CICLO
Chris Marker – A Memória Das Imagens (Parte II)


O programa de dezembro retoma a obra de Chris Marker (1921-2012), cineasta que contribuiu decisivamente para a renovação do documentário através da realização de importantes filmes de pendor ensaístico que cruzam vários géneros cinematográficos, incluindo a ficção, como revela esta segunda e última parte do Ciclo. Partindo do início dos anos setenta, retomamos assim o período mais explicitamente militante da obra de Marker com LE FOND DE L’AIR EST ROUGE (1977), o filme-colagem com que culmina esta fase e uma poderosa análise audio-visual dos movimentos revolucionários do século XX. Da primeira metade dos anos setenta é ainda L’AMBASSADE (1973), que aponta para o modo como o cineasta tão bem soube subverter fronteiras: sob a aparência de um filme amador, surge-nos como uma especulativa ficção em torno de um golpe de Estado num país inventado. Regressamos também a SANS SOLEIL (1982), a importante longa-metragem em que a memória individual se interliga com a História, num poderoso ensaio cinematográfico enformado por uma visão subjetiva de um mundo extremamente vasto e em profunda mutação, que Marker continuará a documentar. É a partir de 1985 que realiza um conjunto de retratos filmados dedicados a amigos próximos ou à aqueles que admira: Simone Signoret (MÉMOIRES POUR SIMONE), Akira Kurosawa (A.K.) Alexandre Medvedkine (LE TOMBEAU D’ALEXANDRE, ao qual já havia dedicado em 1971 LE TRAIN EM MARCHE), Andrei Tarkovski (UNE JOURNÉE D’ANDREI ARSENEVITCH). Filmes que testemunham a profunda cinefilia de Marker e a sua ligação ao cinema soviético e ao Japão.
Mas é também a partir de meados dos anos oitenta que assistimos a uma proliferação do trabalho de Marker por uma grande quantidade de suportes, materializando-se em vídeos de curta duração, que exploram as possibilidades técnicas e estéticas abertas pelas novas tecnologias. Em 1990 concebeu para a exposição Passages de L’Image, que teve lugar no Centre Pompidou, a instalação multimédia Zapping Zone (Proposals for an Imaginary Television), que conheceu inúmeras configurações ao longo dos anos, reunindo muitos dos vídeos que Marker foi realizando e apresentando em vários contextos, que aqui mostramos. LEVEL FIVE (1997), a mais conhecida longa-metragem do cineasta depois de SANS SOLEIL, aponta para o recurso a tais tecnologias, que combinam o mundo real com o virtual, jogos de computador ou imagens transformadas por sintetizadores. É nestas tecnologias que Marker encontra novas possibilidades para cartografar o mundo e a memória na sua relação com a História, ideia que desenvolve no CD-Rom Immemory (1998), cuja estrutura arborescente nos permite ultrapassar a linearidade do tempo. Explorando mundos virtuais na Internet ou criando o seu próprio canal vídeo e um site, Marker não cessou assim de experimentar as possibilidades dos novos meios, produzindo uma obra invulgar.
No contexto deste programa que se pretende exaustivo, apresentamos também uma importante série que, em 1989, Marker realizou para televisão, L’HÉRITAGE DE LA CHOUETTE, em que explorou a relação entre o pensamento grego antigo e o mundo moderno, como forma de questionar o presente. Série cujo protagonismo cabe a uma coruja, emblema da sabedoria e elemento central do “bestiário” de Chris Marker. As corujas, como os gatos, entre os quais Guillaume, o alter-ego de Marker, atravessarão toda a sua obra, como tão bem percebemos ao longo de tantos filmes e vídeos que realizou entre 1952 e 2011.
Complementando este extenso programa, no dia 7 de dezembro, Bernard Eisenschitz, historiador de cinema e crítico que, ao longo dos anos, tem escrito sobre o trabalho de inúmeros cineastas, entre os quais Chris Marker, regressa à Cinemateca para apresentar uma conferência sobre a sua obra.
 
 
02/12/2024, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Chris Marker – A Memória Das Imagens (Parte II)

Le Train En Marche (Portrait D’alexandre Medvedkine) | Une Journée D’andrei Arsenevitch
 
02/12/2024, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Chris Marker – A Memória Das Imagens (Parte II)

L’ambassade | Puisqu’on Vous Dit Que C’est Possible | 2084
03/12/2024, 18h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Chris Marker – A Memória Das Imagens (Parte II)

Le Fond De L’air est Rouge
de Chris Marker
França, 1977 - 180 min
04/12/2024, 19h30 | Sala Luís de Pina
Ciclo Chris Marker – A Memória Das Imagens (Parte II)

Vive La Baleine | Les Hommes de la Baleine | La Mer et les Jours
05/12/2024, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Chris Marker – A Memória Das Imagens (Parte II)

From Chris to Christo | Matta ‘85 | Mémoires Pour Simone
02/12/2024, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Chris Marker – A Memória Das Imagens (Parte II)

Em colaboração com a Festa do Cinema Francês
Le Train En Marche (Portrait D’alexandre Medvedkine) | Une Journée D’andrei Arsenevitch
LE TRAIN EN MARCHE (PORTRAIT D’ALEXANDRE MEDVEDKINE)
França, 1971 – 32 Min

UNE JOURNÉE D’ANDREI ARSENEVITCH
França, 1999 – 55 min

filmes de Chris Marker
duração total da projeção: 87 min
legendados eletronicamente em português | M/12

LE TRAIN EN MARCHE centra-se na experiência revolucionária de Alexandre Medvedkine que, nos anos 1930, transformou um comboio num estúdio de cinema móvel, procurando retratar a vida das pessoas pela URSS fora e usando o “cinema como uma arma poderosa, capaz de reconstruir o mundo.” (A. Medvedkine). UNE JOURNÉE D’ANDREI ARSENEVITCH é o filme de uma amizade, o retrato de Tarkovski por Chris Marker a partir da rodagem de
O SACRIFÍCIO, o seu último filme. “Estava a inaugurar a minha câmara de vídeo portátil, uma novidade na altura, e fiz uma série de imagens sem projeto preciso, para testar a besta e pelo prazer de conservar momentos de um génio a trabalhar. (…) Quando os primeiros sinais do seu cancro surgiram, e ele teve que trabalhar no seu filme à distância (a montagem decorria em Estocolmo), fez-me saber que gostaria que se conservasse um rasto desta prova na sua vida, e a rodagem, começada ao sol e com boa disposição em Gotland, tinha continuado à medida que o inverno e a doença lhe mudassem a cor. Foi portanto naturalmente que me pediu que registasse a chegada de Andrioucha a Paris” (Chris Marker, 2000).
 
02/12/2024, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Chris Marker – A Memória Das Imagens (Parte II)

Em colaboração com a Festa do Cinema Francês
L’ambassade | Puisqu’on Vous Dit Que C’est Possible | 2084
L’AMBASSADE
França, 1973 – 21 Min

PUISQU’ON VOUS DIT QUE C'EST POSSIBLE
França, 1973 – 43 min

2084
França, 1984 – 10 min

filmes de Chris Marker
duração total da projeção: 74 min
legendados eletronicamente em português | M/12

L’AMBASSADE surge como resposta de Chris Marker ao golpe de Estado de Pinochet em 1973 no Chile. O filme assume a aparência de umas filmagens em Super 8 supostamente encontradas numa embaixada, onde ativistas políticos se refugiaram após um golpe de Estado militar. Mas os acontecimentos – e o cenário onde ocorrem – não são o que parecem à primeira vista. Do mesmo ano que L’AMBASSADE, PUISQU’ON VOUS DIT QUE C’EST POSSIBLE é um filme realizado entre muitas mãos, que acompanha os avanços dos trabalhadores da fábrica Lip, que depois de uma negociação falhada com a direção da empresa, se lançam num processo de autogestão. Marker assumirá ainda a montagem do filme. Produzido em 1984, 2084 interroga o futuro a propósito do centésimo aniversário do sindicalismo em França, revelando-nos como Marker transforma uma encomenda num pequeno filme extremamente inspirado, transgredindo os géneros. Os dois últimos filmes são primeiras exibições na Cinemateca. A apresentar em cópias digitais.
 
03/12/2024, 18h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Chris Marker – A Memória Das Imagens (Parte II)

Em colaboração com a Festa do Cinema Francês
Le Fond De L’air est Rouge
de Chris Marker
França, 1977 - 180 min
legendado em português | M/12
Pode filmar-se o “ar do tempo”? Chris Marker mergulhou nos arquivos e fez a crónica, simultaneamente épica e intimista, de dez anos (1967-1977) de contestação do sistema político-económico mundial – apropriadamente, o argumento do filme subintitula-se “cenas da terceira guerra mundial”. Uma montagem lírico-dialética da Revolução em curso, da guerra do Vietname às manifestações de estudantes, de Che Guevara aos tanques de Praga, da tortura na América Latina aos bombardeamentos americanos com napalm. A história de um fracasso? “Ao longo dos últimos dez anos, um determinado número de homens e de forças (por vezes mais instintivas que organizadas) tentaram tomar em mãos os seus destinos e inverter as peças do jogo. Todos eles falharam nos terrenos que tinham escolhido. Apesar disso, a sua passagem foi aquilo que mais profundamente transformou as condições políticas do nosso tempo. Este filme não pretende senão colocar em evidência algumas etapas desta transformação.” (Chris Marker). A apresentar em cópia digital.
 
04/12/2024, 19h30 | Sala Luís de Pina
Chris Marker – A Memória Das Imagens (Parte II)

Em colaboração com a Festa do Cinema Francês
Vive La Baleine | Les Hommes de la Baleine | La Mer et les Jours
VIVE LA BALEINE
de Chris Marker, Mario Ruspoli
França, 1972 – 18 min

LES HOMMES DE LA BALEINE
de Mario Ruspoli
comentário de Chris Marker
França, 1956 – 24 min

LA MER ET LES JOURS
de Raymond Vogel, Alain Kaminker
comentário de Chris Marker
França, 1958 – 22 min

duração total da projeção: 64 min
legendados eletronicamente em português | M/12

VIVE LA BALEINE é um regresso de Mario Ruspoli, acompanhado por Chris Marker, aos Açores e à caça da baleia, então sujeita a um processo de industrialização, dando sequência a LES HOMMES DE LA BALEINE, realizado quase vinte anos antes. Rodado em 1956 em terras açorianas, o segundo filme da sessão regista uma das últimas operações de caça à baleia com arpão em que Ruspoli filma a captura de uma enorme baleia e as subsequentes operações de desmantelamento e armazenamento, que contribuem para a destruição de uma espécie. Um documentário inscrito no universo de memórias familiares e pessoais do seu realizador, cujo comentário foi já escrito por Chris Marker. LA MER ET LES JOURS corresponde a uma crónica dos dias de inverno na Ilha de Sein na Bretanha e um testemunho das operações de salvamento dos sobreviventes do naufrágio de uma traineira de Concarneau. Alguns dias mais tarde, enquanto filmavam a tempestade a bordo do barco de socorro, o Vice-Amiral Touchard, um dos cineastas, Alain Kaminker, caiu à água. O corpo foi encontrado num local da ilha, onde foi enterrado segundo a vontade da sua família. O filme pertence à melhor tradição do documentário dos anos 50, apoiado numa construção ficcional, tornando os pescadores em heróis de corpo inteiro. O comentário foi escrito por Chris Marker, amigo próximo de Kaminker e da sua irmã Simone Signoret. VIVE LA BALEINE  e LES HOMMES DE LA BALEINE são apresentados em cópias digitais.
 
 
05/12/2024, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Chris Marker – A Memória Das Imagens (Parte II)

Em colaboração com a Festa do Cinema Francês
From Chris to Christo | Matta ‘85 | Mémoires Pour Simone
FROM CHRIS TO CHRISTO
França, 1985 – 24 min

MATTA ‘85
França, 1985 – 14 min

MÉMOIRES POUR SIMONE
França, 1986 – 63 min

filmes de Chris Marker
duração total da projeção: 101 min
legendados eletronicamente em português | M/12
Em setembro de 1985, Christo embalou a Pont Neuf em mais uma intervenção artística de forte impacto visual. Marker filmou esse gesto e a reação das pessoas face a tal projeto monumental. No mesmo ano, o cineasta realizou um retrato do seu amigo, o pintor surrealista chileno Robert Matta, que nos conduz numa visita à exposição que lhe foi consagrada pelo Centre Pompidou. Ambos os vídeos foram integrados na instalação interativa Zapping Zone (Proposals for an imaginary television), apresentada também no Pompidou. Amigo que acompanhou de muito perto a vida da atriz Simone Signoret (1921-1985), Chris Marker partiu dos seus arquivos pessoais, conservados por si e pelo seu marido, Yves Montand, para lhe dedicar uma terna homenagem. Como descreve no comentário do filme, não se trata de um relato da sua vida, mas de “uma viagem através das imagens que Simone guardou”. Primeiras exibições na Cinemateca. A apresentar em cópias digitais.