
URSS, 2007-15 - 39 min
25/11/2015, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Marlen Khutsiev, Um Segredo do Cinema Moderno

Iyulskiy Dozhd
“Chuva de Julho”
de Marlen Khutsiev
URSS, 1967 - 115 min
26/11/2015, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Marlen Khutsiev, Um Segredo do Cinema Moderno

Mne Dvadtsat Let
“Tenho Vinte Anos”
de Marlen Khutsiev
URSS, 1965 - 169 min
27/11/2015, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Marlen Khutsiev, Um Segredo do Cinema Moderno

Dva Fyofora
“Os Dois Fedors”
de Marlen Khutsiev
URSS, 1958 - 88 min
19/11/2015, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Marlen Khutsiev, Um Segredo do Cinema Moderno

Com o Alto Patrocínio da Embaixada da Federação da Rússia, em colaboração com o Gosfilmofond – Fundo Nacional de Cinema da Federação da Rússia e a Agência Federal pela Cooperação Internacional Cultural
Lyudi 1941 Goda
“Gente de 1941”
de Marlen Khutsiev
URSS, 2001 - 53 min
legendado eletronicamente em português | M/12

Utilizando amplo material de arquivo, “GENTE DE 1941” é um documentário que retraça o começo da Segunda Guerra Mundial na URSS, particularmente as batalhas que tiveram lugar nas cercanias de Moscovo. A apresentar em cópia digital.

20/11/2015, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Marlen Khutsiev, Um Segredo do Cinema Moderno

Com o Alto Patrocínio da Embaixada da Federação da Rússia, em colaboração com o Gosfilmofond – Fundo Nacional de Cinema da Federação da Rússia e a Agência Federal pela Cooperação Internacional Cultural
Nevechernyaya
“Ainda Não é Noite”
de Marlen Khutsiev
com Vladislav Vetrov, Mikhail Pakhobenko, Igor Bondarenko
URSS, 2007-15 - 39 min
legendado eletronicamente em português | M/12
sessão em colaboração com o LEFFEST – LISBON & ESTORIL FILM FESTIVAL

Marlen Khutsiev é homenageado na sessão, numa cerimónia em que lhe é atribuída a medalha de mérito cultural

NEVECHERNAYA foi um dos projetos mais acarinhados por Khutsiev, que tentou realizá-lo na segunda metade dos anos oitenta, em tempos de perestroika. A ideia de base é mostrar o encontro entre Tchekov e Tolstoi. Através da obra destes dois gigantes da literatura, são discutidos diversos problemas importantes da Rússia. É um work in progress, ainda não inteiramente concluído, do qual algumas sequências acabam de ser filmadas. Tratando-se de material trazido pelo próprio realizador, não é possível anunciar a sua duração exata.

25/11/2015, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Marlen Khutsiev, Um Segredo do Cinema Moderno

Com o Alto Patrocínio da Embaixada da Federação da Rússia, em colaboração com o Gosfilmofond – Fundo Nacional de Cinema da Federação da Rússia e a Agência Federal pela Cooperação Internacional Cultural
Iyulskiy Dozhd
“Chuva de Julho”
de Marlen Khutsiev
com Evguenia Uralova, Aleksandr Belyavsky, Yuri Vizbor
URSS, 1967 - 115 min
legendado eletronicamente em português | M/12

Um dos mais belos filmes dos anos sessenta soviéticos, quando foram realizadas muitas obras de grande valor. Como de costume no cinema soviético, a narrativa é oblíqua: uma mulher descobre que o homem com quem vai casar é mesquinho e tem mau fundo. Ao deixá-lo, encontra outro homem à chuva, que a lava de todos os males. Como “TENHO VINTE ANOS”, o filme é um moderno retrato de Moscovo e dos seus habitantes, filmado com extraordinária leveza e profundidade, “quebrando as estruturas narrativas de uma maneira que anuncia Sokurov” (Christian Zimmer). “CHUVA DE JULHO” suscitou menos polémicas do que o filme anterior, mas foi pouco mostrado à época.

26/11/2015, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Marlen Khutsiev, Um Segredo do Cinema Moderno

Com o Alto Patrocínio da Embaixada da Federação da Rússia, em colaboração com o Gosfilmofond – Fundo Nacional de Cinema da Federação da Rússia e a Agência Federal pela Cooperação Internacional Cultural
Mne Dvadtsat Let
“Tenho Vinte Anos”
de Marlen Khutsiev
com Valentin Popov, Nicolai Gubenko, Stanislas Lyubshin
URSS, 1965 - 169 min
legendado eletronicamente em português | M/12

Depois dos violentos ataques proferidos pelo Primeiro-Secretário do Comitré Central do partido Comunista, Nikita Khrouchev em pessoa, contra ZASTAVA ILLIYCHA, Khutsiev decidiu salvar o que podia ser salvo do filme. Conseguiu controlar a confeção da nova versão remontada e com partes refilmadas, a que deu um um novo título. Num debate com o público no Festival de La Rochelle, em 2003, Khutsiev declarou: “Lutei com todas as minhas forças para que as transformações não destruíssem o filme. Foi preciso astúcia. A única coisa que lamento é que o episódio da noite com os poetas tenha praticamente desaparecido”. Nesta versão, o filme obteve o prémio do júri no Festival de Veneza, já depois da queda de Khrouchev.

27/11/2015, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Marlen Khutsiev, Um Segredo do Cinema Moderno

Com o Alto Patrocínio da Embaixada da Federação da Rússia, em colaboração com o Gosfilmofond – Fundo Nacional de Cinema da Federação da Rússia e a Agência Federal pela Cooperação Internacional Cultural
Dva Fyofora
“Os Dois Fedors”
de Marlen Khutsiev
com Vassily Chukchine, Nikolai Chursin, Tamara Lyonina
URSS, 1958 - 88 min
legendado eletronicamente em português | M/12

OS DOIS FEDORS, que marca a estreia no cinema de Vassily Chukchin, que viria a ser um ator e um realizador de grande envergadura, conta o encontro de um homem e uma criança. No fim da guerra, o operário Fedor é desmobilizado e ao voltar para sua região conhece um pequeno órfão, também chamado Fedor. Os dois estabelecem uma relação extremamente forte, até ao momento em que o homem se casa. A sua mulher tenta conquistar o rapaz, mas este permanece hostil. Considerado um filme de transição, entre “PRIMAVERA NA RUA ZARECHNAIA” e “A PORTA DE ILLICH”, em que o estilo de Khutsiev se radicaliza, DYA FYODORA ilustra indiretamente um dos temas centrais do cinema de Kutsiev: o de uma “nação sem pais”.