CICLO
Almada, da Dança das Formas à Imaginação


Ao longo de cerca de 60 anos, José de Almada Negreiros (1893-1970) desenvolveu uma obra multidisciplinar que atravessou o século XX, cruzando a pintura, o desenho, a escrita, a dança, o teatro, a arquitetura, mas também o cinema, como revela a exposição "José de Almada Negreiros: uma maneira de ser moderno" patente no Museu Calouste Gulbenkian, em colaboração com a qual foi concebido este programa. Uma exposição que insiste nesta "conceção heteróclita do artista moderno, desdobrado por múltiplos ofícios".
A par de um conjunto de ensaios sobre cinema ou de alusões ao cinema em textos de cariz mais literário, em que interroga as propriedades do meio e a sua especificidade enquanto arte, Almada apresenta um vasto trabalho na área, que inclui os cartazes e o genérico do filme A CANÇÃO DE LISBOA (1933), cartazes e outros materiais promocionais que concebeu para a Paramount, inúmeros desenhos, os painéis em gesso que fez para a decoração do Cine San Carlos na sua passagem por Espanha no final dos anos vinte, e ainda duas lanternas mágicas desenhadas. Como ator, participou no filme perdido de Mário Huguin, O CONDENADO (1921), e, como realizador, chegou a projetar um filme animado com desenhos geométricos, ou um outro sobre Amadeo de Souza-Cardoso, ideias que nunca concretizou.
Não pretendendo dar conta de todas estas vertentes, o programa concentra-se num conjunto de filmes e de relações entre filmes que apontam para modos concretos de pensar a relação da obra de Almada com o cinema. Na conferência da estreia em Lisboa de BRANCA DE NEVE E OS SETE ANÕES (1938), que intitulou "Desenhos Animados, Realidade Imaginada", Almada deixou pistas em vários sentidos ao enaltecer o cinema de animação da Disney enquanto produto da imaginação ou o regresso do cinema à lanterna mágica. E é entre o universo efabulatório de Walt Disney e as possibilidades da animação abstrata que situamos o “cinema de Almada”, como o situamos entre o trabalho das vanguardas e um cinema mais narrativo dominado pela presença e pela gestualidade de grandes atores (Greta Garbo, Chaplin, mas também Isabel Ruth) ou por uma conceção de arte total devedora dos famosos Ballets Russes, para os quais Almada escreveu um importante manifesto. Mas pensar a relação de Almada com o cinema é antes de mais pensar o cinema enquanto arte por excelência da modernidade, arte do movimento e da metamorfose permanente conotada com a velocidade e com a dança das formas, mas também como arte da imaginação que convoca tantas outras artes.
O Programa inaugura com ALMADA, UM NOME DE GUERRA, “mixed media” de Ernesto Sousa que assume um discurso extremamente singular sobre a obra de Almada e termina com um regresso à magia de Méliès e aos primórdios do cinema e a primeira projeção de seis vidros originais para lanterna mágica de Almada, recém-descobertos.
 
 
30/05/2017, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Almada, da Dança das Formas à Imaginação

Projeção de Vidros de Almada | La Lanterne Magique | Die Abenteuer des Prinzen Achmed | O Naufrágio da Ínsua
duração total da projeção: 75 min | M/6
 
30/05/2017, 22h00 | Sala Luís de Pina
Ciclo Almada, da Dança das Formas à Imaginação

La Fête Espagnole | The Kiss
duração total da projeção: 97 min | M/12
30/05/2017, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Almada, da Dança das Formas à Imaginação
Projeção de Vidros de Almada | La Lanterne Magique | Die Abenteuer des Prinzen Achmed | O Naufrágio da Ínsua
duração total da projeção: 75 min | M/6
Sessão com apresentação

Com acompanhamento ao piano por Filipe Raposo
PROJEÇÃO DE VIDROS DE ALMADA
Portugal, 1929 – 5 min / projeção muda com lanterna mágica
LA LANTERNE MAGIQUE
de Georges Méliès
França, 1903 – 5 min / mudo
DIE ABENTEUER DES PRINZEN ACHMED
As Aventuras do Príncipe Achmed
de Lotte Reiniger, Carl Koch
Alemanha, 1926 – 55 min / mudo, intertítulos em inglês, legendados eletronicamente em português
O NAUFRÁGIO DA ÍNSUA
de José de Almada Negreiros
Portugal, 1934 – 10 min / mudo, intertítulos em português, legendados em inglês

Georges Méliès foi, para Almada, um dos grandes génios do cinema. Nas suas maravilhosas “féeries” encontramos vários dos motivos presentes no trabalho de Almada, que convocamos para esta sessão através de LA LANTERNE MAGIQUE, filme animado por um Pierrot que nos leva às origens do cinema. Inteiramente realizado em sombras chinesas num verdadeiro prodígio de artesanato, DIE ABENTEUER DES PRINZEN ACHMED relaciona-se muito diretamente com seis quadros para lanterna mágica com desenhos recortados e pintados por Almada Negreiros, parte integrante da obra de 1929 La tragedia de Doña Ajada, que tinha também uma componente musical e outra literária. Os desenhos foram fotografados em placas de vidro pintadas, descobertas já depois da inauguração da exposição na Gulbenkian e são apresentadas pela primeira vez desde essa altura em projeção através de uma lanterna mágica. A encerrar a sessão, O NAUFRÁGIO DA ÍNSUA, falsa lanterna mágica ou falso cinema produzido por Almada para animar as noites das férias em Moledo em 1934, cujos 64 desenhos de grande formato foram transpostos para vídeo.
 
30/05/2017, 22h00 | Sala Luís de Pina
Almada, da Dança das Formas à Imaginação
La Fête Espagnole | The Kiss
duração total da projeção: 97 min | M/12
LA FÊTE ESPAGNOLE
de Germaine Dulac
com Éve Francis, Gabriel Gabrio
França, 1919 – 8 min / mudo, sem intertítulos
THE KISS
O Beijo
de Jacques Feyder
com Greta Garbo, Conrad Nagel, Anders Randolf
Estados Unidos, 1929 – 89 min / mudo, intertítulos em inglês legendados eletronicamente em português

Do filme de Germaine Dulac é apresentado apenas um fragmento sobrevivente. Como escreveu Langlois sobre os membros desta Primeira Vanguarda do cinema francês, para eles "estes filmes, não eram o ponto culminante do cinema, mas o início de uma arte nova”. LA FÊTE ESPAGNOLE, na sua relação com um imaginário espanhol, é um exemplo de um cinema mais narrativo realizado por Dulac, que tanto na prática como na teoria se iria dedicar a uma pesquisa sobre as especificidades do cinema. THE KISS é o último filme mudo de Garbo, embora incluindo dois importantes efeitos sonoros (o disparo de uma arma e o toque de um telefone). Diz-se, aliás, que THE KISS só foi mudo porque a MGM receava a reação do público à voz de Garbo. Jacques Feyder dirige brilhantemente este “courtroom melodrama”, em que Garbo é ré por um crime que não cometeu, mas cuja responsabilidade, por amor, assumiu. De modos diferentes, os dois filmes convocam o universo de Almada Negreiros, que consagraria um desenho a Greta Garbo depois de ter visto o filme de Feyder em Madrid. LA FÊTE ESPAGNOLE é exibido em cópia digital.