CICLO
Bulle Ogier, Atriz Oceânica


“Bulle é oceânica”, observou Marguerite Duras, referindo-se ao desempenho da atriz em LE PONT DU NORD, numa conversa com Jacques Rivette publicada no Le Monde por ocasião do lançamento do filme. O adjetivo escolhido por Duras, que trabalhou com Bulle Ogier em diversos filmes e peças, define perfeitamente bem o que é a presença desta extraordinária atriz, que teve uma presença única no teatro e no cinema franceses a partir dos anos 60. Bulle Ogier não é uma “não atriz”, como certos nomes da Nouvelle Vague a quem se pedia uma presença e um comportamento mas não a capacidade de “compor” personagens, mas tão pouco teve uma formação convencional no Conservatório. Em início dos anos 60 conhece Marc’O, um dos grandes nomes da vida intelectual e artística francesas da sua geração, escritor ligado ao lettrisme, encenador de teatro e cineasta. É com ele que Bulle Ogier tem a sua formação teatral, nos moldes menos convencionais e é sob a sua direção que se estreia nos palcos em 1963. Até 1966 participaria em mais três espetáculos do grupo, dois dos quais foram filmados, antes de se afastar da troupe em 1968. É com L’AMOUR FOU, de Jacques Rivette (que descobrira a atriz nos espetáculos de Marc’O), filmado em 1967, mas distribuído em janeiro de 1969, que ela atinge o reconhecimento do público “de ponta”, que se amplia dois anos depois com o triunfo nos circuitos de art-et-essai de LA SALAMANDRE, de Alain Tanner. As peças de Marc’O e o filme de Rivette são a matriz de todo o futuro trabalho de Bulle Ogier, que observa numa entrevista de 1985 a Jean-Claude Biette que a sua carreira foi “um trajeto. No período pós-68 havia o ideal de fazer arte pela arte, arte para si mesmo, não para ser uma vedeta, não para criar uma imagem. O meu agente dizia-me para não fazer tudo e mais alguma coisa depois de ter trabalhado com Marc’O e Rivette. Toda a gente tinha um grande rigor neste período em que nasci realmente como atriz. O meu caminho foi muito coerente. Quando se adota uma linha de conduta, não se muda a toda a hora de direção. Alguns atores, depois de ganharem muito dinheiro, fartam-se e buscam um certo rigor. Eu tive-o desde o começo e tive sorte. Quando por volta de 1977-78 houve uma mudança em relação ao cinema, em relação ao ator e ao business, não pude acompanhar, porque isto não correspondia em absoluto ao que eu tinha feito. Uma pessoa não pode renegar-se, querer mudar aquilo que fez. É desonesto”. Em palco Bulle Ogier interpretou sobretudo um exigente repertório do século XX (Marc’O, Duras, Botho Strauss, Schnitzler, Ibsen, Grombowicz), sob a direção de alguns dos encenadores mais reputados de França, como Claude Régy, Patrice Chéreau e Roger Planchon. No cinema, o seu nome é indissoluvelmente ligado ao de Jacques Rivette, com quem colaborou em alguns dos seus filmes mais radicais (OUT ONE, CÉLINE ET JULIE VONT EN BATEAU, LE PONT DU NORD), mas também aos de René Allio, André Téchiné, André Delvaux, Daniel Schmid, Barbet Schroeder, Philippe Garrel, Werner Schroeter, Luis Buñuel e, a partir dos anos 80, Manoel de Oliveira. Também colaborou com cineastas de gerações mais jovens, como Olivier Assayas, Xavier Beauvois, Caroline Champetier e Jeanne Balibar. Também teve presença em filmes mais convencionais, mas, como bem resumiu Alain Philippon, Bulle Ogier “é uma atriz tentada pela aventura, mas não pelo caos, uma atriz franca, mas que conservou no olhar e na silhueta um resto de infância, uma profissional que recusa a identificação à personagem e prefere aquilo a que chama a «sobreposição»: uma atriz inseparável do cinema moderno”.
 
07/07/2025, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Bulle Ogier, Atriz Oceânica

Les Idoles
de Marc’O
França, 1968 - 105 min
 
08/07/2025, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Bulle Ogier, Atriz Oceânica

La Paloma
de Daniel Schmid
Suíça, França, , 1974 - 110 min
10/07/2025, 21h45 | Esplanada
Ciclo Bulle Ogier, Atriz Oceânica

Tricheurs
Batoteiros
de Barbet Schroeder
França, Portugal, Alemanha, 1984 - 92 min
11/07/2025, 21h45 | Esplanada
Ciclo Bulle Ogier, Atriz Oceânica

Belle Toujours
Belle Toujours
de Manoel de Oliveira
França, Portugal, 2006 - 68 min
15/07/2025, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Bulle Ogier, Atriz Oceânica

Weisse Reise
“A Viagem Branca”
de Werner Schroeter
Alemanha, 1980 - 60 min
07/07/2025, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Bulle Ogier, Atriz Oceânica
Les Idoles
de Marc’O
com Bulle Ogier, Pierre Clémenti, Jean-Pierre Kalfon, Michèle Moretti
França, 1968 - 105 min
legendado eletronicamente em português
Marc’O é uma importante figura das vanguardas francesas, a partir dos anos 50, nos domínios da literatura, do teatro e do cinema. Teve grande influência sobre Bulle Ogier nos começos da carreira dela, que participou de quatro dos seus espetáculos de palco entre 1963 e 1966, entre os quais LES IDOLES, sátira aos “ídolos” do show-business que tem lugar durante uma conferência de imprensa de quatro vedetas, que denunciam o “sistema”. Dois anos depois, Marc’O adaptava o espetáculo para o cinema. Lançado em maio de 1968, o filme só ficou em cartaz por alguns dias, mas permaneceu como um dos emblemas do espírito daquela época. Numa entrevista de 2004, em que nota que tem muita dificuldade em falar dos anos 60, “porque o vocabulário não é o mesmo”, Marc’O acrescenta que “em LES IDOLES, era a representação que me interessava. Escolhíamos os planos em relação com os gestos, as atitudes. A cada vez era preciso encontrar o destinatário e o destinatário podia ser um espaço.”. Primeira apresentação na Cinemateca.

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08/07/2025, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Bulle Ogier, Atriz Oceânica
La Paloma
de Daniel Schmid
com Bulle Ogier, Ingrid Caven, Peter Kern, Peter Chatel
Suíça, França, , 1974 - 110 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Daniel Schmid tem muitas afinidades com o cinema de Werner Schroeter, o que se reflete nitidamente nos seus dois primeiros filmes, ESTA NOITE OU NUNCA e sobretudo LA PALOMA, cuja trama narrativa transpõe a de A Dama das Camélias e congrega elementos diversos: o melodrama, o cabaret, o musical. O resultado é de uma extravagância formal que o realizador nunca mais atingiria. O filme reúne diversos temas romanescos e melodramáticos (o jogo, o cabaré, a doença mortal, a prima donna, o amor louco e sem reciprocidade), com uma colagem de elementos musicais que vai de Korngold a Oum Kalsoum, passando por Offenbach e por diversas canções dos anos 30. Bulle Ogier tem a presença de uma guest star, no papel de uma condessa.

A sessão repete no dia 18 às 19h30, na sala Luís de Pina.

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10/07/2025, 21h45 | Esplanada
Bulle Ogier, Atriz Oceânica
Tricheurs
Batoteiros
de Barbet Schroeder
com Bulle Ogier, Jacques Dutronc, Virgílio Teixeira
França, Portugal, Alemanha, 1984 - 92 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Filmado no Funchal, com destaque para o casino projetado por Oscar Niemeyer, TRICHEURS é um magnífico filme sobre o jogo, o seu poder e a batota. Baseia-se num facto real, em que um batoteiro profissional aliava-se aos croupiers para ganhar à roleta, com uma técnica extremamente elaborada. Longe das mitologias do luxo e da elegância em que o cinema costuma envolver o mundo dos casinos, Barbet Schroeder sublinha o que Jacques Fieschi definiu à época num artigo sobre o filme como “a fúnebre banalidade da compulsão dos jogadores, com alguns loucos momentos de risco, de disfarce”. Barbet Schroeder jamais se afasta da matéria narrativa, aparentemente magra, a rotina de um par de amantes obcecados, que fazem eco aos de LA BAIE DES ANGES, de Jacques Demy e encontra o ritmo narrativo ideal, atingindo um alto grau de suspense em diversas passagens.

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11/07/2025, 21h45 | Esplanada
Bulle Ogier, Atriz Oceânica
Belle Toujours
Belle Toujours
de Manoel de Oliveira
com Bulle Ogier, Michel Piccoli
França, Portugal, 2006 - 68 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Manoel de Oliveira presta tributo a Luis Buñuel, propondo em BELLE TOUJOURS uma continuação de BELLE DE JOUR, juntando os dois protagonistas de Buñuel, em Paris, 39 anos depois do seu encontro. Michel Piccoli volta a interpretar o papel de Henri, guardador do segredo que Séverine (Bulle Ogier no papel interpretado por Catherine Deneuve no primeiro filme) quer descobrir. Extremamente bem recebido à época, BELLE TOUJOURS não é apresentado na Cinemateca desde 2015.
15/07/2025, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Bulle Ogier, Atriz Oceânica
Weisse Reise
“A Viagem Branca”
de Werner Schroeter
com Bulle Ogier (narração off), Jim Auwae, Tilly Soffing
Alemanha, 1980 - 60 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Schroeter realizou este filme entre O REINO DE NÁPOLES e PALERMO ODER WOLFSBURG, com um pequeno orçamento e um grupo de amigos. Filmado diante de telas pintadas, sem diálogos, com narração em off por Bulle Ogier e uma belíssima e eclética seleção musical (música árabe, havaiana, Schubert, canções francesas dos anos 30 por Fréhel e Tino Rossi), esta “viagem branca” é a de dois marinheiros embarcados num barco americano. As telas pintadas por Harald Vogel evocam portos, ruas, barcos e a voz da narradora conta-nos a história e leva-nos através dos mares. O filme narra uma viagem através do desejo e da paixão entre dois homens, que o texto narrativo em off descreve como pura e inocente. Um dos filmes mais belos e estilizados de Werner Schroeter. Esta foi a segunda das quatro colaborações entre Bulle Ogier e o realizador alemão (as demais são GOLDFLOCKEN, DEUX e NUIT DE CHIEN).