O FILMar, projeto operacionalizado pela Cinemateca Portuguesa – Museu do Cinema, no âmbito do Mecanismo Europeu de Financiamento EEAGrants, iniciou-se a 4 de fevereiro de 2020 com o compromisso de, por três anos, digitalizar e tornar acessíveis, 10 mil minutos de cinema português relacionado com o mar.
Em fevereiro apresentaremos duas sessões especiais. A primeira, na data em que o projeto celebra dois anos, junta cinco filmes, entre eles cópias novas de NUM MAR DE MOLIÇO (Alfredo Tropa, 1965) e THE COLUMBUS ROUTE (José Fonseca e Costa, 1969). De José Fonseca e Costa é a segunda curta-metragem que o FILMar recupera, depois de, em dezembro, ter mostrado E ERA O MAR (1966) que, tal como o que amanhã mostramos, são exemplo de como, para muitos realizadores, o mar foi, através da encomenda institucional, um modo de iniciar e construir uma relação entre a imagem e o discurso cinematográfico.
Os restantes filmes da sessão de 4 de fevereiro são títulos que nos chegaram incompletos, seja na banda de som ou imagem, mas essenciais para compreendermos a diversidade de usos do mar como personagem e cenário. Precisamente, o uso do mar como matéria ideológica é, num país como o nosso, motor de uma reflexão necessária sobre o poder das imagens em movimento.
No dia 19, em colaboração com o festival PLAY, e no âmbito da atividade da Cinemateca Júnior, mostraremos quatro títulos, entre eles dois com acompanhamento ao piano, por Filipe Raposo, num arco temporal que inicia em 1913 e termina em 1964.
Dois anos depois, são já visíveis muitos dos resultados – apresentados em sessões realizadas em parceria com festivais, ou nas salas da Cinemateca – de um trabalho de equipa que, no Arquivo Nacional das Imagens em Movimento (ANIM), se dedica a investigar, interpretar e reconstruir as marcas que o tempo foi deixando em materiais que são, muitos deles, únicos e preciosos instrumentos para a leitura da história do cinema.
Apesar do atraso que o contexto pandémico provocou em todos os projetos, nomeadamente os culturais, foi possível dar início à instalação de um novo laboratório digital no Arquivo Nacional das Imagens em Movimento, e proceder à contratação de uma equipa especializada na preservação, restauro e promoção de um património que compreende a ficção, documentário, animação, experimental, bem como o filme científico, institucional, de promoção turística, de desenvolvimento industrial, de investigação marinha e geológica.
O programa, desenvolvido pela Noruega, Islândia e Liechtenstein, conta com um financiamento de 881 mil€, e tem como parceiro o Norwegian Film Institut, congénere da Cinemateca Portuguesa, com quem são desenvolvidos programas bilaterais de cooperação, programação e formação. Estão previstas a organização de retrospetivas de filmes portugueses e norugueses nos dois países, bem como a edição temáticas – catálogos, DVD – e seminários com a participação de especialistas de diferentes áreas relacionadas com o mar.
No final deste programa – estendido para abril de 2024, por força da situação pandémica – a Cinemateca estará em condições de apresentar dez mil minutos de cinema português em condições técnicas que permitam a sua exibição em todo o território nacional. Começamos pelo mar, não por desígnio tradicional, mas por ser esse o tema deste programa de financiamento e, através dele, podermos dar a conhecer filmes de ficção e documentário, em curta e longa-metragem nos mais diferentes géneros, mas também uma muito importante e fundamental lista de títulos institucionais, industriais, de promoção turística, de inevitável propaganda, investigação científica, em particular a marinha, o desenvolvimento territorial e as práticas comunitárias que têm no, ou com, o mar uma relação estruturante.
Em dois anos foram digitalizados 623 minutos de filmes, correspondendo a 18 títulos. Destes, 4 são longas-metragens (351 minutos) e 14 são curtas-metragens (272 minutos). Entre estes títulos, encontram-se filmes fundamentais para uma leitura da história do cinema português nas suas mais distintas frentes, como MARIA DO MAR (Leitão de Barros, 1930), TRÁFEGO E ESTIVA (Manuel de Guimarães, 1968) e O FAUNO DAS MONTANHAS (Manuel Luís Vieira, 1926).
Entre os títulos apresentados houve também lugar para uma sessão especial com o documentário SOBRE MARIA DO MAR, de Manuel Mozos, focado no processo de composição e gravação da partitura de Bernardo Sassetti, encomendada pela Cinemateca Portuguesa. Ainda, o compositor Filipe Raposo apresentou, em estreia, a composição concebida para NAZARÉ, PRAIA DE PESCADORES. Estes dois títulos integrarão a edição em DVD de MARIA DO MAR.
Até hoje foram apresentados 18 filmes (16 curtas e 2 longas), em 7 sessões, realizadas em colaboração com os festivais DocLisboa e Porto/Post/Doc, o Museu Nacional do Teatro e da Dança e a Casa Bernardo Sassetti, em diferentes salas, para além da Cinemateca, nomeadamente o São Luiz Teatro Municipal e a Culturgest (Lisboa), o Teatro Municipal do Porto e o Passos Manuel (Porto). O FILMar colaborou ainda com os projetos internacionais de promoção da literacia cinematográfica, nomeadamente A Season of Classic Films, da Associação das Cinematecas Europeias, e o programa O Dia Mais Curto, em cooperação com a Agência da Curta-Metragem. As sessões tiveram um total de 1225 espetadores.
Para 2022 estão previstos, entre outros, a apresentação de filmes de António Campos, no centenário do seu nascimento, de José Álvaro Morais, nos 35 anos da estreia de O BOBO (Leopardo de Ouro em Locarno, 1987), e FAROLEIROS, de Maurice Mariaud, épico mudo 1922, um dos maiores filmes do início do cinema português. A estes títulos juntar-se-ão, ainda, filmes assinados por Manuel Guimarães (VIDAS SEM RUMO, 1956), Leitão de Barros (ALA-ARRIBA, 1942) e José Álvaro Morais (ZÉFIRO, 1994), a par de dois títulos de Solveig Nordlund (ATÉ AMANHÃ, MÁRIO, 1994; APARELHO VOADOR A BAIXA ALTITUDE, 2002).
Estão já em curso mais 5 longas-metragens (386 minutos), entre elas as que celebrarão, em junho, em colaboração com o Curtas de Vila do Conde o centenário do nascimento de António Campos (1922-1999): a curta-metragem O TESOURO (1958), a média-metragem A ALMADRABA ATUNEIRA (1961), e a longa-metragem GENTE DA PRAIA DA VIEIRA (1975) contam-se entre os exemplos a partir do qual poderemos redescobrir a filmografia de um dos mais destacados nomes do cinema português, pela sua relação com o mar.
Em 2022 prosseguiremos as colaborações com os festivais nacionais DocLisboa e Porto/Post/Doc, num trabalho de contínua reflexão sobre a dimensão memorialista e documental trazida pelos filmes, nomeadamente no que respeita à curta-metragem e ao seu papel na interpretação histórica, social e política do mar no cinema português. Iniciaremos, ainda, colaborações, entre outros, com os festivais PLAY, Curtas de Vila do Conde, o Mar Film Festival e MotelX, exemplificando o modo como o cinema de género encontra no mar vertentes narrativas consequentes e temporalmente transversais. E desenvolveremos ações de divulgação, coprogramação e mediação com festivais, cineclubes, museus e exibidores nacionais e internacionais, com o objetivo de alargarmos o modo de inscrição do cinema enquanto disciplina que interpreta o lugar do mar na criação artística nacional ao longo da sua história.
O que é o FILMar?
Até 2024, a Cinemateca Portuguesa – Museu do Cinema irá desenvolver um programa de preservação, digitalização e divulgação do cinema português relacionado com o mar, no âmbito do mecanismo financeiro de apoio EEAGrants. Este programa, criado pela Noruega, Islância e Liechenstein prevê a digitalização de 10 mil minutos de títulos, entre longas e curtas-metragens, em depósito no Arquivo Nacional das Imagens em Movimento, com o objetivo de devolver às comunidades um conhecimento sobre o modo como o cinema contou as suas histórias.
A relação que o cinema português tem com o mar é transversal às épocas, géneros e temáticas, sendo possível encontrar registos desde 1896, quando se realizaram as primeiras sessões públicas. Desde então, o mar foi matéria de trabalho para autores e instituições, através de títulos a partir dos quais é possível acompanhar o desenvolvimento da indústria, em particular a conserveira, a construção de estaleiros e o poderio militar, as campanhas marítimas, a expansão e consolidação urbanística das comunidades piscatórias, as suas práticas religiosas e os rituais pagãos, os movimentos sociais e as condições laborais, bem como a promoção do território nacional, do turismo ao mar enquanto fator identitário, o conhecimento científico e o estudo da fauna e flora marítima e costeira, a relação com os países de expressão portuguesa em contexto ditatorial e, naturalmente, a ficção como motor para narrativas que permitiram descrever realidades distintas a partir de uma mesma matéria.
O potencial de trabalho que o FILMar permite, contribuirá para um conhecimento mais aprofundado sobre as histórias contadas pelo cinema português, tanto na ficção como no documentário, criando, ainda, relações de proximidade com questões relacionadas com a ciência, a educação e economia que perpassam nos filmes e, através deles, contextualizam o conhecimento, aprofundam o debate e potenciam relações complementares de trabalho.
Em 2023 será organizada, em Portugal e na Noruega, uma retrospetiva dos filmes abrangidos pelo programa, incluindo filmes noruegueses em diálogo com a produção nacional, bem como um catálogo e uma edição em DVD com uma seleção das curtas-metragens recuperadas.