CICLO
15 Anos de Laboratório de Restauro


Em finais dos anos noventa, no contexto mais geral da edificação do ANIM (Arquivo Nacional das Imagens em Movimento, inaugurado em 1996), a Cinemateca lançava-se na aventura da criação de um laboratório especializado de restauro de filmes, que, entre as muitas novas frentes de trabalho então abertas, era a que envolvia maior dificuldade e ambição técnica. Instalado no núcleo central do ANIM, o laboratório produziu os primeiros novos materiais em 1998 e completou o primeiro verdadeiro restauro em 2000 – o restauro de MARIA DO MAR, a partir do negativo original em suporte de nitrato de celulose, cuja cópia foi estreada nesse mesmo ano durante um encontro que reuniu em Lisboa as direções dos grandes arquivos europeus. Com esse ato, após décadas de trabalhos de preservação e restauro levados a cabo em laboratórios externos (portugueses e estrangeiros), arrancava a era dos restauros feitos in loco, que mudou a nossa relação com essa atividade e o próprio lugar da Cinemateca na rede de conservação mundial. Hoje, uma década e meia depois, em plena desagregação do contexto tecnológico industrial fotoquímico, contamos com uma unidade laboratorial autónoma que é única no nosso país e que se tornou entretanto uma das poucas infraestruturas de restauro analógico de referência existentes na Europa (fundamental para a museografia de cinema e à qual têm recorrido, por isso, vários outros arquivos e museus europeus e não só). Tendo tudo isto em conta, ao longo deste mês de fevereiro de 2015, numa altura em que a vida do laboratório enfrenta aliás novos desafios (a instalação de um embrião de restauro digital, que vem complementar a infraestrutura analógica), decidimos evocar e pôr em discussão este trabalho de quinze anos, aproveitando para abordar os seus desafios atuais e os projetos e dilemas futuros. Em treze sessões (incluindo colóquios), vamos então voltar a mostrar algum do trabalho feito e debater aquilo que, numa cinemateca, é sempre a parte invisível do icebergue.

 

As sessões assinaladas como “Colóquios” e “Conferência” são de entrada livre mediante o levantamento de ingressos na bilheteira.
 

 
02/02/2015, 18h00 | Sala Luís de Pina
Ciclo 15 Anos de Laboratório de Restauro

COLÓQUIO | 15 ANOS DE EXPERIÊNCIA(S)
 
03/02/2015, 18h00 | Sala Luís de Pina
Ciclo 15 Anos de Laboratório de Restauro

OS LOBOS
de Rino Lupo
Portugal, 1923 - 83 min
05/02/2015, 18h00 | Sala Luís de Pina
Ciclo 15 Anos de Laboratório de Restauro

THE PATRIOT | FRAU IM MOND
duração total da projeção: 198 min | M/12
06/02/2015, 18h00 | Sala Luís de Pina
Ciclo 15 Anos de Laboratório de Restauro

VENDAVAL MARAVILHOSO
de Leitão de Barros
Portugal, 1949 - 138 | M/12
16/02/2015, 18h00 | Sala Luís de Pina
Ciclo 15 Anos de Laboratório de Restauro

A ALMADRABA ATUNEIRA | CHAGALL – BREVE A LUA, LUA CHEIA, VAI APARECER | A INVENÇÃO DO AMOR
duração total da projeção: 65 min | M/12
02/02/2015, 18h00 | Sala Luís de Pina
15 Anos de Laboratório de Restauro
COLÓQUIO | 15 ANOS DE EXPERIÊNCIA(S)
Colóquio com Luigi Pintarelli, Paolo Bernardini, Tiago Ganhão, Rui Machado, José Manuel Costa

Sessão de entrada livre mediante o levantamento de ingressos na bilheteira.

Sessão evocativa dos 15 anos de trabalho no laboratório instalado no Arquivo Fílmico da Cinemateca (ANIM) em que a projeção de filmes (ou excertos de filmes) será intercalada com intervenções sobre os trabalhos efetuados. Debater-se-á ainda a função dos laboratórios de restauro no contexto presente. Entre os filmes mostrados estarão excertos de MARIA DO MAR, de Leitão de Barros, ou de ACTO DA PRIMAVERA, de Manoel de Oliveira, e outros títulos como EXTIRPATIONS DES TUMEURS ENCAPSULÉES, uma compilação de 1906 que reúne algumas das famosas operações médicas do Dr. Doyen, THE IMMORTAL SWAN, raridade que regista a dança de Ana Pavlova, uma publicidade à LARANJINA C, AMÁLIA CANTA “OIÇA LÁ Ó SENHOR VINHO” e JORNAL PORTUGUÊS Nº1.

03/02/2015, 18h00 | Sala Luís de Pina
15 Anos de Laboratório de Restauro
OS LOBOS
de Rino Lupo
com José Soveral, Branca de Oliveira, Joaquim Almada, Sarah Cunha
Portugal, 1923 - 83 min
mudo, com intertítulos em português | M/12
com acompanhamento ao piano de Daniel Bruno Schvetz
sessão apresentada por Paolo Bernardini, técnico do laboratório fílmico da Cinemateca

OS LOBOS é o melhor filme português de Lupo, feito logo depois de MULHERES DA BEIRA, e um dos melhores filmes mudos portugueses – não considerando aqueles que uma nova geração de realizadores viria a fazer no final da década, e que já nascidos num universo cinematográfico moderno, também se definiriam, justamente, em oposição às obras de realizadores como Lupo. Valorizado à época por Félix Ribeiro e Roberto Nobre, muito comentado pelo menos desde os anos cinquenta, OS LOBOS foi um dos primeiros filmes preservados pela então Cinemateca Nacional e muito contribuiu para a redescoberta dos filmes mudos portugueses e para a inclusão do cinema no património cultural do país que merecia a pena salvar. Foi novamente restaurado em 2003 e 2004, com duas etapas distintas. Uma primeira, em 2003, que teve origem numa cópia nitrato tintada de época (não se conhecia ainda a existência do negativo), e uma segunda, em 2004, quando foi descoberto o negativo original do filme nos arquivos franceses CNC. A cópia a exibir resultou deste último restauro em que as tintagens originais de OS LOBOS foram reproduzidas através de um processo fotográfico com o nome de Desmet, pelo que o filme recuperou assim grande parte do seu esplendor original.

05/02/2015, 18h00 | Sala Luís de Pina
15 Anos de Laboratório de Restauro
THE PATRIOT | FRAU IM MOND
duração total da projeção: 198 min | M/12
sessão apresentada por Tiago Ganhão, técnico do laboratório fílmico da Cinemateca

THE PATRIOT
O Patriota
de Ernst Lubitsch
com Emil Jannings
Estados Unidos, 1928 – 8 min / mudo, com intertítulos em português (excerto)
FRAU IM MOND
A Mulher na Lua
de Fritz Lang
com Gerda Maurus, Willy Fritsch, Kirsten Heilberg
Alemanha, 1929 – 190 min / mudo, com intertítulos em alemã, traduzidos em português

Uma expedição à Lua, em 1929, em busca de ouro, com fabulosos cenários, numa história de amor, de cobiça, de luta contra o destino e de fracasso, como todos os filmes de Lang. Ao fim da aventura, só restarão um homem e uma mulher, novos Adão e Eva num mundo deserto. FRAU IM MOND tem a curiosidade de ter sido também o primeiro grande filme de ficção científica feito com rigor. Foi o último título mudo de Lang. “Obcecado pela exatidão documental, Lang quer imagens visionárias, não uma utopia fantasiosa. Ao imbróglio e ao ritmo da vida moderna, já presentes em SPIONE, junta-se aqui a sua paixão pela técnica moderna e futurista” (Bernard Eisenschitz). Um tesouro da Cinemateca, restituído, no ano 2000, à sumptuosidade de origem, numa versão restaurada a partir de uma cópia em nitrato de época conservada no nosso arquivo. A abrir a sessão, THE PATRIOT, um dos filmes perdidos mais procurados da História do cinema. Este fragmento de oito minutos foi encontrado na coleção de Henrique Alves Costa, que os seus herdeiros depositaram na Cinemateca. Uma preciosa gota de água que não mata a sede, mas prova porque as gentes das cinematecas defendem que não se deve falar de filmes perdidos, mas de filmes que se julgam perdidos.
 

06/02/2015, 18h00 | Sala Luís de Pina
15 Anos de Laboratório de Restauro
VENDAVAL MARAVILHOSO
de Leitão de Barros
com Amália Rodrigues, Paulo Maurício, Barreto Poeira, Isa Lobato
Portugal, 1949 - 138 | M/12

Depois de ter realizado três filmes sobre Bocage, Inês de Castro e Camões, Leitão de Barros dedicou a que foi a sua última longa-metragem de ficção a uma obra baseada na vida do poeta brasileiro do século XIX, Augusto de Castro Alves, “o poeta dos escravos”, figura tutelar do romantismo brasileiro. O projeto (o maior investimento da cinematografia portuguesa até então) foi rodado no Rio de Janeiro, em coprodução com o Brasil, então um importante mercado para os filmes portugueses. O grande trunfo é Amália Rodrigues no papel da atriz portuguesa, e amante do poeta, Eugénia Infante da Câmara. Pelas vicissitudes que condenaram VENDAVAL MARAVILHOSO ao desaparecimento forçado ao longo das últimas décadas, é o papel menos conhecido da carreira cinematográfica de Amália. Esta sessão dá novamente a ver o resultado do mais complexo trabalho de restauro até agora levado a cabo pela Cinemateca, e que aqui foi apresentado pela primeira vez em março de 2004. Esta complexidade provém da inexistência da banda original de som que terá desaparecido num dos vários incêndios que foram provocados pela inflamabilidade do suporte de nitrato. Em 2004, após a descoberta de uma cópia de distribuição no Brasil que se encontrava em muito mau estado de conservação, foi possível duplicar a banda de som desse material que, no entanto, tinha menor duração que a versão portuguesa do negativo original. Para além desta banda de som da cópia brasileira, foram aproveitados e montados na versão restaurada pequenos excertos de som de restos de takes que não tinham sido aproveitados na montagem original. Após todo este puzzle, só não foram recuperados nesta versão sonora de VENDAVAL MARAVILHOSO três minutos de som, reduzidos aqui ao silêncio.

16/02/2015, 18h00 | Sala Luís de Pina
15 Anos de Laboratório de Restauro
A ALMADRABA ATUNEIRA | CHAGALL – BREVE A LUA, LUA CHEIA, VAI APARECER | A INVENÇÃO DO AMOR
duração total da projeção: 65 min | M/12

A ALMADRABA ATUNEIRA
de António Campos
CHAGALL – BREVE A LUA, LUA CHEIA, VAI APARECER
de António Campos
A INVENÇÃO DO AMOR
de António Campos
com Maria Carolina, Quiné, Manuel Catarro, Francelino Barros
Portugal, 1961, 1966, 1965 – 26, 10, 29 min

A ALMADRABA ATUNEIRA, primeiro filme de António Campos em 16mm (depois dos títulos em 8mm dos finais da década de cinquenta que motivaram imediato destaque por parte de alguns críticos e realizadores) é um precioso registo da última companha de atum dos pescadores da ilha de Abóbora, na costa algarvia, e um testemunho evidente do instinto cinematográfico do autor, patente na força dos enquadramentos e da montagem. A INVENÇÃO DO AMOR, ficção que adapta o poema homónimo de Daniel Filipe, é um elo decisivo na obra de Campos que à época foi visto por muito poucos e se tornou depois longamente invisível por opção do autor (em face da inevitável interdição de censura), só voltando a ser exibido na retrospetiva da Cinemateca em setembro e outubro de 2000. Com estes dois títulos, a que acrescentámos ainda CHAGALL (raridade de 1966, inspirada em quatro obras do pintor) evocamos alguns momentos fundamentais dos inícios do cinema de A. Campos, através de obras cuja recuperação e divulgação (nessa mesma retrospetiva e desde essa altura) muito deveram aos trabalhos feitos no laboratório interno. Todos foram restaurados a partir dos originais de 16mm e são exibidos nas cópias de 35mm produzidas e divulgadas pela primeira vez em 2000.