CICLO
A Cinemateca com o Doclisboa: Johan Van Der Keuken e Outras Sessões


Prosseguindo uma colaboração de longa data, a Cinemateca junta-se ao DocLisboa’14, em décima segunda edição, na apresentação de uma retrospetiva da obra cinematográfica de Johan van der Keuken, um dos mais singulares realizadores do cinema documental da segunda metade do século XX. A Cinemateca dedicou-lhe uma primeira retrospetiva em 1991, que contou com a sua presença, pelo que é altura de regressar à totalidade da obra de Johan van der Keuken. No último filme que concluiu, DE GROTE VAKANTIE (“AS FÉRIAS GRANDES”, 2000), o realizador afirmava que filmar era um modo de vida, e na realidade filmou até ao fim, pois só a morte interrompeu aquele que van der Keuken previa que seria o seu "filme-testamento", ONVOLTOOID TEGENWOORDING / FOR THE TIME BEING (2001), do qual apenas resta um belíssimo fragmento, que mostramos neste Ciclo.
Nascido em 1938 em Amesterdão, começou por se dedicar à fotografia, mas cedo se direcionou também para o cinema, tendo realizado o seu primeiro filme em 1957 enquanto estudava como bolseiro no IDHEC, em Paris (PARIS À L'AUBE). Foi entre as décadas de sessenta e noventa que desenvolveu a grande maioria dos seus mais de cinquenta filmes, que abordam toda uma diversidade de questões fundamentais da história desse mesmo período: as várias guerras, as contradições entre países ricos e pobres e entre o Norte e o Sul, o problema da habitação, a destruição dos ecossistemas naturais, a necessidade de transformação da sociedade. Como afirmou o realizador, "Muitos dos meus filmes têm realçado a necessidade de mudança política e social, numa perspetiva mundial. É com “I LOVE DOLLARS” que, nos últimos anos, o cerne da minha atenção tem vindo a deslocar-se da questão da necessidade básica de mudança, para o problema da resistência à mudança, que parece estar enraizada na própria estrutura das sociedades humanas.” É uma afirmação que evidencia muitas das preocupações que orientarão uma obra profundamente pessoal em que se manifesta um forte empenhamento social e político, que se estende a toda a esfera mundial. Viajante compulsivo, Johan van der Keuken procurava através do cinema "uma imagem total e emocional do mundo", ou seja, interpretações para um mundo regido por "leis" em que se acentuavam progressivamente os contrastes motivados pela assimétrica distribuição da riqueza e do poder. A "Trilogia Norte-Sul" que realiza entre 1972 e 1974 é bem exemplificativa da sua forma de trabalhar pelo modo como à ousadia temática e à militância política, corresponde ainda a ousadia formal. O próprio descreve de modo exemplar os seus procedimentos: "Uso imagens documentais, mas não as monto segundo um 'esquema documental'. Posso associá-las umas às outras, colocá-las em conflito, amplificá-las ou destruí-las pelo som ou pela música, ou associá-las a fragmentos estilizados. Há no Tríptico uma abundância de estilos e de abordagens que visam a constituição de uma imagem total em que a experiência do espectador, mais do que a teoria é soberana." Na Cinemateca, a retrospetiva prolonga-se a novembro.
A associação ao DocLisboa’14 estende-se ainda, na Cinemateca, à apresentação de sete dos títulos que integram dois dos programas especiais do festival dedicados ao “Neorrealismo e Novos Realismos” e a “O Nosso Século XX – O Cinema Face à História”, com a projeção de obras fundamentais do cinema italiano dos anos cinquenta como UMBERTO D de Vittorio De Sica, L’AMORE IN CITTÀ de Cesare Zavattini, Carlo Lizzani, Dino Risi, Michelangelo Antonioni, Francesco Maselli, Federico Fellini e Alberto Lattuada; os fundamentais títulos britânicos da história do cinema documental TOGETHER de Lorenza Mazzetti e WE ARE THE LAMBETH BOYS de Karel Reisz, realizados na mesma década; os raros filmes soviético e filipino de 1965 (PERED SUDOM ISTORII / “ENFRENTANDO A HISTÓRIA”, Fridrikh Ermler) e 1975 (MANYLIA SA MGA KUKO NG LIWANAG / MANILA AT THE CLAWS OF THE NIGHT, Lino Brocka); um fabuloso documentário de Jürgen Böttcher, de 1990, sobre o Muro de Berlim (DIE MAUER); e uma das obras maiores de Ritwik Ghatak: SUBARNAREKHA.
 

 
18/10/2014, 19h00 | Sala Dr. Félix Ribeiro
Ciclo A Cinemateca com o Doclisboa: Johan Van Der Keuken e Outras Sessões

VIER MUREN / FOUR WALLS | DE SNELHEID: 40-70 / VELOCITY 40-70 | VAKANTIE VAN DE FILMER / FILMMAKER’S HOLIDAY
duração total da sessão: 85 minutos | M/16
 
18/10/2014, 21h30 | Sala Dr. Félix Ribeiro
Ciclo A Cinemateca com o Doclisboa: Johan Van Der Keuken e Outras Sessões

DE PLATTE JUNGLE / THE FLAT JUNGLE
de Johan van der Keuken
Holanda, 1978 - 90 min
20/10/2014, 15h30 | Sala Dr. Félix Ribeiro
Ciclo A Cinemateca com o Doclisboa: Johan Van Der Keuken e Outras Sessões

UMBERTO D
Humberto D
de Vittorio De Sica
Itália, 1952 - 89 min
20/10/2014, 19h00 | Sala Dr. Félix Ribeiro
Ciclo A Cinemateca com o Doclisboa: Johan Van Der Keuken e Outras Sessões

TOGETHER | WE ARE THE LAMBETH BOYS
duração total da sessão: 104 min | M/16
20/10/2014, 21h30 | Sala Dr. Félix Ribeiro
Ciclo A Cinemateca com o Doclisboa: Johan Van Der Keuken e Outras Sessões

DE WEG NAAR HET ZUIDEN / THE WAY SOUTH
de Johan van der Keuken
Holanda, 1981 - 153 min
18/10/2014, 19h00 | Sala Dr. Félix Ribeiro
A Cinemateca com o Doclisboa: Johan Van Der Keuken e Outras Sessões

Em colaboração com o Doclisboa’14 – Festival Internacional de Cinema
VIER MUREN / FOUR WALLS | DE SNELHEID: 40-70 / VELOCITY 40-70 | VAKANTIE VAN DE FILMER / FILMMAKER’S HOLIDAY
duração total da sessão: 85 minutos | M/16

VIER MUREN / FOUR WALLS
DE SNELHEID: 40-70 / VELOCITY 40-70
VAKANTIE VAN DE FILMER / FILMMAKER’S HOLIDAY
de Johan van der Keuken
Holanda, 1965, 1970, 1974 – 22, 25, 38 min / legendados eletronicamente em português
 

Um programa heteróclito que introduz o empenhamento político e social da obra de Johan van der Keuken, mas também a leveza com que capta os aspectos mais simples do quotidiano. VAKANTIE VAN DE FILMER ou “AS FÉRIAS DO CINEASTA” é o filme mais célebre da sessão e um título fundamental no contexto da filmografia do realizador. Trata-se de um documentário com uma forte componente nostálgica que convoca muito material dos filmes anteriores, que van der Keuken reutiliza com uma liberdade total. Um retrato do seu avô ou acontecimentos da atualidade combinam-se com imagens de homenagem ao músico Ben Webster (BIG BEN,1967) ou o testemunho de um velho casal que lhe confia memórias da guerra. Um filme que abre inúmeras pistas para a leitura de uma obra profundamente ancorada nas vivências do seu autor e que explora “de um ponto de vista amador… a velhice e a infância. O cinema e a fotografia. A morte e a vida… a memória em trabalho” (van der Keuken). Realizado cerca de dez anos antes, VIER MUREN, o primeiro filme da sessão, representa uma contundente denúncia das consequências da crise da habitacional ao nível do espaço metal de quem a atravessa. Tirando máximo partido da figura da metáfora, aproxima as quatro paredes do espaço filmado às "paredes" de um crânio humano. "VELOCIDADE: 40-70” foi produzido no quadro das comemorações da libertação de Amesterdão, desenhando uma cronologia muito própria que começa na data da invasão da cidade e termina no ano da sua realização. O testemunho de uma sobrevivente de Auschwitz ecoa sobre imagens do presente, que indiciam a continuidade de um estado de guerra. Primeiras exibições na Cinemateca.
 

18/10/2014, 21h30 | Sala Dr. Félix Ribeiro
A Cinemateca com o Doclisboa: Johan Van Der Keuken e Outras Sessões

Em colaboração com o Doclisboa’14 – Festival Internacional de Cinema
DE PLATTE JUNGLE / THE FLAT JUNGLE
de Johan van der Keuken
Holanda, 1978 - 90 min
legendado eletronicamente em português | M/16

Johan van der Keuken filma uma região única, a “Waddenzee” ou “o mar das terras húmidas”, que se encontra separado do Mar do Norte por pequenas ilhas e que, consoante as marés, oscila entre a terra e a água. Uma região com um meio natural excecional que se distribui pela orla costeira de vários países, mas cujos habitantes, fauna e flora estão ameaçados pelo desenvolvimento económico e industrial. DE PLATTE JUNGLE é um filme belíssimo de acentuado fundo ecológico, mas que ultrapassa em muito o clássico documentário de encomenda pelo modo como expande as possibilidades do cinema. Feito de múltiplos contrastes, aborda de modo único a desequilibrada relação entre o infinitamente pequeno e o infinitamente grande ou entre a natureza e a realidade quotidiana de quem a habita.

20/10/2014, 15h30 | Sala Dr. Félix Ribeiro
A Cinemateca com o Doclisboa: Johan Van Der Keuken e Outras Sessões

Em colaboração com o Doclisboa’14 – Festival Internacional de Cinema
UMBERTO D
Humberto D
de Vittorio De Sica
com Carlo Battisti, Maria Pia Casilio, Lina Gennari
Itália, 1952 - 89 min
legendado eletronicamente em português | M/16
Neorrealismo e Novos Realismos

Com LADRI DI BICICLETTE e SCIUSCIÀ, UMBERTO D completa a trilogia “neorrealista” de De Sica, sobre a qual assenta o seu renome como realizador. Mas esta história de um modesto reformado que corre o risco de perder a casa onde vive, também é o filme em que surgem elementos sentimentais e lacrimejantes que começam a afastar o Neorrealismo italiano da dureza das suas primeiras obras. Mas – surpreendentemente ou não – era também o filme favorito de Ingmar Bergman.

20/10/2014, 19h00 | Sala Dr. Félix Ribeiro
A Cinemateca com o Doclisboa: Johan Van Der Keuken e Outras Sessões

Em colaboração com o Doclisboa’14 – Festival Internacional de Cinema
TOGETHER | WE ARE THE LAMBETH BOYS
duração total da sessão: 104 min | M/16
Neorrealismo e Novos Realismos

TOGETHER
de Lorenza Mazzetti
com Eduardo Paolozzi, Michael Andrews
Reino Unido, 1956 – 52 min / sem diálogos
WE ARE THE LAMBETH BOYS
de Karel Reisz
Reino Unido, 1959 – 52 min / legendado eletronicamente em português

A sessão reúne dois filmes britânicos dos anos cinquenta: TOGETHER retrata o East End londrino através das vidas de dois surdos-mudos num registo experimental semidocumental, a partir de The Glass Marble de Denis Horne. Foi realizado entre o verão de 1954 e terminado em janeiro de 1956, a tempo de incluir o primeiro programa do movimento Free Cinema, juntamente com filmes de Karel Reisz e Tony Richardson, que teve lugar em fevereiro desse ano no National Film Theatre. “A sua representação da modernidade da vida quotidiana da classe operária e os novos termos da sua aproximação ao realismo foram inspirados pelo Neorrealismo italiano e pelas técnicas usadas pelos amigos do Free Cinema de Mazzetti” (BFI). Filmado no verão de 1958 num clube de juventude do sul de Londres (Alford House), no espírito do Free Cinema, WE ARE THE LAMBETH BOYS segue um grupo de adolescentes de quem regista frustrações e aspirações, fixando-se em grandes planos das suas personagens e movimentando-se entre o grupo que formam. Richard Hoggart chamou-lhe “um filme ensaio”: “propõe-se mostrar, não toda a verdade, mas alguns aspectos da verdade, totalmente.” TOGETHER é uma primeira exibição na Cinemateca.
 

20/10/2014, 21h30 | Sala Dr. Félix Ribeiro
A Cinemateca com o Doclisboa: Johan Van Der Keuken e Outras Sessões

Em colaboração com o Doclisboa’14 – Festival Internacional de Cinema
DE WEG NAAR HET ZUIDEN / THE WAY SOUTH
de Johan van der Keuken
Holanda, 1981 - 153 min
legendado eletronicamente em português | M/16

“Uma história de emigração exterior e alienação interior, mas também uma ode à coragem de viver”. Estas são as palavras de van der Keuken a propósito de um filme que começa em Amesterdão com uma festa de coroação e um imóvel ocupado por squatters e parte em direção ao Sul, sucedendo-se Paris, Roma, Cairo,.... Um documentário que coloca em evidência o acentuado contraste entre o Norte e o Sul através de uma viagem em que se sucedem os encontros com muitos daqueles que projetam uma vida melhor encetando um trajeto em sentido inverso ao do cineasta. Regressando ao "tema" da ambiciosa “Trilogia Norte-Sul” que realizou entre 1972 e 1974, van der Keuken filma esta realidade com um virtuosismo único, como descrevem as palavras de Serge Daney: “Perdido na multidão do Cairo, van der Keuken ‘toca o cinema’ como se tocasse saxofone (…) É raríssimo ‘tocar-se o cinema’ desta forma…”. Primeira exibição na Cinemateca.