CICLO
Double Bill


Em março prosseguem as “sessões duplas” que fazem sobressair as rimas e as relações que, na realidade, devem presidir à construção de qualquer programa. Nas quatro tardes de sábado estarão em diálogo dois belíssimos filmes assombradas pela genialidade de Nicholas Ray, THEY LIVE BY NIGHT e LIGHTNING OVER WATER; BONJOUR TRISTESSE e LES HAUTES SOLITUDES (Otto Preminger/Philippe Garrel); INDIA SONG e TRAITÉ DE BAVE ET D’ÉTERNITÉ (Marguerite Duras/Isidore Isou); e TOUCH OF EVIL e DE L’AUTRE CÔTÉ (Orson Welles/Chantal Akerman). As aproximações serão mais ou menos óbvias, mas acima de tudo importa ver e pensar os vários filmes em relação.

 

entre a projeção dos dois filmes há um intervalo de 30 minutos

 
07/03/2015, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Double Bill

THEY LIVE BY NIGHT | LIGHTNING OVER WATER
duração total da projeção: 211 minutos | M/12
 
14/03/2015, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Double Bill

BONJOUR TRISTESSE | LES HAUTES SOLITUDES
duração total da projeção: 174 minutos | M/12
21/03/2015, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Double Bill

INDIA SONG | TRAITÉ DE BAVE ET D’ÉTERNITÉ
duração total da projeção: 238 minutos | M/12
28/03/2015, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Double Bill

TOUCH OF EVIL | DE L’AUTRE CÔTÉ
duração total da projeção: 211 minutos | M/12
07/03/2015, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Double Bill
THEY LIVE BY NIGHT | LIGHTNING OVER WATER
duração total da projeção: 211 minutos | M/12
entre a projeção dos dois filmes há um intervalo de 30 minutos

THEY LIVE BY NIGHT
Os Filhos da Noite
de Nicholas Ray
com Farley Granger, Cathy O’Donnell, Howard da Silva, Jay C. Flippen
Estados Unidos, 1949 – 95 min / legendado em português
LIGHTNING OVER WATER
de Wim Wenders, Nicholas Ray
com Nicholas Ray, Wim Wenders, Susan Ray
Estados Unidos, 1980 – 116 minutos / legendado eletronicamente em português

O primeiro filme de Nicholas Ray é adaptado do romance Thieves Like Us, vagamente inspirado na história de Bonnie e Clyde. THEY LIVE BY NIGHT acompanha o destino trágico de um jovem revoltado que encontra no amor uma forma de redenção que o mundo, porém, lhe não permite. Uma legenda inicial avisa: “This boy and this girl were never properly introduced to the world we live in.” Um dos mais belos e mais pessoais filmes de estreia de um realizador, a quem se podem aplicar as palavras que dedicou ao casal de acossados amantes. LIGHTNING OVER WATER, cuja autoria é muito discutida em termos da participação de Ray, é o último grande trabalho do cineasta. Também conhecido como NICK’S MOVIE, trata-se de uma homenagem de Wim Wenders a Ray, que há muito tempo tinha dificuldades em filmar e que já se encontrava extremamente doente (Ray morreria antes da estreia do filme). Tal como já acontecia em WE CAN'T GO HOME AGAIN, é uma obra invulgar que, na sua liberdade, se revela como um comovente diário de um quotidiano partilhado, mas também como um testemunho sobre a genialidade de um grande cineasta e uma reflexão sobre o sentido da vida e da morte. Como diz Ray em LIGHTNING OVER WATER, “The closer I’m getting to my ending, the closer I’m getting to rewriting my beginning”.
 

14/03/2015, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Double Bill
BONJOUR TRISTESSE | LES HAUTES SOLITUDES
duração total da projeção: 174 minutos | M/12
entre a projeção dos dois filmes há um intervalo de 30 minutos

BONJOUR TRISTESSE
Bom Dia Tristeza
de Otto Preminger
com Deborah Kerr, David Niven, Jean Seberg, Mylene Demongeot
Estados Unidos, 1958 – 94 min / legendado em espanhol
LES HAUTES SOLITUDES
de Philippe Garrel
com Jean Seberg, Nico, Tina Aumont
França, 1974 – 80 min / mudo, sem diálogos

Depois de ter contribuído para a desmontagem do modelo clássico de Hollywood, Preminger não deixou de procurar novos e alternativos caminhos. BONJOUR TRISTESSE é um bom exemplo disso, com uma estrutura e estilo que resultam de um encontro feliz entre uma sensibilidade americana e uma sensibilidade europeia, entre a cor e o preto e branco e entre um complexo trio de personagens (Kerr, Niven e Seberg), cujo vértice, como escrevia João Bénard da Costa, é “o anjo (da morte ou da vida)”. Um filme de uma beleza e de uma tristeza avassaladoras. LES HAUTES SOLITUDES corresponde na obra de Garrel ao encontro com Jean Seberg. É assumidamente o retrato de uma das atrizes por excelência do "cinema moderno", filmado de improviso em 1974 sempre de muito perto, desenvolvendo-se como uma sucessão de rushes que correspondem a imagens misteriosas do rosto de Seberg, que partilha o filme com Tina Aumont ou Nico. Rostos mudos que evocam tantos outros filmados por Andy Warhol mediante o escrutínio de uma câmara que, pela insistência e proximidade, atinge momentos de verdadeira revelação.
 

21/03/2015, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Double Bill
INDIA SONG | TRAITÉ DE BAVE ET D’ÉTERNITÉ
duração total da projeção: 238 minutos | M/12
Double Bill com a Linha de Sombra

entre a projeção dos dois filmes há um intervalo de 30 minutos

INDIA SONG
Índia Song
de Marguerite Duras
com Delphine Seyrig, Matthieu Carrière, Michel Lonsdale
França, 1975 – 118 min / legendado em português
TRAITÉ DE BAVE ET D’ÉTERNITÉ
de Isidore Isou
com Marcel Achard, Isidore Isou, Jean-Louis Barrault, Jean Cocteau
França, 1951 – 120 min / legendado eletronicamente em português

INDIA SONG é uma inesquecível experiência que acompanha a história “de um amor vivido na Índia, nos anos trinta, numa cidade superpovoada à beira do Ganges” (Duras), filmada nos arredores de Paris, que circula por entre personagens silenciosas, enquanto em off se ouvem as confissões envolvidas na música encantatória de Carlos d’Alessio. Um filme mágico que forma um par com SON NOM DE VENISE DANS CALCUTTA DÉSERT, em que a mesma banda sonora surge associada a imagens esvaziadas da presença humana. Autor do movimento letrista lançado em 1946 como manifesto de uma poesia fonética, Isidore Isou estende-o em 1951 ao cinema com este TRAITÉ DE BAVE ET D’ÉTERNITÉ, prémio da vanguarda no festival de Cannes desse mesmo ano por um júri improvisado para a ocasião e onde foi motivo de escândalo. Baseado no princípio da “montagem discrepante”, o filme, que é hoje um título lendário do cinema experimental e que antecipa o cinema de Guy Debord, trabalha a disjunção entre o som e a imagem e a desconstrução narrativa para anunciar a morte de uma certa ideia de cinema. Nos Cahiers, Maurice Schérer (Éric Rohmer) distinguiu ainda o modo particular como Isou filma o bairro de Saint-Germain-des-Prés nas suas deambulações por Paris. Dois filmes em que a palavra tem um papel determinante e que, experimentando inventivamente diferentes modos de combinação entre as bandas de som e de imagem, expandem os limites do próprio cinema.
 

28/03/2015, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Double Bill
TOUCH OF EVIL | DE L’AUTRE CÔTÉ
duração total da projeção: 211 minutos | M/12
entre a projeção dos dois filmes há um intervalo de 30 minutos

TOUCH OF EVIL
A Sede do Mal
de Orson Welles
com Charlton Heston, Janet Leigh, Orson Welles, Akim Tamiroff, Marlène Dietrich
Estados Unidos, 1958 – 108 min / legendado em português
DE L’AUTRE CÔTÉ
de Chantal Akerman
França, Bélgica, 2003 – 103 min / legendado eletronicamente em português

A obra que marca o regresso de Orson Welles aos Estados Unidos, dez anos depois de THE LADY FROM SHANGHAI, é uma vertiginosa investida no filme negro, e um angustiante solilóquio sobre o mal. O genial plano-sequência de abertura é um dos melhores da história do cinema, um tour de force inimitável que revela todo o talento do cineasta. Welles, que deve o convite para dirigir TOUCH OF EVIL a Charlton Heston, também domina o filme como intérprete, na figura de um polícia que impõe a sua lei numa cidade de fronteira com o México, fazendo frente a um agente que procura libertar a noiva de um bando de traficantes de droga. E se um dos diálogos de A SEDE DO MAL faz referência a "uma das mais longas fronteiras da Terra. Uma fronteira aberta com muitos quilómetros livres, sem uma única metralhadora", a aludida linha divisória entre o México e os Estados Unidos é representada em DE L’AUTRE CÔTÉ de modo muito distinto. O poderoso documentário que Akerman realizou em 2003, depois do proustiano LA CAPTIVE, aborda a imigração ilegal do México para os EUA, as violentas medidas para a conter, e as tristes histórias de muitos daqueles que perderam a vida a tentar passar para “o outro lado” relatadas pelos seus familiares. Os longos planos-sequência, que oscilam entre a fixidez dos testemunhos e os lentos travellings que acompanham a grande muralha fortificada que separa os dois países, são impressivos no modo como fazem oscilar o filme entre uma dimensão individual e uma realidade mais universal e abstrata.