CICLO
O Ano de 1967 – Terras em Transe


No ano passado dedicámos um ciclo à “viagem fantástica” ocorrida no ano cinematográfico de 1966, carregando a nota de um tempo de transição e de mudanças externas e internas ao cinema (turbulência político-social, “momentum” na cultura pop, estertor do contexto de produção “clássico”, efervescência do “moderno”…). Em 1967, nem o mundo estava mais calmo (novos picos na guerra do Vietname) nem o cinema em transformação mais lenta. Olhando para os filmes estreados em 1967, não se pode senão reforçar a ideia de uma fronteira que está a ser transposta (ou que já foi transposta), ao mesmo tempo que se depara com novas clivagens que suscitarão porventura outras hipóteses de leitura. A par de mais alguns últimos sinais de um universo que vai desaparecer (esta é agora a data do último Chaplin - A CONDESSA DE HONG KONG -, e do penúltimo Hawks - EL DORADO, que exibimos no Ciclo anterior mas na verdade se veio a estrear já no ano seguinte), o ano de 1967 está, tanto ou mais que o precedente, recheado de grandes títulos vindos de uma nova galáxia, mostrando à saciedade a que ponto o cinema todo se está a mover vertiginosamente. Por outro lado, dentro da avalanche do novo, irrompem de facto obras que evidenciam uma descontinuidade ainda maior e cuja diferença dificilmente poderá ser lida apenas como um outro grau das novidades anteriores. O que há de comum entre, por exemplo, WEEK-END de Godard (o último dos três filmes que ele estreia neste ano), TERRA EM TRANSE de Glauber Rocha e os primeiros títulos de Robert Kramer (neste caso em embrião de algo que não cessa de clarificar-se a seguir) começa por ser precisamente a distância que os separa mesmo em relação às obras que os “prepararam”. Mais do que epítomes dos “cinemas novos” lançados na primeira metade da década, mais do que testemunhos da “negação das convenções narrativas clássicas”, o que eles parecem incorporar é uma vontade de disrupção narrativa “tout court”, ou uma vontade de construir uma ordem narrativa radicalmente diferente que dissolve o próprio caminho anterior. Face às brechas que estão a ser abertas por estas e outras obras, bem nos poderemos então interrogar se, entre os dois lados da fronteira anterior (o que chamámos “clássico” e o que chamámos “pós-clássico”, entendendo por este a mudança operada nos anos precedentes) não terá até havido afinal uma proximidade maior do que longamente se pensou, a um nível que pode sugerir toda uma outra cartografia temporal do cinema da época. Foi portanto também pensando nisto - um possível cinema em transe no contexto de uma explosão imensa -, foi pensando naquilo que é, mais uma vez, a fecundidade e a diversidade da produção revelada num único ano, que optámos por prolongar o Ciclo anterior com uma viagem pelas estreias de 1967. A seleção procura exemplificar todas estas vertentes – fim de carreiras clássicas, títulos decisivos da década, diferentes expressões da rutura e de um sentimento de rutura -, basicamente com obras lançadas já no decurso do ano. Entre a lista de que partimos, para além de alguns que nos foi impossível obter, ficaram também de fora, neste caso por opção, filmes que foram aqui exibidos muito recentemente (caso de LES DEMOISELLES DE ROCHEFORT de Demy, mostrado em 2016, e do “opus um” de Frederick Wiseman, TITICUT FOLLIES, projetado em fevereiro deste ano), e filmes que deverão integrar outros Ciclos a realizar muito em breve (como PLAYTIME, de Tati). Quanto a uma das obras icónicas de 1967 – o BONNIE AND CLYDE de Penn -, será exibido em sobreposição com o Ciclo apresentado em paralelo este mês (“The Heartbreak Kids: Warren Beatty & Elaine May”) marcando o diálogo intencional entre as duas mostras. Antes da revisitação da data mítica de 1968 (cujas raízes todas estão já aqui), eis então, meio século depois, um pouco da explosão de 67.
 
 
12/06/2017, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo O Ano de 1967 – Terras em Transe

The Big Shave + The Trip
duração total da projeção: 88 min | M/16
 
12/06/2017, 18h30 | Sala Luís de Pina
Ciclo O Ano de 1967 – Terras em Transe

The Graduate
A Primeira Noite
de Mike Nichols
Estados Unidos, 1967 - 106 min
14/06/2017, 18h30 | Sala Luís de Pina
Ciclo O Ano de 1967 – Terras em Transe

The Big Shave + The Trip
duração total da projeção: 88 min | M/16
14/06/2017, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo O Ano de 1967 – Terras em Transe

Week-End
Fim-de-Semana
de Jean-Luc Godard
França, Itália, 1967 - 102 min
17/06/2017, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo O Ano de 1967 – Terras em Transe

Bonnie and Clyde
Bonnie e Clyde
de Arthur Penn
Estados Unidos, 1967 - 111 min
12/06/2017, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
O Ano de 1967 – Terras em Transe
The Big Shave + The Trip
duração total da projeção: 88 min | M/16
THE BIG SHAVE
de Martin Scorsese
com Peter Bernuth
Estados Unidos, 1967 – 6 min
THE TRIP
de Roger Corman
com Peter Fonda, Dennis Hopper, Susan Strasberg, Bruce Dern
Estados Unidos, 1967 – 82 min / legendado eletronicamente em português

Roger Corman, mestre da série B e mentor de boa parte da geração que formou a Nova Hollywood, filmou Peter Fonda (um dos seus rostos) numa trip de LSD em THE TRIP, um dos filmes mais significativos da contracultura e das novas experiências sociais e políticas em que o mundo mergulhava (o psicadélico filme de Corman viria mesmo a ser um dos mais lucrativos da sua carreira). A abrir a sessão, Martin Scorsese, um dos seus discípulos, alude à tragédia da Guerra do Vietname e ao suicídio coletivo de um país em THE BIG SHAVE, um dos seus mais poderosos filmes.
 
12/06/2017, 18h30 | Sala Luís de Pina
O Ano de 1967 – Terras em Transe
The Graduate
A Primeira Noite
de Mike Nichols
com Dustin Hoffman, Anne Bancroft, Katharine Ross
Estados Unidos, 1967 - 106 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Segundo filme de Mike Nichols (e o seu mais recordado) e a obra que lançou Dustin Hoffman. THE GRADUATE, uma história de “coming of age” da geração de “baby boomers”, tornou-se num dos filmes mais populares de todos os tempos, assim como um dos tiros de partida, com BONNIE AND CLYDE, da Nova Hollywood, e de uma nova estética nos estúdios norte-americanos. Dustin Hoffman faz o papel de um jovem adulto recém-licenciado que, ao passar os dias em casa dos seus pais (por não saber o que fazer à vida), acaba envolvido com uma jovem rapariga (Katharine Ross) e, simultaneamente, com a sua mãe (Anne Bancroft, no papel da famosíssima Mrs. Robinson). Banda sonora de Simon & Garfunkel. Primeira exibição na Cinemateca.
 
14/06/2017, 18h30 | Sala Luís de Pina
O Ano de 1967 – Terras em Transe
The Big Shave + The Trip
duração total da projeção: 88 min | M/16
THE BIG SHAVE
de Martin Scorsese
com Peter Bernuth
Estados Unidos, 1967 – 6 min / legendado eletronicamente em português
THE TRIP
de Roger Corman
com Peter Fonda, Dennis Hopper, Susan Strasberg, Bruce Dern
Estados Unidos, 1967 – 82 min / legendado eletronicamente em português

Roger Corman, mestre da série B e mentor de boa parte da geração que formou a Nova Hollywood, filmou Peter Fonda (um dos seus rostos) numa trip de LSD em THE TRIP, um dos filmes mais significativos da contracultura e das novas experiências sociais e políticas em que o mundo mergulhava (o psicadélico filme de Corman viria mesmo a ser um dos mais lucrativos da sua carreira). A abrir a sessão, Martin Scorsese, um dos seus discípulos, alude à tragédia da Guerra do Vietname e ao suicídio coletivo de um país em THE BIG SHAVE, um dos seus mais poderosos filmes.
 
14/06/2017, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
O Ano de 1967 – Terras em Transe
Week-End
Fim-de-Semana
de Jean-Luc Godard
com Jean Yanne, Mireille Darc, Jean-Pierre Léaud
França, Itália, 1967 - 102 min
legendado em português | M/12
Segundo Godard, um filme "perdido no cosmos" e "encontrado no ferro velho". Em forma de antecipação, WEEK-END é a mais radical parábola sobre a civilização de hoje. Reflexo do mal-estar do seu tempo, o filme de Godard anunciava, um ano antes, o Maio de 68. Um casal em férias, caos e drama ao longo da estrada (com um fabuloso e célebre plano-sequência de um travelling de dez minutos) e estranhos encontros com a história e a ficção (Saint-Just, Alice, Lautréamont, etc.).
 
17/06/2017, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
O Ano de 1967 – Terras em Transe
Bonnie and Clyde
Bonnie e Clyde
de Arthur Penn
com Warren Beatty, Faye Dunaway, Michael J. Pollard, Gene Hackman, Estelle Parsons, Gene Wilder
Estados Unidos, 1967 - 111 min
legendado eletronicamente em português | M/16
Há um antes e depois, em Hollywood, com BONNIE AND CLYDE. O projeto andou a circular entre François Truffaut e Jean-Luc Godard (sinal da ligação da Nova Hollywood à Nova Vaga francesa) até cair nas mãos de Warren Beatty, que avançou, como ator e produtor, para a sua concretização (nunca deixando de cumprir esse papel até ao fim da carreira). O filme, um olhar renovado sobre a história do mítico casal de bandidos, e inicialmente um projeto em que poucos apostavam, veio a tornar-se num tremendo sucesso popular e num dos mais brilhantes exemplos da contracultura norte-americana a tomar conta de uma indústria envelhecida. Atores novos e carismáticos (Beatty, Faye Dunaway, Gene Hackman, Gene Wilder), uma montagem por vezes frenética, e um final cuja violência falava por toda a raiva sentida num país em guerra consigo mesmo. Também programado em “The Heartbreak Kids: Warren Beatty & Elaine May”.