CICLO
Um Dia para Rui Santana Brito


Eleanor Parker, my beautiful, beautiful lady

Rui Santana Brito foi Vice-Presidente da Cinemateca entre 1997 e 2005, ou seja, no período decisivo que se seguiu à criação de novas estruturas e à redefinição orgânica consagrada na lei de 97. Mas o contributo que deu à casa e à cultura cinematográfica no país começou muito antes disso e não terminou com isso. Antes, porque marcara já a história do Centro de Documentação, onde deixara raízes profundas, indissociáveis da sua dupla preparação enquanto documentalista e cinéfilo. Depois, porque a sua saída naquele último ano (em reforma antecipada por motivos de saúde) não foi realmente uma saída, tendo voltado pouco tempo depois como voluntário – um gesto que por si mesmo sintetizou a natureza e o sentido último de toda a sua ligação a este lugar e esta missão.
Esquece-se por vezes quanto a Documentação é uma das bases essenciais de qualquer cinemateca (na verdade, uma das três áreas estruturantes delas desde os primórdios, a par da conservação patrimonial e da programação), e isso tanto enquanto suporte das restantes como enquanto serviço público direto. Este foi o campo de ação de Rui Santana Brito desde que, em 1981, trocou as suas anteriores funções de documentalista no Ministério da Agricultura pelo serviço na Cinemateca, num encontro natural que o terá realizado a ele tanto quanto beneficiou a casa e os utentes dela. O Rui fazia parte das gerações obsessivamente cinéfilas, para as quais o cinema, antes de poder ser uma qualquer profissão, era parte essencial da vida. Dentro desse mundo, os atores eram a sua área de eleição, e portanto uma das áreas do seu imenso saber (estava obviamente relacionada com isso a sua preciosa coleção de fotografias autografadas de atores e atrizes, conhecida no meio, e que a Cinemateca expôs parcialmente em 2005 no contexto da exposição “Vedetas com Tinta”). Da conjugação entre esta paixão, este saber e este novo quadro profissional resultou um corpo importante de trabalho que, insiste-se, deixou contributo decisivo para a identidade e o desenvolvimento desta área no seio da Cinemateca, e que se estendeu ao nível internacional: além de técnico superior de documentação e depois responsável do sector, e além de Vice-Presidente, Rui Santana Brito foi ainda membro da Comissão de Documentação da FIAF (Federação internacional dos Arquivos de Filmes).
Uma síntese desse corpo de trabalho foi feita pela atual responsável pelo Centro de Documentação da Cinemateca, Teresa Borges, em texto evocativo entretanto publicado no nosso sítio Web. Chamando a atenção para essas linhas, limitemo-nos então a lembrar aqui dois marcos especiais: a tradução para português do Thesaurus da FIAF (Federação internacional dos Arquivos de Filmes) e a autoria do volume dedicado a Portugal e Espanha da série Cinematographers, Set and Costume Designers da FIAF. E lembremos também o Rui Santana Brito-tradutor literário, que na Cinemateca teve o seu expoente nas versões portuguesas das autobiografias de Frank Capra e Preston Sturges, mas que se alargou depois a uma atividade independente também ela relevante e reconhecida.
O legado de Rui Santana Brito está hoje numa infinidade de referências e instrumentos de pesquisa publicamente utilizáveis no nosso Centro de Documentação – no qual o imenso trabalho feito no campo da indexação de conteúdos (uma tarefa que ele não apenas impulsionou mas executou pessoalmente até ao seu último dia na Cinemateca) é um dos mais notáveis e produtivos exemplos. Mas esse legado vai muito para além disso, na medida em que, nas suas várias tarefas e em todos os seus níveis de participação, o Rui nos deixou uma inesquecível lição geral de entrega, competência, profissionalismo e compreensão humana que nenhum de nós esquecerá.
Neste dia que lhe dedicamos, e no qual queremos chamar a atenção pública para essa lição, é em tudo isso e na sua cinefilia que pensamos. Escolher um tema ou objeto para esta homenagem não foi difícil ou demorado. Quando, em 2004, João Bénard da Costa o desafiou, como a vários dentre nós, a programar o seu próprio ciclo, o Rui escolheu seis filmes com Eleanor Parker – a atriz de quem, tal como Teresa Borges também evoca, ele se despediu na sua página de redes sociais escrevendo simplesmente “my beautiful, beautiful lady”.
É então com Eleanor Parker que estaremos, para estar com Rui Santana Brito.
 
 
14/03/2017, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Um Dia para Rui Santana Brito

The King and Four Queens
Um Rei e Quatro Rainhas
de Raoul Walsh
Estados Unidos, 1956 - 84 min
 
14/03/2017, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Um Dia para Rui Santana Brito

Caged
Encarcerada
de John Cromwell
Estados Unidos, 1950 - 96 min
14/03/2017, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Um Dia para Rui Santana Brito

Three Secrets
Três Segredos
de Robert Wise
Estados Unidos, 1950 - 98 min
14/03/2017, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Um Dia para Rui Santana Brito
The King and Four Queens
Um Rei e Quatro Rainhas
de Raoul Walsh
com Clark Gable, Eleanor Parker, Jo Van Fleet, Barbara Nichols, Jean Willes, Sara Shane
Estados Unidos, 1956 - 84 min
legendado em português | M/12

À avidez com que Barbara Nichols, Jean Willes e Sara Shane oferecem ao Rei Gable aquilo que, mais cedo ou mais tarde, ele sabia estar garantido, Eleanor Parker contrapõe arrogância, astúcia e uma certa, estratégica, distância, para vencer as rivais na corrida para o ouro e para os braços de Gable. Um western com um cowboy de meia-idade e quatro lindíssimas viúvas. Para além de protagonista masculino, Gable foi também o produtor deste Walsh.

14/03/2017, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Um Dia para Rui Santana Brito
Caged
Encarcerada
de John Cromwell
com Eleanor Parker, Agnes Moorehead, Jan Sterling
Estados Unidos, 1950 - 96 min
legendado eletronicamente em português | M/12

O primeiro sinal do fugaz interesse da Academia por Eleanor Parker (e a sua primeira nomeação para um Óscar). Subtilmente evoluindo da inocência para a perversidade, Parker traz à sua personagem a dimensão humana que transcende os clichés do “women’s prison film”, onde o mundo habitualmente se dividia entre o preto-muito-preto da culpa e o branco-mais-que-branco da inocência.

14/03/2017, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Um Dia para Rui Santana Brito
Three Secrets
Três Segredos
de Robert Wise
com Eleanor Parker, Patricia Neal, Ruth Roman, Frank Lovejoy
Estados Unidos, 1950 - 98 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Sessão Especial de Homenagem

Com uma estrutura semelhante à de A LETTER TO THREE WIVES, em que, nesse mesmo ano, Mankiewicz suspendia o destino de três mulheres de uma informação crucial mantida secreta até ao final, as mulheres de Robert Wise esperam saber a qual das três pertence o filho que morreu num desastre de aviação. Ao lado de Eleanor Parker, duas outras atrizes dos “fifties” injustamente esquecidas: Patricia Neal e Ruth Roman.
A projeção é antecedida por um breve ato de evocação do homenageado.