CICLO
Eduardo Serra, "Interpretar Um Texto Com Luz"


Eduardo Serra é o mais internacional dos diretores de fotografia portugueses.
Nascido em Lisboa, em 1943, no seio de uma família modesta do bairro da Picheleira, manteve com Portugal uma relação de vai-e-vem desde que, em 1963, se exilou em Paris, depois de participar nas lutas estudantis da paradigmática Crise Académica de 1962 (fortemente reprimida pela ditadura). Abandonou o curso de engenharia, em que estava inscrito no Instituto Superior Técnico (“quando entrei para o Técnico já tinha as maiores dúvidas que isso fosse a minha vida. Tentei. Andei lá três anos. No primeiro ano, não correu muito bem; só fiz uma cadeira. Já estava mergulhado nos cineclubes…”), e foi para França, onde estudou cinema, na École Nationale de Photographie (vocacionada para diretores de fotografia e engenheiros de som), terminando a sua formação em 1966. Depois disso, conclui ainda o curso de História da Arte e Arqueologia na Universidade de Paris-Sorbonne em 1970.
Iniciou o seu percurso como operador de câmara e assistente de imagem na década de 1970, em filmes de realizadores como Alain Cavalier, Francis Girod ou Patrice Leconte. E, já no final da década, começa a assinar os primeiros filmes como diretor de fotografia (documentário e filmes de curta-metragem), sendo que será José Fonseca e Costa, que conhecia há poucos anos, quem primeiro aposta no seu talento. SEM SOMBRA DE PECADO será, portanto, o seu cartão de visita. Como explicou em entrevista, “Organizei uma projeção em Paris, convidei toda a gente que conhecia, vieram muitos, e nunca mais parei. No mês que se seguiu à sessão, propuseram-me vários filmes e a coisa começou a pegar. Curiosamente trabalhei, como diretor de fotografia com realizadores com quem já tinha trabalhado como assistente, o que não acontece muitas vezes. Mas já tinha feito mais de trinta filmes como primeiro assistente, conhecia muita gente.” 
Assim, nesse arranque da década de 1980, Eduardo Serra começa por trabalhar numa série de produções de cariz popular: comédias e filmes de ação. Nomeadamente, em filmes de François Leterrier (LE GARDE DU CORPS e TRANCHES DE VIE) e também nas estreias na realização de dois dos atores cómicos mais conhecidos do público francês, Gérard Jugnot e Michel Blanc. De facto, os dois eram protagonistas de LE BRONZÉS (1978), sucesso comercial de Patrice Leconte (mais de 2 milhões de espectadores), no qual Eduardo Serra havia trabalhado como primeiro assistente de imagem. Tanto PINOT SIMPLE FLIC (de Jugnot) como MARCHE À L’OMBRE (de Blanc) tornam-se fenómenos de público (o primeiro chega perto dos 2 milhões e meio de bilhetes vendidos, ao passo que o segundo ultrapassa a barreira dos 6 milhões) e afirmam Eduardo Serra no coração da indústria do cinema francês.
A partir daí, o diretor de fotografia começa a ser um dos artífices mais requisitados, impondo gradualmente um estilo e uma metodologia, com especial preferência pela luz natural: “Tenho este princípio de respeitar as direções de luz natural, mesmo que seja um natural fabricado: quando há janelas, a luz vem das janelas. (…) O meu ponto de partida é sempre fazer uma luz que possa ser identificada como a luz natural da situação ou do lugar.” Além de trabalhar com cineastas portugueses (como José Fonseca e Costa, João Mário Grilo, Luís Filipe Rocha ou Fernando Lopes), fez carreira em França, no Reino Unido e nos Estados Unidos da América. Tornou-se colaborador habitual de dois nomes maiores do cinema francês, Claude Chabrol (com quem fez sete filmes) e Patrice Leconte (outros nove) e trabalhou também com realizadores ingleses (como Michael Winterbottom ou Iain Softley), e com cineastas norte-americanos (como M. Night Shyamalan ou Edward Zwick), tendo sido nomeado duas vezes para o Oscar de Melhor Direção de Fotografia: em 1997, por THE WINGS OF THE DOVE, e em 2003, por GIRL WITH A PEARL EARRING. 
Do cinema popular ao cinema de autor europeu e do filme de qualidade inglês ao coração da indústria de Hollywood (foi o responsável pela fotografia dos dois últimos filmes da saga Harry Potter), o percurso de Eduardo Serra revela um método de “interpretar o texto com a luz” (citando de uma entrevista a Anabela Mota Ribeiro) que se caracteriza pela força da simplicidade. Este Ciclo acontece depois de, em 2005, a Cinemateca lhe ter dedicado um ciclo no âmbito da série “Grandes Diretores de Fotografia do Cinema Português”, e de ter organizado uma cerimónia de homenagem a propósito da entrega do Prémio Carreira 2014 da Academia Portuguesa de Cinema.
 
12/07/2025, 21h45 | Esplanada
Ciclo Eduardo Serra, "Interpretar Um Texto Com Luz"

Sem Sombra de Pecado
de José Fonseca e Costa
Portuga, 1982 - 104 min
 
14/07/2025, 21h45 | Esplanada
Ciclo Eduardo Serra, "Interpretar Um Texto Com Luz"

Le Mari De La Coiffeuse
O Marido da Cabeleireira
de Patrice Leconte
França, 1990 - 82 min
15/07/2025, 21h45 | Esplanada
Ciclo Eduardo Serra, "Interpretar Um Texto Com Luz"

Marche À L'Ombre
Vai Pela Sombra
de Michel Blanc
França, 1984 - 90 min
16/07/2025, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Eduardo Serra, "Interpretar Um Texto Com Luz"

Funny Bones
Comédia Louca
de Peter Chelsom
Reino Unido, Estados Unidos, 1995 - 128 min
16/07/2025, 21h45 | Esplanada
Ciclo Eduardo Serra, "Interpretar Um Texto Com Luz"

L'Ivresse du Pouvoir
A Comédia do Poder
de Claude Chabrol
França, 2005 - 110 min
12/07/2025, 21h45 | Esplanada
Eduardo Serra, "Interpretar Um Texto Com Luz"
Sem Sombra de Pecado
de José Fonseca e Costa
com Mário Viegas, Victoria Abril, Lia Gama, Armando Cortês
Portuga, 1982 - 104 min
M/12
Na década de 40, durante a Segunda Guerra Mundial, na paz podre do salazarismo, SEM SOMBRA DE PECADO segue a relação de um militar com uma mulher misteriosa. Enquanto cumpre o serviço militar, Henrique, um jovem que pertence a uma família burguesa abastada, começa a receber misteriosos telefonemas de uma mulher. Segue-se uma série de encontros sem consequência, que desembocam numa revelação: o amor e a guerra têm muito em comum. Baseado no conto E Aos Costumes Disse Nada, de David Mourão-Ferreira, o filme de José Fonseca e Costa foi apresentado em Cannes, na Quinzena dos Realizadores, e garantiu o futuro de Eduardo Serra enquanto diretor de fotografia. Como recordou, em 2002, ao jornal Público “do ponto de vista cinematográfico, não devo nada a Portugal. [No entanto,] devo muito ao Fonseca e Costa. [SEM SOMBRA DE PECADO] era um filme a que, no estado em que estava a minha carreira, eu ainda não teria acesso. Ele apostou em mim e isso foi decisivo para a minha carreira, mesmo em França”.
14/07/2025, 21h45 | Esplanada
Eduardo Serra, "Interpretar Um Texto Com Luz"
Le Mari De La Coiffeuse
O Marido da Cabeleireira
de Patrice Leconte
com Jean Rochefort, Anna Galiena, Maurice Chevit, Albert Delpy
França, 1990 - 82 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Desde que Antoine, de 12 anos, viu Madame Sheaffer, a voluptuosa cabeleireira do bairro, soube que um dia se casaria com uma cabeleireira. À medida que os meses se transformam em anos e Antoine se recusa a esquecer a sua fantasia infantil, a silenciosa e distante Mathilde entra no seu mundo, apanhando-o de surpresa. Será ela uma ficção? LE MARI DE LA COIFFEUSE corresponde à segunda colaboração de Eduardo Serra com Patrice Leconte (fizeram nove filmes juntos), sobre quem o primeiro disse que “a ousadia e a força visual de Leconte levam-no muitas vezes a fazer coisas muito originais, diferentes e variadas, absolutamente corretas e totalmente revolucionárias sem nunca se tornarem gratuitas. Os planos que inventou em LE MARI DE LA COIFFEUSE são de cortar a respiração! (…) Tive a rara oportunidade de filmar um dos meus filmes preferidos.” Além de se tornar num fenómeno mundial, o filme daria a Eduardo Serra a sua primeira e única nomeação para os prémios César, o galardão da Academia Francesa de Cinema.

consulte a FOLHA da CINEMATECA aqui 
15/07/2025, 21h45 | Esplanada
Eduardo Serra, "Interpretar Um Texto Com Luz"
Marche À L'Ombre
Vai Pela Sombra
de Michel Blanc
com Gérard Lanvin, Michel Blanc, Sophie Duez
França, 1984 - 90 min
legendado em português | M/12
De mochila às costas, dois músicos chegam a Marselha, vindos da Grécia. François (Gérard Lanvin) é talentoso e tem a ambição de conquistar os estúdios de música parisienses. Já Denis (Michel Blanc – o “Woody Allen francês” que se estreou como realizador com este filme) é ansioso e pessimista e parece atrair todo o tipo de azares. Inseparáveis e complementares, os dois vagueiam pelo submundo urbano até que, à porta de um cinema, conhecem Mathilde. Falecido no final de 2024, Blanc foi um dos atores cómicos mais populares do cinema francês e MARCHE À L’OMBRE tornou-se num extraordinário sucesso comercial, com mais de 6 milhões de espectadores, afirmando Eduardo Serra dentro da indústria francesa. Sobre o filme, explicou o diretor de fotografia “normalmente, a comédia não é muito interessante do ponto de vista fotográfico porque a luz não é um elemento na construção da história (…). Numa comédia, é a ação e não a luz que nos pode fazer rir. (…) Mas em MARCHE À L’OMBRE filmámos contra a luz da comédia, trabalhando o realismo e o claro--escuro”. Primeira exibição na Cinemateca. 

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16/07/2025, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Eduardo Serra, "Interpretar Um Texto Com Luz"
Funny Bones
Comédia Louca
de Peter Chelsom
com Jerry Lewis, Oliver Platt, Lee Evans, Leslie Caron
Reino Unido, Estados Unidos, 1995 - 128 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Um filme de homenagem à genialidade cómica de Jerry Lewis. Vivendo à sombra do seu pai, um famoso comediante (interpretado pelo próprio Lewis), um jovem cómico (Oliver Platt) refugia-se na sua antiga cidade natal (Blackpool, em Inglaterra), após o desastre do seu último espetáculo em Las Vegas. Disposto a tudo para se inspirar, o regresso a “casa” vem com uma série de revelações sombrias sobre o seu passado. Mas também lhe dá a ver que a sua excêntrica família é o melhor material para o seu próximo número de comédia física. A abordagem de Eduardo Serra foi uma de “reinterpretação”, isto é, “replicar em cinema o que faríamos se se tratasse de iluminar um espetáculo real (…) mesmo que isso signifique enganar a realidade.” Primeira exibição na Cinemateca. 

A sessão repete no dia 22 às 19h30, na sala Luís de Pina.
 
16/07/2025, 21h45 | Esplanada
Eduardo Serra, "Interpretar Um Texto Com Luz"
L'Ivresse du Pouvoir
A Comédia do Poder
de Claude Chabrol
com Isabelle Huppert, François Berléand, Patrick Bruel, Robin Renucci, Maryline Canto, Jean-François Balmer
França, 2005 - 110 min
legendado em português | M/12
Jeanne Charmant-Killman é a juíza de instrução encarregada de um caso de corrupção que compromete o presidente de um importante grupo empresarial. As investigações conferem-lhe um crescente sentido de poder que acabam por fragilizar a sua vida pessoal. Inspirado no caso Elf Aquitaine, muito publicitado em França em 2003 como o mais notório escândalo político--industrial do pós-guerra, o filme abre maliciosamente com um aviso, “Qualquer semelhança com factos reais e personagens conhecidas será, como se diz, fortuito…” Estudo sobre a natureza do poder, L’IVRESSE DU POUVOIR é também um filme que trabalha a luz e as sombras. Corresponde à quinta colaboração entre Eduardo Serra e Chabrol (fizeram sete filmes juntos), sendo que sobre o seu trabalho conjunto, o diretor de fotografia explicou que “Chabrol privilegia outros aspetos e esquece a dimensão visual. (...) [No entanto,] ter liberdade torna-se um constrangimento. Podemos fazer o que quisermos, mas ao mesmo tempo podemos meter-nos por becos sem saída.” 

A sessão repete no dia 31 às 19h00, na sala M. Félix Ribeiro.


A sessão repete no dia 31 às 19h00, na sala M. Félix Ribeiro, com A THERAPY, de Roman Polanski.