CICLO
O Cinema e a Cidade I


Perante as transformações evidentes que têm afetado os modos de receção dos filmes, e perante a transformação evidente da natureza, da implantação e do modo de usufruto das salas de cinema nas cidades contemporâneas, a Cinemateca organiza um conjunto de iniciativas através das quais propõe uma reflexão sobre o binómio cinema-cidade, tentando mergulhar mais fundo na evolução cruzada e nos impactos mútuos desses dois polos.
Tal como previamente anunciado no sítio web da Cinemateca, estas iniciativas têm início em setembro e englobam um Ciclo que se prolongará por outubro e novembro, um colóquio de dois dias sobre o mesmo tema (28 e 29 de setembro), e ainda uma série de sessões com projeção e debate a realizar fora da Cinemateca, em vários pontos do território nacional, ao longo dos meses seguintes.
Desde as suas origens o cinema surgiu indissociavelmente ligado às cidades, cujas ruas se transformam em espaços eminentemente cinemáticos conotados com uma forma de experiência da velocidade e do movimento, como tão bem revelam alguns dos escritos que melhor caracterizaram tal sensibilidade urbana moderna, de Charles Baudelaire a Walter Benjamin. Não só as cidades são um dos grandes temas dos primeiros “travelogues”, de Lumière a Edison, como é nas cidades que se concentram as primeiras grandes salas pensadas para acolher especificamente o cinema, que ao longo de mais de um século conhecerão profundas transformações. Mas é também às cidades que é dedicado um conjunto de “sinfonias urbanas” que, a partir dos anos vinte, toma grandes e pequenas metrópoles e os seus habitantes como protagonistas, e que encontra em MANHATTA, de Paul Strand e Charles Sheeler, e em BERLIM, SINFONIA DE UMA CAPITAL, de Walter Ruttmann, dois dos seus filmes fundadores. Um género que inclui DOURO, FAINA FLUVIAL, de Manoel de Oliveira, e que conhecerá até hoje as mais diversas ramificações apresentando-se na origem de uma categoria mais vasta que podemos classificar como "filmes de cidades".
Envolvendo 46 programas com perto de 100 filmes, o Ciclo inicia-se no dia 2 de setembro com uma jornada de programação especial e apresenta várias vertentes que necessariamente se recobrem, em que se destacam filmes privilegiadamente ligados a uma cidade, que a tomam como centro e que participam ativamente da construção do imaginário dessa mesma cidade, contribuindo para uma reflexão sobre ela. Categoria vasta que atravessa diferentes géneros, incluindo títulos em que a experiência cinematográfica se funde com o urbano, transformando-o ao mesmo tempo em base de pesquisa formal e metáfora orgânica, das sinfonias urbanas das primeiras vanguardas até aos filmes-ensaio do presente ou a um cinema mais experimental. Numa relação mais direta com o colóquio, o programa envolve ainda um núcleo de filmes cujo objeto é a própria experiência da sala de cinema e a transformação das salas nas suas conexões com a vivência urbana.
Para lá das referidas “sinfonias urbanas”, a relação entre o cinema e a construção do imaginário de cidades concretas encontra o seu exemplo paradigmático num filme como LOS ANGELES PLAYS ITSELF, pois aqui Thom Andersen faz da ficção matéria documental para abordar uma história de L.A. à luz da montagem de fragmentos de filmes dos mais variados períodos e géneros. Um apurado trabalho arqueológico sobre a memória do cinema/das cidades, presente em outros filmes do programa como HELSINKI IKUISESTI de Peter von Bagh, BERLIN 10/90, de Robert Kramer, EUREKA, de Ernie Gehr, ou LONDON, de Patrick Keiller, que cruzam frequentemente uma dimensão histórica com geografias pessoais. Por outro lado, são muitas as cidades que se confundem com as suas representações, pois para muitos Paris é a Paris da Nouvelle Vague, Roma, a Roma de Fellini ou de Rossellini, Tóquio, a cidade de Ozu, e Nova Iorque a grande metrópole retratada por tantos como Scorsese, Woody Allen ou Andy Warhol.
Há outros filmes que traduzem o modo contrastante como o século XX olhou para as cidades, entre as utopias de uma cidade moderna, expressas pela primeira vanguarda americana ou por autores como King Vidor, e os medos de um futuro mais sombrio (METROPOLIS, BLADE RUNNER), mas também PLAYTIME, de Jacques Tati. Partindo de uma pluralidade de géneros, períodos, escolas e cinematografias que traduzem a diversidade de cidades retratadas – do neorrealismo aos cinemas novos e ao cinema negro, e incluindo vertentes contemporâneas e mais experimentais –, este é um Ciclo que podia estar na origem de muitos subciclos dedicados a motivos específicos como a relação da cidade com as suas periferias e as comunidades migrantes e marginais, a ruralidade, a arquitetura e urbanismo, etc. Questões necessariamente afloradas, mas não aqui exploradas em profundidade. As ruas são o grande palco deste programa que, atravessando mais de um século de cinema, assume as cidades como protagonistas.

JORNADA DE ABERTURA DO PROGRAMA O CINEMA E A CIDADE
Bilhete Especial para a jornada de 2 de setembro no valor de cinco euros, abrangendo as três sessões do dia, disponível para aquisição “online” a partir de 22 de agosto.
Possibilidade de Refeição-Buffet na Esplanada 39 Degraus com condições especiais antes da sessão da noite.
Entre as 14 horas e as 20 horas, a livraria Linha de Sombra organiza uma Feira do Livro Manuseado na Esplanada 39 Degraus.
 
05/09/2017, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo O Cinema e a Cidade I

Nadja a Paris | Le Signe du Lion
duração total da projeção: 113 min | M/12
 
06/09/2017, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo O Cinema e a Cidade I

Tokyo Monogatari
“Viagem a Tóquio”
de Yasujiro Ozu
Japão, 1953 - 136 min
06/09/2017, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo O Cinema e a Cidade I

Manhatta | Rien que les Heures | Berlin, die Symphonie der Grosstadt
duração total da projeção: 121 min | M/12
07/09/2017, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo O Cinema e a Cidade I

Manhatta | Metropolis
duração total da projeção: 159 min | M/12
07/09/2017, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo O Cinema e a Cidade I

London
de Patrick Keiller
Reino Unido, 1994 - 85 min
05/09/2017, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
O Cinema e a Cidade I
Nadja a Paris | Le Signe du Lion
duração total da projeção: 113 min | M/12
NADJA A PARIS
de Eric Rohmer
com Nadja Tesich
França, 1964 – 13 min / legendado eletronicamente em português
LE SIGNE DU LION
de Eric Rohmer
com Jess Hahn, Jean Le Poulain
França, 1959 – 100 min / legendado eletronicamente em português

NADJA A PARIS acompanha as deambulações de Nadja, jovem estudante estrangeira que explora Paris. As ruas, os cafés e o espaço da cidade universitária são dissecados por este curto filme de Rohmer. LE SIGNE DU LION, o seu tardio filme de estreia, feito quando o realizador tinha 39 anos, não se inscreve no projeto de realizar uma série de filmes à volta dos mesmos temas, como este o fará com os seis contos morais, as comédias e provérbios ou os contos das quatro estações. Nesta história sobre um americano de Paris, com pouco dinheiro e reduzido à mendicidade durante o mês de agosto, quando todos os seus amigos estão de férias, a ação é menos conduzida pelo verbo do que nos filmes posteriores de Rohmer – as personagens não vivem como se fossem personagens de romance. Mas o rigor e o humor do realizador são os mesmos. E como tantos filmes da Nouvelle Vague, LE SIGNE DU LION é um grande filme sobre Paris. NADJA A PARIS é mostrado pela primeira vez na Cinemateca.
 
06/09/2017, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
O Cinema e a Cidade I
Tokyo Monogatari
“Viagem a Tóquio”
de Yasujiro Ozu
com Chishu Ryu, Chieko Higashiyama, Setsuko Hara
Japão, 1953 - 136 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Conhecido em inglês como TOKYO STORY, foi o filme através do qual os espectadores ocidentais descobriram tardiamente o cinema de Ozu, em meados dos anos setenta. Um velho casal vai visitar os filhos a Tóquio, mas estes não têm tempo para a atenção devida. Tal é o pretexto para Ozu abordar o tema central do seu cinema na fase final da sua obra, a dissolução de uma família, a separação dos membros que a compõem, a resignação diante daquilo que muda. Um momento sublime de cinema, um cineasta no apogeu da sua arte que filma uma cidade em plena transformação.
 
06/09/2017, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
O Cinema e a Cidade I
Manhatta | Rien que les Heures | Berlin, die Symphonie der Grosstadt
duração total da projeção: 121 min | M/12
Com acompanhamento ao piano por Daniel Bruno Schvetz
MANHATTA
de Paul Strand, Charles Sheeler
Estados Unidos, 1921 – 10 min / mudo, com intertítulos em inglês, legendados eletronicamente em português
RIEN QUE LES HEURES
de Alberto Cavalcanti
França, 1926 – 45 min / mudo, intertítulos legendados eletronicamente em português
BERLIN, DIE SYMPHONIE DER GROSSTADT
Berlim, Sinfonia de uma Capital
de Walter Ruttmann
Alemanha, 1927 – 66 min / mudo, sem intertítulos

MANHATTA é cronologicamente a primeira “sinfonia urbana” que se conhece e um marco na história do modernismo. Partindo de um poema de Walt Whitman e realizado pelo famoso fotógrafo Paul Strand e pelo pintor e fotógrafo Charles Sheeler, MANHATTA justapõe às palavras do escritor imagens de forte carga poética de Nova Iorque, um hino a Manhattan e à cidade moderna. RIEN QUE LES HEURES do brasileiro Alberto Cavalcanti antecipa também uma sinfonia como BERLIN ao acompanhar o ritmo de um dia na vida de Paris. BERLIN, DIE SYMPHONIE DER GROSSTADT é o mais célebre e o mais perfeito dos filmes feitos em meados dos anos vinte sobre as diversas atividades de uma cidade, Berlim, que é a protagonista. A influência exercida por esta obra de Ruttmann foi enorme, e acabou por dar nome a um género: sinfonias das cidades.
 
07/09/2017, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
O Cinema e a Cidade I
Manhatta | Metropolis
duração total da projeção: 159 min | M/12
MANHATTA
de Paul Strand, Charles Sheeler
Estados Unidos, 1921 – 10 min / mudo, com intertítulos em inglês, legendados eletronicamente em português
METROPOLIS
Metrópolis
de Fritz Lang
com Alfred Abel, Brigitte Helm, Rudolf Klein-Rogge, Gustav Fröhlich, Fritz Rasp
Alemanha, 1927 – 149 min / versão sonorizada, com intertítulos em alemão legendados eletronicamente em português

MANHATTA é cronologicamente a primeira “sinfonia urbana” que se conhece e um marco na história do modernismo. Partindo de um poema de Walt Whitman e realizado pelo famoso fotógrafo Paul Strand e pelo pintor e fotógrafo Charles Sheeler, justapõe às palavras do escritor imagens de forte carga poética de Nova Iorque, um hino a Manhattan e à cidade moderna. É sob a influência de uma visita a Nova Iorque em 1924 que Lang realiza um dos mais célebres filmes sobre uma cidade imaginada. METROPOLIS é uma parábola sobre as relações sociais numa cidade do futuro. Os privilegiados vivem nas alturas, enquanto a massa de trabalhadores oprimidos vive nos subterrâneos, trazendo o desenlace uma reconciliação artificial entre as classes. O que faz de METROPOLIS uma obra-prima é a realização de Fritz Lang, os impressionantes e excecionais cenários futuristas, o domínio absoluto das massas de figurantes, a oposição entre homens e máquinas. É uma obra conhecida pela mutilação a que foi submetida logo depois da sua estreia, que apresentamos na versão do restauro realizado em 2010 a partir da descoberta na Cinemateca Argentina de uma cópia que continha a quase totalidade das cenas perdidas da versão original. Segundo o historiador e arquivista responsável pelo restauro, Martin Koerber, a versão do restauro permite uma nova visão de METROPOLIS. Partindo de Nova Iorque, a sessão introduz diferentes visões da cidade moderna, espelhando um confronto entre as utopias/distopias urbanas que marcaram o imaginário do século XX.
 
07/09/2017, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
O Cinema e a Cidade I
London
de Patrick Keiller
Reino Unido, 1994 - 85 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Os ensaios cinematográficos de Patrick Keiller, LONDON, ROBINSON IN SPACE e ROBINSON IN RUINS, desenham um mapa não-linear da evolução histórica e política da cidade de Londres e do Reino Unido em geral. O extraordinário retrato que Keiller faz de Londres reimagina a cidade através das explorações do “investigador” Robinson, que nunca vemos, e do seu igualmente invisível companheiro, o narrador do filme (Paul Scofield), “tentando conjugar duas linhagens de pensamento crítico: por um lado, a literatura urbana de Poe, Baudelaire, Louis Aragon, Walter Benjamin, entre outros; por outro lado, as visões diversas do declínio do capitalismo inglês, em particular a ideia de que a Inglaterra é uma economia em decadência e atrasada por nunca ter tido uma revolução burguesa de sucesso” (Patrick Keiller).