CICLO
Billy Woodberry | Realizador Convidado



Nascido em 1950, em Dallas, de onde se mudou para a Califórnia em finais dos anos 1960, e radicado em Lisboa onde vive e trabalha desde 2018, Billy Woodberry está em junho na Cinemateca como “realizador convidado” para mostrar a sua obra em contexto. Fá-lo a partir da constelação de filmes a apresentar e comentar com um núcleo de pessoas chamadas por afinidades com ele, com as obras, com os motivos trabalhados e os olhares subjacentes.
Desde 2015, a “rubrica regular” de programação Realizador convidado apresentou programas de e com Pedro Costa, Nicola Rey, Mark Rappaport, Abi Feijó, Jean-Claude Rousseau, Edgardo Cozarinsky, Albert Serra, Adolfo Arrieta, Boris Lehman, Regina Guimarães & Saguenail. No quadro acima resumido da edição de junho de 2025, propõem-se os seis filmes realizados por Billy Woodberry até à data, nos períodos norte-americano e português da sua filmografia de vertente, a princípio, mais ficcional, e na mais documental que assumiu a partir de 1980: as curtas-metragens THE POCKETBOOK, MARSEILLE APRÈS LA GUERRE, A STORY FROM AFRICA e as longas BLESS THEIR LITTLE HEARTS, AND WHEN I DIE I WON’T STAY DEAD, MÁRIO. Também as suas escolhas (um total de dezassete títulos e outros tantos cineastas) refletem uma visão do mundo, o conhecimento da História do cinema e um diálogo com o presente, o percurso como professor de fotografia e cinema e como cineasta, referências, inspirações ou influências, o trabalho com as imagens de arquivo a que tem dedicado o seu cinema nos últimos anos, num mergulho que cruza a história colonial portuguesa fundamentalmente a partir da reflexão em torno da ocupação colonial em Angola no início do século XX que configura A STORY FROM AFRICA.
Billy Woodberry é, lembre-se, um fundador do movimento coletivo, intergeracional, de cineastas afro-americanos conhecido como L.A. Rebellion, formado na UCLA nas décadas de 1970-80, cujos filmes representaram vidas e comunidades afro-americanas, procurando a construção de um novo cinema negro e, de forma lata, revitalizando o cinema independente americano. O movimento surgiu em sintonia com a iniciativa da UCLA que, entre 1968 e 1973, incentivou a inscrição de estudantes negros, latinos, nativos americanos ou asiáticos, agregando, entre outros e além de Woodberry, Charles Burnett, Haile Gerima, Julie Dash, Jamaa Fanaka, Barbara McCullough, Larry Clark, Alile Sharon Larkin, Ben Caldwell, Zeinabu irene Davis. BLESS THEIR LITTLE HEARTS é um título nuclear desse movimento: com uma forte ligação a KILLER OF SHEEP, de Burnett, e à modernidade do cinema italiano e das cinematografias de Cuba, Brasil, Índia ou África, a primeira ficção de Woodberry é hoje reconhecida como uma obra essencial do cinema independente americano. AND WHEN I DIE I WON’T STAY DEAD, a caleidoscópica longa seguinte, retrata o poeta beat americano Bob Kaufman, enquanto a mais recente MÁRIO se centra no angolano Mário Pinto de Andrade e numa geração de combatentes africanos pela independência dos territórios sob domínio colonial português. A curta MARSEILLE APRÈS LA GUERRE que, como depois A STORY FROM AFRICA, se compõe de imagens fotográficas, é um retrato coletivo dos trabalhadores do porto de Marselha e presta tributo ao cineasta e escritor senagalês Ousmane Sembène.
Entre 1989, Billy Woodberry tornou-se professor da CalArts School of Film/Video e da School of Art do California Institute of the Arts, marcando gerações sucessivas de alunos. Realizou o vídeo “The Architect, the Ants, and the Bees” para a instalação multimédia “Facing the Music” (2004)  à volta da construção do Walt Disney Concert Hall desenhado por Frank Gehry para a baixa de Los Angeles. Da sua filmografia constam ainda a participação como ator em WHEN IT RAINS de Charles Burnett (1995) e narrador de RED HOLLYWOOD de Thom Andersen e FOUR CORNERS de James Benning (1998). O seu cinema tem uma vibração de franca intensidade, distinguindo-se, nos últimos trabalhos, por uma rara capacidade de articulação de materiais, trabalho com os arquivos, fluidez, rigor de montagem, em linha com o ritmo musical dos primeiros filmes.
 
O programa reúne filmes cronologicamente produzidos entre 1929 (o raro VOYAGE EN ANGOLA, de Marcel Borle) e 2024 (MÁRIO), de autores como Chaplin e Ford, Helen Levitt, Janice Loeb, James Agee, Sidney Meyers, Manfred Kirchheimer, Satyajit Ray, Ermanno Olmi, Emile De Antonio, Santiago Álvarez, Octavio Cortazar, Pastor Vega, Chris Marker, Nelson Pereira dos Santos e Eduardo Coutinho ou Mila Turajlic. É uma proposta de tangentes e nos quatro sábados do mês, as sessões sugerem “double bills” com os filmes de Billy Woodberry em rima direta com outros da sua escolha. O programa é organizado em diálogo estreito com Billy Woodberry e conta com o apoio inestimável de Andy Rector. A acompanhar as sessões estão Djaimilia Pereira de Almeida, Filipa Vicente, José Manuel Costa, José Oliveira, Maria do Carmo Piçarra, Olivier Hadouchi, Rita Rato, Ruth Wilson Gilmore, Sílvia das Fadas, além de Joana Ascensão, Luís Mendonça, Luís Miguel Oliveira e Maria João Madeira. Será publicado um livro, em edição bilingue (português e inglês), a lançar posteriormente em data próxima.
 
 
03/06/2025, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Billy Woodberry | Realizador Convidado

A Story From Africa | Voyage En Angola
 
04/06/2025, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Billy Woodberry | Realizador Convidado

Por Primera Vez | Modern Times
06/06/2025, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Billy Woodberry | Realizador Convidado

Pather Panchali
de Satyajit Ray
Índia, 1955 - 125 min
07/06/2025, 18h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Billy Woodberry | Realizador Convidado

Cabra Marcado para Morrer
de Eduardo Coutinho
Brasil, 1984 - 119 min
07/06/2025, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Billy Woodberry | Realizador Convidado

And When I Die I Won´t Stay Dead
de Billy Woodberry
Estados Unidos, Portugal, 2015 - 89 min
03/06/2025, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Billy Woodberry | Realizador Convidado
A Story From Africa | Voyage En Angola
VOYAGE EN ANGOLA é acompanhado ao piano por Filipe Raposo

A STORY FROM AFRICA
de Billy Woodberry
Portugal, 2019 – 32 min / intertítulos em inglês com legendas em português | M/12

VOYAGE EN ANGOLA
de Marcel Borle
Suíça, 1929 – 74 min / mudo, intertítulos em francês legendados eletronicamente em português

duração total da projeção: 106 min | M/12

projeção seguida de conversa com Billy Woodberry e Filipa Vicente (em inglês)

“Uma história de África” em diálogo com uma “viagem a Angola” no princípio do século XX. O penúltimo filme de Billy Woodberry a esta data é uma preciosa curta-metragem composta por raras imagens fotográficas de arquivo e sons que interpelam a narrativa da ocupação do território Cuamato, no sul de Angola, em 1907, pelo exército português, a partir do diário visual do militar e fotógrafo Velloso de Castro. “O olhar colonial vem da sua condição histórica. Porém, estas mesmas fotografias admitem e apontam – involuntariamente talvez – para um testemunho espetacularmente raro do seu tempo: a luta e a reação das populações nativas ante as campanhas de conquista e a subjugação colonial, testemunho este que seria muito difícil de alcançar de outro modo dado que o povo Cuamato não teve oportunidade de registar a sua própria luta e discernimento sobre a batalha.” (Billy Woodberry, Buala) VOYAGE EN ANGOLA apresenta-se como “um diário de viagem”, uma expedição privada com origem numa Missão Científica Suíça em Angola, que assume a crónica de um “safari científico”. Com imagens excecionais, realizado por Marcel Borle, que teve um percurso no cinema etnográfico apoiado em práticas ditas amadoras na primeira metade do século XX, trata-se de um filme que esteve esquecido durante décadas. A apresentar na cópia 35 mm da Cinemateca, que restaurou o filme em parceria com a Cinemateca da Suíça e o mostrou em 2018, quando Billy Woodberry o descobriu.

consulte a FOLHA da CINEMATECA do STORY FROM AFRICA aqui

consulte a FOLHA da CINEMATECA do VOYAGE EN ANGOLA aqui
 
04/06/2025, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Billy Woodberry | Realizador Convidado
Por Primera Vez | Modern Times

POR PRIMERA VEZ
de Octavio Cortazar
Cuba, 1967 – 10 min / legendado em português

MODERN TIMES
Tempos Modernos
de Charles Chaplin
com Charles Chaplin, Paulette Godard, Henry Bergman, Tiby Sandford, Chester Conklin
Estados Unidos, 1936 – 86 min / intertítulos em inglês legendados eletronicamente em português

duração total da projeção: 96 min | M/6

POR PRIMERA VEZ regista os acontecimentos de 12 de abril de 1967 na aldeia rural de Munos, em Baraco, Cuba, quando um camião mostra uma projeção de cinema pela primeira vez àquela comunidade. Mais de cem pessoas assistem a TEMPOS MODERNOS de Charles Chaplin, a ver de seguida na sessão (em cópia digital). Antecedendo a justaposição de imagens de um rebanho de ovelhas e de trabalhadores a saírem de uma fábrica, um cartão afirma – “A história da indústria, da iniciativa individual – a humanidade bate-se pela felicidade”: no último filme da personagem do vagabundo Charlot, Chaplin desafia os tempos modernos, fazendo da indústria mecânica e dos conflitos laborais o alvo da sua sátira em tempos de Grande Depressão, desemprego massivo, automatização industrial. Na comédia que se tornou um clássico absoluto, a crítica à desumanização corre a par do elogio da luta pelo amor. Uma obra-prima, e um caso exemplar da mestria do cinema mudo na era do sonoro (o último filme quase mudo de Chaplin tem momentos de som e uma canção).

A sessão repete no dia 24 às 19h00, na sala M. Félix Ribeiro

consulte a FOLHA de POR PRIMERA VEZ aqui

consulte a FOLHA de MODERN TIMES aqui





 
06/06/2025, 15h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Billy Woodberry | Realizador Convidado
Pather Panchali
de Satyajit Ray
com Kanu Bannerjee, Karuna Bannerjee, Subir Banerjee
Índia, 1955 - 125 min
legendado eletronicamente em português | M/12
Sessão de dia 18 apresentada por José Manuel Costa
Primeira obra de Satyajit Ray e primeiro título da chamada “trilogia de Apu”, que representa três fases da vida da personagem homónima, PATHER PANCHALI revelou um cineasta maior, um universo novo em que confluem a cultura indiana, uma dimensão universal e humanista.  É um filme de exteriores, atores não profissionais, fotografia esplendorosa, uma fortíssima carga poética. Segue a história de uma família pobre numa aldeia remota de Bengala cujo pai, aspirante a poeta e dramaturgo, parte para a cidade procurando melhores condições de vida para todos, enquanto, junto da independente irmã mais velha, Durga, da mãe atormentada que fica com a família a cargo, e de uma singular prima anciã, o pequeno Apu vive uma infância livre mas ameaçada pela pobreza extrema. “O tipo de cinema que flui com a serenidade e a nobreza de um grande rio.” (Akira Kurosawa) Um filme prodigioso. A apresentar em cópia digital.

A sessão repete no dia 18 às 21h30, na sala M. Félix Ribeiro.

consulte a FOLHA da CINEMATECA aqui
 
07/06/2025, 18h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Billy Woodberry | Realizador Convidado
Cabra Marcado para Morrer
de Eduardo Coutinho
Brasil, 1984 - 119 min
sessão comentada por Billy Woodberry no final da projeção (em inglês)
Apesar de não ter sido o primeiro filme rodado por Eduardo Coutinho, trata-se do início oficioso da sua carreira como documentarista de referência, no Brasil e no mundo. Coutinho iniciou a rodagem de um filme, a poucos meses do golpe militar de 1964 e mais de vinte anos antes da sua estreia internacional. No início era uma ficção, sobre a morte do líder da liga camponesa de Sapé, João Pedro Teixeira, mas, devido à interrupção de duas décadas, acabou por se tornar um documentário sobre a tentativa de resgatar o filme perdido, propiciando várias oportunidades de reencontro com alguns dos protagonistas. Billy Woodberry vê nele uma inspiração de AND WHEN I DIE I WON’T STAY DEAD. Obra fundamental da história do documentário, CABRA MARCADO PARA MORRER foi mostrado na Cinemateca apenas uma vez, em 1987. A apresentar em cópia digital.

consulte a FOLHA da CINEMATECA aqui.
07/06/2025, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Billy Woodberry | Realizador Convidado
And When I Die I Won´t Stay Dead
de Billy Woodberry
Estados Unidos, Portugal, 2015 - 89 min
legendado em português | M/12
projeção seguida de conversa com Nuno Lisboa e Billy Woodberry (em inglês)
Realizado três décadas depois de BLESS THEIR LITTLE HEARTS e correspondendo a uma inflexão para o registo documental no cinema de Billy Woodberry, AND WHEN I DIE I WON’T STAY DEAD (prémio de melhor documentário de investigação no Doclisboa 2015) retrata a vida e a obra do poeta e ativista norte-americano Bob Kaufman (1925-1986), também conhecido como “o Rimbaud americano”, “uma das vozes esquecidas da beat generation” (MoMA). Perseguido por questões raciais e políticas ligadas à sua origem negra e judaica e ao seu compromisso político (na juventude foi marinheiro e sindicalista, liderando o Sindicato Nacional dos Trabalhadores Marítimos dos Estados Unidos), Kaufman foi alvo de uma série de prisões injustificadas e internado num sanatório onde foi submetido a tratamentos de choque e fez um voto de silêncio que durou mais de uma década. O filme evoca a singularidade do seu percurso e da sua poesia recorrendo a material de arquivo, em que se incluem leituras de poemas gravados na época, fotografias e registos de polícia, uma série de depoimentos que contribuem para resgatar a sua poderosa história.

consulte a FOLHA da CINEMATECA aqui