CICLO
Brevemente Neste Cinema


A "temporada” que a Cinemateca prevê apresentar em 2021 - assim o permita a evolução da pandemia - trará retrospetivas abrangentes de realizadores de diferentes épocas e geografias da história do cinema (alguns deles nunca ou raramente mostrados na Cinemateca) e  programas temáticos de natureza muito diversa. A apresentação dos principais ciclos programados para 2021 (outros haverá que serão posteriormente anunciados) é feita em abril com uma sessão dedicada a cada uma dessac coming attractions que abaixo (sem nenhuma ordem particular) se enunciam em maior detalhe.
 
 
Os Mares da Europa
Previsto para janeiro e fevereiro e não tendo chegado a iniciar-se por coincidir com o princípio do segundo confinamento, o Ciclo Os Mares da Europa terá a sua abertura oficial no primeiro dia em que a Cinemateca retoma a sua programação em sala, com a exibição de FINIS TERRAE, de Jean Epstein, para depois continuar em maio. É um extenso ciclo de cinema (cerca de 40 filmes) sobre a presença do mar nas diversas cinematografias europeias, de Portugal à Europa de Leste, do cinema mudo ao cinema contemporâneo, já que a temática marítima alimentou de forma profunda muita da melhor ficção e do melhor documentário europeu, servindo tanto como centro dessas narrativas como de elemento plástico e poético inextricável dessas obras. O programa Os Mares da Europa está integrado na programação cultural da Presidência Portuguesa do Conselho da União Europeia 2021.
 
Alexander Kluge
Uma sessão que antecipa a retrospetiva da vastíssima obra cinematográfica de Alexander Kluge, organizada em colaboração com a Casa do Cinema Manoel de Oliveira/Fundação de Serralves, que acolherá ainda a primeira exposição da obra de Kluge em Portugal, uma instalação inédita constituída por vários filmes intitulada A Política dos Sentimentos. Alexander Kluge (n. 1932), que contamos poder receber na Cinemateca em julho, é um dos mais importantes nomes do cinema contemporâneo, que, desde os anos cinquenta, tem desenvolvido uma obra multidisciplinar que atravessa a literatura, a filosofia e o cinema, passando pela produção de programas culturais para televisão. Próximo de Theodor Adorno ou de Jürgen Habermas e da Teoria Crítica da Escola de Frankfurt, Kluge foi um dos signatários do Manifesto de Oberhausen (1962) e um dos precursores do Novo Cinema Alemão. Das mais conhecidas longas-metragens, aos muitos filmes produzidos em vídeo nas últimas décadas, todo o seu prolixo trabalho revela uma profunda reflexão sobre a contemporaneidade e sobre a História recente da Europa e da Alemanha, no seu cruzamento com a história do cinema e um questionamento das próprias imagens, reinventando continuamente os modos de fazer cinema (e televisão). Trata-se de um cinema crítico de pendor progressivamente mais ensaístico, assente na colagem de géneros e de materiais, que revelaremos ao longo de uma retrospetiva muito abrangente, que atravessará as várias fases da sua obra, incluindo os trabalhos mais recentes. Em modo de antecipação, apresentamos em abril a versão curta (sendo a versão original, de nove horas e meia, exibida posteriormente no Ciclo) de NOTÍCIAS DA ANTIGUIDADE IDEOLÓGICA: MARX, EISENSTEIN, ‘O CAPITAL’, o filme que parte do ambicioso projeto cinematográfico que S.M. Eisenstein nunca realizou.
 
Allan Dwan
Allan Dwan, tido como o mais prolífico cineasta de todos os tempos, é creditado como realizador em mais de 1600 títulos, desde os primórdios (anos 1910) até 1961. Foi um dos pioneiros da indústria cinematográfica americana, que ele próprio ajudou a estabelecer, sobretudo durante os tempos em que trabalhou sob os auspícios de David Wark Griffith, de quem foi um colaborador fundamental na busca de soluções técnicas. O seu trabalho como realizador, cruzando diversas décadas, faz um percurso por todo o classicismo americano, e termina no momento em que esse edifício clássico começava a desmonorar-se. Polivalente e eclético, Dwan tocou todos os géneros – do musical ao filme de guerra, do melodrama ao noir, do western à comédia. Nos anos 20 foi um dos realizadores da primeira linha de Hollywood, especialmente apreciado por algumas das maiores vedetas da altura, como Gloria Swanson ou Douglas Fairbanks. Nas décadas finais, a partir dos anos 40, foi um realizador ao serviço de produtores independentes, trabalhando em low budget naqueles que terão sido os filmes em que encontrou maior liberdade. Esta obra imensa, a que toda a aproximação será sempre lacunar, nunca teve na Cinemateca uma abordagem em extensão. O Ciclo que preparamos, e onde contamos mostrar cerca de meia centena de títulos, deverá ser a mais extensa retrospectiva Allan Dwan alguma vez apresentada em qualquer lugar. Antecipando esse festim cinéfilo previsto para o final de 2021, mostramos em abril o extraordinário THE RIVER’S EDGE.
 
Chris Marker
Cineasta, fotógrafo, viajante, editor, artista multimédia, Chris Marker (1921-2012) foi um dos criadores mais multifacetados que se afirmou no cinema na segunda metade do século XX, desde a sua associação com Resnais para a realização de LES STATUES MEURENT AUSSI (1953). Assinalando-se este ano o centenário do seu nascimento, Marker foi o grande cronista do pós-Segunda Guerra em imagens, desenvolvendo um cinema muito pessoal que contribuiu determinantemente para a renovação do documentário e teve uma imensa influência nas correntes mais ensaísticas do cinema contemporâneo. Entre as dezenas de filmes e de obras para televisão que realizou (e as muitas em que colaborou), destaca-se uma profunda militância política, que resultou na sua associação a vários coletivos, mas também um profundo amor pelo cinema. Herdeiro da tradição soviética dos anos 20, Marker é antes de mais um cineasta da montagem, em cujo universo se manifesta a importância do tempo e da memória, na sua articulação com uma História feita de imagens e sons, como revela o seu mais famoso filme, LA JETÉE (1962). É entre esta ficção assente quase integralmente em imagens fotográficas, uma miríade de filmes muito pouco vistos, e outros títulos mais conhecidos como as longas SANS SOLEIL (1982) ou LEVEL 5 (1995), que se apresenta em 2021 na Cinemateca uma retrospetiva integral da obra do cineasta. Para a introduzir neste mês de abril, escolhemos LE FOND DE L’AIR EST ROUGE (1977), fresco sobre os movimentos revolucionários da década que o precedem, que culmina com palavras de ordem da Revolução Portuguesa, “O Povo Unido Jamais Será Vencido”.
 
Jacqueline Audry
Realizadora francesa de uma curta-metragem documental e 16 longas de ficção entre 1943 e 1969, Jacqueline Audry (1908-1977), a única mulher a ter uma produção regular em França em meados do século XX, desapareceu da história do cinema durante largas décadas, não obstante a popularidade de alguns dos seus filmes. Talvez por ter ficado entalada entre o cinema do pós-guerra e a Nouvelle Vague franceses, talvez pela elegância Belle Époque de algumas das suas adaptações literárias – hipóteses recentemente adiantadas –, desapareceu do radar. A atenção agora reclamada deve-se ao empenho de realizadores como Bertrand Tavernier (VOYAGE e VOYAGES ATRAVERS LE CINÉMA FRANÇAIS, 2015/18), a autores como Brigitte Rollet (La femme à la caméra, 2015), à digitalização e consequente possibilidade de divulgação alargada dos filmes. Marcada pela liberdade de abordagem, pela emancipação feminina, o papel das mulheres e a sexualidade, é uma obra surpreendente e ousada, que compreende o filme histórico, a comédia dramática, a comédia policial ou o filme político. Sobre os seus filmes, Audry afirmou retrospetivamente que “tiveram por objeto as relações passionais entre os seres”. Sobre o percurso firmado num mundo eminentemente masculino, sintetizou: “Toda a minha vida profissional foi uma espécie de torneio, tive de guerrear muito.” A retrospetiva, que terá lugar em outubro em colaboração com a 22ª Festa do Cinema Francês, é antecipada em abril com a apresentação de HUIS-CLOS.
 
 
Lois Weber
Um dos nomes mais sonantes dos primeiros anos do mudo era uma mulher. Chamava-se Lois Weber, fundou o próprio estúdio com base no sucesso alcançado pelas suas produções, mas nunca se vergou às fórmulas de Hollywood. O cinema de Weber aparece-nos hoje como um compêndio dos problemas sociais que afligiam a sociedade americana de então, dotado de uma sensibilidade política que Weber terá adquirido quando, na qualidade de voluntária em “missões” que prestavam assistência aos mais pobres em Nova Iorque, se deparou com um país real manchado por vários “borrões”, para citar o título do seu filme THE BLOT (que mostramos em abril), que deviam ser encarados e extirpados, a saber: desemprego, fome, doença, vício das drogas, prostituição, aborto... e acrescenta uma visão nada romântica sobre a instituição matrimonial. Esta “lista de encargos” ilustra a audácia política do seu cinema, isto é, dos cerca de 140 filmes que realizou, alguns em parceria com o marido, o também ator Phillips Smalley, mas não é suficiente para dar conta da extensão dos recursos visuais e narrativos que lhe dão nome e a colocam entre os cineastas mais experimentais do seu tempo, ao lado de D. W. Griffith e Erich von Stroheim. SUSPENSE talvez seja o epítome de uma arte cinética que ainda deslumbra pela sua sofisticação formal, patente na utilização da montagem alternada para fins dramáticos e em prodigiosos efeitos de montagem, como o split screen que rasga o plano em três partes. A faceta humanista desta cineasta teve uma das suas expressões máximas em SHOES, história de uma mulher sem dinheiro para substituir os seus velhos sapatos, sendo, até à data, o único dos seus filmes alguma vez exibido na Cinemateca Portuguesa.
 
Pál Fejos
É comum encontrar, sobretudo nas primeiras décadas do século XX, cineastas que fizeram as suas obras num trânsito quase permanente. Mas poucos terão tido um trânsito tão intenso como o húngaro Pál Fejos. A sua obra começa na Hungria, nos anos 20, onde foi contemporâneo de Michael Curtiz, quando este ainda era Mihaly Kertesz. E, como Curtiz, também Fejos seguiu para Hollywood, no final dos anos 20, onde chegou em pleno período de transição do mudo para o sonoro. Não esteve em Hollywood mais do que dois ou três anos, o tempo suficiente para assinar meia dezena de filmes e nomeadamente duas obras-primas que são fundamentais também no contexto do cinema americano daquele período de transição: LONESOME e BROADWAY. Fejos regressou à Europa no princípio dos anos 30, e filmou em Paris, em Viena (onde fez o belíssimo SONNENSTRAHL, que agora mostramos como cartão de visita da retrospetiva), e de novo em Budapeste. Daí seguiu para Copenhaga, como imigrante convidado a trazer a sua experiência para a indústria dinamarquesa. O relativo fracasso que encontrou levou-o a voltar as costas ao cinema de estúdio, ao cinema industrial. Dedicou-se a outra das suas paixões, a antropologia, rodando até meados dos anos 30 uma série de filmes documentais que foram o produto de expedições a África, à Ásia, à América do Sul, e que fazem dele um nome central entre os pioneiros da relação entre o cinema e a etnografia. Esta obra heteróclita e surpreendente será o foco de um ciclo, que pretendemos significativo dos vários tempos do trabalho de Fejos, e que representará, para os espectadores da Cinemateca, a revelação de um cineasta excecional ainda insuficientemente divulgado.
 
Peter Bogdanovich
Peter Bogdanovich, nascido em 1939, foi uma figura central da “nova Hollywood” que despontou nos anos 1970. Com THE LAST PICTURE SHOW, estreado em 1971, foi mesmo o responsável pela abertura das portas de Hollywood a toda uma nova geração de cineastas que estava na altura a entrar na faixa dos 30 anos. Ao contrário de outros casos, que se tornaram muito mais conhecidos do grande público e tiveram percursos muito mais bem sucedidos, Bogdanovich lidou com o fracasso (crítico e de bilheteira) frequentemente, razão porque a sua obra, para além de um outro ponto alto, tem ainda zonas de muito intermitente visibilidade. Mas é uma obra central no cinema americano das últimas décadas do século XX, tanto mais que Bogdanovich, cinéfilo com profunda admiração pelo cinema clássico americano, tentou fazer a síntese entre a modernidade dos novos tempos e a herança do classicismo, revisitando géneros em desuso e construindo vários filmes sobre a ruína do edifício clássico. Para além de THE LAST PICTURE SHOW (e do seu par, TEXASVILLE, rodado vinte anos depois), THEY ALL LAUGHED, PAPER MOON (filme que escolhemos para antecipar a retrospetiva), DAISY MILLER, WHAT'S UP DOC? são filmes que põem em evidência um discurso sobre a forma do cinema e sobre o que, a partir dela, se revela da história da sociedade americana. Contamos voltar a esta obra, acompanhada por uma carta branca, na presença do próprio Peter Bogdanovich.
 
Sarah Maldoror
Em setembro, a filmografia de Sarah Maldoror (1929-2020) será objeto de uma retrospetiva praticamente integral organizada pela Cinemateca em colaboração com o Festival IndieLisboa, oportunidade para mergulhar na obra desta cineasta com papel determinante nas lutas contra o colonialismo e na afirmação da negritude. Dando eco às obras dos poetas (e políticos) Aimé Césaire, Léopold Senghor ou Léon G. Damas, aos quais dedicou vários filmes entre os muitos retratos de artistas que realizou, Maldoror foi uma extraordinária voz deste movimento político, social e artístico que, desde os anos sessenta, promoveu uma cultura negra associada ao anticolonialismo e ao panafricanismo, em que o surrealismo tem também lugar importante. Filha de pai antilhano e de mãe francesa, Sarah Ducados adoptou o pseudónimo Maldoror em homenagem a Lautréamont, o autor de Os Cantos de Maldoror, e começou por se dedicar ao teatro, cofundando em 1956 a companhia de teatro Les Griots, a primeira composta unicamente por atores negros. Companheira do poeta e fundador do MPLA, Mário Pinto de Andrade, estudou cinema no VGIK em Moscovo (ao lado de Ousmane Sembène), envolvendo-se nos movimentos de libertação em África. Assistente de realização em títulos fundamentais de um cinema anticolonial, como A BATALHA DE ARGEL (1965), de Gillo Pontecorvo, ou FESTIVAL PANAFRICAIN D’ALGER (1969), de William Klein, as suas primeiras e mais conhecidas ficções, MONANGAMBÉ (1969) e SAMBIZANGA (1972), denunciam abertamente a violência do sistema colonial português. Já depois das respetivas independências, Maldoror filmará em Cabo Verde e na Guiné-Bissau os vários filmes que compõem a sessão que agora realizamos em abril. Annouchka de Andrade, filha de Sarah Maldoror, estará em Lisboa para acompanhar a retrospetiva, que incluirá raridades e alguns filmes inéditos, cujo paradeiro foi recentemente descoberto, que anunciaremos com mais detalhe nesta sessão.
 
 
Canções
Em certos filmes, certas canções irrompem e suspendem, impregnando, a ação, a atmosfera, o movimento das coisas. Uns e outros tornam-se, por vezes, ligações diretas. À volta de canções, numa ideia ligeira, será um programa de verão de toadas (re)conhecidas em momentos particulares, como o de I’m on Fire de Springsteen no PALOMBELLA ROSSA de Moretti (também podia ser o do Famous Blue Raincoat de Cohen no MIA MADRE), As Tears Goes By de Mick Jagger e Keith Richards por Marianne Faithfull em MADE IN USA de Godard, o bolero Sabor a Mí no FIO DO HORIZONTE de Fernando Lopes ou uma versão espanhola de Crying de Roy Orbison em MULHOLLAND DRIVE, que vamos ouvir em abril. À regra, as suas exceções, de que são exemplo os temas do assobio de M de Lang ou o de Herman Hupfeld no CASABLANCA de Curtiz, As Time Goes By. Pensado para noites de projeção ao ar livre na Esplanada 39 Degraus.
 
 A Casa
A “Casa”, como lugar físico e simbólico, centro aglutinador da narrativa ou, mesmo, sua personagem: eis o tema que com este Ciclo pretendemos abordar. Não é um ciclo sobre arquitetura, não é a descrição de propriedades arquitetónicas aquilo que procuramos, sem prejuízo de também essa vertente estar presente. Antes, o carácter ambivalente do tratamento cinematográfico do tema: uma casa tanto pode ser um espaço de conforto, “lar, doce lar”, como, e bem o sabemos desde há um ano, um espaço de confinamento, uma pequena prisão. Incluiremos, portanto, filmes que exploram esta duplicidade, que a enquadram numa visão ambígua de temas conexos como a “Família” - títulos como REBECCA de Alfred Hitchcock ou THE MAGNIFICENT AMBERSONS de Orson Welles. Sem esquecer que foi frequentemente um cenário de predileção – justamente por essa turva fronteira entre o “familiar” e o “secreto” - para o cinema fantástico (THE HAUNTING, de Robert Wise, por exemplo), e noutras ocasiões o pretexto para a exploração e exaustão de um décor (THE LADIES MAN, de Jerry Lewis). Finalmente, a Casa é também uma instância que se presta à biografia e ao diarismo: uma secção do Ciclo dedicar-se-á a filmes em que os realizadores filmam as suas próprias e reais casas, a começar por Manoel de Oliveira e VISITA, OU MEMÓRIAS E CONFISSÕES, que revisitamos em abril.
 
O Cinema Italiano, Lado B
Brevemente… nesta sala propomos, e parafraseando Martin Scorsese, uma outra viagem a Itália. Não é novidade para ninguém que a cinematografia italiana é todo um manancial, com muito por (re)descobrir e cuja riqueza está - também - na sua diversidade. Ao longo dos mais de 40 anos de exibições na Barata Salgueiro, estamos muito, mas mesmo muito longe de esgotar esse filão. Mas temos de começar por algum lado. Assim, para esta nossa “viagem” estabelecemos três regras. A primeira, e porventura, a mais polémica: a sua delimitação temporal (1945-1980), ou seja, a época de ouro desta cinematografia. A segunda: não incluir obras dos grandes mestres (Rossellini, Visconti, De Sica, Antonioni, Pasolini, Fellini, Bertolucci, Olmi e Zurlini) que, por isso mesmo, têm tido, ao longo dos anos, maior visibilidade nesta sala. A terceira: não incluir obras de géneros intrinsecamente característicos do cinema italiano deste período: western-spaghetti, peplum e giallo. Assim, neste ciclo incluímos um conjunto de filmes de realizadores chamados de segunda linha. Alguns mais “cá de casa” (Dino Risi, Mario Monicelli, Antonio Pietrangeli), outros nem tanto (Marco Ferreri, Ettore Scola, Luigi Comencini, Raffaello Matarazzo), outros muito esquecidos (Luigi Zampa, Alberto Lattuada, Pietro Germi – de quem escolhemos o ferocíssimo SEDOTTA E ABBANDONATA para apresentar em abril o ciclo -, Elio Petri, Lina Wertmüller, Luciano Emmer, Alessandro Blasetti, Mauro Bolognini). E, claro, como não podia deixar de ser, Totò.
 
No Coração do Noir
Depois do melodrama e da comédia nos dois anos transatos, o capítulo recorrente de programação “Revisitar os Grandes Géneros” dedica-se, em 2021, ao film noir que – precise-se – é discutível que seja exatamente um género já que, acentuadamente policial, atravessa vários outros, mas que se afirmou em tempos de guerra, pós-guerra e Guerra Fria como um poderoso universo cinematográfico, significativamente alimentado pelos então exilados europeus em Hollywood. Revelado pelo olhar francês sobre visões americanas (o termo film noir foi primeiramente cunhado em França, em 1946, por Nino Frank, e vingou sobre dark cinema ou cinema negro), o noir centra-se genericamente na idiossincrasia de situações, emoções ou personagens cruas, contraditórias, obsessivas, violentas à superfície e em profundidade, tratados num estilo visual que as contamina e as salienta confluindo num imaginário de sombras.
O programa decorrerá em dois passos, “No Coração do Noir” e “Disponíveis para o Noir”. O primeiro incide no fulcro do cinema hollywoodiano dos anos 1940 e 50 (de STRANGER ON THE THIRD FLOOR de Boris Ingster a ODDS AGAINST TOMORROW de Robert Wise), propondo maioritariamente títulos sonantes da grande produção e da série B americana da época clássica será antecipado em abril através do filme THE LOCKET.
 
Disponíveis para o Noir
O fulcro clássico do noir americano foi lastrando noutros pesadelos e muitas paragens, que dobraram o século XX e, revisitando ou reinventando, continuam a projectar-se, em declinações neo e néon. Este programa incide especialmente nas cinematografias francesa, britânica e japonesa atraídas pelo noir hollywoodiano, balizando-se nas duas décadas que decorreram entre 1947 e 67. Além das incursões geográficas mencionadas (em filmes de John Boulting, Alberto Cavalcanti, Carol Reed, Jules Dassin, Terence Fisher, Henri Decoin, Jacques Becker, Julien Duvivier, Louis Malle, Gilles Grangier, Pierre Chenal, Jean-Pierre Melville, Koreyoshi Kurahara - de quem apresentamos em abril “INTIMIDAÇÃO” -, Akira Kurosawa, Teruo Ishii, Yoshitaro Nomura, Seijun Suzuki), dar-se-á um salto à Suécia, onde Edith Carlmar estreou a linhagem noir em 1949 (DØDEN ER ET KJAERTEGN / “A MORTE É UMA CARÍCIA”), e à Coreia, com Shin Sang-ok (JIOKHWA / “UMA FLOR NO INFERNO”, 1958).
 
Centenários
O ano de 2021 é rico em centenários de atrizes e atores da primeira linha do cinema americano, inglês e francês. Ao longo de diferentes momentos do ano vamos assinalar a passagem dos 100 anos do nascimento de Jane Russell, Deborah Kerr, Simone  Signoret, Yves Montand e Dirk Bogarde com programas dedicados a cada um deles e constituídos por uma dezena de algumas das suas mais marcantes interpretações no cinema. Em abril, antecipamos o centenário de Jane Russell num dos seus papéis mais emblemáticos em THE REVOLT OF MAMIE STOVER, de Raoul Walsh.
 
22/04/2021, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Brevemente Neste Cinema

Mulholland Drive
Mulholland Drive
de David Lynch
Estados Unidos, 2001 - 145 min
23/04/2021, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Brevemente Neste Cinema

Le Fond de l’Air Est Rouge
de Chris Marker
França, 1977 - 180 min
26/04/2021, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Brevemente Neste Cinema

Aru Kyounhaku
“Intimidação”
de Koreyoshi Kurahara
Japão, 1960 - 65 min
27/04/2021, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Brevemente Neste Cinema

Paper Moon
Lua de Papel
de Peter Bogdanovich
Estados Unidos, 1973 - 102 min
27/04/2021, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Brevemente Neste Cinema

Huis-Clos
de Jacqueline Audry
França, 1954 - 95 min
22/04/2021, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Brevemente Neste Cinema
Mulholland Drive
Mulholland Drive
de David Lynch
com Naomi Watts, Laura Harring, Justin Theroux
Estados Unidos, 2001 - 145 min
legendado em português | M/16
No início deste milénio, David Lynch partiu da ideia “de uma mulher que tenta tornar-se estrela em Hollywood e dá por si como uma detetive e possivelmente a entrar num mundo perigoso” e construiu um filme profundamente hipnótico, narrativamente assimétrico, abissalmente no limiar da realidade e do imaginário. Há uma chave azul, uma caixa azul, mas o rumo é a desorientação. Noutro Lynch, Blue Velvet de Bernie Wayne e Lee Morris na interpretação de Isabella Rossellini é encantatório, mas em MULHOLLAND DRIVE há uma canção para um lancinante momento em suspenso numa sala-cabaret com Llorando, por Rebekah Del Rio numa versão de Crying de Roy Orbison.

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23/04/2021, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Brevemente Neste Cinema
Le Fond de l’Air Est Rouge
de Chris Marker
França, 1977 - 180 min
legendado em português | M/12
a sessão decorre com intervalo
Pode filmar-se o “ar do tempo”? Chris Marker mergulhou nos arquivos e fez a crónica, simultaneamente épica e intimista, de dez anos (1967-1977) de contestação do sistema político-económico mundial. Uma montagem lírico-dialética da revolução em curso, da guerra do Vietname às manifestações de estudantes, de Che Guevara aos tanques de Praga, da tortura na América Latina aos bombardeamentos americanos, passando por breves imagens da Revolução Portuguesa. “Ao longo dos últimos dez anos, um determinado número de homens e de forças (por vezes mais instintivas que organizadas) tentaram tomar em mãos os seus destinos e inverter as peças do jogo. Todos eles falharam nos terrenos que tinham escolhido. Apesar disso, a sua passagem foi aquilo que mais profundamente transformou as condições políticas do nosso tempo. Este filme não pretende senão colocar em evidência algumas etapas desta transformação.” (Chris Marker). Primeira exibição na Cinemateca desta última versão do filme, remontada pelo cineasta em 1996. A exibir em cópia digital.

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26/04/2021, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Brevemente Neste Cinema
Aru Kyounhaku
“Intimidação”
de Koreyoshi Kurahara
com Kô Nishimura, Nobuo Kaneko, Mari Shiraki, Jun Hamamura
Japão, 1960 - 65 min
legendado em inglês e eletronicamente em português | M/12
Koreyoshi Kurahara (1927-2002) estreou-se na realização para a Nikkatsu em 1957 e foi aí que assinou o drama criminal de elementos noir ARU KYOUNHAKU, em que um ambicioso bancário se enreda num esquema de chantagem que o leva a organizar um assalto ao próprio banco confrontando-se com um subalterno movido pelo ressentimento vingativo. A acidez das reviravoltas narrativas engendradas na concentração da intriga tem lugar no Japão do pós-guerra, expondo o fundo corrupto pequeno burguês de uma sociedade ameaçada pela desagregação. Os meandros da história, o ambiente noturno e a firmeza da realização fazem reverberar motivos do cinema clássico americano. Primeira apresentação na Cinemateca. A exibir em cópia digital.

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27/04/2021, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Brevemente Neste Cinema
Paper Moon
Lua de Papel
de Peter Bogdanovich
com Ryan O’Neal, Tatum O’Neal, Madeline Kahn, John Hillerman, P. J. Johnson, Randy Quaid
Estados Unidos, 1973 - 102 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Na terceira longa-metragem, Bogdanovich reincidiu na comédia e voltou ao preto e branco. O argumento parte de um romance de Joe David Brown (Addie Pray), decorrendo o filme durante o período da Grande Depressão no estado do Kansas, com Ryan e Tatum O’Neal (em estreia no cinema) a assumir, como na vida real, os papéis de pai e filha. Por aqui pairam sombras de Ford e de THE WIZARD OF OZ. “É justo, racional e salutar que neste filme, convocador de todas as memórias, se comece por invocar a memória de Dorothy-Judy Garland” (João Bénard da Costa).

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27/04/2021, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Brevemente Neste Cinema
Huis-Clos
de Jacqueline Audry
com Arletty, Gaby Sylvia, Franck Villard, Nicole Courcel, Yves Deniaud, Danièle Delorme, Jean Debucourt
França, 1954 - 95 min
legendado eletronicamente em português | M/12
A partir da obra original de Sartre, esclarece o plano inicial da sétima longa-metragem de Jacqueline Audry: “É o inferno segundo Jean-Paul Sartre. [...] e os carrascos são aqueles cuja presença nos é infligida. O inferno são os outros!” Rodado em Paris e na Côte-d’Azur, é o filme em que três seres entre si desconhecidos, Inès (Arletty), Garcin (Franck Villard) e Estelle (Gaby Sylvia), são fechados no mesmo compartimento que será murado, compreendendo a maldição individual na companhia inelutável dos restantes e das memórias de cada um. Estas, terrenas, surgem na tela que se abre entre as cortinas da janela da sala de estar, como um ecrã de cinema. A ideia da projeção cinematográfica é verbalizada pelo “mordomo” que, sendo preciso, vai aparecendo na sala de estar até que a câmara suba num último movimento que fixa o infernal cenário entre os vapores do lugar dos mortos condenados a penas eternas. Primeira apresentação na Cinemateca.

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