CICLO
Artavazd Pelechian


"Trata-se de um trabalho sobre montagem como eu achava que já não se fazia na URSS desde Dziga Vertov. Sobre, com e contra a montagem. Tenho subitamente o sentimento (agradável) de me encontrar face a um elo perdido da verdadeira história do cinema"
Serge Daney, Libération, 11 de agosto de 1983
 
“Para mim, a montagem à distância abre os mistérios do movimento do universo. Posso sentir como tudo é feito e posto em relação; posso sentir o seu movimento rítmico.”
Artavazd Pelechian
 
Em maio, Artavazd Pelechian estará na Cinemateca a apresentar a integralidade da sua obra. Mestre absoluto da montagem e um dos maiores cineastas do presente, Pelechian é autor de uma filmografia breve, mas magnífica, composta essencialmente por curtas-metragens de natureza documental, reveladoras de uma poética única e do poder transformador do cinema. Oriundo da Arménia, o cinema de Pelechian reflete claramente a dura condição do seu povo, bem como uma profunda ligação à ex-URSS, no contexto da qual nasceu em 1938 e onde estudou cinema, sendo considerado por muitos como um dos últimos herdeiros da escola de montagem soviética. Desenvolvendo-se ao longo de três décadas, o início da sua obra cinematográfica remonta a meados da década de sessenta, o período em que frequentou o conhecido Instituto de Cinema de Moscovo, o VGIK, momento em que estabelece ainda as bases de uma reflexão teórica, que desenvolverá paralelamente à prática cinematográfica (os textos de Pelechian sobre cinema foram publicados pela primeira vez em 1988 em Erevan sob o título "Moe Kino" / "O Meu Cinema"). Os últimos filmes, os belíssimos FIM e VIDA, datam de meados dos anos noventa, altura em que Pelechian deixa de filmar. 
É desde o início clara a sua relação com a tradição clássica soviética da montagen, mas também a sua singularidade, como revela o seu conceito de  “montagem à distância”, em que uma ideia de “contraponto” se opõe às conceções de cineastas como Vertov, ou Eisenstein. Através de uma apurada manipulação das imagens de base com que trabalha (sejam elas imagens de arquivo ou imagens filmadas pelo próprio Pelechian – o caso de AS ESTAÇÕES é particularmente exemplar), reenquadramento, aceleração, paragem, repetição, ou ampliação, mas também desta prática de montagem em que um “filme resulta de uma composição de planos mantidos à distância” e em que a música desempenha um papel essencial, Pelechian constrói verdadeiras estruturas corais que, dispensando a palavra, apontam para uma visão cósmica da vida e da História. Um cinema em que o homem se inscreve diretamente no movimento da natureza, do Mundo e da História, movimento vertiginoso portador de um lirismo fulgurante.
Fazendo corresponder os sete filmes deste Ciclo à “obra completa de Pelechian”, entendemo-la enquanto conjunto de filmes que hoje reconhece como seus. Da sua história fazem ainda parte alguns outros títulos (poucos) que Pelechian recusa no contexto de uma longa relação tumultuosa com as autoridades soviéticas, que atrasou o reconhecimento da sua obra no Ocidente. No cinema há ainda que referir as colaborações com outros cineastas, sobretudo ao nível de um trabalho com imagens de arquivo, de que SIBERÍADA, de Andrei Kontchalovski, será o caso mais conhecido. Não é a primeira vez que Pelechian vem a Portugal – esteve cá em 1994 no contexto de um Ciclo organizado pelo Festival Internacional de Curtas-Metragens de Vila do Conde, que teve uma extensão na Cinemateca, momento da revelação da sua obra no nosso país –, mas é extremamente importante salientar o carácter excecional de tal presença, dado que são cada vez mais raras as aparições públicas de um cineasta que permanece um dos nomes mais secretos da história do cinema. É na realidade uma obra rarissimamente mostrada na sua integralidade nas salas de cinema, o que em grande parte se explica pela grande dificuldade de acesso a cópias com qualidade de projeção, que também se espelham na dificuldade em organizar uma retrospetiva como esta. Neste sentido procuraremos exibir o máximo de filmes nos seus suportes analógicos de origem, optando no caso dos restantes por exibi-los em suporte digital. O programa é ainda complementado por um filme recente de Vincent Sorrel sobre a obra de Pelechian, a apresentar em estreia em Portugal.
 
Artavazd Pelechian está presente na primeira sessão e participa numa conversa com o público no dia 29
 
 
31/05/2019, 18h30 | Sala Luís de Pina
Ciclo Artavazd Pelechian

Skizbe / Natchalo | Mer Dare / Nach Vek
duração total da projeção: 40 min | M/6
 
31/05/2019, 18h30 | Sala Luís de Pina
Artavazd Pelechian

Em colaboração com a Fundação Calouste Gulbenkian
Skizbe / Natchalo | Mer Dare / Nach Vek
duração total da projeção: 40 min | M/6
Por vontade de Pelechian, o programa do ciclo sofreu algumas alterações de última hora, pelo que apresentamos o novo alinhamento desta sessão
SKIZBE | NATCHALO
"O Início"        
URSS, 1967 – 10 min / sem diálogos
MER DARE | NACH VEK
"O Nosso Século"
URSS, 1982-1990 – 30 min / sem diálogos
de Artavazd Pelechian

A abrir a sessão, um dos mais conhecidos excursos poéticos de Artavazd Pelechian. Realizado por ocasião das celebrações do 50º aniversário da Revolução de Outubro, “O INÍCIO” é uma singularíssima aproximação à ideia de Revolução e um portentoso trabalho de montagem que se revela como um dos pontos culminantes da obra de Pelechian. Já “O NOSSO SÉCULO" ergue-se como uma meditação sobre "a conquista do espaço" e uma homenagem aos cosmonautas numa interpretação única de um século de História. Nesta sessão, apresentamos a versão mais curta do filme (30’) que resulta de uma remontagem realizada pelo próprio Pelechian em 1990 da versão de 1982 (48’).