CICLO
Konrad Wolf


Konrad Wolf (1925-1982) foi a figura mais importante, institucionalmente, no cinema da República Democrática Alemã, e até para além dele, como o atesta o tempo (quase vinte anos, entre a década de 1960 e a sua morte prematura) em que presidiu à Academia das Artes da RDA.
A sua estrela não empalideceu depois do colapso do regime, ao contrário do que sucedeu a muitas outras figuras de importância comparável nas hierarquias da RDA: descrito como um genuíno humanista, dotado de uma sensibilidade e de uma bondade naturais e invulgares, terá usado o poder e a influência não para reprimir mas para apoiar, tendo frequentemente intercedido em abono de colegas cineastas que entravam em conflito com as autoridades políticas do país.
E foi, sobretudo, um cineasta notável, cuja divulgação internacional sofreu, em vida dele, com a animosidade votada à RDA, que muito limitou a circulação dos seus filmes – como aliás a de muitos seus compatriotas, vários realizadores notáveis ainda hoje menorizados ou ignorados pelos estereótipos do olhar “ocidental” sobre o passado da RDA. Wolf, que cresceu na URSS, para onde os pais se mudaram logo em 1933 assim que os nazis subiram ao poder, acreditava no comunismo e acreditava no regime da Alemanha democrática, mas isso não fazia dele um “propagandista”, bem pelo contrário: fazia dele um “crítico”, alguém que constantemente interrogava, punha em causa, reflectia, os rumos políticos e sociais da RDA, tanto na relação com o “ocidente” (a RFA, sobretudo) como na relação com o “oriente” (o restante “bloco de leste”, pela designação comum), como ainda na relação com o que unia os alemães de leste e oeste, o passado histórico comum, sobretudo no período 1933-1945.
Assinalando o centenário do seu nascimento, vamos ver três filmes dele que se encontram os mais famosos que fez mas são ainda, de modo geral, injustamente desconhecidos. Três propostas de reflexão – sobre o Holocausto (STERNE), sobre o Muro de Berlim (DER GETEILTE HIMMEL), sobre as culturas “jovens” e marginais da RDA (SOLO SUNNY) - que o tempo tornou em documentos “históricos” mas não “congelou”, e onde ainda se continua a sentir, com toda a frescura, a pulsação de uma vontade de diálogo com a História contemporânea e com a vida de todos os dias.
 
 
19/05/2025, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Konrad Wolf

Solo Sunny
de Konrad Wolf e Wolfgang Kohlhaase
RDA, 1980 - 100 min
 
20/05/2025, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Konrad Wolf

Sterne
“Estrelas”
de Konrad Wolf
RDA, 1959 - 92 min
20/05/2025, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Konrad Wolf

Der Geteilte Himmel
“O Céu Dividido”
de Konrad Wolf
RDA, 1964 - 110 min
19/05/2025, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Konrad Wolf

em colaboração com o KULTURfest
Solo Sunny
de Konrad Wolf e Wolfgang Kohlhaase
com Renate Krössner, Alexander Lang, Dieter Montag
RDA, 1980 - 100 min
versão original com legendas em inglês e electronicamente em português | M/12
sessão com apresentação
Foi a última ficção de Konrad Wolf (partilhando o crédito de realização com Kohlhaase, autor do argumento) e um fenómeno de popularidade na RDA: esteve seis meses em cartaz, foi possivelmente o filme nacional mais visto em toda a história da Alemanha Democrática, e esse sucesso até foi parcialmente replicado no lado Federal, onde o filme também estreou com considerável adesão popular. É um hino à rebeldia, através de uma protagonista, Sunny, que quer ser uma cantora “rock” – e é por sua vez inspirada numa figura real, esta bastante reprimida pelas autoridades políticas, cujas entrevistas com Kohlhaase serviram para a definição da ossatura do argumento. É um filme divertido e movimentado, com um retrato inesperado de um “underground” da RDA e dos seus círculos culturalmente marginais, a que não falta hoje um interesse de ordem quase arqueológica: o roteiro, belissimamente filmado, por uma cidade que já não existe, a Berlim antigamente chamada “Leste”.
20/05/2025, 19h00 | Sala M. Félix Ribeiro
Konrad Wolf

em colaboração com o KULTURfest
Sterne
“Estrelas”
de Konrad Wolf
com Sasha Krusharska, Jürgen Frohriep, Erik Klen
RDA, 1959 - 92 min
versão original com legendas em inglês e electronicamente em português | M/12
As “estrelas” do título são uma alusão às estrelas amarelas que identificavam os cidadãos judeus durante o nazismo: ambientado (e parcialmente rodado) na Bulgária, STERNE é uma reflexão sobre o Holocausto, a partir da história da relação entre um oficial alemão e uma rapariga judia grega que integra o grupo que ele deve conduzir para um campo de concentração. STERNE impôs definitivamente Konrad Wolf como figura de proa do cinema da RDA. Se está hoje muito esquecido, tal como grande parte da produção da Alemanha Democrática, que já na época encontrava dificuldades de circulação internacional, foi em 1959 um objecto bastante polémico, politica e diplomaticamente, mesmo dentro do chamado “Bloco de Leste” a que pertencia o sector alemão oriental: a Bulgária protestou formalmente, e a URSS não lhe concedeu autorização de estreia. De resto, e fora desse “bloco”, também foi proibido em Israel. Primeira exibição na Cinemateca.
20/05/2025, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Konrad Wolf

em colaboração com o KULTURfest
Der Geteilte Himmel
“O Céu Dividido”
de Konrad Wolf
com Renate Blume, Eberhard Esche, Hans Hardt-Hardtloff
RDA, 1964 - 110 min
versão original com legendas em inglês e electronicamente em português | M/12
Baseado num livro de Christa Wolf, DER GETEILTE HIMMEL é a história de um casal separado pelas novas fronteiras políticas – o muro a dividir Berlim, recorde-se, existia desde 1961. O homem parte para Oeste e a mulher fica no Leste. Sendo uma apologia da RDA (Konrad Wolf foi uma figura destacada na hierarquia cinematográfica da Alemanha de Leste) e narrando um processo de melancólica aceitação, é tudo menos propaganda e proclamação de certezas políticas. Pelo contrário, testemunha como se via, entre os crentes no regime, a divisão das Alemanhas, e deixa claro não haver nenhuma contradição entre crer no regime político da RDA e lamentar profundamente a existência desse “contentor” artificial – o muro – a isolar os alemães. Certos planos do céu, esse céu “dividido”, e a poesia triste que lhes está subjacente, sugerem a influência que o filme de Wolf terá tido sobre Wim Wenders, cujas ASAS DO DESEJO estão para os últimos dias de Berlim dividida como DER GETEILTE HIMMEL está para os primeiros.