CICLO
Centenário de Rita Hayworth


Para quê inventar? Para celebrar Rita Hayworth, por ocasião do centenário do seu nascimento, optámos por transcrever excertos do texto de João Bénard da Costa publicado no catálogo do Ciclo de cinema O Musical (1989), “Rita Hayworth (17-10-1918-14-05-1987). Aí vai:
 
“The woman whose looks set the stan­dard for her generation”. “The Sex Sym­bol for whom the term Love Goddess was coined”. “The first Hollywood star to become a real-life princess”. Em qualquer biografia de Rita Hayworth (…) encontram-se chavões destes. E o que é certo é que, com mais ou menos retórica e mais ou menos empolamento, não são exagera­dos. É verdade que Hollywood chamou “deusas do amor” a muitas outras, mas, como nota Shipman, “mostly about Rita Hayworth”.
Rita Hayworth, se não era mulher a quem uma senhora fa­lasse, foi também chamada “the intellectual’s glamour girl” e casou com um génio (Orson Welles) e com um prín­cipe (Ali Khan). Com um e com outro só deu barracas e ninguém a veria, como à sua colega mais nova das telas e de leitos reais (Grace Kelly) a ser tomada a sério (e a tomar a sério) fun­ções majestáticas, mesmo no mais mi­núsculo reino do mundo. Ninguém a estava a ver a presidir a bailes de gala, a chás de caridade ou a ter precedên­cias com princesas de sangue bem azul. O príncipe dela era semibárbaro (para códigos ocidentais) e mais a viram como efémera odalisca de luxo (num bem povoado harém) do que como Sua Alteza Real, a Princesa Rita. Também nunca a imaginamos a discutir Shakes­peare com Welles ou, sequer, a ter paciência para ver até ao fim CITIZEN KANE. Mas esses casamentos eram im­pensáveis para as suas colegas que se limitavam a ser belas ou boas. Sobre todas elas, Rita Hayworth tinha um “mais”, um “mais” que é o segredo do seu mito; E, ao contrário de quase todas as outras (as dos cultos de cas­tas, sejam estas snobs ou suadas), esse mito não se confundiu com uma década e ninguém minimamente cinéfilo per­gunta hoje quem foi Rita Hayworth. Muito pelo contrário: poucas atrizes despertaram tanto a imaginação de biógrafos nas décadas recentes. Há romances célebres com o nome dela, há filmes sobre a vida dela, a televisão dedicou-lhe uma série (…) ”posters” dela, bilhetes postais com ela, continuam a vender-se aos milhões (…).
Em cinema, só conheço outro fenómeno assim, tão típico dos “fifties” como ela o foi dos “forties”: “o mais belo animal do mundo”, Ava Gardner cha­mado. E, como Ava, Rita durou pouquíssimo. Quem nunca as tenha visto nos filmes dos anos áureos (42 a 47 para Rita, 49 a 56 para Ava) não pode fazer a mais pequena ideia. Antes, eram só muito bonitas como tantas outras; depois, prematuramente envelhecidas, marcadas pelos copos e pela celulite, ruínas onde a espaços (mas era pre­ciso conhecê-las antes) acontecia um plano que fazia lembrar visões muito mais esplendorosas. Ava Gardner é quatro anos mais nova e começou e acabou um tudo-nada depois. Mas a diferença é pequena.
O que Rita nunca teve foi Lewins ou Mankiewiczs para pintarem dela Pan­doras ou Condessas Descalças. Se Ava foi a deusa de três ou quatro filmes soberbos com Rita nem isso aconteceu. Os melhores filmes em que entrou (HUMAN CARGO de Dwan, ONLY ANGELS HAVE WINGS de Hawks, STRAWBERRY BLONDE de Walsh) precedem a sua exis­tência fenomenal. São premonições, mas ainda não são monumentos à glória dela, em qualquer deles ainda relativamente secundária. Nos monumentos não teve, como Jennifer Jones, King Vidor, mas um Vidor menos real, chamado Charles. Era um excelente cineasta, mas não era um génio. Estou a esque­cer A DAMA DE XANGAI? Não estou. Mas A DAMA DE XANGAI é, precisamente, o único filme dela, nos “forties” em que Rita Hayworth me não parece “a magnificent animal (...) with that hypnotic half-aware quality that made her mysterious”, como escreveu Kobal. O único filme em que me não parece fascinante. E foi feito deliberadamente para ela o não ser. Se há filme feito contra a vedeta é THE LADY FROM SHANGHAI, ajuste de contas implacável de Welles com a mulher com quem vi­vera quatro anos e de quem se separou nesse ano. Talvez que a única forma possível de se esquecer dela não fosse, como diz no fim, viver muitos anos e envelhecer. “The only way to get out of trouble” (se acaso o foi) era conse­guir destruir assim aquela imagem. A explicação do célebre plano dos espe­lhos talvez seja essa: desmultiplicar o que era uno e fazer tantas imagens de Rita que, perdida nelas, a imagem se acabasse.
De qualquer modo, THE LADY FROM SHANGHAI, ao contrário de GILDA, COVER GIRL ou THE LOVES OF CARMEN, não vale o que vale por causa de Rita Hayworth. Kobal, ao falar da qualidade hipnótica que a tornava misteriosa, acrescentava “mysterious until the moment she kicked off her shoes and began to dance. Then she was a volcano”. É muito bem visto, porque a incandes­cência nela andou sempre associada ao movimento, em termos dos cabelos, das mãos, dos, pés, no torvelinho de que fazia corpo ou em que o corpo se tor­nava. E, diante dessa imagem, como só sucede nas “real stars” perguntamo-nos se o cinema existiu para mulheres assim, ou se foi por causa de mulheres assim que o cinema existiu. E quem saiba que explique, que tudo o resto é metá­fora ou retórica (…).
Lutou até 73, quando se anunciou TALES THAT WITNESS MADNESS, mas foi substituída por Kim Novak. Aí, depois de mais um processo perdido e de um sexto divórcio, foi-se definitivamente abaixo, aos 55 anos. Ainda se chegou a falar no seu regresso à Broadway ou à televisão, mas já não estava em estado para nada. Em 77, um tribunal deu-a por interdita e incapaz de se curar do alcoolismo crónico. Em 81, internaram-na. Por esses anos, como disse, começava o seu culto. Tão pós­tumo, como Rita hoje o é.
 
 
03/09/2018, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Centenário de Rita Hayworth

Gilda
Gilda
de Charles Vidor
Estados Unidos, 1946 - 110 min
 
04/09/2018, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Centenário de Rita Hayworth

Only Angels Have Wings
Paraíso Infernal
de Howard Hawks
Estados Unidos, 1939 - 120 min
05/09/2018, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Centenário de Rita Hayworth

Salome
Salomé
de William Dieterle
Estados Unidos, 1953 - 103 min
07/09/2018, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Centenário de Rita Hayworth

The Lady from Shanghai
A Dama de Xangai
de Orson Welles
Estados Unidos, 1948 - 87 min
14/09/2018, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Centenário de Rita Hayworth

The Strawberry Blonde
Uma Loira com Açúcar
de Raoul Walsh
Estados Unidos, 1941 - 95 min
03/09/2018, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Centenário de Rita Hayworth
Gilda
Gilda
de Charles Vidor
com Rita Hayworth, Glenn Ford, George Macready, Joseph Callea, Steven Geray
Estados Unidos, 1946 - 110 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Um dos mais populares filmes “negros” da década de quarenta, famoso pela bofetada que Glenn Ford dá a Rita Hayworth, gesto que voltaria a repetir em mais dois filmes que fizeram juntos. Ford é um jogador que entra ao serviço de um misterioso proprietário de bar, ligado aos nazis, apaixonando­‑se pela sua mulher, Gilda, uma mítica Rita Hayworth. Nunca esquecer o Put the Blame on Mame, com o “strip tease” das luvas de Rita. Sendo um título famoso, o filme que se “colou” à sensualidade da imagem curvilínea de Rita Hayworth não é um filme que se veja muitas vezes em projeção por aqui (a última delas foi em 2009). A apresentar em cópia digital.
 
04/09/2018, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Centenário de Rita Hayworth
Only Angels Have Wings
Paraíso Infernal
de Howard Hawks
com Cary Grant, Jean Arthur, Richard Barthelmess, Thomas Mitchell, Rita Hayworth
Estados Unidos, 1939 - 120 min
legendado em francês e eletronicamente em português | M/12
Howard Hawks realizou obras-primas em quase todos os géneros do cinema de Hollywood (musicais, comédias, westerns, filmes “negros”) e também em filmes de aviação, de que ONLY ANGELS HAVE WINGS é exemplo. Protagonista do filme, Cary Grant, explicava assim o segredo da sua atração: “I play myself”. Em ONLY ANGELS HAVE WINGS, ele é o homem que nunca tem lume e atira sempre uma moeda (sem coroa) ao ar perante uma dúvida. A quintessência do cinema de Howard Hawks: um filme de aviadores, de sacrifício por amor e de heróis suicidários. Um dos mais belos filmes do mundo. A protagonista feminina é Jean Arthur, a quem Cary Grant se há de render, mas Rita Hayworth, aqui em parelha com Richard Barthelmess, desempenha um importante papel, na intriga e em cena.
 
05/09/2018, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Centenário de Rita Hayworth
Salome
Salomé
de William Dieterle
com Rita Hayworth, Stewart Granger, Charles Laughton, Cedric Hardwicke
Estados Unidos, 1953 - 103 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Hollywood no seu máximo delírio. Nesta versão épica e em technicolor da celebérrima história de Salomé a partir de Oscar Wilde, a personagem titular dança para salvar João Baptista (!) e, aliciada pelo namorado romano que se convertera secretamente ao cristianismo, acaba entre a multidão que ouve, em primeira-mão, o Sermão da Montanha. SALOME foi produzido pela reputada atriz russa Alla Nazimova – conhecida pelos filmes em que contracenou com Rudolph Valentino nos anos dez e que se notabilizou pelos filmes de “arte e ensaio” da sua produtora, fundada na década seguinte. Durante largos anos relegado como um filme menor, trata-se de um caso invulgar da produção de Hollywood, hoje reconhecido pelo seu modernismo. Charles Laughton faz o papel de Herodes e Cedric Hardwicke o de Tibério. Rita Hayworth é – é claro – a Princesa Salomé, e a referida cena de dança é um dos seus momentos ímpares de erotismo cinematográfico. É um título algo raro, que vale a pena ser redescoberto.
 
07/09/2018, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Centenário de Rita Hayworth
The Lady from Shanghai
A Dama de Xangai
de Orson Welles
com Orson Welles, Rita Hayworth, Everett Sloane, Glenn Anders, Ted de Corsia
Estados Unidos, 1948 - 87 min
legendado eletronicamente em português | M/12
A quinta longa-metragem de Orson Welles inscreve-se, à sua maneira, no contexto do “filme negro”, que estava então no apogeu, género de que uma das características são as tramas narrativas pouco límpidas, cuja ação nunca tem causas claras. Neste filme, Welles é um marinheiro em terra conquistado pela beleza de Rita Hayworth, que, aqui loira, o arrasta numa intriga de sexo e crime que culmina numa das mais famosas sequências da história do cinema: o frente a frente das três personagens principais na Casa dos Espelhos do Luna Parque, como tubarões que se devoram, segundo a fábula que Welles conta no filme. A apresentar em cópia digital.
 
14/09/2018, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Centenário de Rita Hayworth
The Strawberry Blonde
Uma Loira com Açúcar
de Raoul Walsh
com James Cagney, Olivia de Havilland, Rita Hayworth, Alan Hale, Jack Carson
Estados Unidos, 1941 - 95 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Uma das várias versões cinematográficas da peça One Sunday Afternoon (que Walsh voltaria a adaptar com o título original). Uma irresistível comédia sobre um barbeiro (Cagney) apaixonado por uma esplendorosa loira que acaba por casar com um seu amigo. Nem tudo o que luz é oiro e aquilo que muito se deseja nem sempre é o melhor.