CICLO
Chris Marker – A Memória Das Imagens (Parte I)


Em novembro e dezembro a Cinemateca, em colaboração com a 25ª Festa do Cinema Francês, organiza uma retrospetiva que se pretende integral do cinema realizado por Chris Marker, envolvendo ainda alguns filmes em que colaborou.
Cineasta, fotógrafo, escritor, viajante e escritor, Chris Marker (1921-2012) criou, ao longo de seis décadas, uma obra multifacetada que atravessou vários campos, sem se fixar. No cinema, desenvolveu um trabalho de forte pendor ensaístico, inspirado por iluminados comentários de sua autoria, que contribuiu decisivamente para a renovação do documentário e tem influenciado sucessivas gerações. Viajante incessante, tal vertente materializou-se num cinema que atravessou mundo, que Marker concebeu individualmente, ou no contexto dos vários coletivos que integrou, mas também na autoria de uma coleção de guias de viagem, a que deu o nome de “Petite Planète”.
Entre os primeiros filmes que realizou, encontramos LES STATUES MEURENT AUSSI (1953), o resultado de uma frutuosa colaboração com Alain Resnais que, envolvendo uma crítica explícita ao colonialismo, foi censurado durante onze anos. Este sucedeu cronologicamente a OLYMPIA 52, a obra de estreia de Marker, que posteriormente a menosprezou e votou a um certo esquecimento. Voltaria a trabalhar novamente com Resnais em 1956, ao coassinar a narração de TOUTE LA MÉMOIRE DU MONDE, documentário sobre a Biblioteca Nacional Francesa, que também exibimos neste programa. DIMANCHE À PÈKIN (1956) e LETTRE DE SIBÈRIE (1957) são as primeiras grandes obras que realizou a solo. Marker publicou o “comentário” destes e de outros filmes num par de livros cujo título é precisamente Commentaires, o que traduz como o seu cinema assenta de modo único na articulação das palavras e das imagens, sejam estas filmadas por si ou recicladas a partir de arquivos de origem diversa, que confluem em ensaios fílmicos atravessados por uma forte subjetividade.
LA JETÉE (1962), composto quase exclusivamente por imagens fotográficas, e uma das suas raras ficções, marcará definitivamente uma obra em que se manifesta a importância do tempo e da memória, na sua articulação com a História. Pouco depois, Marker realizou LE JOLI MAI (1963), crónica parisiense e um marco do cinema direto, sucedendo-lhe LE MYSTÈRE KOUMIKO (1965), filmado já no Japão, um país que terá um papel determinante na sua vida e obra, e SI J’AVAIS QUATRE DROMADAIRES (1966), que nos conduz numa volta ao mundo através de um conjunto de fotografias.
É com À BIENTÔT, J’ESPÈRE (1968) e LA SIXIÈME FACE DU PENTAGONE (1967) que se inaugura a vertente mais militante da obra do cineasta, que culmina em LE FOND DE L’AIR EST ROUGE (1977), um fresco sobre os movimentos revolucionários da década que o precedem, que exibiremos já em dezembro. Neste período, Marker esteve na origem de vários coletivos como a SLON ou os Grupos Medvedkine, movimentos operários que documentarão a sua própria luta em filmes como CLASSE DE LUTTE (1969). Juntando-se a Joris Ivens, William Klein, Claude Lelouch ou Jean-Luc Godard, participou ainda em LOIN DU VIETNAM (1967), e foi o autor de vários CINÉTRACTS (1968), curtíssimos filmes anónimos sobre os protestos estudantis de Maio de 1968, em França. São ainda desses anos LA BATAILLE DES DIX MILLIONS (1970), que assinalou um regresso a Cuba, ou vários episódios da série “On Vous Parle” (1969-1973). Prolongando a vertente mais explicitamente política da sua obra, a última sessão desta primeira parte do programa aponta para a profunda relação do cineasta com alguns dos seus grandes cúmplices, como Simone Signoret e Yves Montand, a quem dedica LA SOLITUDE DU CHANTEUR DE FOND (1974).
SANS SOLEIL (1982), que voltamos a mostrar em dezembro, representa simultaneamente o culminar de uma primeira fase da obra de Marker, mas também o início de uma outra, marcada por um maior impressionismo, que coincide com a realização de muitas obras em vídeo, algumas de curtíssima duração, e com incursões por novos meios. É deste período o CD-Rom a que deu o título de Immemory (1998), que nos permite viajar pelo universo criativo de Marker e pelas suas muitas obsessões. Nele, o protagonismo cabe a Guillaume, o gato que tantas vezes o substituiu, preenchendo o espaço criado pela sua voluntária invisibilidade. É assim entre mais de meia centena de curtas e longas-metragens, incluindo títulos realizados para televisão, que se desenha este ambicioso programa, que se prolonga em dezembro.
 
21/11/2024, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Chris Marker – A Memória Das Imagens (Parte I)

On Vous Parle Du Brésil : Tortures | On Vous Parle De Paris : Maspero, Les Mots Ont Un Sens | On Vous Parle Du Brésil : Carlos Marighela | On Vous Parle Du Chili : Ce Qui Disait Allende
 
22/11/2024, 19h15 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Chris Marker – A Memória Das Imagens (Parte I)

Jour De Tournage | On Vous Parle De Prague : Le Deuxième Procès D’arthur London | La Solitude Du Chanteur De Fond
23/11/2024, 17h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Chris Marker – A Memória Das Imagens (Parte I)

Toute La Mémoire Du Monde | Si J’avais Quatre Dromadaires
26/11/2024, 19h30 | Sala Luís de Pina
Ciclo Chris Marker – A Memória Das Imagens (Parte I)

À Bientôt, J’espère | La Charnière | Classe De Lutte
21/11/2024, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Chris Marker – A Memória Das Imagens (Parte I)
On Vous Parle Du Brésil : Tortures | On Vous Parle De Paris : Maspero, Les Mots Ont Un Sens | On Vous Parle Du Brésil : Carlos Marighela | On Vous Parle Du Chili : Ce Qui Disait Allende
ON VOUS PARLE DU BRÉSIL : TORTURES
França, 1969 – 24 min

ON VOUS PARLE DE PARIS : MASPERO, LES MOTS ONT UN SENS
França, 1970 – 20 min

ON VOUS PARLE DU BRÉSIL : CARLOS MARIGHELA
França, 1970 – 40 min

ON VOUS PARLE DU CHILI : CE QUI DISAIT ALLENDE
França, 1973 – 16 min

de Chris Marker

duração total da projeção: 100 min
legendados eletronicamente em português | M/12

“On Vous Parle” é um magazine de contrainformação em que se aborda a atualidade política do mundo sob o ponto de vista dos movimentos de contestação. Nesta sessão mostramos quatro filmes da série assinados por Chris Marker. Em ON VOUS PARLE DU BRÉSIL: TORTURES, o cineasta entrevista um grupo de militantes revolucionários que sobreviveram à opressão da ditadura militar brasileira e partilham as suas experiências sobre as prisões e os métodos de tortura por que passaram. ON VOUS PARLE DE PARIS: MASPERO, LES MOTS ONT UN SENS centra-se na editora francesa, na qual François Maspero e os seus colaboradores contextualizam os livros que publicam e o modo como pensam a arte da edição. Carlos Marighela, assassinado numa emboscada em novembro de 1969, ocupa o centro do segundo “filme brasileiro” da série. Um ano depois da sua morte, Marker presta-lhe a devida homenagem. Em ON VOUS PARLE DU CHILI, Régis Debray entrevista Salvador Allende, então eleito presidente do Chile, que aborda o futuro do seu país. Primeiras exibições na Cinemateca, com exceção de ON VOUS PARLE DU BRÉSIL: TORTURES. A apresentar em cópias digitais.

consulte a FOLHA da CINEMATECA aqui

 
22/11/2024, 19h15 | Sala M. Félix Ribeiro
Chris Marker – A Memória Das Imagens (Parte I)
Jour De Tournage | On Vous Parle De Prague : Le Deuxième Procès D’arthur London | La Solitude Du Chanteur De Fond
JOUR DE TOURNAGE
com Yves Montand
França, 1968 – 11 min

ON VOUS PARLE DE PRAGUE : LE DEUXIÈME PROCÈS D’ARTHUR LONDON
com Yves Montand, Simone Signoret, Arthur London
França, Bélgica, 1969 – 28 min

LA SOLITUDE DU CHANTEUR DE FOND
com Yves Montand, Bob Castella
França, 1974 – 60 min

de Chris Marker

duração total da projeção: 99 min
legendados eletronicamente em português | M/12

Contratado como fotógrafo de cena da longa-metragem L’AVEU, de Costa-Gavras, Marker realiza JOUR DE TOURNAGE, em que se centra sobre a filmagem de um complexo plano com recurso a uma grua. ON VOUS PARLE DE PRAGUE parte de uma conversa que teve lugar durante a rodagem do mesmo filme, envolvendo Yves Montand, Arthur London e Simone Signoret. O seu tema: o que é um verdadeiro comunista? Em LA SOLITUDE DU CHANTEUR DE FOND vemos Yves Montand na preparação de um tour de chant em Paris, como um “protesto solitário” contra o golpe de Estado ocorrido no Chile alguns meses antes. A solidão evocada no título (que também joga com o de THE LONELINESS OF THE LONG DISTANCE RUNNER, clássico do free cinema britânico) é a de um homem que está, por assim dizer, sozinho com ele mesmo, enquanto prepara um espetáculo (a única outra pessoa com quem o vemos interagir é o pianista). Chris Marker mistura com estas sequências trechos de outros concertos de Montand e o resultado é um retrato multifacetado de Montand-cantor. JOUR DE TOURNAGE é uma primeira exibição na Cinemateca. A apresentar em cópias digitais.


consulte JOUR DE TOURNAGE e ON VOUS PARLE:LE DEUXIÈME PROCÈS aqui

consulte LA SOLITUDE DU CHANTEUR DE FOND aqui
23/11/2024, 17h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Chris Marker – A Memória Das Imagens (Parte I)
Toute La Mémoire Du Monde | Si J’avais Quatre Dromadaires
TOUTE LA MÉMOIRE DU MONDE
de Alain Resnais
comentário de Chris Marker e Remo Forlani
França, 1956 – 22 min

SI J’AVAIS QUATRE DROMADAIRES
de Chris Marker
França, RFA, 1966 – 50 min

duração total da projeção: 72 min
legendados eletronicamente em português | M/12

TOUTE LA MÉMOIRE DU MONDE, inspirado documentário sobre a Biblioteca Nacional Francesa realizado por Alain Resnais, aborda ainda as questões mais vastas da memória e dos imaginários perdidos. Trabalhando como assistente do filme, Marker partilhou ainda a autoria do poético comentário que o acompanha com Remo Forlani. Em SI J’AVAIS QUATRE DROMADAIRES, um fotógrafo amador e dois dos seus amigos comentam uma escolha de fotografias registadas um pouco por todo o mundo no final dos anos cinquenta e início dos sessenta, da China a Cuba, passando pelo Japão ou pela Grécia. Um fotofilme escrito e fotografado por Chris Marker, e um álbum com mais de 800 imagens que envolve uma interessante reflexão sobre a fotografia. “Há a vida e há o seu duplo, e a fotografia pertence ao mundo dos duplos”. A apresentar em cópias digitais.
 
consulte a FOLHA da CINEMATECA aqui
 
26/11/2024, 19h30 | Sala Luís de Pina
Chris Marker – A Memória Das Imagens (Parte I)
À Bientôt, J’espère | La Charnière | Classe De Lutte
À BIENTÔT, J’ESPÈRE
de Chris Marker, Mario Marret
França, 1968 – 43 min / dobrado em português

LA CHARNIÈRE
de Antoine Bonfanti
França, 1969 – 12 min / legendado eletronicamente em português

CLASSE DE LUTTE
de Grupo Medvedkine de Besançon
França, 1969 – 40 min / legendado eletronicamente em português

duração total da projeção: 95 min | M/12

Os três filmes desta sessão centram-se na greve na fábrica Rodhiaceta, de Besançon, a qual teve lugar em março de 1967. Em A BIENTÔT, J’ESPÈRE, filme assinado conjuntamente por Chris Marker e Mario Marret e produzido pela SLON, estrutura coletiva impulsionada por Marker, os dois cineastas colocam a câmara ao serviço dos trabalhadores e das suas reivindicações. LA CHARNIÈRE, que mostramos pela primeira vez na Cinemateca, não é um filme, mas um registo sonoro gravado por Antoine Bonfanti após uma projeção de À BIENTÔT, J’ESPÈRE aos operários da fábrica de Besançon, que o acharam demasiado “romântico”. Na sequência de tal episódio, Marker propôs ensiná-los a usar as câmaras para filmarem a sua própria luta. Esta é a origem dos Grupos Medvedkine e de CLASSE DE LUTTE. Uma sessão que revela a profunda militância da obra do cineasta, que está na origem de vários coletivos. LA CHARNIÈRE e CLASSE DE LUTTE são apresentados em cópias digitais.

consulte a FOLHA da CINEMATECA aqui