CICLO
Cinema e Escrita


"Cinema e Escrita", e não "Cinema e Literatura": distinção fundamental no caso deste Ciclo, que convém salientar imediatamente. Não se trata de abordar pela enésima vez o tema das relações entre cinema e literatura (tema quase sempre submergido pela questão da "adaptação") mas de refletir um pouco sobre o modo como o cinema, domínio da imagem, se relacionou e relaciona com a escrita, domínio da palavra, sobre os modos como o cinema incorporou, ou "inscreveu", a escrita, tomada enquanto objeto de natureza textual mas também enquanto atividade. Tema muito vasto, obviamente inesgotável num só Ciclo com esta dimensão, que se preocupa sobretudo em oferecer algumas pistas e dar a ver alguns casos concretos da multiplicidade de formas que essa relação pode tomar. A tradição do "filme epistolar", por exemplo, onde as cartas, reveladas na íntegra ou não, são o motor dramático ou mesmo a principal matéria, e de que abundam exemplos no cinema clássico mas também na modernidade de um filme como o NEWS FROM HOME de Chantal Akerman. Ou o cinema que também é feito "para ler", distinção que por absurdo incluiria todo o cinema mudo com intertítulos mas que também cobre objetos em que o "convite à leitura" tem outro tipo de densidade, do ANEMIC CINEMA de Marcel Duchamp às constelações de fragmentos escritos que povoam tantos filmes de Godard (como NOUVELLE VAGUE). A presença da literatura, ou de um texto ou alusão de cariz literário, não como matéria sujeita a adaptação, mas como dínamo para a narrativa ou para a ação (como sucede no OUT 1 de Rivette). Os casos em que o cinema se reinventou como modo alternativo de pegar em práticas tradicionalmente da ordem da escrita: os filmes-diário, na primeira pessoa ou não, como o WALDEN de Jonas Mekas. Ainda mais peculiares, as experiências que tentaram inscrever a própria crítica de cinema num objeto cinematográfico "comum" (LES CINÉPHILES, de Louis Skorecki), sem esquecer que uma das ideias cruciais para o nascimento do cinema moderno se reportava à dimensão manual do ato da escrita, no texto fundamental de Alexandre Astruc ("La Caméra-Stylo"), aqui representado por LE RIDEAU CRAMOISI. Outras pistas e ideias surgirão pontuadas pelos vários filmes que compõem o Ciclo, mas cabe ainda referir, muito especificamente, esses retratos, bastante alucinados, do processo de criação escrita que são o NAKED LUNCH de Cronenberg e o IN THE MOUTH OF MADNESS de Carpenter, filmes onde o cinema e a escrita se fundem na imaginação de um universo mental.
O Ciclo foi concebido em colaboração com o Projeto Falso Movimento – Estudos sobre Escrita e Cinema, do Centro de Estudos Comparatistas da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, que ao longo dos últimos anos organizou vários seminários e sessões de reflexão sobre o tema, algumas delas realizadas aqui na Cinemateca.
 

 
03/03/2016, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Cinema e Escrita

In a Lonely Place
Matar ou Não Matar
de Nicholas Ray
Estados Unidos, 1950 - 93 min
 
03/03/2016, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Cinema e Escrita

Das Kabinett des Dr. Caligari
O Gabinete do Dr. Caligari
de Robert Wiene
Alemanha, 1919 - 76 min
04/03/2016, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Cinema e Escrita

Journal d’un Curé de Campagned
“O Diário de um Pároco de Aldeia”
de Robert Bresson
França, 1951 - 110 min
04/03/2016, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Cinema e Escrita

Nouvelle Vague
Nouvelle Vague
de Jean-Luc Godard
França, 1990 - 89 min
04/03/2016, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Cinema e Escrita

Out 1 – Spectre
de Jacques Rivette
França, 1972 - 253 min
03/03/2016, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Cinema e Escrita

Em colaboração com o Projeto Falso Movimento – Estudos Sobre Escrita e Cinema
In a Lonely Place
Matar ou Não Matar
de Nicholas Ray
com Humphrey Bogart, Gloria Grahame, Frank Lovejoy, Martha Stewart
Estados Unidos, 1950 - 93 min
legendado em português | M/12

IN A LONELY PLACE foi produzido pela sua estrela, Humphrey Bogart, e tem o cinema como pano de fundo. Bogart interpreta o papel de um argumentista suspeito de ter assassinado brutalmente uma jovem empregada de um restaurante, mas o filme é essencialmente um testemunho sobre a violência que todos temos dentro de nós. “Não se perde um olhar / não é verdade meu irmão Humphrey Bogart?”, como diz o poema de Ruy Belo.

03/03/2016, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Cinema e Escrita

Em colaboração com o Projeto Falso Movimento – Estudos Sobre Escrita e Cinema
Das Kabinett des Dr. Caligari
O Gabinete do Dr. Caligari
de Robert Wiene
com Werner Krauss, Lil Dagover, Conrad Veidt, Friedrich Feher
Alemanha, 1919 - 76 min
mudo, intertítulos em alemão, legendados em português | M/12
“Uma criação sonora pensada especificamente para este fime, com piano, violoncelo e outros instrumentos” por João Caldas e Pedro Rodrigues

CALIGARI deu início ao que os historiadores do cinema denominaram o Expressionismo Alemão, ou, como sugeriu Henri Langlois, o "caligarismo", que se destaca pelos seus cenários e perspetivas deformadas, para representar as visões de um louco. Langlois também observou que este filme violava todas as regras vigentes e “agredia todos os hábitos”, abrindo assim ao cinema alemão as portas de uma conceção moderna do cinema. E o cinema alemão dos anos vinte, feito a seguir a CALIGARI, seria da mais alta ambição e da mais alta qualidade.

04/03/2016, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Cinema e Escrita

Em colaboração com o Projeto Falso Movimento – Estudos Sobre Escrita e Cinema
Journal d’un Curé de Campagned
“O Diário de um Pároco de Aldeia”
de Robert Bresson
com Claude Laydu, Armand Guibert, Nicole Ladmiral
França, 1951 - 110 min
legendado eletronicamente em português | M/12

JOURNAL D’UN CURÉ D’UN CAMPAGNE, que muitos consideram como a obra-prima de Bresson, é uma adaptação de um romance de Georges Bernanos e uma peça fundamental na definição da estética (e da ética) do cineasta francês. É o filme em que Bresson filma aquilo a que chamou o “realismo interior”, onde o que conta é a pintura dos estados de alma e a exposição, nunca demonstrativa, da angústia do protagonista. Foi o filme que consagrou Bresson junto da crítica.

04/03/2016, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Cinema e Escrita

Em colaboração com o Projeto Falso Movimento – Estudos Sobre Escrita e Cinema
Nouvelle Vague
Nouvelle Vague
de Jean-Luc Godard
com Alain Delon, Domiziana Giordano
França, 1990 - 89 min
legendado em português | M/12

NOUVELLE VAGUE é uma das obras-primas absolutas de Jean-Luc Godard, magistral teia de corpos e formas, cores e sons, textos e vozes. Alain Delon é filmado como nunca ninguém o filmou numa história de eterno retorno: de palavras, de seres, de sentimentos. “História eterna da história que se repete. A história das mulheres apaixonadas e dos homens solitários (…) A história do indivíduo condenado a ser múltiplo” (Jean-Luc Douin).

04/03/2016, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Cinema e Escrita

Em colaboração com o Projeto Falso Movimento – Estudos Sobre Escrita e Cinema
Out 1 – Spectre
de Jacques Rivette
com Michel Lonsdale, Bulle Ogier, Jean-Pierre Léaud, Bernadette Lafont, Françoise Fabian, Juliet Berto
França, 1972 - 253 min
legendado eletronicamente em português | M/12
In Memoriam Jacques Rivette

OUT 1 na sua versão SPECTRE, na primeira apresentação de um filme de Rivette na Cinemateca depois da sua morte. Duas companhias de teatro ensaiam uma tragédia grega. Um jovem, inspirado em Balzac, procura encontrar as treze personagens ligadas a uma hipotética conspiração. Mais do que a história o que importa é “a liberdade de filmar”. Liberdade da câmara em planos-sequência atentos a tudo e todos, e dos atores que, em grande parte, improvisam os seus textos. “Uma reflexão sobre a dilatação da realidade cinematográfica”, segundo as palavras de Michel Grisolia. A apresentar em cópia digital. A sessão é dedicada à memória de Jacques Rivette (1928-2016), a cuja obra a Cinemateca há de voltar oportunamente.