CICLO
Viagens Pela Noite – O Mundo de Anatole Litvak (Parte I)


Atravessando várias décadas e vários países na História do cinema (e em particular o cinema clássico americano), o nome de Anatole Litvak (1902-1974) será eventualmente menos lembrado hoje do que alguns dos títulos dos filmes que realizou. Sem um estilo e um universo tão vincado e reconhecível como os de alguns dos seus colegas europeus igualmente expatriados nos Estados Unidos (não será preciso ir buscar os sacrossantos nomes de Lubitsch ou Lang, basta lembrar Rouben Mamoulian ou Robert Siodmak), Litvak foi um dos muitos cineastas que vindos da Europa contribuíram para o sucesso industrial de Hollywood, mas ultrapassou largamente o estatuto de realizador competente, tendo deixado pelo menos um punhado de filmes memoráveis bem como outra mão-cheia de filmes dignos de figurar em qualquer antologia de diferentes géneros cinematográficos. Nesta revisão muito alargada do conjunto diverso da sua obra (através de duas dezenas e meia dos filmes que realizou e que prossegue em janeiro) será possível perceber melhor se a “segunda linha” onde frequentemente é arrumado não será porventura redutora face à grandeza de alguns dos seus filmes. Convidado pela Cinemateca Portuguesa a co-programar esta retrospectiva, Ehsan Khoshbakht (diretor de programação do Il Cinema Ritrovato de Bolonha e responsável pela retrospetiva que esse festival dedicou este ano a Litvak, que aqui se apresenta em formato mais alargado) estará em Lisboa para uma conferência sobre a obra de Litvak e para apresentar as primeiras sessões do Ciclo.
 
A base de produção de Litvak foi mudando, tal como a grafia do seu nome, a par da sua mudança de Moscovo para Berlim, Paris, Londres e, por fim, Hollywood, mas a essência do seu cinema permaneceu intacta: a vida como metáfora de uma travessia pela noite, em busca da luz do dia. Um realizador reservado e pouco dado a sentimentalismos, os seus filmes exaltam uma atmosfera noturna, como refletem alguns dos seus títulos — BLUES IN THE NIGHT, THE LONG NIGHT, DECISION BEFORE DAWN.
Anatole Litvak, nascido em Kiev, numa família judia russa, testemunhou revoluções e guerras, glamour e miséria. Ao longo de seis décadas de trabalho, os seus filmes retrataram homens e mulheres imperfeitos e instáveis, cujas crises de identidade refletem os abalos do mundo entre a Revolução Russa e as repercussões da Segunda Guerra Mundial.
Conhecido entre amigos como “Tola”, Litvak coescreveu e produziu grande parte da sua obra. Dada a sua experiência no cinema mudo, onde trabalhou como assistente de realização e montador ao lado de figuras como Abel Gance e G.W. Pabst, é possível afirmar que experimentou todas as componentes da realização de um filme para além da própria filmagem. Realizou igualmente trabalho pioneiro: o primeiro filme abertamente anti-nazi de Hollywood, THE CONFESSIONS OF A NAZI SPY, o “filme-ensaio” em formato de compilação, THE BATTLE OF RUSSIA, e um remake americano em adaptação televisiva do seu mais famoso filme europeu, MAYERLING.
Apesar de ter um doutoramento em Filosofia pela Universidade de Leninegrado, Litvak era, como cineasta, mais intuitivo do que metódico. Para ele, o espaço era mais importante do que a narrativa, e, para frustração de alguns dos seus atores, começava o dia sentado na dolly, a planear a cena em movimentos de câmara. “A câmara era o seu Deus”, lamentou certa vez Bette Davis. No entanto, os seus arrebatadores longos planos eram pensados tanto para a criação de harmonia como para a busca de contradição. A câmara era simultaneamente um instrumento musical e um microscópio.
Depois da guerra, a câmara tornou-se mais tranquila, e os seus filmes refletem um homem sombrio e pensativo, a lidar com o reajuste e com os escombros psicológicos deixados pelo conflito, mesmo quando as suas histórias tinham lugar num passado distante. Vários filmes deste programa centram-se em mulheres que tentam reaver a sua identidade, maioritariamente sob uma perspetiva masculina. Enquanto as mulheres reivindicam uma identidade perdida, os homens têm dificuldades em agarrar-se à sua. Outros filmes abordam a mudança de valores num universo masculino onde a linha entre heroísmo e traição, integridade artística e cedência, ou mesmo entre o bem e o mal, se caracteriza pela sua indefinição. Litvak era também um mestre dos finais – surpreendentes, subtis, modernos. Mesmo nos seus filmes mais medianos, um último ato memorável transforma e redefine o filme. Se “tudo está bem quando acaba bem”, o cinema de Litvak garante sempre esse desfecho.
Ehsan Khoshbakht
 
 
12/12/2024, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Viagens Pela Noite – O Mundo de Anatole Litvak (Parte I)

The Amazing Dr. Clitterhouse
O Génio do Crime
de Anatole Litvak
Estados Unidos, 1938 - 87 min
 
13/12/2024, 16h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Viagens Pela Noite – O Mundo de Anatole Litvak (Parte I)

Nie Wieder Liebe!
“Amor Nunca Mais!”
de Anatole Litvak
Alemanha, 1931 - 88 min
14/12/2024, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Viagens Pela Noite – O Mundo de Anatole Litvak (Parte I)

Cette Vieille Canaille
O Médico e o Homem
de Anatole Litvak
França, 1933 - 99 min
16/12/2024, 16h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Viagens Pela Noite – O Mundo de Anatole Litvak (Parte I)

Coeur de Lilas
Sombras de Paris
de Anatole Litvak
França, 1932 - 90 min
17/12/2024, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Viagens Pela Noite – O Mundo de Anatole Litvak (Parte I)

L’Équipage
A Equipagem
de Anatole Litvak
França, 1935 - 111 min
12/12/2024, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Viagens Pela Noite – O Mundo de Anatole Litvak (Parte I)

Em colaboração com Il Cinema Ritrovato
The Amazing Dr. Clitterhouse
O Génio do Crime
de Anatole Litvak
com Edward G. Robinson, Humphrey Bogart, Claire Trevor
Estados Unidos, 1938 - 87 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Com argumento adaptado de um grande sucesso nos palcos teatrais, THE AMAZING DR. CLITTERHOUSE põe em cena a personagem de um médico psiquiatra (Robinson) da alta de Nova Iorque que mergulha no submundo com o propósito de estudar a “mente criminosa”. O gang com que se envolve é liderado por Humphrey Bogart, naqueles anos em que se especializava em papéis de vilão, à espera de renascer como herói e galã. Primeira apresentação na Cinemateca.

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13/12/2024, 16h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Viagens Pela Noite – O Mundo de Anatole Litvak (Parte I)

Em colaboração com Il Cinema Ritrovato
Nie Wieder Liebe!
“Amor Nunca Mais!”
de Anatole Litvak
com Lilian Harvey, Harry Liedtke, Felix Bressart
Alemanha, 1931 - 88 min
legendado eletronicamente em português | M/12
O terceiro filme realizado por Anatole Litvak é uma comédia musical típica da produção alemã daquele período. Rodada entre os estúdios da UFA e as paisagens da Côte d’Azur, com parte essencial da ação a bordo de um navio de cruzeiro, alia as canções a uma intriga cómica mais ou menos mirabolante. Um milionário declara-se farto do amor e das mulheres e faz uma aposta com um amigo: será capaz de passar sem qualquer romance durante pelo menos cinco anos. Só que depois encontra Lilian Harvey, à época uma das maiores vedetas da UFA. Primeira apresentação na Cinemateca. A exibir em cópia digital.

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14/12/2024, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Viagens Pela Noite – O Mundo de Anatole Litvak (Parte I)

Em colaboração com Il Cinema Ritrovato
Cette Vieille Canaille
O Médico e o Homem
de Anatole Litvak
com Harry Baur, Pierre Blanchar, Alice Field
França, 1933 - 99 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Depois de sair da Alemanha, Anatole Litvak passou por Inglaterra, onde fez um filme, TELL ME TONIGHT, e depois aportou a França. CETTE VIEILLE CANAILLE foi o seu primeiro filme francês, uma variação melodramática em torno da relação entre um velho médico e a sua mulher muito mais nova. Primeira apresentação na Cinemateca. A exibir em cópia digital.

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16/12/2024, 16h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Viagens Pela Noite – O Mundo de Anatole Litvak (Parte I)

Em colaboração com Il Cinema Ritrovato
Coeur de Lilas
Sombras de Paris
de Anatole Litvak
com André Luguet, Marcelle Romée, Jean Gabin
França, 1932 - 90 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Um curioso filme do começo da carreira de Anatole Litvak, no período francês, e onde se encontra já o gosto pelas atmosferas estranhas e sombrias, na noite e dos bares de fumo e de sombras, onde as personagens procuram esconder-se, dos seus grandes filmes do período americano. E já, também, a atmosfera do “realismo poético” com um dos seus intérpretes de eleição também em começo de carreira: Jean Gabin.
   
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17/12/2024, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Viagens Pela Noite – O Mundo de Anatole Litvak (Parte I)

Em colaboração com Il Cinema Ritrovato
L’Équipage
A Equipagem
de Anatole Litvak
com Charles Vanel, Annabella, Jean Murat
França, 1935 - 111 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Adaptado de um romance de Joseph Kessel, L’ÉQUIPAGE retrata o ambiente entre os aviadores de uma esquadrilha da força aérea francesa durante a I Guerra Mundial. Por entre o fatalismo que vem do convívio diário com a morte, recorta-se um triângulo amoroso com centro na personagem de Annabella, mulher de um aviador (Vanel) e amante de outro (Jean Murat). É um dos filmes franceses mais famosos de Litvak, e porventura aquele que mais longe vai na exploração de um melodramatismo “existencial” à beira do masoquismo. A história de Kessel já tinha sido adaptada ao cinema, no tempo do mudo, por Maurice Tourneur, e seria de novo filmada por Litvak para o seu batismo de fogo em Hollywood, THE WOMAN I LOVE. Primeira apresentação na Cinemateca. A exibir em cópia digital.

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