CICLO
Cinema Experimental Português: O Cinema dos Artistas, Anos 60 e 70



Ana Hatherly, Carlos Calvet, E. M. de Melo e Castro, Ângelo de Sousa, Luís Noronha da Costa, António Palolo, Artur Varela, ou Julião Sarmento, são alguns dos artistas portugueses que, nos anos sessenta e setenta, expandiram a sua prática artística ao cinema, prosseguindo, por outras vias, experiências que vinham a desenvolver em áreas como a pintura, a escultura, o desenho, a fotografia, a performance, ou no cruzamento entre estes vários meios. Este é um programa dedicado ao cinema experimental realizado em Portugal por estes e outros artistas, e incluirá nesta primeira parte, que tem lugar no mês de novembro, filmes de Carlos Calvet, Hatherly, Noronha da Costa, Ernesto de Sousa, António Palolo, Julião Sarmento, Lourdes Castro, Helena Almeida, Vítor Pomar, Silvestre Pestana e Fernando Calhau. A lista de nomes é extensa e o número de filmes também, naquele que se pretende um programa exaustivo sobre a obra cinematográfica associada a um conjunto de criadores que, nas décadas de 1960 e 1970, experimentaram o cinema, encarando as possibilidades deste meio como uma extensão do seu trabalho anterior, abrindo novas vias para o mesmo.
À semelhança do contexto internacional, as fronteiras entre o filme e as restantes formas de arte sofreram uma profunda transformação, revelando-se o filme, mas também a fotografia e o vídeo, suportes fundamentais para uma redefinição das práticas artísticas. E se tal se começou a desenvolver no final dos anos 1950 (o caso de Calvet), teve uma maior expressão nas décadas seguintes, em particular na de setenta.
Exibiremos assim na Cinemateca obras realizadas por artistas que, no período em questão, recorreram sobretudo a formatos dito amadores, película de pequenos formatos, nomeadamente Super 8 e 8 mm, mais raramente ao 16mm, e muito residualmente ao vídeo. Se nos centramos sobretudo no suporte fílmico, apresentamos algumas exceções, como é o caso do trabalho de Silvestre Pestana, que acompanha o momento em que o vídeo começava também a dar os primeiros passos, antes da proliferação das câmaras portáteis. A aproximação da obra fílmica destes artistas, pensada a partir do ponto de vista do cinema, procurará assim interrogar as origens de um cinema dito experimental feito em Portugal, insistindo-se para que vários destes filmes sejam projetados nos seus suportes originais.
Este programa, que terá uma segunda parte em meados de 2026, é o resultado de um trabalho continuado de prospeção, conservação e digitalização, desenvolvido ao longo dos últimos anos e que contou com a participação de inúmeros intervenientes. Parte destes títulos serão mostrados em cópias novas, recém-digitalizadas pela Cinemateca, mas sempre que possível serão exibidos nos seus suportes de origem, concluindo-se o programa com uma sessão em que projetaremos filmes exclusivamente em Super 8, 8 e 16 mm.
É entre “filmes de artistas” e “filmes de amadores” que se desenrolam estas sessões, que a par de “obras acabadas”, revelarão um cinema livre, muitas vezes associado ao quotidiano de quem o fazia com a sua pequena câmara, um cinema documental ou diarístico, mais ou menos narrativo. Trabalhos que registam um encontro entre amigos, numa clara insistência na importância da relação arte/vida, documentam uma exposição ou uma performance e que se juntam a outros que se apropriam de imagens pré-existentes ou envolvem a manipulação expressa de imagens e sons, mais explicitamente conotados com o cinema experimental. São filmes frequentemente mudos, cujo som era o dos pequenos projetores na sala, que poderemos ouvir em algumas sessões. 
 
05/11/2025, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Cinema Experimental Português: O Cinema dos Artistas, Anos 60 e 70

Programa Carlos Calvet
 
06/11/2025, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Cinema Experimental Português: O Cinema dos Artistas, Anos 60 e 70

Programa Ana Hatherly - 1
07/11/2025, 19h30 | Sala Luís de Pina
Ciclo Cinema Experimental Português: O Cinema dos Artistas, Anos 60 e 70

Programa Ana Hatherly - 2
08/11/2025, 20h00 | Sala Luís de Pina
Ciclo Cinema Experimental Português: O Cinema dos Artistas, Anos 60 e 70

Programa Julião Sarmento - 1
08/11/2025, 22h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Cinema Experimental Português: O Cinema dos Artistas, Anos 60 e 70

Programa Lourdes Castro - 1
05/11/2025, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Cinema Experimental Português: O Cinema dos Artistas, Anos 60 e 70
Programa Carlos Calvet
sessão com apresentação
MOMENTOS NA VIDA DO POETA
com Mário Césariny, João Rodrigues
Portugal, 1964 – 12 min / mudo

VENEZIA 1959
Portugal, 1959 – 10 min / som

ESTUDO DE CAMIONETA ABANDONADA
Portugal, [1960] – 2 min / mudo

FILME EXPERIMENTAL
Portugal, 1963 – 3 min / mudo

UM DIA NO GUINCHO, COM ERNESTO
Portugal, 1969 – 7 min / mudo

de Carlos Calvet

duração total da projeção: 34 minutos | M/12

Carlos Calvet (1928-2014) foi um pioneiro entre os artistas plásticos que, em Portugal,  experimentaram filmar em película, maioritariamente em suportes amadores, o 8 mm e o Super 8, e pioneiro do que podemos chamar de cinema experimental português, que entronca em algumas experiências das vanguardas do final dos anos 1920/1930. Os seus primeiros filmes datam de 1959, ano de VENEZIA, trabalho a cores e o único com som da sessão, que revela um olhar apurado em termos de ritmo e composição, o que se manifesta ainda em ESTUDO DE CAMIONETA ABANDONADA e FILME EXPERIMENTAL. MOMENTOS NA VIDA DO POETA, o seu filme mais conhecido, é uma ficção com conotações surrealistas em que retrata Mário Césariny nas suas deambulações por Lisboa e num quotidiano enigmático. Um "cadavre exquis", como escreveu Calvet ". UM DIA NO GUINCHO, COM ERNESTO documenta um encontro organizado por Ernesto de Sousa, em colaboração com Noronha da Costa e com a Oficina Experimental, que ficou conhecido como "Encontro do Guincho" e contou com a participação de inúmeros artistas e uma intervenção em torno de um "objecto" de Noronha da Costa. Um encontro que terminaria num piquenique/festa, que traduzia o ambiente que  marcou esta fase do experimentalismo português. Nas imagens encontramos Ana Hatherly, Artur Rosa, Noronha da Costa, Clotilde Rosa, E. M. Melo e Castro, Fernando Pernes, Helena Almeida, Jorge Peixinho, etc. MOMENTOS NA VIDA DO POETA será projectado duas vezes; na sua versão recentemente digitalizada, mas também em película. Primeiras exibições na Cinemateca.
06/11/2025, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Cinema Experimental Português: O Cinema dos Artistas, Anos 60 e 70
Programa Ana Hatherly - 1
sessão com apresentação

THE THOUGHT FOX
Reino Unido, 1974 – 1 min / som

FRAGMENTOS DE ANIMAÇÃO
Reino Unido, 1974 – 1 min / mudo

SOPRO
Reino Unido, 1974 – 1 min / mudo

5 EXERCÍCIOS DE ANIMAÇÃO
Reino Unido, 1974 – 3 min / mudo

C. S. S.
Reino Unido, 1974 – 2 min / som

REVOLUÇÃO
Portugal, 1975 – 11 min / som

DIGA-ME, O QUE É A CIÊNCIA? – I
Portugal, 1976 – 20 min / som

DIGA-ME, O QUE É A CIÊNCIA? – II
Portugal, 1976 – 15 min / som

ROTURA
Portugal, 1977 – 6 min / som

de Ana Hatherly

duração total da projeção: 60 minutos | M/12

Para além do seu trabalho no domínio das artes plásticas e da literatura, Ana Hatherly (1929-2015) também se interessou pelo cinema. REVOLUÇÃO, o seu filme mais conhecido, sucede a um raríssimo conjunto de trabalhos realizados em 1974 e produzidos pela London Film School, na qual Hatherly prosseguiu uma especialização no domínio da animação. Originalmente filmado em Super 8, ampliado para 16 mm e estreado na Bienal de Veneza em 1976, REVOLUÇÃO retrata as paredes, os murais e os grafitti das ruas lisboetas do pós-25 de Abril de 1974. THE THOUGHT FOX é uma curtíssima ficção que assina enquanto aluna da escola londrina, pertencendo os restantes filmes de 1974 ao domínio do que habitualmente se considera como animação abstrata. DIGA-ME, O QUE É A CIÊNCIA? – I e II, que Hatherly designava respetivamente como "operários" e "camponeses", sobressaem pela simplicidade do seu método interrogativo e pelo modo como são questionados os seus protagonistas. ROTURA documenta uma performance realizada por Ana Hatherly na Galeria Quadrum em 1977, mostrando o confronto da artista com enormes suportes de papel, que rasga com vigor.

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07/11/2025, 19h30 | Sala Luís de Pina
Cinema Experimental Português: O Cinema dos Artistas, Anos 60 e 70
Programa Ana Hatherly - 2
REVOLUÇÃO
Portugal, 1975 – 11 min / som

DIGA-ME, O QUE É A CIÊNCIA? – I
Portugal, 1976-2009 – 16 min / som

DIGA-ME, O QUE É A CIÊNCIA? – II
Portugal, 1976-2009 – 12 min / som

ROTURA
Portugal, 1977-2007 – 16 min / som

de Ana Hatherly

duração total da projeção: 55 minutos | M/12

Uma sessão que reúne quatro filmes a que Hatherly regressou muitos anos depois, e que mostramos em cópias agora produzidas, partindo dos suportes originais. São quatro das mais importantes obras de Hatherly, que fazem parte de um trabalho, por norma "experimental" na aceção comum do termo, e que se relacionam diretamente com o período revolucionário. Os primeiros são três filmes que, como referiu a artista em 2013 por ocasião de uma outra sessão que organizámos em sua presença na Cinemateca, participam de uma mesma vontade de "dar a voz ao povo". REVOLUÇÃO convoca para o cinema o princípio dos seus "cartazes rasgados" e das pinturas murais pelas quais se disseminavam palavras de ordem, que se cruzam com as palavras dos discursos e da música de intervenção. DIGA-ME, O QUE É A CIÊNCIA? – I e II parte de um conjunto de questões colocadas a operários e camponeses. Se as diferenças face às primeiras versões são poucas nos três primeiros filmes, ROTURA é apresentado numa versão substancialmente mais longa. A apresentar em cópias digitais.

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08/11/2025, 20h00 | Sala Luís de Pina
Cinema Experimental Português: O Cinema dos Artistas, Anos 60 e 70
Programa Julião Sarmento - 1
sessão com apresentação
ACORDAR
Portugal, 1976 – 3 min / mudo

1, 2, 3
Portugal, 1975 – 3 min / mudo

TV
Portugal, 1975 – 3 min / mudo

MEDIA
de Julião Sarmento, Fernando Calhau
Portugal, 1975 – 8 min / mudo

PERNAS
Portugal, 1975 – 4 min / mudo

CÓPIAS
Portugal, 1976 – 4 min / mudo

FACES
Portugal, 1976 – 45 min / mudo

de Julião Sarmento

duração total da projeção: 70 minutos | M/16

O cinema ocupou um lugar central na obra de Julião Sarmento (1948-2021) desde 1967. Trabalhando sobre o erotismo ou os impulsos reprimidos de cada um, a sua obra desenvolveu-se em consonância com muito do cinema experimental. Esta sessão reúne os filmes realizados por Sarmento em 1975 e 1976, excluindo-se trabalhos anteriores, dados como destruídos. Entre a representação de relva e de seixos brancos e a sua numeração, 1,2,3 é uma obra em que a estrutura mais se revela. PERNAS e FACES centram-se mais explicitamente na relação entre o desejo e a imagem do corpo feminino. Em TV uma mulher é filmada num duplo alheamento face ao que vê na televisão e face ao facto de estar a ser vista. MEDIA trabalha a fronteira entre a imagem fixa e a imagem em movimento, convocando o próprio movimento de um fotógrafo. CÓPIAS inscreve-se entre a esferas da intimidade e um registo da paisagem em movimento. Kerry Brouguer referia como estes filmes iniciais condessavam grande parte da produção do artista: "o foco na mulher, na sexualidade e na objetificação; a parede monocromática como tela em branco (que seria incorporada nas suas Pinturas Brancas duas décadas mais tarde); a fusão entre o corpo e o pano de fundo; e, acima de tudo, a amplificação do próprio medium para neutralizar as ilusões cinemáticas e abrir o sentido da imagem." ACORDAR será projetado em Super 8.
08/11/2025, 22h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Cinema Experimental Português: O Cinema dos Artistas, Anos 60 e 70
Programa Lourdes Castro - 1
sessão com apresentação

O AMOR QUE PURIFICA
Portugal, 1970 – 37 min 

TROTOÁRIO AZUL
Portugal, 1970-72 –33 min

realização coletiva (de Lourdes Castro, René Bertholo, José A. Paradela, Pitum Keil do Amaral, Eduarda e Marcelo Costa, Leonor Bettencourt, João Conceição, Alexandra e Luis Moreira, Marcela Costa, Jorge Sumares)

duração total da projeção: 70 minutos | M/12

A partir da década de 1960, Lourdes Castro (1930-2022) desenvolveu um interesse pela projeção e fixação de perfis e sombras, retratando-as no seu trabalho em materiais diversos, como lençóis, acrílico e papel. As sombras surgem no seu trabalho associadas à procura da depuração e do essencial. Os filmes desta sessão embora não sejam assinados por Lourdes Castro a solo, revelam o modo como para a artista e para os seus companheiros a arte era indissociável da vida. No verão de 1969 um grupo de amigos juntou-se para realizar um "fotonovelo", projeto que durou algumas semanas e que congregou uma sequência de diapositivos, dois filmes em Super 8, gravação de voz em fita magnética, e duas canções de um disco em vinil. Juntos fizeram O AMOR QUE PURIFICA, uma paródia de um género muito popular na altura. Um ano depois (já sem Pitum Keil do Amaral e Leonor Bettencourt) realizaram um filme em 16 mm a que deram o nome de TROTOÁRIO AZUL, que envolve uma montagem de sequências improvisadas e filmadas em diferentes locais da Ilha da Madeira.

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