Catembe, Esse Obscuro Desejo de Cinema recebe selo Ler + do Plano Nacional de Leitura
Catembe, Esse Obscuro Desejo de Cinema, de Maria do Carmo Piçarra, é o primeiro livro lançado pela Cinemateca Portuguesa-Museu do Cinema distinguido pelo Plano Nacional de Leitura. Editado com a Edições Tinta-da-China é recomendado para jovens entre os 15 e 18 anos, na categoria de Arte e Sociedade/ Vida Prática.
Lançado em abril deste ano, no encerramento do programa público do projeto FILMar – Digitalização do património fílmico, que a Cinemateca desenvolveu entre 2020 e 2024 com o apoio do Mecanismo Financeiro Europeu EEAGrants, o livro compreende, para além do ensaio da investigadora e programadora Maria do Carmo Piçarra sobre o filme datado de 1965, a planificação original prevista por Manuel Faria de Almeida, fotografias de rodagem e um DVD que junta a versão resultante das duas passagens pela censura (45 minutos), os cortes que sobreviveram à destruição, e que foram depositados pelo realizador no Arquivo Nacional das Imagens em Movimento no início da década de 1990, e um trailer inédito, com algumas das imagens censuradas, que demonstra a estrutura do filme e foi pensado para a sua promoção em sala de cinema.
A edição prolonga o trabalho de restauro e digitalização do filme, que teve a sua estreia no festival DocLisboa 2022, e que depois de várias passagens em sessões especiais pelo país, culminou na estreia comercial do filme em novembro de 2023, no Cinema Ideal, 58 anos depois da sua proibição.
Com esta recomendação para agrupamentos e comunidade escolares, bem como para o público em geral, o selo Ler+ do Plano Nacional de Leitura permite que se lance uma nova visibilidade para um dos mais brutais ataques à criação artística. É um contributo fundamental para que a memória, a persistência e a coragem de Manuel Faria de Almeida e da sua equipa, na denúncia do autoritarismo sirvam de exemplo para demonstrar como o cinema é uma ferramenta de liberdade.
Catembe, Esse Obscuro Desejo de Cinema sublinha a importância histórica do trabalho e da visão do realizador Manuel Faria de Almeida, apoiado pelo produtor António da Cunha Telles, num filme que ficou na História como o mais censurado de sempre. É um retrato lúcido e transparente da realidade colonial em Moçambique, num cruzamento entre ficção e documentário que permaneceu como um dos fantasmas da História do cinema português. O trabalho de investigação de Maria do Carmo Piçarra revela os bastidores da arbitrariedade do sistema de censura da ditadura fascista do Estado Novo, e a singularidade de um pensamento sobre cinema que foi amputado e vilipendiado.
Proibido após ser sujeito ao maior número de cortes na História do cinema português, CATEMBE é uma «caixa negra» reveladora da mentalidade e da prática censória da ditadura. Enquadrada por uma lei nunca regulamentada, a censura era opaca e tão arbitrária quanto dependente da subjectividade dos censores. Neste documentário ficcional, que pretendia mostrar quem eram e como viviam os habitantes de Lourenço Marques, hoje Maputo, Manuel Faria de Almeida usou o cinema direto para mostrar sete dias na vida local, serviu‑se do humor e da ficção para caricaturar questões sociais e políticas, e desvelou uma convivência racial desenquadrada do que era desejável oficialmente.
A par da digitalização de CATEMBE – SETE DIAS EM LOURENÇO MARQUES, a Cinemateca Portuguesa digitalizou outros filmes de Manuel Faria de Almeida com o apoio dos projetos FILMar e PRR em Movimento, que estão disponíveis na sua página, através da Cinemateca Digital: FAÇA SEGUNDO A ARTE (1965), A EMBALAGEM DE VIDRO (1966), PARA UM ÁLBUM DE LISBOA (1966), PORTUGAL DESCONHECIDO (1969), POSTAL DE LUANDA (1970), TRIUNFO DA TÉCNICA (1970), A FEIRA (1970) e 24 IMAGENS POR SEGUNDO (1976).
Desenhado por Pedro Serpa, o livro tem 136 páginas e encontra-se à venda nas livrarias. Pode ser encomendado no site da Tinta-da-China e na Livraria Linha de Sombra, na Cinemateca Portuguesa.