CICLO
O Cinema de Michael Snow


Michael Snow (n.1928, Canadá), músico, artista multifacetado e figura fundamental da História do cinema experimental, está na Cinemateca em fevereiro a apresentar uma retrospetiva integral da sua obra cinematográfica. O programa inicia-se dia 16 com a sua presença, e prolonga-se até ao fim do mês. Estão programados 25 filmes, que correspondem à totalidade do cinema de Michael Snow, nomeadamente às obras criadas para serem mostradas numa sala de cinema, excluindo-se vídeos e instalações pensados para contextos expositivos. Uma mostra abrangente e uma homenagem que engloba uma conversa com o cineasta, que acaba de completar 90 anos, e cujo trabalho desenvolvido desde o início da segunda metade do século XX envolve uma multiplicidade de disciplinas, meios e suportes, como a pintura, escultura, música, filme, fotografia, vídeo, som, e instalação, cujas linguagens experimenta sem cessar.
Para lá de algumas exibições pontuais, esta é a primeira retrospetiva integral do cinema de Snow em Portugal, sucedendo a um primeiro Ciclo dedicado à sua obra cinematográfica, programado por João Nisa e Ricardo Matos Cabo no Cinema King em 2000, que mostrou sete dos seus filmes mais relevantes realizados até ao início dos anos oitenta, e à recente exposição O Som da Neve, que teve lugar em 2018 na Culturgest, no contexto da qual, a par de um conjunto de instalações e de obras sonoras, se exibiram ainda quatro filmes em que o som desempenha um papel essencial.
Se Michael Snow começou por estudar pintura e escultura e se iniciou como artista plástico e músico jazz, no corpus da sua obra, o cinema teve desde cedo um lugar essencial. É ainda nos anos cinquenta que começa a trabalhar no atelier do realizador de animação George Dunning e assina o primeiro trabalho de cinema, A TO Z (1956), um curtíssimo filme animado. Os filmes seguintes seriam já realizados em Nova Iorque, para onde se muda temporariamente com Joyce Wieland em 1962. É a partir de então que o seu trabalho plástico conhece um maior reconhecimento público no contexto da arte pop e do minimalismo norte-americano, destacando-se a importante série Walking Woman. Mas também é nessa altura que revoluciona o cinema de avant-garde, juntando-se a Jonas Mekas, Hollis Frampton ou Ken Jacobs, e afirmando-se como uma das figuras de proa do movimento apelidado por P. Adams Sitney como “cinema estrutural”. Entre os títulos fundamentais de Snow deste período estão os incontornáveis "clássicos" do cinema experimental, WAVELENGTH (1967) e LA RÉGION CENTRALE (1971), o primeiro dos quais venceu o Festival International du Cinéma Expérimental de Knokke-le-Zoute, chamando sobre si uma enorme atenção. Dois filmes que, pelo modo como contribuíram para uma interrogação sobre a essência do cinema, até hoje não cessaram de lançar a discussão, influenciando sucessivas gerações de cineastas e artistas.
Mas estes são apenas dois marcos de uma obra que questionará permanentemente a natureza do cinema, colocando em causa as nossas perceções e hábitos enquanto espectadores, através da imposição de um tempo e de uma duração que se tornam frequentemente palpáveis. Uma obra cuja modernidade é frequentemente associada ao modo como Snow, em cada filme, investiga as propriedades do cinema, seja através de uma exploração das possibilidades dos movimentos de câmara, das relações entre som e imagem, ou de tantos outros aspetos da linguagem e da técnica cinematográfica. Uma obra que, em última instância, pode ser encarada como um imenso estudo sobre a perceção e sobre as infinitas possibilidades de articular espaço e tempo em cinema, que continua a expandir-se através de diferentes meios.
 
21/02/2019, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo O Cinema de Michael Snow

Breakfast (Table Top Dolly) | Presents
duração total da projeção: 105 min | M/12
22/02/2019, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo O Cinema de Michael Snow

Funnel Piano | Seated Figures | See You Later / Au Revoir
duração total da projeção: 63 min | M/12
23/02/2019, 21h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo O Cinema de Michael Snow

La Région Centrale
de Michael Snow
Canadá, 1971 - 190 min
25/02/2019, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo O Cinema de Michael Snow

Prelude | To Lavoisier, Who Died in the Reign of Terror
duração total da projeção: 59 min | M/12
 
26/02/2019, 18h30 | Sala Luís de Pina
Ciclo O Cinema de Michael Snow

*Corpus Callosum
de Michael Snow
Canadá, 2001 - 92 min
 
21/02/2019, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
O Cinema de Michael Snow
Breakfast (Table Top Dolly) | Presents
duração total da projeção: 105 min | M/12
BREAKFAST (TABLE TOP DOLLY)
Canadá, 1976 – 15 min / sem diálogos
PRESENTS
Canadá, 1981 – 90 min / sem legendas
de Michael Snow

BREAKFAST (TABLE TOP DOLLY) é uma paródia em torno de WAVELENGTH: a câmara avança para a frente num movimento único, destruindo tudo o que encontra numa mesa de pequeno-almoço muito cheia. Um travelling cujos efeitos físicos são enfatizados, o que contrasta com os efeitos óticos de WAVELENGTH. Apresentado como uma "investigação material sobre o movimento da câmara", PRESENTS divide-se em três partes: na primeira, é o cenário que se move; na segunda, é a câmara que se move, literalmente destruindo, nesse processo, o cenário; na terceira, montagem de mais de 2000 planos de coisas tão distintas como o Coliseu de Roma ou iglus de esquimós, "a câmara ziguezagueia sobre linhas de força e campos de visão em movimento, numa aproximação ao olhar da natureza" (Philip Monk). BREAKFAST (TABLE TOP DOLLY) é uma primeira exibição na Cinemateca.
 
22/02/2019, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
O Cinema de Michael Snow
Funnel Piano | Seated Figures | See You Later / Au Revoir
duração total da projeção: 63 min | M/12
FUNNEL PIANO
Canadá, 1984 – 3 min / sem diálogos
SEATED FIGURES
Canadá, 1988 – 42 min / sem legendas
SEE YOU LATER / AU REVOIR
Canadá, 1990 – 18 min / sem diálogos
de Michael Snow

FUNNEL PIANO é uma raridade filmada por Michael Snow em Super 8, em 1984, que até hoje foi muito pouco vista: um exercício de improvisação em que toca piano com uma mão e filma com a outra. SEATED FIGURES é construído com imagens que surgem como variações em torno de oito movimentos captadas a partir de um veículo em andamento: subir, descer, para a esquerda ou para a direita, e os quatro movimentos diagonais possíveis. A vegetação aparece, as estradas tornam-se caminhos até que que finalmente as imagens correspondem a campos com flores num hipnótico movimento não contínuo. Mas SEATED FIGURES versa também sobre o espectador e sobre a sua perceção. SEE YOU LATER / AU REVOIR tem o próprio Snow como protagonista, que realiza ações extremamente simples registadas por uma câmara que as submete a um ralenti extremo, que assim chama a atenção para os mínimos detalhes desses mesmos gestos. Uma obra em que Snow prossegue claramente o seu trabalho com os elementos cinematográficos e em que, mais uma vez, o tempo e a duração se tornam palpáveis. FUNNEL PIANO é apresentado em cópia digital. Primeiras exibições na Cinemateca.

 
23/02/2019, 21h00 | Sala M. Félix Ribeiro
O Cinema de Michael Snow
La Région Centrale
de Michael Snow
Canadá, 1971 - 190 min
sem diálogos | M/12
Em LA RÉGION CENTRALE Snow montou uma câmara num dispositivo mecânico capaz de se mover em todas as direções, produzindo um filme que corresponde a um movimento contínuo no espaço, interrompido ocasionalmente por um X que serve de ponto de referência e nos permite retomar a estabilidade da realidade. Snow escolheu filmar numa região deserta, sem rasto de vida humana, tornando o espectador cúmplice de uma fragmentação do espaço associada a um movimento cósmico, que o transcende. "LA RÉGION CENTRALE não é apenas um documentário que regista um lugar específico em diferentes momentos do dia, mas é também e sobretudo uma fonte de sensações, uma ordenação, uma composição dos movimentos do olho e do ouvido interno (...) o enquadramento sublinha a continuidade admirável mas trágica do cosmos, que progride sem nós” (Michael Snow). Um filme incontornável na história do cinema e das artes visuais, que nos força a repensar o cinema, mas também o nosso universo, a que Jean-Luc Godard presta uma justa homenagem no seu último trabalho LE LIVRE D'IMAGE (2018), em que cria a sua própria "região central".
 
25/02/2019, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
O Cinema de Michael Snow
Prelude | To Lavoisier, Who Died in the Reign of Terror
duração total da projeção: 59 min | M/12
PRELUDE
Canadá, 2000 – 6 min / sem legendas
TO LAVOISIER, WHO DIED IN THE REIGN OF TERROR
Canadá, 1991 – 53 min / sem legendas
de Michael Snow      

Como grande parte dos trabalhos de Snow, o aparentemente improvisado PRELUDE é extremamente meticuloso do ponto de vista conceptual. O filme constrói um mundo físico momentâneo sujeito a leis comportamentais e cinematográficas específicas que parodiam a ideia de trailer. "Antoine Lavoisier (1743-1794) foi o químico francês que deu a primeira explicação científica precisa sobre os mistérios do fogo. Ele também provou a lei da conservação da matéria, que afirma que a matéria não pode ser criada nem destruída. O seu trabalho e este filme estão situados entre a química moderna e a alquimia. O filme encena um drama de abstração e realismo teórico. A vida quotidiana vista fotoquímica e musicalmente" (Michael Snow). TO LAVOISIER contou com a contribuição do cineasta canadiano Carl Brown, conhecido pelo seu trabalho de intervenção fotoquímica sobre a matéria fílmica, que mais tarde coassinaria o filme TRIAGE com Snow. Como escreveu Jonathan Rosenbaum, "Surpreendentemente perto em alguns aspectos do trabalho de Stan Brakhage, pelo menos ao nível das aparências, TO LAVOISIER é simultaneamente provocador e belo, como a maior parte dos melhores filmes de Snow". Primeiras exibições na Cinemateca.
 
26/02/2019, 18h30 | Sala Luís de Pina
O Cinema de Michael Snow
*Corpus Callosum
de Michael Snow
Canadá, 2001 - 92 min
sem legendas | M/12
O “corpus callosum” é uma região central do tecido do cérebro humano que passa mensagens entre os dois hemisférios. *CORPUS CALLOSUM, o filme, representa e é intermediário entre o começo e o fim, entre o natural e o artificial, entre a ficção e o real, entre ouvir e ver, entre 1956 e 2002. Recorrendo a tecnologia digital de ponta usada na animação, e que tem aqui os seus primeiros usos no universo do cinema experimental, trata-se de um filme assumidamente artificial, que pretende ser percebido enquanto fenómeno musical e pictórico que aborda a questão da metamorfose. Primeira exibição na Cinemateca.