CICLO
Realizador Convidado: Adolfo Arrieta


São inúmeras as grafias do seu nome que Adolfo Arrieta adoptou ao longo dos anos – Adolpho, Udolfo, Ado, Arrietta com dois tês - mas todas essas reescritas e rasuras, se por um lado rimam o trabalho incessante do cineasta sobre os seus filmes (remontou vários ao longo dos anos), por outro configuram uma espécie de gag a sublinhar o carácter fugidio do realizador e da sua obra, que ainda são, quase sessenta anos depois do seu momento inicial, um tesouro bem guardado do cinema europeu, e particularmente do cinema feito entre Espanha (onde Arrietta nasceu) e França (onde se instalou durante muitos anos). Espanha e França foram também países por onde se moveu Luis Buñuel, naturalmente uma das inspirações de Arrieta – a quem explicitamente prestou homenagem numa curta que vamos ver, DRY MARTINI. Mas seus primeiros filmes, nos anos 60, têm títulos quase-buñuelianos, EL CRIMEN DE LA PIRINDOLA ou LA IMITACIÓN DEL ÁNGEL, e não em vão, não é menos certo é que o seu fascínio de juventude pendia mais para Jean Cocteau, autor a cuja obra, através de uma peculiar mistura de surrealismo, fantasia e romantismo, voltou diversas vezes. É preciso frisar que, em Espanha ou em França, Arrieta filmou por sistema na margem da margem, por tuta e meia, totalmente alheado dos circuitos de produção e distribuição comercial. Se é hoje bem conhecido o cinema underground americano de 60 e 70, talvez não o seja tanto o seu hipotético equivalente europeu, história em que o nome de Arrieta é altamente relevante. Um filme como LES INTRIGUES DE SYLVIA KOUSKI, e para lá do que vem do lirismo e da idiossincrasia de Arrieta, pode ser visto - como certos filmes de Jonas Mekas, para o caso nova-iorquino - como uma crónica, um testemunho, de um muito específico ecossistema artístico parisiense dessa década.
Jean-Claude Biette, que frequentou esse “ecossistema” (e até é figurante em SYLVIA KOUSKI), referiu-se uma vez à “imitação da negligência” que identificava como uma característica do estilo de Arrieta: um amadorismo radical, em total recusa da correção artística, como maneira de não sacrificar absolutamente nada da incandescência - por vezes muito direta, muito vinda da “vida” de todos os dias, outras mediada pela arte e pela literatura - da sua poesia e do seu imaginário, feitos de um invulgar casamento entre a brutalidade material (a imanência de cada plano, cada corte, cada som) e os caminhos para um universo fantasioso, romântico ou memorial, que nunca exclui cabalmente o arcaismo surrealista mesmo se não se pode resumir a ele.
A retrospetiva que propomos, com a presença do próprio realizador, não é a primeira dedicada a Arrieta que se faz no nosso país mas será a mais completa. Para além dos filmes e da presença do Arrieta, a apresentação da obra é complementada (como tem sido habitual no contexto e no espírito da rubrica Realizador Convidado, inaugurada por Pedro Costa em 2015) com uma Carta Branca que tem – como o espectador que siga o ciclo facilmente entenderá – um carácter profundamente luminoso no foco que lança sobre os seus filmes. Certamente, um dos grandes momentos da nossa programação deste ano.
 
01/06/2022, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Realizador Convidado: Adolfo Arrieta

Le Sang d’un Poète | La Imitación del Ángel
duração total da projeção: 75 min
01/06/2022, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Realizador Convidado: Adolfo Arrieta

Les Dames du Bois de Boulogne | Le Chateau de Pointilly
duração total da projeção: 123 min | M/12
 
02/06/2022, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Realizador Convidado: Adolfo Arrieta

The Roman Spring of Mrs. Stone
A Primavera em Roma de Mrs. Stone
de José Quintero
Reino Unido, 1961 - 103 min
 
02/06/2022, 19h30 | Sala Luís de Pina
Ciclo Realizador Convidado: Adolfo Arrieta

Les Intrigues de Sylvia Couski
de Adolfo Arrieta
França, 1974 - 72 min
03/06/2022, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Realizador Convidado: Adolfo Arrieta

It Had to Be You
Tinhas que Ser Tu
de Don Hartman e Rudolph Maté
Estados Unidos, 1947 - 94 min
01/06/2022, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Realizador Convidado: Adolfo Arrieta
Le Sang d’un Poète | La Imitación del Ángel
duração total da projeção: 75 min
legendados eletronicamente em português | M/12
com a presença de Adolfo Arrieta
LE SANG D’UN POÈTE
de Jean Cocteau
com Enrique Rivero, Lee Miller, Pauline Carton
França, 1932 – 53 min

LA IMITACIÓN DEL ÁNGEL
de Ado Arrietta
com Xavier Grandès, German Portillo, Fernando Mora
Espanha, 1966 – 22 min

Primeira incursão de Cocteau no cinema, LE SANG D’UN POÈTE contém elementos autobiográficos que voltam em várias das suas obras, e algumas das suas obsessões, como os espelhos e a passagem para “o outro lado”. É a primeira parte da “Trilogia de Orfeu” que Cocteau continuou em ORPHÉE e LE TESTAMENT DE ORPHÉE. LA IMITACIÓN DEL ÁNGEL foi o segundo filme realizado por Arrieta (depois de EL CRIMEN DE LA PIRINDOLA), também em película de 16mm a preto e branco, sob inspiração surrealista e mais particularmente sob o signo de Cocteau. Um lirismo que pode ser ao mesmo tempo muito doce e muito venenoso, justapondo ao mundo real um mundo de sonhos e de sombras – o mundo do cinema, o mundo da poesia – onde anjos conspiram em assassínios.

consulte a FOLHA DA CINEMATECA de LE SANG D'UN POÈTE aqui

consulte a FOLHA DA CINEMATECA de LA IMITACIÓN DEL ÁNGEL aqui
 
01/06/2022, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Realizador Convidado: Adolfo Arrieta
Les Dames du Bois de Boulogne | Le Chateau de Pointilly
duração total da projeção: 123 min | M/12
Com a presença de Adolfo Arrieta
LES DAMES DU BOIS DE BOULOGNE
de Robert Bresson
com Paul Bernard, Maria Casarès, Eléna Labourdette
França, 1944 – 85 min / legendado em português

LE CHATEAU DE POINTILLY
de Ado Arrietta
com Xavier Grandès, Françoise Lebrun, Dionys Mascolo
França, 1972 – 38 min / legendado eletronicamente em português

Adaptação para o século XX de um capítulo de Jacques le Fataliste, de Diderot, com diálogos de Jean Cocteau, LES DAMES DU BOIS DE BOULOGNE é uma história de vinganças amorosas, encenações e arrependimentos. Foi o filme que consolidou a reputação de Bresson. O filme, que foi um fracasso comercial absoluto, é a segunda longa--metragem do realizador e a última em que trabalhou com atores profissionais. A partir de então, Bresson preferiu “modelos”, porque “somos complexos e aquilo que o ator projeta não é complexo”. Numa célebre análise publicada à época, André Bazin observou que “a estilização de Bresson constrói-se sobre uma dialética do concreto e do abstrato, pela ação recíproca de elementos contraditórios”. LE CHATEAU DE POINTILLY, rodado em Paris e protagonizado pela genial Françoise Lebrun, é um filme onde as imagens do quotidiano urbano são uma passagem para um mundo próximo de algo entre o sonho, as memórias de infância, e as fábulas clássicas com castelos cheios de segredos, maravilhas e terrores. Filme de imaginações e assombrações, a figuração interior da memória deixa-o na vizinhança de alguns filmes de Resnais ou Marguerite Duras – que não por acaso, esta última, foi grande admiradora de POINTILLY, tendo na altura publicado um texto que ajudou a chamar a atenção sobre Arrieta.

consulte a FOLHA DA CINEMATECA de LES DAMES DU BOIS DE BOULOGNE aqui

consulte a FOLHA DA CINEMATECA de LE CHATEAU DE POINTILLY aqui
 
02/06/2022, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Realizador Convidado: Adolfo Arrieta
The Roman Spring of Mrs. Stone
A Primavera em Roma de Mrs. Stone
de José Quintero
com Vivien Leigh, Warren Beatty, Coral Browne, Lotte Lenya
Reino Unido, 1961 - 103 min
legendado eletronicamente em português | M/12
sessão apresentada por Adolfo Arrieta
Adaptação ao grande ecrã do romance homónimo de Tennessee Williams, este drama ambientado “sob o sol abrasivo de Roma”, como apregoa o trailer do filme, é protagonizado por uma atriz, perto de atingir as 50 primaveras, que enfrenta o ocaso da carreira. Em Roma, Karen Stone (Vivien Leigh), recém enviuvada, lida com o abandono e tenta resistir à tentação de se apaixonar por um gigolô chamado Paolo (Warren Beatty). Manipulando as emoções, e trocando-as por dinheiro, está a condessa Magda Terribili-Gonzales (interpretação de Lotte Lenya que lhe valeu uma nomeação para o Óscar de Melhor Actriz Secundária). Este foi o primeiro e o último filme realizado para o cinema por José Quintero, panamiano que ficou conhecido pelas suas bem-sucedidas encenações de peças de Eugene O’Neill levadas à Broadway. Primeira apresentação na Cinemateca.

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02/06/2022, 19h30 | Sala Luís de Pina
Realizador Convidado: Adolfo Arrieta
Les Intrigues de Sylvia Couski
de Adolfo Arrieta
com Marie-France, Michèle Moretti, Howard Vernon, Xavier Grandès, Gaëtane Gaël
França, 1974 - 72 min
legendado eletronicamente em português | M/16
com a presença de Adolfo Arrieta
As intrigas do título referem as da ex-mulher de um escultor célebre que convence o amante a esconder uma das obras do ex-marido e a substituí-la pelo seu modelo vivo no dia da abertura da exposição onde vai ser exibida. “Os travestis não são eróticos neste filme, são angélicos.O travestismo é algo de completamente mental, espiritual. Não vejo a [personagem de] Marie France como um objeto de desejo mas como um ser angélico. A sua aparição no filme é como a aparição de um anjo” (Adolfo Arrieta).

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03/06/2022, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Realizador Convidado: Adolfo Arrieta
It Had to Be You
Tinhas que Ser Tu
de Don Hartman e Rudolph Maté
com Ginger Rogers, Cornel Wilde, Percy Waram
Estados Unidos, 1947 - 94 min
legendado eletronicamente em português | M/12
sessão apresentada por Adolfo Arrieta
Uma reincidente “noiva em fuga”, interpretada por Ginger Rogers, cede ao amor por um bombeiro encarnado por Cornel Wilde. No entanto, a sua “má reputação” irá dificultar o enlace há muito esperado e demasiadas vezes adiado. Uma comédia romântica que tira partido do carisma de Rogers e da química com a estrela em ascensão, Cornel Wilde. O produtor Don Hartman, também coautor da história aqui adaptada, a dado momento terá passado a realização do filme para as mãos do seu diretor de fotografia, Rudolph Maté, conhecido, entre outros trabalhos, por ter sido o responsável pela fotografia de LA PASSION DE JEANNE D’ARC de Carl Th. Dreyer. Primeira apresentação na Cinemateca.

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