CICLO
Revisitar os Grandes Géneros: O Esplendor do Melodrama


Um dos princípios da programação da Cinemateca Portuguesa tem sido o equilíbrio entre o património clássico e diversas tendências do cinema contemporâneo. Com este Ciclo, abrimos um espaço, a que voltaremos com alguma regularidade nos próximos anos, dedicado aos maiores géneros clássicos, nisso incluindo produções de referência no interior do “studio system” de Hollywood e muitas outras, à volta, no cinema mundial, mais ou menos circunscritas (de acordo com cada caso concreto) ao intervalo histórico em que as convenções desse “sistema” mais se afirmaram. A prazo, nalguns casos, voltaremos a territórios que, em décadas anteriores, a Cinemateca já abordou em termos de género (como o Musical, o Western, a Ficção Científica ou o “Film Noir” ou numa série de programas intitulada “É do Meu Género”). Noutros, organizaremos de forma sintética aquilo que foi antes aqui tratado em Ciclos temáticos diversos, por vezes a partir de evocações de autores marcantes ou de períodos específicos dentro da evolução global de um género. Inauguramos este percurso com o Melodrama, um género que, em última análise, é tão antigo quanto o cinema, e que costuma despertar reações extremas nos espectadores, de adesão ou rejeição. Na verdade, os verdadeiros apreciadores do Melodrama talvez procurem um duplo prazer: por um lado, a adesão aos sonhos e emoções das personagens; por outro, a distância irónica. O próprio Melodrama baseia-se em princípios antitéticos: culpabilidade/redenção, lealdade/traição, pureza/perversidade. As tramas narrativas também costumam ser divididas de maneira antinómica, com um “antes”, feito de felicidade e um “depois”, no qual se acumulam as desgraças e que costuma desembocar numa redenção. Estas tramas narrativas contêm diversas situações-chave, independentemente do país em que o filme foi produzido, sobre as quais pairam a hipocrisia moral e as noções de culpa e pecado (o ato sexual não destinado à reprodução da espécie é, evidentemente, o maior de todos os pecados). Entre estas situações narrativas típicas do melodrama estão o segredo, a confissão, o engano, o adultério, a substituição de personagens, a enfermidade, a doença mortal, o amor entre pessoas de condição social diferente, a oposição entre a pureza do campo e a corrupção moral da cidade. As catástrofes – pessoais, naturais ou sociais – abatem-se impiedosamente sobre as personagens, que só aspiram à felicidade. O protagonista é sempre uma vítima inocente cercada por diversas personagens maléficas, mas encontra pelo caminho pessoas de bom coração. Estoica e algo masoquista, a personagem do melodrama não luta contra o seu destino, aceita-o com fatalismo. Neste contexto, a mulher é a vítima ideal, sobretudo se for mãe e tiver de se sacrificar pelo filho (mais raramente a filha) ou for separada dele por ter sido seduzida e abandonada. Para este Ciclo composto por filmes realizados nos anos trinta, quarenta e cinquenta do século XX (donde, neste caso, no período central do que costumamos entender por “cinema clássico”), escolhemos obras vindas de horizontes muito variados – não apenas europeias e americanas – algumas célebres e outras raras, algumas de cineastas maiores, como Douglas Sirk e John M. Stahl, outras de competentes e prolíficos makers como Augusto Genina e Carmine Gallone, outras ainda de cineastas pouco conhecidos além das fronteiras do seu país. Além de quatro exemplos da cinematografia mexicana, talvez a mais rica no género e a que concebeu as histórias mais extravagantes, apresentamos exemplos de duas grandes cinematografias que muito ilustraram o género, a americana, com sete filmes e a italiana, com quatro. Como o melodrama não tem fronteiras geográficas ou políticas, há um exemplo da cinematografia da Alemanha nazi e outro da URSS estalinista, além de incursões por filmes vindos de Espanha, da Finlândia, do Egito, da Grécia e da Índia. Portugal não podia deixar de estar representado num Ciclo sobre este tema e podemos rever FADO, com Amália Rodrigues. Em todos estes filmes podemos encontrar as situações dramáticas e as técnicas narrativas descritas acima. O Ciclo desdobra-se numa série de cinco sessões-conferência por Mário Jorge Torres (grande estudioso e divulgador do Melodrama entre nós) integradas na rubrica “Histórias do Cinema”, que, como habitualmente nesta rubrica, antecedem outros tantos filmes por ele escolhidos para introduzir o género.
 
 
12/06/2019, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Revisitar os Grandes Géneros: O Esplendor do Melodrama

To Each his Own
Lágrimas de Mãe
de Mitchell Leisen
Estados Unidos, 1946 - 120 min
 
14/06/2019, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Revisitar os Grandes Géneros: O Esplendor do Melodrama

Aventurera
de Alberto Gout
México, 1950 - 101 min
14/06/2019, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Revisitar os Grandes Géneros: O Esplendor do Melodrama

Only Yesterday
Só uma Noite
de John M. Stahl
Estados Unidos, 1933 - 105 min
14/06/2019, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Revisitar os Grandes Géneros: O Esplendor do Melodrama

Sellaisena Kuin Sina Minut Halusit
“Como Tu Me Desejaste”
de Teuvo Tulio
Finlândia, 1944 - 102 min
15/06/2019, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Revisitar os Grandes Géneros: O Esplendor do Melodrama

Cielo Negro
de Manuel Mur-Oti
Espanha, 1951 - 99 min
12/06/2019, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Revisitar os Grandes Géneros: O Esplendor do Melodrama
To Each his Own
Lágrimas de Mãe
de Mitchell Leisen
com Olivia de Havillad, John Lund Mary Anderson
Estados Unidos, 1946 - 120 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Um dos grandes melodramas dos anos quarenta considerado à época como o “Woman’s Picture” por excelência, típico tearjerker sobre uma mulher (Olivia de Havilland, que recebeu o seu primeiro Óscar pelo seu desempenho). Como em tantos melodramas, o tema central é o da mãe que sofre por ter “pecado”, como bem indica o título português. Trata-se da história de uma mãe solteira que, por este motivo, não pode criar o seu filho e, enquanto prospera com o seu trabalho, faz-se passar pela sua tia, sem nunca lhe confessar a verdade. A mise-en-scène é um prodígio de contenção e elegância. Na Cinemateca o filme não é apresentado desde 2006.
 
14/06/2019, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Revisitar os Grandes Géneros: O Esplendor do Melodrama
Aventurera
de Alberto Gout
com Ninón Sevilla, Andrea Palma, Tito Junco
México, 1950 - 101 min
legendado eletronicamente em português | M/12
O México foi provavelmente o país que concebeu e produziu os melodramas mais delirantes. AVENTURERA, um dos clássicos deste cinema, é um dos seus pontos altos. O filme aborda o clássico tema da mulher de província que é enganada e levada para uma cidade onde é obrigada a trabalhar como cantora e prostituta num cabaré (onde canta inclusive uma canção de Carmen Miranda em português). A dona do cabaré e “madame” do bordel é malvadíssima e ameaça constantemente “marcar” a cara da sua vítima com uma navalha. Numa reviravolta que nenhum espectador poderá prever, a situação inverte-se e a patroa fica à mercê da sua serva. O filme (a apresentar em cópia digital) não passa na Cinemateca desde 2007. Ver para crer.
 
14/06/2019, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Revisitar os Grandes Géneros: O Esplendor do Melodrama
Only Yesterday
Só uma Noite
de John M. Stahl
com Margaret Sullavan, John Boles, Edna May Sullivan
Estados Unidos, 1933 - 105 min
legendado eletronicamente em português | M/12
John M. Stahl foi um dos mestres do melodrama em Hollywood e ONLY YESTERDAY é um dos pontos altos do género no cinema americano. A estrutura narrativa é certamente derivada de Carta de uma Desconhecida, de Stefan Zweig: arruinado pelo crash da Bolsa de Nova Iorque, em 1929, um homem vai suicidar-se, quando recebe uma carta. A ação desenrola-se então em flashback: 15 anos antes, este homem seduzira uma jovem, que engravidou sem que ele soubesse. Ao longo do tempo, os dois voltam a encontrar-se duas vezes, mas o homem não a reconhece. A mulher está prestes a morrer e pede, na carta, que ele tome conta do filho que tiveram. O filme não é apresentado na Cinemateca desde 2009.
 
14/06/2019, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Revisitar os Grandes Géneros: O Esplendor do Melodrama
Sellaisena Kuin Sina Minut Halusit
“Como Tu Me Desejaste”
de Teuvo Tulio
com Marie-Louise Fock, Ture Ara, Kunto Karapäa, lauri Korpela
Finlândia, 1944 - 102 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Para a surpresa de muitos, a Finlândia revelou-se uma fonte de extravagantes melodramas, desde que se “descobriu” a obra de Teuvo Tulio, que foi revelada aos espectadores da Cinemateca por escolha de Aki Kaurismaki e Peter von Bagh em 2005, e alvo de um curto Ciclo em 2015. O argumento de SELLAISENA KUIN SINA MINUT HALUSIT nada fica a dever, em matéria de coincidências e desgraças, ao mais descabelado melodrama mexicano, como AVENTURERA (também aqui programado). Mas uma pesada e inesperada capa luterana parece tudo envolver e o estilo da realização nada tem de expansivo. É sóbrio, “camerístico”, os chavões de um género são trabalhados numa mise-en-scène cerrada e claustrofóbica. O resultado é tão implosivo como explosivo.
 
15/06/2019, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Revisitar os Grandes Géneros: O Esplendor do Melodrama
Cielo Negro
de Manuel Mur-Oti
com Susana Canals, Fernando Rey, Luis Prendes
Espanha, 1951 - 99 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Manuel Mur-Oti (1908-2003) é considerado o grande mestre espanhol dos melodramas. Desprezado pela crítica durante muito tempo, Mur-Oti foi reavaliado nos anos noventa, graças a filmes como ORGULLO, CONDENADOS ou CIELO NEGRO, que costuma ser considerado a sua obra-prima. Trata-se de um melodrama escuro e cerrado, centrado na história de amor entre uma jovem caixeira de loja (magnífica Susana Canales) e um sedutor desalmado (Fernando Rey, a exalar falsidade). É um dos filmes que vem lembrar-nos que a História do cinema clássico nunca será definitivamente escrita e que há muitos meandros por descobrir.