CICLO
70 Anos de Cinemateca


Depois do sinal de partida dado em setembro com a sessão de lançamento do primeiro volume dos Escritos sobre Cinema de João Bénard da Costa, e de acordo com um programa divulgado na reabertura da temporada, arrancamos agora com uma série de iniciativas que visam explicitamente assinalar o septuagésimo aniversário da Cinemateca. Espraiadas no total por um período de nove meses – de novembro de 2018 a julho de 2019 –, estas iniciativas envolvem todos os setores de atividade da casa e têm aqui, durante este mês, na sala M. Félix Ribeiro e nos espaços da sede, três dos seus atos mais simbólicos: o princípio de um longo Ciclo pensado para marcar a data; uma jornada de homenagem ao cinema feito em Portugal (no mesmo dia em que realizamos a “festa de aniversário”); um colóquio com vários convidados sobre o percurso e os desafios da Cinemateca. Num momento que é ainda de encruzilhada histórica – as questões suscitadas na museologia de cinema pela reconversão da indústria ao digital, e, no contexto interno, as limitações e a inadequação estrutural do quadro de funcionamento presente –, o que desejamos é evocar o passado com os olhos postos no futuro. Há que continuar a lançar as bases da Cinemateca das próximas décadas garantindo que isso se faz com a consciência plena do que aqui foi realizado até agora, e do que isso significou em termos nacionais e internacionais. Por outro lado, desejamos que este foco no organismo não se limite a uma discussão concentrada nele, mas, pelo contrário, seja entendido como um elo de uma cadeia mais vasta, em que o que está em causa é a continuação de uma genuína cultura de cinema em Portugal, assim como de uma genuína arte cinematográfica portuguesa. Nenhum destes fenómenos existe separadamente, e a Cinemateca pode e deve ter um papel em todos eles, velando contra o esquecimento, valorizando o património e a criação (entendidos como duas formas de abordagem do que é essencialmente a mesma coisa), e portanto, em última análise, contribuindo para que o debate sobre o cinema em Portugal seja exigente e conhecedor.
 
70 Anos, 70 Filmes
1ª Parte: 35 Histórias da História da Cinemateca (I)
Este é o Ciclo principal que concebemos para evocar explicitamente o aniversário. São 70 obras divididas em dois grandes grupos, um dirigido à história do cinema em articulação com a própria história da casa, outro voltado para o cinema contemporâneo. O primeiro grupo, a apresentar em novembro e dezembro, incluirá alguns exemplos escolhidos dentre o mar de títulos exibidos pela Cinemateca desde 1958, quando começaram as projeções públicas no Palácio Foz. Cada um tem óbvia justificação por si, mas cada um traz também uma história dentro desta história maior – a evocação de um Ciclo particularmente memorável, ou estruturante, na programação da Cinemateca, a lembrança de uma sessão específica, a recordação de uma presença especial… O segundo grupo, a apresentar no primeiro trimestre de 2019, incluirá outras tantas sessões entendidas como uma sugestão de leitura da arte cinematográfica nos dias de hoje – de novo uma pista eclética e assumidamente subjetiva, que a equipa de programação da Cinemateca proporá ao público das nossas salas e que apresentaremos na devida altura.
Por ora, nos últimos dois meses de 2018, eis 35 obras (que, em rigor, são mais do que isso, pois que, como se verá, num dos casos tomámos a liberdade de tomar como “obra” um conjunto coerente de filmes curtos…), através das quais lembramos marcos do nosso caminho. São estas como poderiam ser muitíssimas outras, tão vasta que foi a oferta ao longo destas décadas, em particular desde que, no verão de 1980, iniciámos o regime de sessões diárias na primeira sala construída na Rua Barata Salgueiro. Nem os referidos Ciclos pensados como estruturantes, nem o mapa das tipologias do cinema (categorias de géneros, regimes de produção, representação de regiões ou culturas…), nem a presença de convidados especiais podem ter aqui evocação exaustiva ou sistemática. Para lá de questões relativas ao acesso às cópias (nalguns casos, mais difícil do que na altura do Ciclo evocado, ou até impossível nas circunstâncias presentes), o que contou, portanto, foi a intenção da variedade, o impulso deste outro momento e a própria liberdade da celebração. 
Tratando-se de uma componente especialíssima do nosso panorama de exibição, não é acidental que a relação com o cinema português esteja aqui representada por um único filme – VISITA OU MEMÓRIAS E CONFISSÕES de Manoel de Oliveira. Que a primeira exibição pública do filme nestas salas constituiu um acontecimento memorável e absolutamente singular no percurso da Cinemateca, e, cremos bem, das cinematecas – a de uma grande obra feita e depositada pelo seu autor 33 anos antes com a condição de só ser divulgada post-mortem, e que antes de ser divulgada foi alvo de significativo trabalho de preservação – é algo incontestável. O facto de nos circunscrevermos a ela neste Ciclo particular representa então, ao contrário de uma “limitação”, o facto de preferirmos um gesto de forte simbolismo a uma breve antologia de casos, que, ela sim, neste âmbito específico, seria necessariamente equívoca, ou inconsistente. Num Ciclo de “histórias”, esta é o exemplo que escolhemos para evocar as mil e uma histórias que aqui marcaram, e que aqui continuam regularmente a marcar, o nosso diálogo com o nosso cinema. Fora do Ciclo, mas no âmbito das iniciativas que assinalam o aniversário, a questão do património nacional e a questão da nossa relação com o cinema português estarão, pelo contrário, no centro das atenções. Como será aliás o caso, ainda este mês, com a jornada especial de dia 16.       
 
05/11/2018, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo 70 Anos de Cinemateca

The River
O Rio Sagrado
de Jean Renoir
França, Índia, Estados Unidos, 1951 - 99 min
05/11/2018, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo 70 Anos de Cinemateca

Der Tod der Maria Malibran
“A Morte de Maria Malibran”
de Werner Schroeter
República Federal da Alemanha, 1971 - 109 min
06/11/2018, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo 70 Anos de Cinemateca

The River
O Rio Sagrado
de Jean Renoir
França, Índia, Estados Unidos, 1951 - 99 min
 
06/11/2018, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo 70 Anos de Cinemateca

Tva Människor
“Dois Seres”
de Carl Th. Dreyer
Suécia, 1944 - 78 min
 
06/11/2018, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo 70 Anos de Cinemateca

Fantastic Voyage
Viagem Fantástica
de Richard Fleischer
Estados Unidos, 1966 - 100 min
05/11/2018, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
70 Anos de Cinemateca
The River
O Rio Sagrado
de Jean Renoir
com Adrienne Corri, Patricia Walter, Nora Swinburne, Radha Shri Ran, Esmond Knight, Thomas E. Breen
França, Índia, Estados Unidos, 1951 - 99 min
legendado eletronicamente em português | M/12
70 Anos, 70 Filmes

1ª Parte: 35 Histórias da História da Cinemateca (I)
Uma das obras maiores do cinema que aqui tem sido exibida regularmente, THE RIVER (que foi projetado pela primeira vez na Cinemateca no “Ciclo Jean Renoir” de 1974/75) foi um dos filmes incluídos num ciclo de 1984 (“Robert Flaherty e a herança de Flaherty”, também evocado neste programa a propósito da sessão com MOANA), onde teve uma apresentação muito especial. Nesta segunda passagem, a Cinemateca contou com a presença de Kenneth McEldowney, o mais gentil e inesperado dos produtores de Hollywood, porquanto esta tinha sido a única incursão nessa área de alguém que era conhecido na época como comerciante de flores em Beverly Hills… THE RIVER foi inteiramente filmado na Índia, adaptando o romance homónimo de Rumer Godden sobre a vida de uma família inglesa na região de Calcutá. Obra de uma espiritualidade assombrosamente serena, cuja “ação” se resume ao facto de nascer, morrer e amar pela primeira vez, marca, na obra de Renoir, a transição entre o seu período de exílio americano (no qual, como sempre, assinou filmes belíssimos, mas de sabor nitidamente mais amargo) e as grandes obras finais realizadas em Itália e França. Escapando ao mergulho direto numa civilização de que não era especialista (por via da intermediação da memória de uma família estrangeira), Renoir soube porém tocar como poucos alguns dos traços profundos dessa outra cultura, que filmou num Technicolor deslumbrante trabalhado pelo seu sobrinho Claude Renoir.     
 
05/11/2018, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
70 Anos de Cinemateca
Der Tod der Maria Malibran
“A Morte de Maria Malibran”
de Werner Schroeter
com Magdalena Montezuma, Christine Kaufmann, Ingrid Caven
República Federal da Alemanha, 1971 - 109 min
legendado eletronicamente em português | M/16
70 Anos, 70 Filmes

1ª Parte: 35 Histórias da História da Cinemateca (I)
Werner Schroeter (1945-2010) impôs-se desde as suas primeiras obras como um dos maiores nomes do cinema alemão ao apresentar um universo único, que conjuga domínios como a ópera, o teatro, a literatura e a pintura. Sétima longa-metragem do realizador, DER TOD DER MARIA MALIBRAN é um dos filmes mais célebres e mais belos realizados por Werner Schroeter num período particularmente fecundo do seu trabalho. Inspirando-se no mito de uma célebre cantora de inícios do século XIX, é um filme sobre os mitos da ópera, feito por um apaixonado pelo género, um filme sobre “a voz como extensão da vida, como veículo de libertação e de morte” (José Manuel Costa). Uma das grandes obras de um poeta do cinema, um dos raros cineastas verdadeiramente independentes que aqui teve presenças memoráveis e cujos filmes deixaram uma marca fortíssima, desde o mítico “Ciclo de Cinema Alemão” realizado logo em 1981 (no ano seguinte à abertura da sala na Barata Salgueiro), que cruzava títulos do cinema mudo com o Novo Cinema Alemão, a uma importante retrospetiva, realizada em 2014, já depois da morte de Schroeter.
 
06/11/2018, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
70 Anos de Cinemateca
The River
O Rio Sagrado
de Jean Renoir
com Adrienne Corri, Patricia Walter, Nora Swinburne, Radha Shri Ran, Esmond Knight, Thomas E. Breen
França, Índia, Estados Unidos, 1951 - 99 min
legendado eletronicamente em português | M/12
70 Anos, 70 Filmes

1ª Parte: 35 Histórias da História da Cinemateca (I)
Uma das obras maiores do cinema que aqui tem sido exibida regularmente, THE RIVER (que foi projetado pela primeira vez na Cinemateca no “Ciclo Jean Renoir” de 1974/75) foi um dos filmes incluídos num ciclo de 1984 (“Robert Flaherty e a herança de Flaherty”, também evocado neste programa a propósito da sessão com MOANA), onde teve uma apresentação muito especial. Nesta segunda passagem, a Cinemateca contou com a presença de Kenneth McEldowney, o mais gentil e inesperado dos produtores de Hollywood, porquanto esta tinha sido a única incursão nessa área de alguém que era conhecido na época como comerciante de flores em Beverly Hills… THE RIVER foi inteiramente filmado na Índia, adaptando o romance homónimo de Rumer Godden sobre a vida de uma família inglesa na região de Calcutá. Obra de uma espiritualidade assombrosamente serena, cuja “ação” se resume ao facto de nascer, morrer e amar pela primeira vez, marca, na obra de Renoir, a transição entre o seu período de exílio americano (no qual, como sempre, assinou filmes belíssimos, mas de sabor nitidamente mais amargo) e as grandes obras finais realizadas em Itália e França. Escapando ao mergulho direto numa civilização de que não era especialista (por via da intermediação da memória de uma família estrangeira), Renoir soube porém tocar como poucos alguns dos traços profundos dessa outra cultura, que filmou num Technicolor deslumbrante trabalhado pelo seu sobrinho Claude Renoir.     
 
06/11/2018, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
70 Anos de Cinemateca
Tva Människor
“Dois Seres”
de Carl Th. Dreyer
com Wanda Rothgard, Georg Ryderberg, Gabriel Alw
Suécia, 1944 - 78 min
legendado em francês e eletronicamente em português | M/12
70 Anos, 70 Filmes

1ª Parte: 35 Histórias da História da Cinemateca (I)
Entre janeiro e março de 1983, a Cinemateca organizou um vasto “Panorama do Cinema Dinamarquês”, dividido em três partes: cinema mudo, a obra integral de Carl Th. Dreyer e cinema contemporâneo. Este Ciclo foi acompanhado pelo catálogo mais original entre os muitos que publicou a Cinemateca: um pacote lacrado, que uma vez aberto não podia mais ser fechado, verdadeiro objeto de arte concebido por Carlos Nogueira (que expôs recentemente na Cinemateca “écran cego. e projecção de céu”). Entre os muitos filmes do mestre dinamarquês então totalmente desconhecidos em Portugal revelados naquele Ciclo, TVA MÄNNISKOR foi um dos que mais se destacou. Toda a ação tem lugar num só quarto, em que um jovem é acusado de ter plagiado o trabalho de um velho professor. João Lopes comentou à época: “O filme revela um Dreyer profundamente moderno, particularmente atento àquilo que no teatro pode ser fonte de cinema e abertura inesperada de novos modos de significação”.
 
06/11/2018, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
70 Anos de Cinemateca
Fantastic Voyage
Viagem Fantástica
de Richard Fleischer
com Stephen Boyd, Raquel Welch, Arthur Kennedy, Edmond O’Brien, Donald Pleasance
Estados Unidos, 1966 - 100 min
legendado em espanhol e eletronicamente em português | M/12
70 Anos, 70 Filmes

1ª Parte: 35 Histórias da História da Cinemateca (I)
Com este filme evocamos o “Ciclo Cinema de Ficção Científica”, um dos grandes ciclos de género organizados pela Cinemateca em parceria com a Fundação Calouste Gulbenkian, que decorreu entre novembro de 1984 e fevereiro de 1985. Entre curtas e longas-metragens foram exibidos 136 filmes e editado um catálogo com cerca de 500 páginas. Fleischer voltava aqui aos submarinos depois da passagem pelo Nautilus em 20,000 LEAGUES UNDER THE SEA, para a mais fantástica viagem da ficção científica, com os seus heróis navegando pelas veias do corpo humano até alcançarem o cérebro de um cientista, que sofrera uma hemorragia. Espetaculares efeitos especiais num filme de culto no género.