CICLO
O Filme da Escola: A ESTC no Coração do Cinema Português


Acidentado no seu arranque, idiossincrático, não raro polémico, o percurso daquela que nos habituámos a chamar simplesmente “a escola de cinema” em Portugal não pode senão ser considerado um parâmetro incontornável de qualquer análise do último meio século do cinema português. Nascida da derradeira experiência de reforma de ensino do Estado Novo – a “Reforma Veiga Simão”, no âmbito específico da reforma do Conservatório Nacional levada a cabo por Madalena Perdigão -, mas logo aí marcada pelos sonhos de uma parte da geração do Cinema Novo (com Alberto Seixas Santos como diretor), de seguida arrastada no turbilhão de Abril e relançada, em 1975, sob élan ainda mais ambicioso e radical, e finalmente enquadrada, em 1983, no ensino superior politécnico, com o desmembramento do Conservatório e a reconfiguração como ESTC no Instituto Politécnico de Lisboa, a escola foi palco intenso das digladiações vividas no seio do nosso cinema no mesmo período, convertendo-se em espaço de clivagem, lugar de transmissão e de utopia, óbvio sintoma, e, nalgumas vertentes, certamente também agente, de tendências marcantes desse cinema. 
Há muito imaginado na Cinemateca, o ciclo que agora se concretiza, feito em colaboração com a própria ESTC, na sequência do depósito do seu acervo fílmico neste organismo e em contexto de aniversário, visa então mostrar uma parte do que nesse espaço se produziu, ou que da experiência dele resultou, mas também, e na medida indireta em que tal é de algum modo possível, algo do que aí aconteceu no sentido mais lato, ou mais subterrâneo, do cruzamento de gerações e de visões, sobretudo nas etapas em que a escola mais construiu a sua identidade. Mostrando filmes de alunos em diálogo com os de alguns dos seus mais influentes professores, mostrando ainda exemplos de obras cujo visionamento e cuja análise foram recorrentes nalgumas das unidades pedagógicas mais marcantes, o que se pretende não é só evocar cada um desses territórios por si, mas também, e talvez sobretudo, aquilo que só no espaço entre eles pode ser “visto”, a saber, o elo, que é também o fosso inevitável e essencial entre formadores e formandos em que assenta qualquer escola que, como esta, apostou em “criar criadores”. Pesem embora as dificuldades ou tensões internas daí advindas, esse foi um desígnio convicto e convictamente arvorado: o de uma escola profissional que, pela mão de professores fundadores ou pela de alguns realizadores ali formados que continuaram o exercício docente dos primeiros, se quis sempre, acima de tudo, escola artística, deixando-se atravessar por aquilo que, porventura ainda mais no cinema, é a tão particular tensão entre esses dois polos.
O ciclo que agora se organiza é um dos filmes possíveis desse desígnio, dessa tensão, e da forma como isso se cruzou com o percurso maior do cinema feito em Portugal, ou seja, no final de contas, com o país.
Disposto segundo cinco eixos, este programa excede em larga medida a mera apresentação dos filmes realizados em contexto escolar, ainda que esses componham uma parte significativa do ciclo (“Filmes da Escola”). Além desses, o programa começa por evocar algumas das principais figuras que fundaram a Escola de Cinema, tanto em termos pedagógicos como cinéfilos, através de um conjunto de títulos seminais dos professores-realizadores que marcaram o arranque do curso no Conservatório Nacional (“Filmes dos Professores Fundadores”) e, posteriormente, através de uma seleção de filmes que eram analisados em contexto letivo e tidos como referência para a prática cinematográfica (“Filmes das Aulas”). O quarto eixo de programação apresenta um conjunto de títulos correspondente às estreias no formato da longa-metragem, daqueles que foram os alunos das primeiras turmas da Escola de Cinema, todos títulos produzidos no final da década de 70 (“Filmes dos Primeiros Alunos”). Finalmente, um dos assumidos propósitos deste ciclo prende-se com o desejo de recortar, dentro da primeira década de alunos da Escola de Cinema, um retrato daquela que foi já antes rotulada (cremos que, em primeiro lugar, por Augusto M. Seabra) de “terceira geração” do Cinema Português. Embora uma tal geração extravase o universo particular dos ex-alunos da Escola de Cinema a verdade é que coincide em boa medida com este. O quinto eixo do programa (“A Escola e a Terceira Geração”) é assim aquele que põe em destaque filmes desse grupo de ex-alunos, realizados entre a segunda metade dos anos 80 e a primeira metade da década seguinte, alguns dos quais permaneceriam obras únicas dos respetivos autores. Além das sessões de cinema, o ciclo propõe ainda três debates, organizados de acordo com o programa abaixo definido, para os quais desafiámos sempre, à cabeça, elementos de diferentes gerações da vida da escola.
 
 
01/07/2023, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo O Filme da Escola: A ESTC no Coração do Cinema Português

O Apartamento | Parabéns! | Inventário de Natal | Arena
duração total da projeção: 66 min | M/12
 
03/07/2023, 19h30 | Sala Luís de Pina
Ciclo O Filme da Escola: A ESTC no Coração do Cinema Português

Os Bonecos de Santo Aleixo
de João Loureiro, Jorge Loureiro
Portugal, 1977 - 99 min | M/12
03/07/2023, 21h45 | Esplanada
Ciclo O Filme da Escola: A ESTC no Coração do Cinema Português

They Live by Night
Os Filhos da Noite
de Nicholas Ray
Estados Unidos, 1949 - 95 min
04/07/2023, 19h30 | Sala Luís de Pina
Ciclo O Filme da Escola: A ESTC no Coração do Cinema Português

Provas para um Retrato em Corpo Inteiro
de José Alves Pereira, José Bogalheiro, Pedro Massano Amorim
Portugal, 1978 - duração total da projeção: 89 min | M/12
04/07/2023, 21h45 | Esplanada
Ciclo O Filme da Escola: A ESTC no Coração do Cinema Português

The Searchers
A Desaparecida
de John Ford
Estados Unidos, 1956 - duração total da projeção: 118 min
01/07/2023, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
O Filme da Escola: A ESTC no Coração do Cinema Português

Em colaboração com a Escola Superior de Teatro e Cinema do Instituto Politécnico de Lisboa nos 50 anos desta
O Apartamento | Parabéns! | Inventário de Natal | Arena
duração total da projeção: 66 min | M/12
Sessão de Abertura

Sessão com apresentação
O APARTAMENTO
de João Milagre, Rui Poças, Luís Fonseca, João Tuna, Leonardo Simões, Tiago Costa, Vitor Nobre, Vítor Joaquim
Portugal, 1996 – 13 min

PARABÉNS!
de João Pedro Rodrigues
Portugal, 1997 – 15 min

INVENTÁRIO DE NATAL
de Miguel Gomes
Portugal, 2000 – 23 min

ARENA
de João Salaviza
Portugal, 2009 – 15 min


A abrir este Ciclo onde se reflete sobre o papel da ESTC nos últimos cinquenta anos do cinema português, percorremos um edifício, de patamar em patamar, através daquilo que foi o papel da Escola de Cinema enquanto elevador geracional. O primeiro filme da sessão é O APARTAMENTO, um caso sui generis na história recente do cinema feito em Portugal: através das Produções Off, de Rosi Burguete, um conjunto de oito recém-formados da Escola de Cinema juntou-se, não para jogar à bola, mas para realizar um filme de sketches. Um apartamento está para alugar. O proprietário vai recebendo os vários candidatos ao aluguer. Cada visita ao apartamento vazio é como uma pequena história. A partir deste filme, dá-se o mote para outros primeiros filmes realizados logo após a Escola, sempre em apartamentos. PARABÉNS!, que inaugura o cinema de autor de João Pedro Rodrigues depois do exercício escolar O PASTOR, apresenta-nos Chico (João Rui Guerra da Mata) que no dia do seu aniversário acorda com a namorada ao telefone, a desejar-lhe os parabéns, e um rapaz, João, deitado na cama a seu lado. Depois, é dia 25 de dezembro, em meados dos anos 80. A família reúne-se em casa dos avós. Não há um destaque individual, interessa apenas o retrato de grupo constituído por quatro gerações e dois cães. Neste corrupio familiar que é INVENTÁRIO DE NATAL reconhecemos Alberto Seixas Santos, Manuel Mozos ou Pedro Caldas, professor e ex-alunos da ESTC onde Miguel Gomes também estudou. No topo deste prédio de quatro andares, já a chegar perigosamente ao telhado, com risco de nos despenharmos lá em baixo, temos ARENA, a curta protagonizada por Carloto Cotta que deu a João Salaviza a Palma de Ouro de Cannes.

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03/07/2023, 19h30 | Sala Luís de Pina
O Filme da Escola: A ESTC no Coração do Cinema Português

Em colaboração com a Escola Superior de Teatro e Cinema do Instituto Politécnico de Lisboa nos 50 anos desta
Os Bonecos de Santo Aleixo
de João Loureiro, Jorge Loureiro
Portugal, 1977 - 99 min | M/12
Filmes dos Primeiros Alunos
Produzido pela Companhia Paz dos Reis, com argumento de João Botelho, Jorge Loureiro e António Rações, e o apoio do Centro de Estudos de Etnologia, OS BONECOS DE SANTO ALEIXO dá conta da manifestação popular alentejana da Companhia dos Bonecreiros, que passava em digressão na região de Estremoz. Para além do registo de um espetáculo, as experiências e a técnica aplicada pelos artistas da Companhia dos Bonecreiros, que manipulam e dão voz às marionetas articuladas, são contadas na primeira pessoa. Jorge Loureiro e João Botelho foram colegas no então Conservatório de Cinema na primeira turma de 1973/1974.

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03/07/2023, 21h45 | Esplanada
O Filme da Escola: A ESTC no Coração do Cinema Português

Em colaboração com a Escola Superior de Teatro e Cinema do Instituto Politécnico de Lisboa nos 50 anos desta
They Live by Night
Os Filhos da Noite
de Nicholas Ray
com Farley Granger, Cathy O’Donnell, Howard da Silva, Jay C. Flippen
Estados Unidos, 1949 - 95 min
legendado eletronicamente em português
Filmes das Aulas
O primeiro filme de Nicholas Ray adapta o romance Thieves Like Us, vagamente inspirado na história de Bonnie e Clyde. THEY LIVE BY NIGHT conta o destino trágico de um jovem revoltado que encontra no amor uma forma de redenção que o mundo, porém, não lhe permite. Uma legenda inicial avisa: “This boy and this girl were never properly introduced to the world we live in.” Um filme muito amado por várias gerações de cinéfilos portugueses, era também um título essencial no programa curricular de Vítor Gonçalves, quando lecionava Realização na Escola de Cinema.

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04/07/2023, 19h30 | Sala Luís de Pina
O Filme da Escola: A ESTC no Coração do Cinema Português

Em colaboração com a Escola Superior de Teatro e Cinema do Instituto Politécnico de Lisboa nos 50 anos desta
Provas para um Retrato em Corpo Inteiro
de José Alves Pereira, José Bogalheiro, Pedro Massano Amorim
com Pauliteiros de Miranda, Maria Albertina, Banda do Casaco, GAC – Vozes na Luta, Eugénio de Andrade
Portugal, 1978 - duração total da projeção: 89 min | M/12
Filmes dos Primeiros Alunos
Retrato de um país e da sua cultura popular, expressamente realizado para a difundir junto das comunidades emigrantes espalhadas pela Europa. Recusando o panfletarismo que caracteriza grande parte da produção documental deste período pós­-revolucionário, PROVAS PARA UM RETRATO EM CORPO INTEIRO dispensa quase inteiramente a voz off e integra depoimentos e representantes de diferentes tendências musicais (etnográfica, folclórica, ligeira e de intervenção). No final, Eugénio de Andrade lê cinco poemas. Para além da realidade rural de norte a sul do país, o filme integra imagens da primeira projeção de NÓS POR CÁ TODOS BEM, de Fernando Lopes, na aldeia da Várzea dos Amarelos, onde foi filmado. José Bogalheiro foi um dos primeiros alunos do então Conservatório de Cinema e seria, mais tarde, um dos professores que mais marcará a Escola de Cinema, assim como José Alves Pereira.

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04/07/2023, 21h45 | Esplanada
O Filme da Escola: A ESTC no Coração do Cinema Português

Em colaboração com a Escola Superior de Teatro e Cinema do Instituto Politécnico de Lisboa nos 50 anos desta
The Searchers
A Desaparecida
de John Ford
com John Wayne, Jeffrey Hunter, Vera Miles, Ward Bond, Natalie Wood
Estados Unidos, 1956 - duração total da projeção: 118 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Filmes das Aulas
Uma das obras­-primas de John Ford e o filme que contém todas as chaves do western, marcando em simultâneo a entrada de Ford na última fase da sua obra, aquela em que a serenidade do olhar acompanha a consciência do fim de um tempo. Ethan Edwards (John Wayne) é um homem misterioso e fechado sobre si mesmo que nutre um ódio desmedido pelos índios Comanche desde que estes raptaram as suas duas sobrinhas. Uma delas é encontrada morta e Debbie (Natalie Wood), a outra, desaparece. A partir daí Ethan fica completamente obcecado pela ideia de a encontrar. O filme era bastante querido de vários professores da Escola de Cinema, e integrava as aulas quer de Alberto Seixas Santos, quer de Vítor Gonçalves.

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