CICLO
Jean-Claude Biette – O Teatro Das Matérias


Jean-Claude Biette (1942-2003) começou por ser um notável crítico de cinema, especialmente nas páginas dos Cahiers du Cinéma, para onde começou a escrever em 1964, parceiro de geração de Serge Daney ou Louis Skorecki. Como outros nomes dessa e da geração anterior de críticos, passou mais tarde à realização, sem nunca ter abandonado a prática da reflexão escrita sobre cinema, porque Biette escreveu e publicou até ao fim da vida. Como realizador, a obra de Biette tem pontos de contacto com uma secção relativamente secreta do cinema francês dos anos 1970, aquela que foi lançada sob os auspícios da produtora Diagonale de Paul Vecchiali, e onde se podem incluir nomes como os de Jean-Claude Guiguet ou Marie-Claude Treilhou (para além do próprio Vecchiali). O primeiro filme não realizado por Vecchiali produzido pela Diagonale foi justamente a primeira longa-metragem de Biette, LE THÉÂTRE DES MATIÈRES, filme que desde logo lançava vários eixos fundamentais do cinema do autor – a relação com o teatro, o teatro do palco e o teatro dos bastidores mas também as suas continuidades fora do palco e dos bastidores, e muito especialmente com os atores (vários filmes de Biette tem personagens de atores ou atrizes como protagonistas), e um sentido profundo e subtil da efabulação, das narrativas que se multiplicam em fios e caminhos, muitas vezes convocando um aura de “mistério” (quase sempre irrisório) e de sugestões de “complots”, que são o ponto em que se completa também o parentesco entre o cinema de Biette e o de Jacques Rivette, associados ainda pela devoção de ambos os cineastas por Fritz Lang (foi sobre Fritz Lang que Biette veio à Cinemateca falar, no princípio dos anos 2000, na série de conferências a propósito do ciclo “Cinema e Pintura”).
São as sete longas-metragens que Biette realizou entre 1977 e 2003 (o ano da sua morte, sucedida antes da estreia do derradeiro título, SALTIMBANK) que fazem o objeto deste ciclo (as curtas, onde se inclui um episódio de um filme de conjunto dos realizadores da Diagonale, ficam prometidas para fevereiro, numa retrospetiva dedicada ao trabalho da casa produtora de Vecchiali). Um universo muito próprio, de facto misterioso e intrigante nas bifurcações e ramificações – que são também o produto ou o reflexo de uma relação de cumplicidade com atores e grupos de atores de várias gerações, de Sonia Saviange e Jean-Christophe Bouvet a Mathieu Amalric e Jeanne Balibar, passando por Howard Vernon, o “ator-fétiche” de Biette – mas também frequentemente muito divertido, eco do sentido de humor do cineasta, e do seu flirt permanente com a paródia mais ou menos corrosiva (como é o caso de LOIN DE MANHATTAN, porventura o seu filme que mais se aproxima do retrato caricatural de um meio, o do círculo artístico-intelectual parisiense). Só um dos filmes de Biette conheceu estreia comercial em Portugal – foi TRÊS PONTES SOBRE O RIO, parcialmente rodado no nosso país e com produção de Paulo Branco (que já tinha produzido LOIN DE MANHATTAN) – e há dois títulos (CHASSE GARDÉE e LE COMPLEXE DE TOULON) que nunca foram mostrados na Cinemateca, e que serão portanto uma revelação total, ou quase total. Fica o convite para este “complot”, um dos mais secretos, mais longe dos holofotes, do cinema francês das últimas décadas, um dos mais fascinantes e recompensadores.
 
 
18/01/2025, 19h30 | Sala Luís de Pina
Ciclo Jean-Claude Biette – O Teatro Das Matérias

Le Champignon des Carpathes
de Jean-Claude Biette
França, 1988 - 100 min
 
21/01/2025, 19h30 | Sala Luís de Pina
Ciclo Jean-Claude Biette – O Teatro Das Matérias

Chasse Gardée
de Jean-Claude Biette
França, 1992 - 97 min
25/01/2025, 19h30 | Sala Luís de Pina
Ciclo Jean-Claude Biette – O Teatro Das Matérias

Le Complexe de Toulon
de Jean-Claude Biette
França, 1994 - 82 min
27/01/2025, 19h30 | Sala Luís de Pina
Ciclo Jean-Claude Biette – O Teatro Das Matérias

Le Théâtre des Matières
de Jean-Claude Biette
França, 1977 - 77 min
28/01/2025, 19h30 | Sala Luís de Pina
Ciclo Jean-Claude Biette – O Teatro Das Matérias

Loin de Manhattan
de Jean-Claude Biette
França, 1980 - 80 min
18/01/2025, 19h30 | Sala Luís de Pina
Jean-Claude Biette – O Teatro Das Matérias
Le Champignon des Carpathes
de Jean-Claude Biette
com Tonie Marshal, Thomas Badek, Howard Vernon, Laura Betti
França, 1988 - 100 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Um regresso ao teatro: prepara-se uma encenação de Hamlet, por um encenador de passado glorioso mas entretanto remetido ao esquecimento, e o filme segue a atriz a quem caberá interpretar o papel de Ofélia. Reconhecem-se elementos dos dois filmes anteriores de Biette (que são, tudo somado, os elementos centrais na generalidade da sua obra), mas LE CHAMPIGNON DES CARPATHES tem porventura a narrativa mais densa, mais intrincada, com múltiplas personagens numa teia de enigmas e segredos, sempre em variações de tom que cuidadosamente evitam todos os extremos (nunca abertamente dramático, nunca abertamente cómico), e cheio de reflexos da realidade daquela segunda metade dos anos 80: o “cogumelo dos Cárpatos” é um suposto antídoto para os malefícios das radiações induzidas por uma explosão numa central nuclear (óbvia referência ao desastre de Chernobil).

A sessão repete no dia 30 às 19h30, na sala Luís de Pina.

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21/01/2025, 19h30 | Sala Luís de Pina
Jean-Claude Biette – O Teatro Das Matérias
Chasse Gardée
de Jean-Claude Biette
com Gérard Blain, Tonie Marshall, Rüdiger Vogler
França, 1992 - 97 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Um dos filmes mais tortuosos, e ao mesmo tempo mais misteriosos, de Jean-Claude Biette. História de um triângulo amoroso, unido, ou rasgado, por segredos e “complots”, ambientada na redação de um jornal (mas com passagem, típica de Biette, pelo teatro), CHASSE GARDÉE é um filme admiravelmente tenso, construído sobre não-ditos e não explicados. O principal trio de atores, bastante heteróclito, é formidável. Primeira apresentação na Cinemateca.

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25/01/2025, 19h30 | Sala Luís de Pina
Jean-Claude Biette – O Teatro Das Matérias
Le Complexe de Toulon
de Jean-Claude Biette
com Jean-Christophe Bouvet, Howard Vernon, Ysé Tran
França, 1994 - 82 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Um mundo ficcional construído por ramificações múltiplas (o Toulon do título é o nome de uma personagem que identificou uma síndroma psiquiátrico que levou o seu nome, o “complexo de Toulon), a partir da história de dois irmãos e dos seus percursos – pelos livros, pelo teatro, pelo rock, pelos encontros e desencontros com as outras personagens. Micro-peripécias, micro-acontecimentos, eis o essencial do filme, que é também um dos mais cómicos, talvez o mais cómico, dos filmes de Jean-Claude Biette. Primeira apresentação na Cinemateca.

A sessão repete no dia 31 às 19h30, na sala Luís de Pina.
27/01/2025, 19h30 | Sala Luís de Pina
Jean-Claude Biette – O Teatro Das Matérias
Le Théâtre des Matières
de Jean-Claude Biette
com Sonia Saviange, Howard Vernon, Philippe Chemin
França, 1977 - 77 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Encantado com FEMMES, FEMMES, Jean-Claude Biette aproximara-se de Paul Vecchiali. Quando este fundou a produtora Diagonale, LE THÉÂTRE DES MATIÈRES, a estreia em longas-metragens de Biette, foi um dos dois primeiros filmes produzidos pela novel casa de produção (ao lado de LA MACHINE, do próprio Vecchiali). LE THÉÂTRE DES MATIÈRES pertence à linha diagonal tanto quanto apresenta já os principais elementos do cinema de Biette, especialmente a relação com o teatro (e, sobretudo, com os atores e as atrizes), através da história de uma atriz (Sonia Saviange, uma das femmes, femmes) que se prepara para interpretar a personagem de Catarina de Médicis numa encenação de Maria Stuart de Schiller. À época, o filme de Biette foi comercialmente estreado em sessão dupla com TOUTE RÉVOLUTION EST UN COUP DE DÉS, de Straub e Huillet.

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28/01/2025, 19h30 | Sala Luís de Pina
Jean-Claude Biette – O Teatro Das Matérias
Loin de Manhattan
de Jean-Claude Biette
com Jean-Christophe Bouvet, Sonia Saviange, Howard Vernon, Laura Betti
França, 1980 - 80 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Com o núcleo de atores que constituía a sua cada vez mais definida “troupe”, a segunda longa-metragem de Jean-Claude Biette é um dos seus filmes mais divertidos – à época, Jacques Siclier, crítico do Le Monde, chegou a comparar os diálogos aos dos Irmãos Marx.  Outro crítico notava que, depois da matéria rivettiana em LE THÉÂTRE DES MATIÈRES, LOIN DE MANHATTAN se acercava da vizinhança de Eric Rohmer. Em todo o caso, e para além do olhar paródico sobre um círculo da intelectualidade parisiense (o mundo da arte e dos críticos de arte), LOIN DE MANHATTAN constrói-se sobre um princípio sumamente biettiano – um mistério, mais ou menos irrisório, mais ou menos macguffin: porque é que o pintor René Dimanche passou por um tão longo período de inatividade? É isso que um jovem crítico, acompanhado por uma sua amiga, se propõe descobrir.

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