CICLO
25 de Abril, Sempre | Parte I. O Movimento das Coisas


Ao longo de todo o mês de abril, data em que se assinalam os 40 anos da revolução, o núcleo central do programa é dedicado ao cinema documental feito em Portugal nos primeiros anos da revolução e ao registo desse momento particularmente intenso da história do país. Balizado por BRANDOS COSTUMES e GESTOS & FRAGMENTOS, o Ciclo inclui a apresentação de títulos centrais da filmografia de abril que interrogam a revolução no seu conjunto, como BOM POVO PORTUGUÊS, mas também raridades e um foco no cinema amador, estruturando-se em três grandes eixos.
Uma primeira parte – relacionando-se com os Ciclos Paulo Rocha e Fernando Lopes, e antecedendo uma retrospetiva António da Cunha Telles –, revela como, antes da revolução, "o cinema já era novo", ou seja: como já havia sofrido uma profunda transformação, naquela que, no catálogo Cinema Novo Português, João Bénard da Costa interroga se seria uma "revolta ou revolução?”. Para lá das “presenças virtuais” (alguns dos filmes mais emblemáticos do Cinema Novo, realizados pelos autores citados), parte dos títulos incluídos neste núcleo do programa foram os últimos a ser proibidos pela censura e os primeiros a ser exibidos, demonstrando o forte poder de antecipação do cinema. Entre eles, O MAL AMADO e JAIME, estreado logo a 2 de maio no Cinema Império, numa mítica sessão conjunta com O COURAÇADO POTEMKINE.
Do “cinema de abril”, apresentamos um conjunto significativo de filmes de registo mais militante, que simultaneamente documentavam e procuravam intervir no quotidiano do processo revolucionário em curso (PREC), muitos dos quais realizados coletivamente a partir de estruturas recém-criadas (Grupo Zero, Cinequipa, Cinequanon, etc.) e produzidos para ou pela televisão. Documentários que, dependendo da sua perspetiva e ambição, se aproximam frequentemente do registo da reportagem e que, se participam de uma vontade de “dar a voz ao povo”, subordinam-na muitas vezes a um discurso marxista e à crença na necessidade de tudo explicar. Filmes de “Ação e Intervenção” (título de uma série produzida pela Cinequanon) sobre as lutas operárias e camponesas ou outras “temáticas revolucionárias”, pensados aqui de um modo alargado, extensível aos filmes de artistas e de cineastas amadores, nos diferentes modos como olham a revolução.
Refletindo uma “divisão” muito discutida na época, em paralelo com este “cinema revolucionário”, que emerge em abril de 74 associado à urgência de registo do presente, no mesmo período encontramos todo um núcleo de filmes de cariz etnográfico, que interrogam as raízes míticas e simbólicas do imaginário português, em prol de “uma cultura popular”. Movimento muito expressivo na produção cinematográfica portuguesa de então, que se relaciona com todo o trabalho anteriormente desenvolvido pelo Centro Português de Cinema e em que tem particular relevância o projeto do "Museu da Imagem e do Som", em que se incluem filmes emblemáticos como TRÁS-OS-MONTES ou MÁSCARAS. Se a deslocação das equipas de cinema para o campo é uma característica comum às duas grandes tendências do “cinema de abril” aqui convocadas, e se a actualidade política se imiscui inevitavelmente em ambas, separava-as o plano das intenções. Todavia, são muitos os realizadores e os filmes que atravessam todo o programa.
Neste contexto, o dia 25 conta com um programa especial em que se inclui a longa-metragem AS ARMAS E O POVO, um restauro de TORRE BELA e parte da histórica emissão televisiva de dia 25 de abril de 74. O programa é organizado em colaboração estreita com a RTP, de cujo arquivo vêm boa parte das cópias de alguns dos títulos menos vistos deste período. O Ciclo prolonga-se em maio, com uma segunda parte dedicada ao trabalho sobre a memória da revolução.

 

PROGRAMA ESPECIAL – 25 DE ABRIL
No dia 25, a Cinemateca abre as suas salas a um programa especial dedicado às primeiras imagens e primeiros filmes da revolução, como o fundamental filme coletivo AS ARMAS E O POVO e CAMINHOS DA LIBERDADE, que inclui também a projeção da cobertura televisiva dos acontecimentos de 25 de abril de 1974, que constituiu uma emissão histórica, e “brutos” de imagens não montadas desses primeiros dias. O programa, que será divulgado em breve em detalhe, envolve ainda a projeção de um restauro do mítico TORRE BELA, de Thomas Harlan.
 

01/04/2014, 19h00 | Sala Dr. Félix Ribeiro
Ciclo 25 de Abril, Sempre | Parte I. O Movimento das Coisas

Brandos Costumes
de Alberto Seixas Santos
Portugal, 1975 - 72 min
01/04/2014, 21h30 | Sala Dr. Félix Ribeiro
Ciclo 25 de Abril, Sempre | Parte I. O Movimento das Coisas

Deus Pátria Autoridade
de Rui Simões
Portugal, 1975 - 103 min
02/04/2014, 15h30 | Sala Dr. Félix Ribeiro
Ciclo 25 de Abril, Sempre | Parte I. O Movimento das Coisas

Dom Roberto
de Ernesto de Sousa
Portugal, 1962 - 102 min
 
02/04/2014, 21h30 | Sala Dr. Félix Ribeiro
Ciclo 25 de Abril, Sempre | Parte I. O Movimento das Coisas

O Auto da Floripes | Jaime
duração total da sessão: 92 min
 
03/04/2014, 15h30 | Sala Dr. Félix Ribeiro
Ciclo 25 de Abril, Sempre | Parte I. O Movimento das Coisas

O Recado
de José Fonseca e Costa
Portugal, 1971 - 110 min
01/04/2014, 19h00 | Sala Dr. Félix Ribeiro
25 de Abril, Sempre | Parte I. O Movimento das Coisas
Brandos Costumes
de Alberto Seixas Santos
com Luís Santos, Dalila Rocha, Sofia de Carvalho, Isabel de Castro
Portugal, 1975 - 72 min
O Cinema Já Era "Novo"

Filmado antes do 25 de abril, BRANDOS COSTUMES só estrearia nas salas em setembro de 1975. Filma-se a morte de um pai de família e dá-se a ver a ascensão e queda do Estado Novo através de imagens de arquivo, parte das quais só seriam acrescentadas ao filme já depois da revolução. Prodigiosamente moderno e radical nos seus propósitos fragmentários, o primeiro filme de Seixas Santos é simultaneamente o primeiro dos filmes do 25 de abril.

01/04/2014, 21h30 | Sala Dr. Félix Ribeiro
25 de Abril, Sempre | Parte I. O Movimento das Coisas
Deus Pátria Autoridade
de Rui Simões
Portugal, 1975 - 103 min
Interrogar a Revolução

com a presença de Rui Simões

Neste filme, Rui Simões analisa a História portuguesa, da implantação da República em 1910 ao 25 de abril de 1974, num projeto de desconstrução da ideologia salazarista e dos seus principais dogmas, utilizando imagens do Estado Novo e uma montagem onde assume uma visão pessoal da História, à luz da teoria da luta de classes. O título reenvia para o discurso de Oliveira Salazar em 1936, “Não discutimos Deus e a virtude, não discutimos a Pátria e a Nação. Não discutimos a Autoridade e o seu prestígio”. São os termos que Rui Simões traz à discussão neste seu primeiro documentário assente em material de arquivo que se propõe pensar a revolução à luz de tudo o que a precedeu.

02/04/2014, 15h30 | Sala Dr. Félix Ribeiro
25 de Abril, Sempre | Parte I. O Movimento das Coisas
Dom Roberto
de Ernesto de Sousa
com Raul Solnado, Glicínia Quartin
Portugal, 1962 - 102 min
O Cinema Já Era "Novo"

DOM ROBERTO representou uma inédita experiência cinematográfica em Portugal, tendo sido produzido em regime de “cooperativa de espectadores” ligada ao cineclubismo. O filme ficou na história do cinema português como uma incursão no neorrealismo e representou o primeiro sinal de mudança. É a história, de características chaplinescas, em que um bonecreiro e uma pobre rapariga procuram sobreviver mantendo a esperança face à adversidade. Um título imprescindível para evocar as origens do Cinema Novo que, juntamente com PÁSSAROS DE ASAS CORTADAS (1963), dividiu opiniões.

02/04/2014, 21h30 | Sala Dr. Félix Ribeiro
25 de Abril, Sempre | Parte I. O Movimento das Coisas
O Auto da Floripes | Jaime
duração total da sessão: 92 min
O Cinema Já Era "Novo"

O AUTO DA FLORIPES
de Secção de Cinema Experimental do Cineclube do Porto
Portugal, 1960 – 57 min
JAIME
de António Reis
Portugal, 1974 – 35 min

O AUTO DA FLORIPES é um filme muito pouco visto onde se cruzam muitas histórias. É o primeiro filme em que participa António Reis, enquanto parte do coletivo do Cineclube do Porto que o realizou, e foi depois de ver O AUTO DA FLORIPES que Oliveira o convidou para seu assistente no ACTO DA PRIMAVERA. Mas este é antes de mais um belíssimo filme que confirma o vigor e a criatividade do Cineclubismo da época e um dos mais belos exemplos de um cinema que procura registar a cultura popular. JAIME, por seu lado, é um dos primeiros trabalhos do poeta do cinema português a solo. Em 1974 irrompeu na nossa cinematografia como um gesto único de solidez e força instintiva. Tendo sido um dos últimos filmes proibidos, foi dos primeiros a estrear. A acompanhá-lo, no cinema Império, estava O COURAÇADO POTEMKINE. O máximo de originalidade com o máximo de modernidade.
 

03/04/2014, 15h30 | Sala Dr. Félix Ribeiro
25 de Abril, Sempre | Parte I. O Movimento das Coisas
O Recado
de José Fonseca e Costa
com Maria Cabral, Paco Nieto, Luís Rocha, José Viana, Constança Canavarro
Portugal, 1971 - 110 min
O Cinema Já Era "Novo"

Em O RECADO, a personagem de José Viana chama-se Maldevivre, e no final do filme profere uma frase eloquente quando diz continuar à espera “que a raiva cresça e rebente”. Filme político e necessariamente elíptico (corriam ainda anos de censura), O RECADO, história sobre desistentes, como disse Fonseca e Costa, é também um filme de interpretações poderosas, com destaque para a sempre extraordinária presença de Maria Cabral.