CICLO
ANIM: 20 Anos (I)


No dia 6 de outubro de 1996 abriram-se as portas do ANIM – o Arquivo Nacional das Imagens em Movimento, no concelho de Bucelas – que se tornou desde então o centro de trabalho em que passou a exercer-se toda a função conservadora da Cinemateca. Concentrando e substituindo os depósitos de filmes e serviços técnicos anteriores (que entretanto se tinham estendido por quatro lugares distintos, na cidade e arredores), alargando muito as valências desses serviços de modo a incluir todo o arco de conservação patrimonial – da prospeção de obras perdidas à organização da disponibilização pública, passando pela conservação, o restauro e a descrição do património cinematográfico em sentido lato (filme e não-filme) – o ANIM é o alicerce e o corpo central em que assentam as componentes mais visíveis da casa (aquelas que para muitos são “a” Cinemateca). Não é este o lugar e o momento para fazermos a história do que nos levou até aí e do que se passou desde aí. Como parte de uma história maior, o registo desse caminho está nos nossos intentos, havendo na atual equipa vontade clara para o fazer, prosseguindo o que antes foi feito nesse campo e deixando a outros, vindouros, elementos que lhes caberão tratar. Mas este é justamente um bom momento para voltar a inverter os termos da habitual perceção pública deste trabalho, colocando o arquivo no centro das atenções. Mais do que comemorar, estão em causa duas outras coisas necessárias e porventura urgentes. Por um lado, voltar a sublinhar uma identidade – uma ideia de cinemateca que ficou bem expressa, também ela, na redefinição orgânica levada a cabo nessa década de noventa, na qual a Cinemateca, enquanto museu de cinema, é também o arquivo nacional, e é antes de tudo o mais a interligação permanente entre os espaços de arquivo, documentação e divulgação. Por outro, convidar a um melhor conhecimento público das infraestruturas de arquivo e das grandes transformações que as estão a marcar, trazendo para as nossas salas debates que estão a atravessar o mundo das cinematecas, e, com isso, em comunidade mais alargada, consolidar um caminho que é também de futuro.
Assinalando a data redonda dos 20 anos, levam-se então a cabo várias iniciativas no e com o setor de arquivo da Cinemateca, que se prolongarão durante os próximos meses, até inícios de 2017. Nelas vamos falar não apenas de nós mas dos arquivos e do trabalho de arquivo, e vamos começar por fazê-lo através destes dois Ciclos, de algum modo complementares.
 

O TRABALHO DOS ARQUIVOS
Restauros, tiragens especiais, o lugar do analógico e o lugar do digital | Sala M. Félix Ribeiro

São dez grandes filmes que foram objeto de trabalhos especiais de arquivo nos últimos anos. Sabendo-se que casos destes têm sido recorrentes na programação da Cinemateca, o que marca a iniciativa é portanto a reunião dos títulos por esse motivo, convidando à discussão não apenas das obras mas também das estratégias que estão por trás da recuperação delas e do modo como nos são dadas a ver. Vivemos um período em que, na sequência da generalizada conversão industrial à tecnologia digital, o trabalho de salvaguarda e transmissão da História do cinema foi e está a ser objeto de alterações macroscópicas, de redefinição de prioridades e de debates fundamentais sobre os efeitos daquela conversão. Tendo marcado um rumo nesse novo contexto (vide a título de exemplo documento estratégico “A Cinemateca em contexto de mudança” no nosso sítio web), tendo insistido tanto quanto possível na oferta da experiência cinematográfica conforme à tecnologia original ao mesmo tempo que na necessidade de digitalização em alta definição para fins de acesso descentralizado, a verdade é que temos também aberto estas salas ao contacto com as diferentes soluções, e, desta vez, convidamos ao contacto explícito com exemplos de referência delas. O que é uma migração tecnológica e o que é um restauro? Face ao património conservado de um século de cinema analógico, qual o papel do digital? Suscitando de novo o debate (que voltará a ser mais formalizado noutros momentos ao longo dos próximos meses), começamos por este programa dividido entre restauros ou tiragens em película e restauros digitais. No caso das primeiras, trata-se de cópias de 35 mm tiradas por algumas outras cinematecas europeias (que assim também voltamos a homenagear) e pela própria Cinemateca Portuguesa-Museu do Cinema. No caso do digital, todos os exemplos mostrados são resultado de trabalhos (de digitalização ou de digitalização e restauro) levados a cabo pelo laboratório nova-iorquino Cineric (com o qual a Cinemateca mantém um acordo de parceria) neste caso para os arquivos de duas “majors” americanas, a Fox e a Sony (produções clássicas Columbia), que prontamente quiseram também juntar-se à iniciativa. Incluídas neste programa, as sessões de TRISTANA e de O SÉTIMO SELO são também, e respetivamente, de homenagem a José María Prado e Catherine Gautier, da Filmoteca Española, e do assinalar da data do Dia Mundial do Património Audiovisual.
 

A CRIAÇÃO COM OS ARQUIVOS
O património cinematográfico português em novas produções que utilizam material de arquivo | Sala Luís de Pina

Paralelamente ao trabalho dos arquivos, evocamos o trabalho com eles. Neste pequeno Ciclo, damos a ver exemplos de novas produções com base relevante de material de arquivo, e concretamente material do arquivo da Cinemateca Portuguesa-Museu do Cinema. Quisemos que fosse uma mostra exemplificativa (de modo nenhum exaustiva sobre a crescente atividade que também no nosso país tem sido desenvolvida neste campo) e quisemo-la variada, tanto na natureza das produções como no tipo de relação que estabelecem com os arquivos. Apresentamos assim filmes contemporâneos pensados de raiz, e de modos inovadores, a partir dessa relação, e apresentamos programas televisivos (ou episódios de séries televisivas) cuja estrutura assenta, também ela, no diálogo entre o discurso presente, o exercício da memória e essa matéria de arquivo. Sem surpresa, uma parte significativa tem a ver com a história do cinema feito em Portugal – o que é também uma chamada de atenção para essa nova história em curso, agora escrita com a própria imagem em movimento, tão desenvolvida internacionalmente desde a década de oitenta do século passado e que entretanto também foi arrancando entre nós. De modo geral, o que está em causa é porém toda a questão moderna – aberta, porventura ainda apenas entrevista ou esboçada – da relação permanente, agora também no campo do cinema, entre criação e reutilização, num movimento que, devendo muito à evolução dos arquivos, não deixa de os interpelar. Um tema que naturalmente vem bastante de trás (o filme de compilação, ou de montagem) mas que percorre hoje caminhos muito diferentes e em constante reformulação. Um tema que não é novo nestas salas e que terá continuação nos meses seguintes.   
01/10/2016, 18h30 | Sala Luís de Pina
Ciclo ANIM: 20 Anos (I)

Welt Spiegel Kino
“Mundo Espelho Cinema”
de Gustav Deutsch
Áustria, 2005 - 93 min
 
01/10/2016, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo ANIM: 20 Anos (I)

The Hustler
A Vida é um Jogo
de Robert Rossen
Estados Unidos, 1961 - 134 min
 
03/10/2016, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo ANIM: 20 Anos (I)

Fat City
Cidade Viscosa
de John Huston
Estados Unidos, 1972 - 100 min
03/10/2016, 18h30 | Sala Luís de Pina
Ciclo ANIM: 20 Anos (I)

Da Invicta ao Sonoro – Cinema Português 1915-1930
de Jorge Queiroga
Portugal, 1997 - 49 min | M/6
03/10/2016, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo ANIM: 20 Anos (I)

Bunny Lake is Missing
Desapareceu Bunny Lake
de Otto Preminger
Estados Unidos, 1965 - 107 min
01/10/2016, 18h30 | Sala Luís de Pina
ANIM: 20 Anos (I)
Welt Spiegel Kino
“Mundo Espelho Cinema”
de Gustav Deutsch
Áustria, 2005 - 93 min
sem diálogos | M/6
A Criação com os Arquivos
Gustav Deutsch considera este seu filme como um "work in progress", nada impedindo que, no futuro, lhe acrescente mais imagens e mais "secções", que poderão ser apresentadas em "diferentes combinações". Exemplo do labor de Gustav Deutsch no âmbito da chamada "found footage", WELT SPIEGEL KINO centra-se em torno de imagens de salas de cinema, dos filmes nelas projetados, e dos seus potenciais espectadores, sempre provenientes de tempos remotos: Viena 1912, Surabaya 1929, São Mamede de Infesta 1929. O "mundo [como] espelho [do] cinema", ou "o cinema [como] mundo [do] espelho" – ou outra combinação: também aqui, várias parecem possíveis. Todas as imagens do episódio português foram encontradas no ANIM.
01/10/2016, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
ANIM: 20 Anos (I)
The Hustler
A Vida é um Jogo
de Robert Rossen
com Paul Newman, Piper Laurie, George C. Scott, Jackie Gleason
Estados Unidos, 1961 - 134 min
legendado eletronicamente em português | M/12
O Trabalho dos Arquivos
Filme de um dos mais celebrados papéis de Paul Newman, THE HUSTLER é também um modelo de uso do CinemaScope com a fabulosa fotografia de Eugen Schuftan. Newman é um talentoso jogador de snooker (Eddie Felson) enredado nos esquemas de um grupo de gangsters e num processo de destruição cuja vítima será a mulher que ama. Paul Newman repetiu personagem e papel 25 anos depois em THE COLOR OF MONEY, de Scorsese, alcançando então o Óscar, que em 1961 perdeu para Maximilian Schell. A apresentar em cópia digital resultante do restauro produzido pelo laboratório Cineric para a 20th Century Fox Film Corporation.
03/10/2016, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
ANIM: 20 Anos (I)
Fat City
Cidade Viscosa
de John Huston
com Stacy Keach, Jeff Bridges, Candy Clark, Susan Tyrell
Estados Unidos, 1972 - 100 min
legendado eletronicamente em português | M/12
O Trabalho dos Arquivos
FAT CITY é um filme surpreendentemente moderno, parecendo ter sido feito por um jovem realizador. Com uma mise-en-scène lacónica e elíptica, que nada tem a ver com o cinema americano industrial, John Huston mostra o itinerário de dois lutadores de boxe que se cruzam, um em decadência, o outro em ascensão. Um filme pungente sobre a solidão e a derrota. Um dos pontos altos da obra de Huston. A apresentar em cópia digital do restauro da Sony Pictures Entertainment a partir da digitalização feita pelo laboratório Cineric.
03/10/2016, 18h30 | Sala Luís de Pina
ANIM: 20 Anos (I)
Da Invicta ao Sonoro – Cinema Português 1915-1930
de Jorge Queiroga
Portugal, 1997 - 49 min | M/6
A Criação com os Arquivos

Com a presença de Jorge Queiroga
DA INVICTA AO SONORO – CINEMA PORTUGUÊS 1915-1930 é o segundo dos oito episódios da série “História do Cinema Português 1896-1996”. Aqui, o foco recai na primeira tentativa de criação de um estúdio de cinema português de grandes dimensões: a histórica Invicta Film, sediada no Porto. Apesar de uma atividade relevante, onde se destaca a adaptação de clássicos literários portugueses, a produtora acabaria por encerrar definitivamente em 1928 e ficar na história como um dos atores intermitentes da atividade cinematográfica, em Portugal, durante os anos vinte. Ao chamar a si vários realizadores estrangeiros, procurou extrair lições para uma indústria que procurava instalar-se, na altura, numa sociedade em ebulição política, objetivos esses que acabariam apenas por acontecer, de forma mais clara, com a transição para o cinema sonoro, o nascimento do Estado Novo e a chegada de uma primeira geração de cineastas portugueses. Primeira exibição na Cinemateca.
03/10/2016, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
ANIM: 20 Anos (I)
Bunny Lake is Missing
Desapareceu Bunny Lake
de Otto Preminger
com Laurence Olivier, Carol Lynley, Keir Dullea, Noel Coward, Martita Hunt, Finlay Currie
Estados Unidos, 1965 - 107 min
legendado eletronicamente em português | M/12
O Trabalho dos Arquivos
Adaptação do romance de Evelyn Piper: uma história de pesadelo, na linha de PSYCHO, sobre o alegado desaparecimento de uma criança de quatro anos, em Londres, que parece ser desconhecida de todos. Filmado a preto e branco CinemaScope, BUNNY LAKE IS MISSING é para muitos uma das obras mais ousadas e insólitas de Preminger. A apresentar em cópia digital resultante do restauro da Sony Pictures Entertainment a partir da digitalização feita pelo laboratório Cineric.