CICLO
Alain Tanner: Um Suíço em Fuga


Antes de se iniciar na realização, Alain Tanner (1929-2022) foi um entusiasta de uma nova cultura, aquela que, como escreveu Freddy Buache, o antigo diretor da Cinemateca Suíça, “ajuda a viver”: a cinefilia. Fundou com Claude Goretta o Cineclube Universitário de Genebra, tendo difundido essa cultura cinéfila pelo território, com apresentações e palestras animadas por autores, tais como Jean Painlevé, Georges Rouquier e Georges Franju. Após um estágio no British Film Institute, onde organizou os arquivos e traduziu filmes, Tanner e Goretta iniciaram-se na prática do cinema, com um dos mais belos filmes de todos os programas do movimento Free Cinema, NICE TIME, “uma série de impressões sobre a realidade do sábado à noite”, descreveu-o assim o próprio. No ano quente de 1968, regressado à Suíça, funda o Grupo 5 com Goretta, Jean-Louis Roy, Michel Soutter e Jean-Jacques Lagrange (substituído em 1971 por Yves Yersin). Este núcleo do novo cinema suíço investe na produção de filmes realizados de maneira, outra vez nas palavras de Buache, “livre e assumidamente pessoal”, que eram transmitidos na TV suíça após terem distribuição comercial em sala. Será, embalado por este contexto de produção e distribuição, que Tanner se estreia na longa-metragem de ficção com CHARLES MORT OU VIF, em que François Simon interpreta um proprietário de uma fábrica de relógios que desaparece subitamente, decidido a mudar de vida. Valeu-lhe o grande prémio em Locarno. Todas estas erupções e irrupções, por vezes, tão violentas que geram mudanças de vida, não serão infrequentes no cinema de Tanner, apresentando-se este repleto de “errâncias” e “desvios”, nomeadamente na sua fase lisboeta, em filmes como DANS LA VILLE BLANCHE e REQUIEM.
O presente Ciclo recorda Alain Tannner (que esteve na Cinemateca para acompanhar o Ciclo e o catálogo que lhe foram dedicados em 1987) concentrando-se apenas na sua fase suíça, nomeadamente nos primeiros sucessos, na qual procurava lidar, de alguma maneira, com o estertor das promessas revolucionárias de 1968, algo muito evidente no primeiro grande sucesso popular de Tanner, LA SALAMANDRE, história, co-assinada pelo inglês John Berger, sobre falsos movimentos, inconformismo e amoralidade no coração da classe trabalhadora suíça. As tensões de classe, o ennui burguês e fugas várias – por exemplo, em LE RETOUR D’AFRIQUE, o casal cansado das comodidades burguesas faz as malas e parte para a Argélia – são mostrados de uma forma desafetada e distanciada, devedora de Brecht mas também reveladora das raízes documentais do seu cinema, a que acresce uma vontade de escapar à linguagem audiovisual mainstream, da televisão e da publicidade, alinhando-se Tanner com a ideia godardiana de que a revolução é tanto uma questão de fundo quanto de forma. JONAS QUI AURA 25 ANS EN L’AN 2000, também co-escrito por John Berger, talvez possa ser visto como o LA CHINOISE do pós-Maio de 68: vários homens e mulheres encaram os anos revolucionários – “A política já não serve para nada”, lamenta um deles – e perguntam-se sobre as voltas que a vida deu ou, como se interroga o professor Marco frente aos seus alunos, “de que são feitas as dobras do tempo?”. 
 
 
30/11/2022, 19h00 | Sala Luís de Pina
Ciclo Alain Tanner: Um Suíço em Fuga

Les Années Lumière
Os Anos de Luz
de Alain Tanner
França, Suíça, Irlanda, 1981 - 105 min
 
30/11/2022, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Alain Tanner: Um Suíço em Fuga

Charles Mort ou Vif
O Último a Rir
de Alain Tanner
Suíça, 1969 - 94 min
30/11/2022, 19h00 | Sala Luís de Pina
Alain Tanner: Um Suíço em Fuga
Les Années Lumière
Os Anos de Luz
de Alain Tanner
com Trevor Howard, Mick Ford, Bernice Stegers, Henri Virlojeux, Odile Schmitt
França, Suíça, Irlanda, 1981 - 105 min
legendado em português | M/12
O reencontro de Alain Tanner com “Jonas, que tem 25 anos no ano 2000”, data em que a narrativa do filme se situa. Mas essa é, como numa private joke, a única relação óbvia com o muito mais conhecido filme de 1975, sendo LES ANNÉES LUMIÈRE uma insólita parábola, quase em regime de ficção científica “distópica”, sobre um mundo pós-apocalíptico, com centro na relação entre Jonas (Mick Ford) e um velho eremita russo (Trevor Howard). À época o filme dececionou mesmo os maiores entusiastas de Tanner. A redescobrir, portanto.

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30/11/2022, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Alain Tanner: Um Suíço em Fuga
Charles Mort ou Vif
O Último a Rir
de Alain Tanner
com François Simon, Marcel Robert, Marie-Claire Dufour
Suíça, 1969 - 94 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Primeira longa-metragem de ficção de Tanner (grande prémio do Festival de Locarno 1969), CHARLES MORT OU VIF segue a personagem de um proprietário de uma fábrica de relógios que desaparece subitamente, decidido a mudar de vida. “Feito sob o signo de Maio, surge, naturalmente, marcado pela rutura, da recusa assumida por uma certa burguesia enfastiada com os seus valores (ou a falta deles)” (Manuel Cintra Ferreira). A apresentar em cópia digital.

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