CICLO
O Vento no Cinema – Fazer Ver o Invisível


“[O] que o cinema moderno perdeu foi a beleza, a beleza do sopro do vento nas árvores.”
                                                                                                           D. W. Griffith
 
Agora que o deus Éolo tanto volta a lembrar­-nos o seu poder no quadro das nossas relações com a natureza que integramos – a ameaça de novas e maiores catástrofes, a esperança associada à utilização de fontes energéticas limpas e regeneradoras – evocamos o vento como personagem de cinema.
Uma possível história do vento no cinema pode ser contada entre dois “guês”: um “guê”, de Griffith, descobriu na dança da folhagem das árvores, ao fundo da vista Lumière de REPAS DE BÉBÉ, o locus fundamental do cinema e o outro “guê”, de Godard, transformou em missão a tarefa de “tornar visível o invisível”. Por todo o lado, o vento sopra e tão intensamente é assim – manifesta­-se nessa dança que agita quem por ela for levado – que houve quem jurasse ter ouvido a respiração do mundo durante a projeção da obra­-prima do mudo THE WIND de Victor Sjöström. Se há uma dimensão alucinatória e poética no elemento em questão, também há um trajeto que ele desenha no espaço, tendo sido no seu encalço, ou “transportado por ele”, que muitas estórias do cinema se desenrolaram, viraram-­se de cabeça para o ar, projetaram-­se em alturas, até à vertigem, ou encaminharam a ação no sentido de uma mão ou de um beijo. O vento tudo compõe, recompõe e destrói, pois ao pequeno sopro, ao segredo sussurrado, responde a intempérie violenta que leva tudo à frente. Joris Ivens, “o holandês voador”, foi sempre atraído – e levado, em viagem – pelo vento, seguindo-­lhe a rota até aos quatro cantos do mundo, mas, por exemplo, um cineasta como Béla Tarr domou-­o e transformou-­o num poderoso elemento dramático e estilístico. E há ainda o caso de Buster Keaton, que desdramatizou a tempestade e nos fez rir do corpo que, em vão, a combate. Por um lado, o sopro fordiano parece vir da paisagem, por outro lado, em Carl Th. Dreyer, as personagens falam contra o vento para se dirigirem a um entidade superior. Para mais, e como Camus escreveu nos seus cadernos, “o vento é uma das raras coisas limpas do mundo”, mas também a sujidade se deixa levar por ele – o pó, que tem no vento o seu principal medium, é teorizado por Hartmut Bitomsky em STAUB, pelo que facilmente o vento é motivo para pensarmos a relação/a distância que verdadeiramente existe entre aquilo que somos e aquilo que vemos.
 
 
31/10/2022, 19h30 | Sala Luís de Pina
Ciclo O Vento no Cinema – Fazer Ver o Invisível

Pour le Mistral | Profit Motive and the Whispering Wind
duração total da projeção: 89 min
 
31/10/2022, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo O Vento no Cinema – Fazer Ver o Invisível

Steamboat Bill Jr.
Marinheiro de Água Doce
de Buster Keaton, Charles Reisner
Estados Unidos, 1928 - 70 min
31/10/2022, 19h30 | Sala Luís de Pina
O Vento no Cinema – Fazer Ver o Invisível
Pour le Mistral | Profit Motive and the Whispering Wind
duração total da projeção: 89 min
legendados eletronicamente em português | M/12
POUR LE MISTRAL
França, 1965 – 32 min
de Joris Ivens

PROFIT MOTIVE AND THE WHISPERING WIND
de John Gianvito
Estados Unidos, 2007 – 57 min

“Retrato” do forte vento que sopra da Provença francesa até ao Mediterrâneo, POUR LE MISTRAL é um dos grandes exemplos do olhar simultaneamente social e poético de Ivens, aqui com a experiência única da passagem do formato “academy” ao “cinemascope”. A importância devida às vozes de protesto e a persistência da paisagem, soprada pelo vento, são a matéria de PROFIT MOTIVE AND THE WHISPERING WIND. Meditação visual sobre a história do ativismo americano olhada a partir das inscrições gravadas em lápides fúnebres, monumentos e memoriais, que compõem o texto do filme que para além dele dispensa voz off e diálogos, o documentário de Gianvito propõe-­se como uma ode a todos os que lutaram pelas suas convicções e foram esquecidos pelos manuais da historiografia oficial.

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31/10/2022, 21h30 | Sala M. Félix Ribeiro
O Vento no Cinema – Fazer Ver o Invisível
Steamboat Bill Jr.
Marinheiro de Água Doce
de Buster Keaton, Charles Reisner
com Buster Keaton, Tom McGuire, Ernest Torrence
Estados Unidos, 1928 - 70 min
mudo, intertítulos em inglês com legendagem eletrónica em português | M/6
Foi a última produção independente de Buster Keaton, distribuída pela United Artists, e é um dos grandes filmes do realizador-­ator, mestre da arte do burlesco: como é regra do burlesco, Keaton está sempre às voltas com os objetos, desta vez um barco que desce um grande rio americano. STEAMBOAT BILL JR. é a história de um marinheiro desajeitado que tenta ajudar o pai e acaba por se apaixonar pela filha do comandante de um barco rival. Destaque para a fabulosa sequência do furacão, verdadeiro tour de force, um dos pontos altos do cinema de Keaton. A exibir em cópia digital.

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