CICLO
Salvar a Cinemateca Brasileira!


Abra-se a exceção para o que é absolutamente excecional. Contra o que tem sido hábito neste jornal, anunciamos nesta página, antes das entradas relativas aos grandes ciclos do mês, duas sessões especiais de setembro, motivadas pelo estado paroxístico da atual crise vivida pelos nossos colegas da Cinemateca Brasileira (CB).
Tínhamo-lo anunciado no comunicado que divulgámos a 3 de agosto passado: no rescaldo de mais um violento incêndio deflagrado em depósitos daquela instituição (a terceira catástrofe patrimonial nela ocorrida em cinco anos, num processo cada vez mais relacionado com o total desamparo de coleções e instalações às quais a equipa da CB está impedida de aceder), sentimos que há que elevar o tom das declarações de solidariedade emanadas da comunidade internacional e da nossa própria cinemateca, desencadeando ações de apoio urgentes e continuadas até que os nossos colegas de São Paulo possam retomar o lugar que lhes compete. 
Lembre-se o essencial: uma das cinematecas de referência no mundo, decisiva para a salvaguarda do Cinema Brasileiro, com papel destacado no panorama das cinematecas latino-americanas e com uma história cujas bases remontam à década de quarenta do século XX, viu-se subitamente posta em causa por um inusitado e intrincado processo político-administrativo, que, independentemente de qualquer eventual remoto pretexto (em si mesmo de há muito inexistente ou contraditório), teve a característica insólita de eleger como inimigos a própria instituição e a sua equipa, levando à interrupção dos apoios do Governo Federal e a uma forçada paralisação de atividade, que, desde o dia 7 de agosto de 2020, inclui a interdição formal de entrada de todos os técnicos nas instalações.
Se este processo tem chocado a comunidade internacional dos arquivos, do cinema e da cultura em geral, a manutenção à outrance desta última medida, feita de forma cega e totalmente irresponsável face à natureza de acervos com estas características, essa, na estrita medida em que, como se constata, está a colocar em risco a mais elementar segurança de um património que é também mundial (não há fronteiras nacionais em nenhum acervo de nenhuma cinemateca, e o grande Cinema Brasileiro não pode deixar de ser visto como património da humanidade) impõe-nos a todos que levantemos a voz e tornemos ainda mais claro que esta não é uma questão local, e que o tempo está a esgotar-se para evitar uma catástrofe ainda maior.
A sessão de 6 de setembro será a primeira de uma série (neste momento prevista com aproximada periodicidade quinzenal) que só será suspensa quando os nossos colegas da CB puderem de novo regressar ao lugar e à missão que lhes compete. Todas serão de homenagem ao Cinema Brasileiro, à instituição Cinemateca Brasileira e à sua história, e à atual equipa que a representa. E é pensando nesse todo que fazemos questão de voltar a exibir um título emblemático de um realizador maior, em torno de cuja memória nos reuniremos aqui, neste dia, com todos aqueles que, com a sua presença, quiserem associar-se a esta causa. A segunda sessão ocorrerá no dia 20 de setembro, com programa a anunciar.
 
 
06/09/2021, 18h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Salvar a Cinemateca Brasileira!

O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro / Antonio das Mortes
de Glauber Rocha
Brasil, 1969 - 95 min
 
20/09/2021, 21h30 | Esplanada
Ciclo Salvar a Cinemateca Brasileira!

O Som ao Redor
de Kleber Mendonça Filho
Brasil, 2012 - 133 min | M/12
06/09/2021, 18h30 | Sala M. Félix Ribeiro
Salvar a Cinemateca Brasileira!
O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro / Antonio das Mortes
de Glauber Rocha
com Maurício do Valle, Odete Lara, Lorival Pariz, Antonio Piranga
Brasil, 1969 - 95 min
sessão com apresentação
Mais conhecida como ANTONIO DAS MORTES, esta primeira longa-metragem a cores de Glauber Rocha amplia o universo de DEUS E O DIABO NA TERRA DO SOL, com uma mise-en-scène que tem alguns pontos em comum com o western spaghetti. O filme aproxima certos mitos populares brasileiros e a alegoria política. O protagonista, Antonio das Mortes, assassino por contrato a serviço dos poderosos, já surgira em DEUS E O DIABO NA TERRA DO SOL. Mas desta feita acaba por se voltar contra eles e massacra os representantes da ordem estabelecida. “ANTONIO DAS MORTES é o meu ALEXANDRE NEVSKI, é o ALEXANDRE NEVSKI do sertão, a ópera global inspirada pelas lições de Eisenstein” (Glauber Rocha).

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20/09/2021, 21h30 | Esplanada
Salvar a Cinemateca Brasileira!
O Som ao Redor
de Kleber Mendonça Filho
com Ana Rita Gurgel, Caio Almeida, Maeve Jenkins
Brasil, 2012 - 133 min | M/12
sessão com apresentação
Nos últimos anos, devido a um trabalho de fundo, a cidade do Recife tornou-se o pólo do cinema de maior ambição artística e melhor qualidade do Brasil, graças em parte à ação como programador de Kleber Mendonça Filho, o realizador de AQUARIUS e BACURAU. O SOM AO REDOR é a sua primeira longa-metragem. Situado num bairro abastado e realizado em scope, o filme mostra as suas personagens (os habitantes novos-ricos e os homens que fazem a segurança do bairro) num denso panorama mural, com diversas histórias simultâneas e pequenos incidentes. No desenlace, uma surpresa narrativa dá uma nova camada de sentido ao filme. Segundo o realizador, “o tema do filme é a inquietação”. Para “tornar palpável o sentimento de violência sem mostrar o ato de violência”, Kleber Mendonça Filho fez um extraordinário trabalho sobre o som off, a partir de mais de sessenta horas de som gravado: o espaço do filme é compartimentado, mas o som invade cada uma destas divisões, num filme em que “a banda sonora não apenas constrói o ambiente do filme como age sobre a sua dinâmica” (Joachim Lepastier). 

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