CICLO
Feios, Porcos e Maus: Um Olhar Europeu


Nem todos são feios, nem todos são porcos, nem todos são maus nestes filmes, tal como nós também não o somos — pelo menos inteiramente. Mas se algo caracteriza este conjunto de longas-metragens é a capacidade que têm de refletir a vida, através de personagens comoventes e imensas, tanto pela sua beleza como pelos seus defeitos, ou ainda, se preferirmos, o sentido de justiça que essas personagens buscam e a amoralidade que acabam por mostrar nas suas narrativas. Tal como nós o fazemos, espectadores, perante as “coisas da vida”: um caminho para o qual sentimos ter um grande desígnio a cumprir e que esbarra, invariavelmente, na incapacidade que temos em controlar os nossos desejos, os nossos sentimentos, ou aquilo que vai surgindo, nas nossas vidas adultas, e que parece querer sabotar tudo aquilo que queríamos viver.
Estes são filmes, também, de uma época em que a ficção cinematográfica via, nessas zonas cinzentas das nossas emoções e das nossas ações, a matéria por excelência para refletir quem éramos e aquilo que tínhamos feito com as nossas vidas e as dos outros. Uma época política e socialmente turbulenta cujos filmes, hoje, ganham uma nova força pela maneira como refletem acontecimentos públicos e privados que nos vão surpreendendo à medida que o nosso centro político e cinematográfico se vai esvaziando (como as salas de cinema), no presente, e nos refugiamos nos extremos. Passadas várias décadas, e apesar dos progressos feitos e das aparências construídas, seremos pessoas mais tolerantes do que éramos enquanto cidadãos e espectadores de cinema? Serão os populismos, a xenofobia, a homofobia, a nossa desconfiança perante as instituições ou, até, dentro das nossas relações, neste novo século, uma sequência surpreendente de dados e de tragédias ou algo já anunciado por aquilo que este cinema nos exibia no seu tempo?
Este é um Ciclo, também, que, pegando no que fora proposto em “American Way of Life: Vidas em Crise”, exibido em fevereiro deste ano, olha, desta vez, para a mesma época no cinema europeu e, particularmente, para realizadores e intérpretes cuja reavaliação se torna urgente perante nomes ou filmes canónicos da história do cinema. Falamos, no cinema francês, na melancolia e vitalidade do olhar de Claude Sautet, cujos retratos de grupo da sociedade francesa se revelam como obras comoventes, verdadeiras e, por isso, extraordinárias. Nos inícios, igualmente, de Maurice Pialat, consagrado, vários anos depois da sua morte, como um autor de renome do cinema europeu. Na impressionante atualidade e transparência, por exemplo, de Rainer Werner Fassbinder e tudo o que se escondia (e ainda se esconde) na sociedade alemã e europeia, com personagens que, hoje, poderiam ser cidadãos a votarem nos extremos políticos que teimam em assombrar a Europa. Na argúcia e impiedade da “comédia italiana” de Luigi Comencini ou Mario Monicelli, filmes que podem fazer rir mas que não procuram confortar o espectador, espelhando diretamente a sua dor, as suas frustrações e a naturalidade com que nos conseguimos transformar em monstros. Num intérprete como Patrick Dewaere, figura trágica do cinema francês que trabalhou na sombra do amigo Gérard Depardieu e no meio dos seus demónios. Ou ainda, por fim, um cineasta árabe a trabalhar na Europa, no século XXI, e que parece querer fazer, deste cinema, um património para os seus poderosos filmes: Abdellatif Kechiche, cuja estreia da mais recente longa-metragem se aguarda e de quem exibimos um olhar realista sobre o que é isso, afinal, de ser estrangeiro numa terra que, julgamos nós, oferece tudo a quem apenas deseja viver a sua vida. Aqui se escondem, neste olhar europeu, as raízes do nosso presente.
 
 
19/07/2018, 18h30 | Sala Luís de Pina
Ciclo Feios, Porcos e Maus: Um Olhar Europeu

Signore e Signori, Buonanotte
de Luigi Comencini, Nanni Loy, Luigi Magni, Mario Monicelli, Ettore Scola
Itália, 1976 - 105 min
 
19/07/2018, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Feios, Porcos e Maus: Um Olhar Europeu

Delitto d’Amore
Delito de Amor
de Luigi Comencini
Itália, 1974 - 96 min
20/07/2018, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Feios, Porcos e Maus: Um Olhar Europeu

Mio Dio, Come Sono Caduta in Basso!
Meu Deus, ao Que Eu Cheguei!
de Luigi Comencini
Itália, 1974 - 107 min
21/07/2018, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Feios, Porcos e Maus: Um Olhar Europeu

Amici Miei
Oh! Meus Amigos
de Mario Monicelli
Itália, 1976 - 107 min
23/07/2018, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Feios, Porcos e Maus: Um Olhar Europeu

Vincent, François, Paul… et les Autres
Os Inseparáveis
de Claude Sautet
França, 1974 - 118 min
19/07/2018, 18h30 | Sala Luís de Pina
Feios, Porcos e Maus: Um Olhar Europeu
Signore e Signori, Buonanotte
de Luigi Comencini, Nanni Loy, Luigi Magni, Mario Monicelli, Ettore Scola
com Marcello Mastroianni, Ugo Tognazzi, Nino Manfredi, Vittorio Gassman, Senta Berger, Adolfo Celi
Itália, 1976 - 105 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Políticos, senadores, autarcas, papas, cardeais, jornalistas, terroristas: ninguém escapa a este retrato implacável da sociedade italiana, e dos seus vários poderes, num dos melhores exemplos de “filme coletivo” da “comédia italiana”. Com um elenco de luxo, e alguns dos melhores intérpretes cómicos do país, Signore e signori, buonanotte é um olhar sobre a Itália através de uma edição de telejornal que certamente lembrará, ao público português, a ideia de um “tal canal” e do seu retrato cómico sobre a nossa corrupção e outras relações sociais. Primeira exibição na Cinemateca.
 
19/07/2018, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Feios, Porcos e Maus: Um Olhar Europeu
Delitto d’Amore
Delito de Amor
de Luigi Comencini
com Giuliano Gemma, Stefania Sandrelli, Brizio Montinaro, Renato Scarpa
Itália, 1974 - 96 min
legendado em português | M/12
No núcleo da história de DELITTO D’AMORE vive a paixão entre dois jovens operários fabris, um do Norte (ele, Nullo) e outro do Sul de Itália (ela, Carmela). O filme de Comencini, em registo drama social e num pano de fundo político, resulta numa dilacerante história de amor de duas jovens vidas entregues à mecanização do trabalho, numa paisagem presa à exploração industrial, e aos conflitos de uma sociedade italiana fatalmente separada entre os seus diferentes códigos, as suas raízes, e os olhares sobre a vida. Uma obra inesquecível, na carreira de Comencini, aliada à pungente banda sonora de Carlo Rustichelli, que toca no nervo das nossas emoções.
 
20/07/2018, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Feios, Porcos e Maus: Um Olhar Europeu
Mio Dio, Come Sono Caduta in Basso!
Meu Deus, ao Que Eu Cheguei!
de Luigi Comencini
com Laura Antonelli, Alberto Lionello, Michele Placido, Jean Rochefort
Itália, 1974 - 107 min
legendado em português | M/16
O filme de Comencini com a inesquecível Laura Antonelli é ambientado na Sicília do início do século XX e segue uma empolada história de enganos. No centro da intriga está um casamento entre um casal que se descobre ligado por estreitos laços de sangue, mantendo uma relação de fachada para evitar o escândalo. MIO DIO, COME SONO CADUTA IN BASSO! é também um caso de comédia à italiana, em registo cruzado com o drama folhetinesco, e um dos melhores exemplos do género, usando o seu período histórico para revelar, ainda hoje, o regime de aparências, os símbolos e as morais que perduram na nossa sociedade. 
 
21/07/2018, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Feios, Porcos e Maus: Um Olhar Europeu
Amici Miei
Oh! Meus Amigos
de Mario Monicelli
com Philippe Noiret, Ugo Tognazzi, Adolfo Celi
Itália, 1976 - 107 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Um dos filmes mais populares dos anos setenta, paradoxalmente amargo e cómico, sobre cinco amigos de meia-idade, bem situados na vida, que se reúnem periodicamente para diabruras e provocações e exorcizar o medo do envelhecimento e da morte. Uma das muitas “comédias masculinas” de que Philippe Noiret foi protagonista e um importante exemplo da fase tardia da carreira de Monicelli. A apresentar em cópia digital.
 
23/07/2018, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Feios, Porcos e Maus: Um Olhar Europeu
Vincent, François, Paul… et les Autres
Os Inseparáveis
de Claude Sautet
com Yves Montand, Michel Piccoli, Serge Reggiani, Gérard Depardieu, Stéphane Audran, Marie Dubois
França, 1974 - 118 min
legendado eletronicamente em português | M/12
No pico da sua carreira, Claude Sautet juntou um elenco de luxo, com alguns dos maiores intérpretes do cinema francês, e traçou um retrato da burguesia francesa através da crise de meia-idade dos seus principais intervenientes: um empresário, um médico, um escritor, e um jovem pugilista, todos eles cruzando e vivendo os seus dilemas sentimentais, pessoais, profissionais, ou da ordem da amizade. A França como poucas vezes se viu, na vida quotidiana e trabalhadora, num retrato de grupo onde o cinema procurou espelhar a forma dilacerante como a vida quotidiana, por vezes, nos atinge com a sua força e simplicidade. A apresentar em cópia digital, numa primeira exibição na Cinemateca.