No ano em que Portugal celebra os cinquenta anos do 25 de Abril, o programa organizado em nova colaboração com a Festa do Cinema Italiano assinala também a data, que liga Itália e Portugal na celebração da conquista da liberdade e do fim do fascismo, com um Ciclo dedicado ao “outro 25 de Abril”: o “25 Aprile” de 1945 quando as forças aliadas protagonizaram a libertação de Itália das tropas nazis. Combinando grandes clássicos do cinema italiano com obras mais recentes, longas-metragens de ficção com documentários, o Ciclo traça um retrato da História política, social, económica e cultural do país, desde a ascensão do fascismo até ao atribulado período dos anos de chumbo, oferecendo ainda uma visão abrangente da História e do legado da Resistência italiana.
No cinema, a revolta e a força popular dos anos da Resistência são imortalizadas pela icónica imagem de Pina (Anna Magnani) correndo desesperadamente atrás de um camião do exército nazi sob uma chuva de tiros em ROMA, CITTÀ APERTA. Nestes anos, o papel social do individuo joga-se entre “o conformismo das «pessoas vulgares»” a que sucumbe o protagonista do filme IL CONFORMISTA, de Bernardo Bertolucci, e a revolta. Andrea, o jovem aristocrata de GLI SBANDATI, tomará, inevitavelmente, consciência dessa urgente necessidade de um posicionamento político, que levará milhares de pessoas a juntarem-se à luta partigiana: jovens rapazes como Milton e Giorgio, os protagonistas do filme UNA QUESTIONE PRIVATA, dos irmãos Taviani, e os seus companheiros, que partem para as montanhas para combater os “escaravelhos negros”. Na Resistência participam ainda milhares de mulheres que desempenham um papel importantíssimo, lutando ao lado dos seus companheiros pela conquista da liberdade, desafiando os tradicionais papéis de género da sociedade patriarcal italiana dos anos 40; histórias contadas no documentário LA DONNA NELLA RESISTENZA, de Liliana Cavani e também no filme L’AGNESE VA A MORIRE, de Giuliano Montaldo, adaptação de um livro baseado na experiência da escritora Renata Viganò durante a Resistência.
Nas décadas seguintes, o cinema foi um instrumento para observar e retratar os novos desafios enfrentados por uma sociedade em constante transformação: a reconstrução no pós-Guerra, os primeiros anos de democracia, o boom económico e os agitados anos de chumbo. Traçando uma ponte entre o período da Guerra – com os seus sonhos, esperanças e utopias – e a nova conjuntura social, política e económica das tão atribuladas décadas de 60 e 70, delineia-se a complexa evolução dessa nova democracia e o rumo que tomaram os sonhos e as promessas dessa primavera de abril. Com as transformações sociais suscitadas pelo boom económico, as prioridades parecem afastar-se dos sonhos de justiça social dos anos de Resistência. Silvio, o jornalista comunista que protagoniza UNA VITA DIFFICILE, confronta-se assim com uma nova e dolorosa realidade: companheiros de luta que tomam o partido dos patrões, pressões para arranjar um emprego estável e comprar o melhor automóvel do mercado. Dez anos depois da estreia de UNA VITA DIFFICILE, Ettore Scola realiza C’ERAVAMO TANTO AMATI, história de três amigos que haviam partilhado a forte experiência de combate nas montanhas durante a Resistência partigiana; estes encontram-se, nas décadas seguintes, numa Itália em constante mutação, cada vez mais distantes nas suas crenças sociais e políticas.
À medida que a História avança, a memória e o legado da Resistência revela-se cada vez mais importante, inspirando novas gerações nos seus caminhos de luta e reivindicação. ALL’ARMI SIAM FASCISTI, documentário realizado na década de 1960, após uma onda de manifestações antifascistas, reconstrói, através de imagens de arquivo, a História e as origens do fascismo, questionando se este terá verdadeiramente terminado. Sessenta anos depois, Giulia Giapponesi procura responder a essa questão num documentário sobre a História e o legado do hino partigiano Bella Ciao, sublinhando como os vários movimentos de Resistência se cruzam, convergindo num objetivo comum: a conquista da liberdade.